sexta-feira, 28 de junho de 2019

IOF. EXPORTAÇÃO. ALÍQUOTA ZERO NA INTERNALIZAÇÃO DOS VALORES DA OPERAÇÃO

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Interessante questão, envolvendo o IOF na internalização no Brasil de recursos financeiros, relativos à exportação de produtos brasileiros para outro País, que lá se encontravam depositados.
Pode uma  Autoridade, hierarquicamente inferior ao Chefe do Poder Executivo, modificar regra que este veiculou em  Decreto, para exigir mencionado Imposto na referida operação?
Boa leitura.  


PROCESSO Nº: 0804718-93.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: TERPHANE LTDA
ADVOGADO: Amanda Rodrigues Guedes
ADVOGADO: Lais Borges De Noronha
ADVOGADO: Washington Lacerda Gomes
ADVOGADO: Flavio Marcos Diniz
ADVOGADO: Gilson Jose Rasador
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



Sentença Tipo A, registrada eletronicamente.

Vistos, etc. 
EMENTA: - TRIBUTÁRIO. CONSTITUCIONAL. IOF
Autoridades do âmbito de Ministério da área Fazendária e Econômica  não podem modificar Decreto do Chefe do  Poder Executivo, relativamente ao IOF.
Concessão da segurança.
1. Breve Relatório
TERPHANE LTDA. este impetrou Mandado de Segurança, em 25.03.2019,  com pedido de concessão de Medida Liminar inaudita altera parte, em face do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE / PE , autoridade administrativa vinculada funcionalmente à UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL). Aduziu, em síntese, que: a Impetrante seria pessoa jurídica de direito privado regularmente constituída, que teria como objeto social a exploração do ramo de importação, exportação e comercialização de mercadorias, conforme seu Estatuto Social anexo;  no desenvolvimento das atividades que compõem o seu objeto a Impetrante realizaria exportações de produtos para o exterior e, de acordo com autorização da Lei n.º 11.371, de 28 de novembro de 2006, manteria recursos em moeda estrangeira, relativos ao recebimento de tais exportações em instituição financeira no exterior, mas especificamente no Banco J. P. Morgan; de acordo com o art. 15-B, I, do Decreto n.º 6.306, de 14 de dezembro de 2007, nas operações de câmbio relativas ao ingresso no País de receitas de exportação de bens e serviços, a alíquota do Imposto sobre Operações Financeiras "IOF" ficaria reduzida a ZERO; todavia, a Coordenação Geral de Tributação da Receita Federal do Brasil "COSIT" teria publicado  a Solução de Consulta nº 246, de 24 de dezembro de 2018, manifestando orientação a todos os órgãos e autoridades fazendárias federais, bem como aos contribuintes, no sentido de que a redução da alíquota do IOF a zero somente se aplicaria aos ingressos de receitas realizadas ocorridas dentro do processo ou do ciclo de exportação, contrariando a norma contida no Decreto n. 6.306/2007; com base em tal orientação, os bancos que operam no mercado de câmbio teriam passado a reter e recolher aos cofres da União Federal o IOF à alíquota de 0,38% sobre o ingresso de receitas de exportação realizadas após o encerramento do ciclo de exportação, conforme atestam os documentos anexos; esse mesmo procedimento seria adotado pelo Banco J. P. Morgan, contratante do câmbio, na próxima operação de ingresso de receitas de exportação em curto prazo, conforme documentos ora juntados; diante da clara violação a direito líquido e certo da Impetrante, perpetrada por determinação da Autoridade Impetrada, não restaria outra alternativa senão a busca junto ao sempre independente Poder Judiciário de ordem que lhe assegure o direito de não sofrer desconto indevido de IOF na operação de câmbio no ingresso de receitas decorrente de exportações.  Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela concessão de medida liminar inaudita altera parte, para determinar à DD Autoridade coatora que se abstenha, por si ou por seus subordinados, de impedir a Impetrante de remeter ao Brasil recursos provenientes de operações de exportação originalmente mantidos no exterior, com incidência do IOF à alíquota ZERO, conforme expressamente previsto no art. 15-B, I do Decreto nº 6.306, de 2007, determinando-se que referida DD Autoridade coatora se abstenha de considerar os valores de IOF aqui discutidos como base para negativa de certidão de regularidade fiscal (arts. 205 e 206 do CTN), para inscrição no CADIN ou outro cadastro de devedores e, ainda, para autuação do contribuinte, inclusive quanto às operações já praticadas com a aplicação da alíquota 0(zero) do IOF. Requereu, ainda, que, deferida a medida liminar, fosse imediatamente oficiado o BANCO CENTRAL DO BRASIL, com endereço na Rua da Aurora, 1259 - Santo Amaro, Recife - PE, 50040-090, para que determine / autorize todas as instituições financeiras a realizar as operações de câmbio de receitas de exportação da Impetrante sob alíquota ZERO do IOF, em especial o BANCO J. P. MORGAN DO BRASIL, com endereço à AV. Brigadeiro Faria Lima, 3.729 - Itaim Bibi, São Paulo/SP, 04.538-905. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.
Foi exarada decisão deferindo a medida liminar (Id. 4058300.10242157).
A autoridade apontada como coatora apresentou Informações. Aduziu, dentre outros aspectos, que:  após o recebimento dos recursos em conta mantida no exterior estaria encerrado o ciclo de exportação; encerra-se o ciclo da exportação; se em data posterior ao depósito o exportador decide internar os recursos ao Brasil, esta internação de moeda não fará parte de um processo de exportação e estará sujeito à alíquota de 0,38%, conforme o Decreto nº 6.306, art. 15-B, caput; o entendimento externado pela RFB na Solução de Consulta nº 246/2018 foi amplamente divulgado nos meios oficiais e pelas próprias instituições financeiras, intermediárias dos contratos de câmbio; seria impossível proceder a compnsação antes do trânsito em julgado, caso concedida a segurança;. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela denegação da segurança. (Id. 4058300.10302787).
A UNÃO pugnou pela devolução do prazo para a necessidade de retificação dos registros informatizados deste processo de "União" para "Fazenda Nacional"  (Id. 4058300.10326261).
A União (Fazenda Nacional) manifestou interesse no feito e registrou que deixaria de interpor recurso  contra a decisão concessiva da medida liminar com amparo em Nota Técnica Justificativa administrativamente arquivada (Id. 4058300.10337781).
O MPF não se manifestou sobre o mérito da questão (Id. 4058300.10525792).
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir..
2. Fundamentação
Inexistindo alteração das circuntâncias fático-jurídicas desde a prolação da decisão que concedeu a medida liminar (Id. 4058300.10242157), passo a transcrevê-la para integrar a fundamentação desta sentença, verbis:
"(...).


Pugna a Impetrante por provimento jurisdicional  liminar inaudita altera parte, para determinar à DD Autoridade coatora que se abstenha, por si ou por seus subordinados, de impedir a Impetrante de remeter/trazer para Brasil recursos provenientes de operações de exportação, originalmente mantidos no exterior, com incidência do IOF à alíquota ZERO, conforme expressamente previsto no art. 15-B, I, do Decreto nº 6.306, de 2007, determinando-se que mencionada DD Autoridade coatora se abstenha de considerar os valores de IOF aqui discutidos como base para negativa de certidão de regularidade fiscal (arts. 205 e 206 do CTN), para inscrição no CADIN ou outro cadastro de devedores e, ainda, para autuação do contribuinte, inclusive quanto às operações já praticadas com a aplicação da alíquota 0 do IOF.


Alegou que a Coordenação Geral de Tributação da Receita Federal do Brasil "COSIT" teria publicado  a Solução de Consulta nº 246, de 24 de dezembro de 2018, manifestando orientação a todos os órgãos e autoridades fazendárias federais, bem como aos contribuintes, no sentido de que a redução da alíquota do IOF a zero somente se aplicaria aos ingressos de receitas realizadas ocorridas dentro do processo ou do ciclo de exportação, contrariando a norma contida no Decreto n. 6.306/2007 e com base em tal orientação, os bancos que operam no mercado de câmbio teriam passado a reter e recolher aos cofres da União Federal o IOF à alíquota de 0,38% sobre o ingresso de receitas de exportação realizadas após o encerramento do ciclo de exportação.


Pois bem.


A COSIT (Coordenação do Sistema de Tributação) publicou, em 24 de dezembro de 2018, a Solução de Consulta n. 246, contendo a interpretação fiscal quanto à incidência do IOF (Imposto sobre Operações Financeiras) em operações de câmbio, relativas a pagamentos de exportações, quando do recebimento e manutenção dos recursos em conta bancária aberta no Exterior.


Para um melhor entendimento da matéria, transcrevo trecho da mencionada Solução de Consulta n.246, verbis:


"ASSUNTO: Imposto sobre Operações de Crédito, Câmbio e Seguros ou relativas a Títulos ou Valores Mobiliários - IOF
EMENTA: RECURSOS PROVENIENTES DE EXPORTAÇÕES. MANUTENÇÃO NO EXTERIOR. INOCORRÊNCIA DO FATO GERADOR.
Não incide IOF quando da manutenção de recursos em moeda estrangeira em instituição financeira fora do país, relativos aos recebimentos de exportações brasileiras de mercadorias e de serviços para o exterior, realizadas por pessoas físicas ou jurídicas. Nesta situação, não há liquidação de contrato de câmbio e, portanto, não se verifica a ocorrência do fato gerador do imposto conforme definido no art. 63, II do Código Tributário Nacional (CTN) e no art. 11 do Decreto 6.306, de 2007.
No entanto, se os recursos inicialmente mantidos em conta no exterior forem, em data posterior à conclusão do processo de exportação, remetidos ao Brasil, haverá incidência de IOF à alíquota de 0,38%, conforme determina o caput do art. 15-B do Decreto nº 6.306, de 2007.
OPERAÇÕES DE CÂMBIO RELATIVAS AO INGRESSO NO PAÍS DE RECEITAS DE EXPORTAÇÃO DE BENS E SERVIÇOS. ALÍQUOTA ZERO.
No caso de operações de câmbio relativas ao ingresso no país de receitas de exportação de bens e serviços, há a incidência do IOF na operação de câmbio à alíquota zero, conforme expressa previsão no art. 15-B do Decreto nº 6.306, de 2007.
DISPOSITIVOS LEGAIS: Lei nº 5.172, de 25 de outubro de 1966 (Código Tributário Nacional - CTN); Lei nº 8.894, de 21 de junho de 1994; e Lei nº 11.371, de 28 de novembro de 2006; Decreto nº 6.306, de 14 de dezembro de 2007.".[Negritei).


Com efeito, vê-se que a COSIT concluiu pela incidência de IOF apenas quando "os recursos inicialmente mantidos em conta no exterior forem, em data posterior à conclusão do processo de exportação, remetidos ao Brasil, haverá incidência de IOF à alíquota de 0,38%, conforme determina o caput do art. 15-B do Decreto nº 6.306, de 2007.".


Como se sabe, utilizando-se da faculdade concedida no § 1º do art. 153 da vigente Constituição da República e no art. 65 do Código Tributário Nacional(Lei 5.172, de 1966), a UNIÃO, por meio do Chefe do Poder Executivo,  reduziu a 0%(zero por cento) a alíquota do IOF incidentes sobre receitas decorrentes de exportação brasileira para outro País.


Nesse aspecto, o Brasil seguiu a saudável orientação econômico-financeira de que não se "exporta tributos, mas produtos".


É que todo País, principalmente aqueles que têm sérios problemas no balanço de pagamento, como o Brasil, necessitam quase que desesperadamente de adquirir moeda estrangeira, para reservas monetárias(controle cambial) via Banco Central do Brasil.


Em termos práticos, no entender da Receita, se a Empresa exportadora recebe pagamento por exportação em banco em outro País e imediatamente, ou seja, dentro do período de "conclusão do processo de exportação", remete o pagamento  em moeda estrangeira para o Brasil(fato gerador do o IOF, art. 63-II, CTN), continuará gozando da alíquota zero desse Imposto, o que não ocorrerá se mencionada remessa der-se fora desse período de "conclusão do processo de exportação", quando então sofrerá retenção do IOF, sob alíquota de 0,38%(trinta e oito centésimos por cento).


No final da mencionada Solução de Consulta, a DD Autoridade Fazendária invoca o "art. 15-B do Decreto nº 6.306, de 2007.".


Bem, quanto a essa operação, consta nesse dispositivo desse Decreto o seguinte:


"Art. 15-B.  A alíquota do IOF fica reduzida para trinta e oito centésimos por cento, observadas as seguintes exceções:         (Incluído pelo Decreto nº 8.325, de 2014)


I - nas operações de câmbio relativas ao ingresso no País de receitas de exportação de bens e serviços: zero;         (Incluído pelo Decreto nº 8.325, de 2014) [1]


         § 4º  Enquadram-se no disposto no inciso I as operações de câmbio relativas ao ingresso no País de receitas de exportação de serviços classificados nas Seções I a V da Nomenclatura Brasileira de Serviços, Intangíveis e Outras Operações que produzam variações no patrimônio - NBS, exceto se houver neste Decreto disposição especial.          (Incluído pelo Decreto nº 8.731, de 2016)"


Note-se que nesse Decreto não há qualquer limitação quanto ao tempo para  ingresso das Receitas no Brasil.


A limitação da mencionada Solução de Consulta teria respaldo na Lei que deu origem a esse Decreto?


Vejamos.


Lei nº 5.143, de 20.10.1966, já com diversas alterações:


       "Art 3º O impôsto será cobrado com as seguintes alíquotas:


        I - empréstimos sob qualquer modalidade, as aberturas de crédito, e os descontos de títulos - 0,3%;


        Il - seguro de vida e congêneres e de acidentes pessoais e do trabalho - 1,0%;


        III - seguros de bens, valôres, coisas e outros não especificados, excluídos o resseguro, o seguro de crédito a exportação e o de transporte de mercadorias em viagens internacionais: - 2,0%.".


Note-se que, no inciso III desse artigo de Lei, as receias decorrentes de exportação ficam à margem da tributação.


E nela, tampouco nas outras Leis que a alteraram parcialmente, há regra idêntica à consignada na noticiada Solução de Consulta.


E mencionada restrição é do tipo que não pode, sequer, ser veiculada em Decreto, porque por Decreto o Presidente da República  só poderá  reduzir a zero a alíquota do Imposto em debate e/ou restabelecê-la até a alíquota máxima fixada em Lei.


Qualquer  outra restrição, com  relação a esse imposto, tendo em vista o princípio da legalidade restrito, previsto no inciso I do art. 150 da vigente Constituição da República, só poderá ser fixada por Lei.


Assim, mencionada Solução de Consulta choca-se diretamente com esse dispositivo constitucional e, por isso, não pode prevalecer.


3. Dispositivo


Posto isso, concedo a pleiteada medida liminar e determino que a DD. Autoridade apontada como coatora abstenha-se, por si ou por seus subordinados, de exigir o imposto em questão à alíquota de 0,38(trinta e oito centésimos por cento), aplicando, sim, a alíquota O%(zero) sobre os valores decorrentes de exportações que a Impetrante realizou para outros Países, e que também forneça à Impetrante, se requerer na  via administrativa, certidão positiva de débito, com  efeito  de certidão negativa, conforme  regras dos arts. 205 e 206 do acima invocado Código Tributário Nacional, exceto se outro(s) débito(s)  existir(erem), e que mencionada DD Autoridade coatora tome todas as providências necessárias para o devido cumprimento desta decisão, sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009.


Oficie-se o Banco Central do Brasil, conforme requerido, para o fiel cumprimento desta decisão, sob as penas do art. 77 e respectivos Parágrafos do vigente Código de  Processo  Civil.


Notifique-se a DD. Autoridade apontada coatora, para a apresentação das informações, no prazo legal, bem como para dar imediato cumprimento a esta decisão, sob as penas acima indicadas.


Outrossim, determino que a União (Fazenda Nacional), por seu órgão de representação judicial próprio, seja cientificada desta decisão, para os fins legais.


No momento oportuno, ao MPF para o r. Parecer legal.


Recife, 01.04.2019


Francisco Alves dos Santos Júnior


 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE".
 Diante de tal contexto e considerando que a DD Autoridade Impetrada, nas Informações, limitou-se a repetir o consignado no ato  ora  impugnado,  mencionada e transcrita medida liminar merece ser ratificada e tornada definitiva, para todos  os fins de direito. 
Mencionado ato administrativo, de caráter normativo, como já dito na decisão acima transcrita, invade esfera privativa do Chefe do Poder Executivo, contrariando a ali mencionada regra constitucional, por isso, não pode continuar sendo aplicada.  .
3. Dispositivo
Posto isso, ratifico a medida liminar, concedida na decisão sob identificador 4058300.10242157, julgo procedentes os pedidos desta ação mandamental e concedo a segurança tornando definitiva referida medida liminar, garantindo à Impetrante o direito de trazer para o Brasil os recursos financeiros provenientes de operações de exportação, que se encontram depositados em Instituições  Financeiras em outro País,  com incidência do IOF à alíquota ZERO, conforme expressamente previsto no art. 15-B, I, do Decreto nº 6.306, de 2007.
Condeno a DD A autoridade coatora, ainda, a compensar as quantias eventualmente exigidas da Impetrante e por ela recolhidas,  retroativamente aos últimos cinco anos, contados a partir da data da impetração deste Mandado de Segurança, observadas as regras legais e administrativas pertinentes, bem como o trânsito em julgado desta sentença ou de acórdão que a mantenha(art. 170-A, CTN)
Atualização mediante aplicação da taxa SELIC, desde o recolhimento indevido até a data da efetiva compensação ou recebimento em restituição.
Custas na forma da Lei.
Sem honorários sucumbenciais (art. 25, da Lei n.º 12.016/2009).
Sentença sujeita ao duplo grau obrigatório de jurisdição (§ 1º do art. 14 Lei n. 12.016/2009), sem efeito suspensivo(§ 3º do art. 14 da mesma Lei).
Registre-se. Intimem-se.
Recife, 28.06.2019
Francisco  Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal, 2a Vara Federal-PE

A LEI TRIBUTÁRIA E SEUS EFEITOS IMEDIATOS NO CAMPO DA COMPENSAÇÃO.

Por Francisco  Alves dos Santos Júnior

Na sentença que segue, discute-se um importante problema do direito tributário, à luz da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: os efeitos imediatos da Lei Tributária nova frente aos direitos dos Contribuintes,  no campo da compensação.
Boa Leitura.  



Obs.: Sentença pesquisada e minutada pela Assessora Luciana Simoes Correa de Albuquerque



PROCESSO Nº: 0812733-85.2018.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: O G G LTDA
ADVOGADO: A C F De O
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DRF) EM RECIFE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)



Sentença Tipo A, registrada eletronicamente.

Vistos, etc. 
EMENTA: - TRIBUTÁRIO. EFEITOS DA LEI NOVA.
A Lei Tributária nova, relativa à compensação, entra em vigor imediatamente(precedente do Supremo Tribunal Federal).
Cassação da Medida Liminar. 
Negação da Segurança.  

1. Breve Relatório

O G G LTDA, qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança com pedido de liminar em face do Sr. DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DRF) EM RECIFE. Aduziu, em síntese, que: seria uma sociedade limitada que teria como objeto social a fabricação e comercialização de equipamentos industriais, incluindo grupos geradores, componentes de grupo geradores, peças, e painéis elétricos, locação de grupos geradores, manutenção de equipamentos, projetos e instalações e representação comercial e reparação, manutenção e locação em equipamentos industriais; a empresa apuraria seu Imposto de Renda (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) com base no Lucro Real com recolhimentos por estimativa mensal; a Impetrante teria optado pelo recolhimento por estimativa no exercício de 2016 e apurou ao final do exercício os valores equivalente a R$285.358,06(duzentos e oitenta e cinco mil, trezentos e cinquenta e oito reais e seis centavos) referente a Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e R$ 87.284,88 (oitenta e sete mil, duzentos e oitenta e quatro reais e oitenta e oito centavos) referente a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), ambos a recolher; seria detentora de crédito acumulado das contribuições relativas ao Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), vinculados a receita de exportação, escriturados em sua contabilidade referente ao período de fevereiro de 2016, créditos estes passíveis de compensação com débitos de IRPJ e CSLL, para a realização de compensação/abatimento de créditos em débitos relativos a tributos federais; teria realizado,  em 2017, tanto um pedido de ressarcimento, quanto de compensação para os débitos de IRPJ e CSLL referente ao exercício de 2016, contudo, devido a erro no cruzamento de suas declarações, a operação teria que ser refeita; para a quitação das estimativas de IRPJ/CSLL referentes a 2016, a Impetrante teria realizado o pedido de ressarcimento por meio do programa PER/DCOMP sob o nº 15324.15023.310818.1.1.19-6420, transmitido em 31.08.2018, solicitando o pedido de ressarcimento (PER) do crédito no valor de R$ 440.181,52 (quatrocentos e quarenta mil, cento e oitenta e um reais e cinquenta e dois centavos) referente a fevereiro de 2016; ao tentar transmitir a declaração de compensação3 (DCOMP) para os débitos relativos a IRPJ e CSLL Lucro Real Estimativa, para surpresa da Impetrante, o sistema teria retornado com a mensagem "ERRO! VALIDADOR PERDCOMP. A TRANSMISSÃO NÃO FOI CONCLUÍDA. É vedada a compensação de débitos de estimativa do IRPJ ou da CSLL, conforme art. 74 da Lei nº 9.430 de 1966, com redação dada pela Lei nº 13.670 de 2018."; teria sido publicada, em 30.05.2018 a Lei nº 13.670/18, alterando o art. 74, §3º da Lei 9.430/96 para incluir o inciso IX, segundo o qual as empresas não poderão quitar seus débitos de estimativa de IRPJ e CSLL por meio de compensação (PER/DCOMP), sendo obrigadas a realizar o pagamento em dinheiro destes débitos: "Art. 6º A Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, passa a vigorar com as seguintes alterações: "Art. 74. (...) § 3º Além das hipóteses previstas nas leis específicas de cada tributo ou contribuição, não poderão ser objeto de compensação mediante entrega, pelo sujeito passivo, da declaração referida no § 1o: (...) IX - os débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) apurados na forma do art. 2º desta Lei";  tal conduta arbitrária e ilegal além de ter ocorrido no meio do exercício fiscal, desrespeitando flagrantemente diversos princípios do direito tributário para a cobrança imediata de impostos, também está sendo aplicada para os casos anteriores a edição da Lei nº 13.670/18, retroagindo seus efeitos, conduta condenável pelo Direito Tributário; o momento da referida alteração teria se dado no dia 30.05.2018 (em meio ao feriado nacional de corpus christi); a União teria achado uma forma de compensar a queda da arrecadação, prejudicando a Impetrante no seu direito de compensar seus débitos de IRPJ e CSLL, obrigando-a ilegalmente a passar a desembolsar em espécie recurso não previsto para este fim, comprometendo severamente seu planejamento fiscal e econômico; ao limitar a compensação de débitos anteriores a sua vigência a alteração legal teria ferido  o princípio da irretroatividade em matéria tributária. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela concessão da liminar para determinar que seja deferida medida liminar, para determinar que a Receita Federal do Brasil providencie a regular recepção do pedido de compensação constante no Anexo 03 da presente.  Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.

Decisão, SOB Id. 4058300.6207506, na qual se concedeu a medida liminar.  

A União (Fazenda Nacional) noticiou a interposição de Agravo de Instrumento (Id. 4058300.6273380).

A União (Fazenda Nacional) apresentou Contestação. Aduziu, em apertada síntese, que: ao contrário do alegado pela impetrante, o fato de os créditos tributários serem anteriores à produção de efeitos da Lei n. 13.670/2018, de modo algum configura direito adquirido; haveria, no máximo, expectativa de direito compensatório; não se poderia confundir o fato gerador do direito à compensação (existência de um débito e um crédito compensáveis e seu correspondente encontro de contas) com o fato gerador dos tributos compensáveis; as regras de compensação poderiam ser alteradas com aplicabilidade imediata sem que isso configurasse surpresa, como já reconhecido jurisprudencialmente à época da MP 449/2008. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela denegação da segurança (Id. 4058300.6273379).

Ceritficado o decurso de prazo sem que fossem apresentadas as Informações (Id. 4058300.6423367).

Foi mantida a decisão agravada e determinada a remessa dos autos ao MPF (Id. 4058300.6423798).

O Ministério Público Federal não se manifestou sobre o mérito da questão (Id. 4058300.8897579).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

Busca a parte autora provimento jurisdicional antecipatório no sentido de se reconhecer o direito à manutenção do regime de apuração da contribuição previdenciária patronal nos moldes do art. 8° da Lei n° 12.546/11 até o final de 2018, conforme opção efetuada em janeiro/2018 . Pugna, ao final, que seja confirmada a medida liminar concedida para determinar a regular recepção e processamento do pedido de compensação constante no anexo 03 da presente, uma vez qu a Lei 13.670/18, no seu sentir, não possuiria eficácia retroativa.

Pois bem.

No que aqui pertine, a  Lei n.12.546/11 estabelece verbis:

"Art. 8º  Poderão contribuir sobre o valor da receita bruta, excluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos, em substituição às contribuições previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, as empresas que fabricam os produtos classificados na Tipi, aprovada pelo Decreto no 7.660, de 23 de dezembro de 2011, nos códigos referidos no Anexo I."           (Redação dada pela Lei nº 13.161, de 2015)     (Vigência).

Com advento Lei 13.161/15,  introduziu-se a possibilidade de os contribuintes  optarem, irretratavelmente, pela forma de recolhimento sobre a folha de salários ou sobre a receita bruta, opção que, uma vez feita,  deveria ser observada no restante do ano-calendário, a teor do § 13 do  art. 9º da Lei 12.546/11,  verbis:

"§ 13.  A opção pela tributação substitutiva prevista nos arts. 7o e 8o será manifestada mediante o pagamento da contribuição incidente sobre a receita bruta relativa a janeiro de cada ano, ou à primeira competência subsequente para a qual haja receita bruta apurada, e será irretratável para todo o ano calendário.".                      (Incluído pela Lei nº 13.161, de 2015)     (Vigência)

Esta opção, porém, veio a ser limitada, em grande medida, pelo advento da Lei 13.670/18, que assim preceituou:

Art. 11.  Esta Lei entra em vigor:

I - no primeiro dia do quarto mês subsequente ao de sua publicação, quanto aos arts. 1º e 2º, e ao inciso II do caput  do art. 12; e

II - na data de sua publicação, quanto aos demais dispositivos.

Art. 12.  Ficam revogados:


II - os seguintes dispositivos da Lei nº 12.546, de 14 de dezembro de 2011:            (Vigência)

a) o inciso II do caput  do art. 7º;

b) as alíneas "b" e "c" do inciso II do § 1º, os §§ 3º a 9º e o § 11 do art. 8º; e

c) os Anexos I e II.

Ou seja, a edição da Lei n. 13.670/18  implicou a exclusão da possibilidade  de algumas atividades econômicas, entre elas, as exercidas pela Impetrante,  de recolher a  contribuição patronal  tendo como base de cálculo a receita bruta, devendo fazê-lo sobre a folha de pagamento/salário, a partir de 1º de setembro de 2018.

Em princípio, embora nos termos do §13 do art. 9º da Lei 12.546/11, a opção pela tributação substitutiva manifestada mediante o pagamento da contribuição incidente sobre a receita bruta relativa a janeiro de cada ano fosse irretratável para todo o ano-calendário, houve alteração no regime jurídico tributário.

E, em se tratando de regime tributário, não há qualquer empecilho a que o Legislador o altere, a qualquer tempo, desde que respeitados os parâmetros constitucionalmente estabelecidos, uma vez que não há que se falar em direito  adquirido a qualquer regime tributário.

A opção feita pelo contribuinte acerca da tributação com base na folha de salários ou na receita bruta é irretratável desde que a referida sistemática de tributação permaneça vigente ao longo do ano. Mas a irretratabilidade - dirigida ao contribuinte e ao fisco - não obsta  que o Legislativo a modifique, como fez.

Acresça-se que a Lei 13.670/18, ao excluir a atividade econômica exercida pela impetrante da opção de calcular a contribuição previdenciária sobre a receita bruta, observou o disposto no § 6º do art. 195 da Constituição,  que, em âmbito constitucional, confere observância ao princípio da segurança jurídica em matéria de tributação.

Nesse sentido, confira-se o precedente que se segue:

TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DÉBITOS RELATIVOS AO RECOLHIMENTO MENSAL POR ESTIMATIVA DO IRPJ E CSLL. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. COMPENSAÇÃO. VEDAÇÃO. ART. 74, PARÁGRAFO 3º, DA LEI Nº 9.430/96, COM REDAÇÃO PELA LEI Nº 13.670/18. LEGALIDADE E CONSTITUCIONALIDADE.

1. Trata-se de apelação interposta por TECIDOS E RETALHOS CAPIBARIBE LTDA contra sentença proferida pelo Juízo da 37ª Vara Federal/PE, que denegou a segurança impetrada, na qual a impetrante objetivava afastar a limitação introduzida ao artigo 74, parágrafo 3º, inciso IX, da Lei nº 9.430/1996 pela Lei nº 13.670/2018, garantindo-lhe o direito de utilizar os créditos referentes ao IRPJ e à CSLL, atinentes ao exercício 2018, recolhidos na modalidade de pagamento por estimativa mensal sobre receita bruta. A apelante alega, em apertada síntese: 1) ilegalidade e inconstitucionalidade da aplicação do inciso IX do parágrafo 3º do art. 74 da Lei nº 9.430/96, com a redação conferida pelo art. 6º da Lei nº 13.670/18; 2) violação ao direito adquirido e aos princípios da confiança, segurança jurídica, anterioridade e retroatividade.

2. A Lei n. 13.670/18 alterou o inciso IX do parágrafo 3º do art. 74 da Lei nº 9.430/96, vedando  a compensação de débitos de IRPJ e CSLL às pessoas jurídicas que optarem pelo pagamento de referidos tributos mês a mês, através de base de cálculo estimada (artigo 2º da Lei n. 9.430/96), nos seguintes termos: "os débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) apurados na forma do art. 2º desta Lei." 

3. Sobre alterações de regras alusivas ao regime de compensação, o STF mantém entendimento de que não há direito adquirido a regime jurídico. (RE 706240, Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, DJe 15/08/2014)

4. A compensação, como forma de extinção do crédito tributário prevista no artigo 170 do CTN, deve obedecer à lei vigente no momento do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte. (REsp 1.164.452/MG, 1ª Seção, Min. Teori Zavascki, julgado em 25/08/2010).

5. Dessa forma, a Lei n. 13.670/18 aplica-se às compensações posteriores à data da sua publicação, ainda que o saldo que se pretenda compensar tenha origem em saldo negativo apurado anteriormente.

6. Não se vislumbra ofensa ao princípio da confiança e da segurança jurídica, porque o crédito apurado pelo contribuinte é passível de compensação pelas demais formas previstas na legislação, bem como de restituição. Além disso, a alteração promovida pela Lei nº 13.670/18, ainda que no curso do exercício fiscal, não impôs restrição à opção pelo pagamento de IRPJ e CSLL com base em estimativas mensais, o que, acaso ocorrido, poder-se-ia questionar violação de tais institutos.

6. Também não há ofensa ao princípio da anterioridade, porque não se trata de instituição ou aumento de tributo, tampouco isenção tributária, mas, sim, de modificação da forma de extinção do crédito tributário por meio de compensação, não havendo porque se falar em ilegalidade ou inconstitucionalidade da alteração legislativa, quanto ao disposto no art. 150 da CF/88.

7. Destarte, ausente o direito líquido e certo vindicado, a solução jurídica deve convergir, de fato, para a denegação da segurança.

8. Apelação improvida.


(PROCESSO: 08079374520184058302, DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADO, 1º Turma, JULGAMENTO: 05/02/2019, PUBLICAÇÃO: )


EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE A RECEITA BRUTA. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. LEI Nº 13.670. ANTERIORIDADE NONAGESIMAL. OBSERVÂNCIA. SURPRESA AO CONTRIBUINTE. NÃO VERIFICAÇÃO. 1. Respeitada a anterioridade nonagesimal não há falar em maltrato ao princípio da não-surpresa ao contribuinte, pois a anterioridade visa justamente à noticiar o contribuinte, com antecedência razoável, da alteração legislativa decidida pelo entre tributante. 2. Não se vislumbra qualquer malferimento aos princípio da segurança jurídica até porque a irretratabilidade foi cometida apenas ao contribuinte como forma de regular o controle fiscal. 3. Agravo de instrumento improvido. (TRF4, AG 5028085-29.2018.4.04.0000, SEGUNDA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 12/09/2018)

Diante de todo o exposto, reformulo a respeitável decisão sob identificador 4058300.6207506 para denegar a segurança requestada.

3. Dispositivo

POSTO ISSO, com base na fundamentação legal supra, julgo improcedentes os pedidos desta ação mandamental, revogo a r. decisão pela qual se concedeu a medida  liminar e denego a segurança requestada.

Sem honorários, ex vi art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009.

Finalmente, com urgência, oficie-se ao Exmo. Sr. Desembargador Federal, relator do Agravo de Instrumento noticiado nos autos, remetendo copia desta Sentença, bem como para a DD Autoridade apontada como coatora.

Registre-se. Intimem-se.

Recife, 28.06.2019
Francisco Alves dos Santos Júnior
  Juiz Federal, 2ª Vara Federal/PE(lsc)

LIMINAR, NO POPULAR E NO JURÍDICO

Por Francisco Alves dos Santos Júnior



Não poucas vezes, ouvimos as pessoas dizerem: "Juiz tal concedeu uma liminar naquele processo". 


Essa linguagem não está de acordo com a linguagem culta da área jurídica. 



Na verdade, a liminar é um instrumento, um meio,  pelo qual o Juiz pode veicular a sua decisão ou a sua sentença.  


Por exemplo:


O juiz,  numa decisão, pode conceder uma  medida liminar, determinando que alguma Autoridade faça ou deixe de fazer alguma coisa, nos autos de um Mandado de Segurança(Lei nº 12.016, de 2009, inciso III e § 2º do seu art. 7º). É verdade que,  no § 1º desse mesmo art.  7º,  o Legislador traiu-se e utilizou a palavra liminar no seu sentido popular, vulgar. 


O vigente Código de Processo Civil, instituído pela Lei 13.105, de 16.03.2015 e que entrou em vigor em 18.03.2016, é prenhe nas possibilidades de o Juiz utilizar-se do instrumento da liminar, e dentre as mais usuais destaco: 1) tutelas provisórias(art. 294): 1.1) nas tutelas provisórias de urgência, por antecipação ou antecedente, o uso da decisão liminar é autorizado no § 2º do seu art. 300; 1.2) tutela provisória de evidência, o uso da decisão liminar é autorizado no Parágrafo Único do seu art. 311, apenas  para as duas hipóteses nele arroladas; 2) mandado liminar de reintegração de posse, utilização autorizada no art.562; e 3) julgar improcedente o pedido liminarmente, art.  332 e respectivo § 1º,  e aqui o Juiz não se utiliza de uma mera decisão,  mas sim de uma  sentença. 


Então, principalmente você que lida no mundo do direito, fique atento e use de forma juridicamente correta  a palavra liminar, que não é a decisão ou sentença, mas um meio ou instrumento para cumprimento célere de uma decisão ou de uma sentença judicial.  Diga então,  "o Juiz, numa decisão,  concedeu uma  medida liminar nos autos daquele mandado de segurança", ou o "Juiz concedeu, numa decisão,  liminarmente, uma  tutela provisória de urgência, ou antecedente, ou de evidência", ou, ainda,  "o Juiz, numa sentença, julgou improcedente, liminarmente, o pedido daquela ação", e nunca "o Juiz deu uma liminar de...", porque, na verdade,  o Juiz concede ou nega alguma coisa por meio de uma decisão ou de uma sentença, liminarmente. 




   

quarta-feira, 26 de junho de 2019

NÃO RECOLHIMENTO DAS CUSTAS PROCESSUAIS. CONSEQUÊNCIAS.










Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Às vezes, o advogado não providencia o recolhimento das custas judiciais, embora não tenha pedido benefício da Justiça Gratuita para o seu Cliente. Quando isso acontece, advêm inúmeras consequências judiciais. A sentença que segue trata desse assunto. 

Boa Leitura. 

PROCESSO Nº: 0806350-57.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: G DA S P
ADVOGADO: J C L M De O
IMPETRADO: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

Sentença tipo C, registrada eletronicamente

Vistos, etc.
EMENTA:- PROCESSUAL CIVIL. CUSTAS PROCESSUAIS. NÃO RECOLHIMENTO.  
Quando o Autor não recolhe as custas processuais, embora para tanto tenha sido regularmente intimado, indefere-se a petição inicial, cancela-se o feito na distribuição e extingue-se o processo, sem resolução do mérito. E também condena-se o Autor ao recolhimento das custas processuais. 
1. Relatório

G DA S P, qualificado na petição inicial, ajuizou este MANDADO DE SEGURANÇA em face da UNIÃO FEDERAL, pleiteando, em síntese, pela conversão das licenças especiais em pecúnia. Juntou instrumento de procuração e documentos.
Despacho (id. 4058300.10418474) no qual determinou-se que o Impetrante juntasse aos autos comprovante de pagamento das custas processuais.
Certidão (Id. 4058300.10888592) na qual noticiou-se que apesar de devidamente intimado, o impetrante não comprovou pagamento das custas.
É o relatório no essencial.
Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1. O Autor foi intimado do despacho acostado sob id. 4058300.10418474, para recolher as custas processuais no prazo de 15 (quinze) dias, sob pena de cancelamento da distribuição e automática extinção do processo, sem resolução do mérito. 
Apesar de intimado a sanear o procedimento, o Autor não comprovou pagamento de custas.
Pois bem.
Reza o Parágrafo Único do art. 321 do CPC:
"Parágrafo único.  Se o autor não cumprir a diligência, o juiz indeferirá a petição inicial."
2.2. O valor das custas processuais tem natureza tributária, é da modalidade taxa contraprestacional, de forma que não sendo pagas, no valor devido, o serviço jurisdicional não pode ser prestado, sob pena de locupletamento ilícito por parte do jurisdicionado.
Assim, é caracterizado a falta de preparo, com o consequente indeferimento da petição inicial (Parágrafo Único do art. 321 do CPC), cancelamento da distribuição (art. 290, CPC) e extinção do processo, sem apreciação do mérito, pelo não cumprimento de diligência judicial, ausência de pressuposto de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo (art. 485, I e IV, do CPC).
E,  mesmo com a extinção do feito, decorrente do não recolhimento das custas processuais, estas são devidas, porque houve o acionamento do serviço jurisdicional, ou seja, concretizou-se o seu fato gerador. 

3. Dispositivo

POSTO ISSO:
3.1 - com base na fundamentação supra, indefiro a petição inicial, determino o cancelamento da distribuição (art. 290, CPC) e dou este processo por extinto, sem apreciação do mérito (art. 485, I e IV, do CPC).
3.2 - Custas pelo Autor, na forma da Lei. 
3.3 - Sem honorários advocatícios (art. 25 da Lei nº 12.016/2009 e Súmula 512 do STF).
3.4. Após o trânsito em julgado, à União para, querendo, requerer a execução do valor das custas processuais e, no silêncio desta, que o feito seja encaminhado para arquivo, com  baixa.  


Registrada, intimem-se.

Recife, 26.06.2019
Francisco Alves dos Santos Júnior

  Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE

domingo, 23 de junho de 2019

OAB. EXECUÇÃO. NECESSIDADE DE EXTRAIR O TÍTULO DE CRÉDITO COM OBSERVÂNCIA DO DEVIDO PROCESSO LEGAL ADMINISTRATIVO.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

As Secções Estaduais da ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL cobram dos Advogados os valores das respectivas anuidades(contribuição social)via ação executiva. Mas, como essa Entidade de Classe tem o privilégio de extrair o seu próprio título de crédito executivo extrajudicial, como o faz, por exemplo, a Fazenda  Pública, tem, como esta, de observar o devido  processo legal, fixado na Lei nº Lei 8.906, de 04.07.1994 e na Resolução nº 4, de 2003, do seu Conselho Federal, indicadas no despacho inicial, também transcrito após a sentença que segue. 
A sentença transitou em julgado em 17.06.2019.
Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0815704-43.2018.4.05.8300 - EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL
EXEQUENTE: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECÇÃO DE PERNAMBUCO - OAB/PE
ADVOGADO: G O C T De M
EXECUTADO: S F B
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

Sentença tipo C, registrada eletronicamente

EMENTA: - PROCESSUAL CIVIL. EXECUÇÃO. FALTA DE LIQUIDEZ E CERTEZA DO TÍTULO. NÃO ATENDIMENTO DE DETERMINAÇÃO JUDICIAL PARA REGULARIZAÇÃO. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃO INICIAL. CONTRARIEDADE A PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS.
-Quando a Parte Exequente não atende à determinação judicial para juntar a documentação relativa à certeza e liquidez do crédito, indefere-se a petição inicial de ação executiva.
-A OAB/PE não pode executar judicialmente título por ela emitido sem observância, na via administrativa, dos princípios do devido processo legal, contraditório, ampla defesa e segurança jurídica.
-Extinção.

Vistos, etc.

1. Relatório

A ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECÇÃO DE PERNAMBUCO - OAB/PE propôs, em 24/10/18, esta Ação de Execução de Título Extrajudicial, contra o advogado S F B, relativa à cobrança da contribuição social denominada de anuidades no valor de R$ 5.450,80 (CINCO MIL, QUATROCENTOS E CINQUENTA REAIS E OITENTA CENTAVOS).
Intimada para comprovar a regularidade da edição da certidão de crédito, consistente na prévia notificação administrativa, do ora Executado para pagamento da dívida, nos termos da legislação pertinente, a OAB/PE atravessou petição (id. 4058300.8595653), pugnando pela juntada do que seria a prévia Notificação Administrativa da Parte Executada, conforme id. 4058300.8595677, e a guia com AR de correspondência que diz "ao remetente" (id. 4058300.10073827).
É o relatório no essencial, passo a decidir.

2. Fundamentação

Há uma longa decisão inicial[1], dando as diretrizes para regularização processual, no que diz respeito aos documentos que atestem a certeza e liquidez do título extrajudicial, extraído pela própria Exequente, para que esta ação de execução pudesse ter regular e válido andamento.
Como vem acontecendo em inúmeros outros casos, o Advogado da Ordem dos Advogados do Brasil, Seccional de Pernambuco, ora Exequente, não recorreu, mas também não atendeu ao consignado na referida decisão inicial (id. 4058300.7031545).
Note-se que a Exequente não juntou, como determinado naquela decisão inicial, a comprovação de que o Executado teria sido previamente notificado na via administrativa, como exigido pela Legislação indicada naquela decisão. Juntou apenas o documento identificado sob o id. 4058300.8595677 (NOTIFICAÇÃO ADMINISTRATIVA), segundo o qual teria enviado tal notificação para o(a) Advogado(a) Executado, entretanto não juntou, sequer, a comprovação de que a Parte Executada teria recebido a referida notificação, ou que a tivesse notificado por edital, tampouco certidão de que o(a) Executado(a) tenha exercido, ou não, o seu direito de defesa na via administrativa, com cópia da respectiva decisão administrativa, com base na qual teria expedido o título extrajudicial em execução, mas anexou apenas cópia de guia com AR de correspondência (id. 4058300.10073827), dizendo que houve devolução ao remetente, sem dizer se foi ou não entregue ao destinatário.
Ora, se a OAB não notifica o(a) Advogado(a), devedor(a) de anuidade, na via administrativa, ou não dá certeza de que houve essa notificação, por uma das formas legais, para que possa ele(a) exercer o seu direito de defesa na via administrativa, tampouco junta a decisão administrativa pela qual se tenha negado o pleito administrativo do(a) ora Executado(a),  ou com aplicação da respectiva pena de confissão administrativa por eventual ausência de defesa em tal via, decisão essa que tivesse dado respaldo à expedição do Título Extrajudicial em Execução, tem-se que esse título extrajudicial juntado com a petição inicial não é líquido, nem certo, porque feridor dos princípios constitucionais do devido processo legal e do contraditório e ampla defesa na via administrativa(art. 5º, incisos LIV e LV, respectivamente), bem como do princípio da segurança jurídica, previsto expressamente no caput do art. 2º e respectivos incisos VIII e IX da Lei nº 9.784, de 1999.
Não pode o(a) Advogado(a), associado(a) da OAB, não ter a chance de quitar a dívida relativa à anuidade em questão na via administrativa e, sem que lhe tenha sido dada essa chance, sofrer o constrangimento de receber, no seu escritório ou na sua residência,  citação judicial, relativa a uma ação executiva.
Nessa situação, incide a regra do Parágrafo Único do art. 321 do CPC, bem como as regras dos incisos I e IV do art. 485 c/c art. 783, todos do mesmo diploma processual, por faltar a este processo executivo "pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular" deste tipo de processo, e liquidez e certeza do crédito em execução. .
Os invocados incisos do art.  485 do CPC são aplicáveis à execução subsidiariamente, conforme regra do Parágrafo Único do art. 771 do mesmo diploma processual.

3. Dispositivo

Posto isso e diante da demonstrada falta de certeza e liquidez do título executivo extrajudicial em questão, indefiro a petição inicial desta execução (Parágrafo Único do art. 321 do CPC) e dou este processo por extinto, sem resolução do mérito (art. 485, I e IV, c/c parágrafo único do art. 771 e art. 783, todos do CPC), facultando à Exequente a cobrança pela via ordinária, caso ainda não tenha ocorrido decadência ou prescrição.
Registrada, intime-se.
Recife, data da assinatura(23.04.2019).

Francisco Alves dos Santos  Júnior

 Juiz Federal, 2a Vara/PE.

[1] - Essa decisão, na verdade um despacho determinando a emenda/complementação da petição inicial de execução,  segue logo após esta sentença.



PROCESSO Nº: 0815704-43.2018.4.05.8300 - EXECUÇÃO DE TÍTULO EXTRAJUDICIAL
EXEQUENTE: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECÇÃO DE PERNAMBUCO - OAB/PE
ADVOGADO: G O C T De M
EXECUTADO: S F B
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

 

            A OAB-PE propôs esta ação executiva contra o advogado acima nominado, para o pagamento de anuidade da OAB, que estaria em atraso e instruiu a petição inicial com a documentação referida nos respectivos identificadores eletrônicos.

            Fundamentação
             Reza o art. 46 e respectivo Parágrafo Único da Lei 8.906, de 04.07.1994:
            "Art. 46. Compete à OAB fixar e cobrar, de seus inscritos, contribuições, preços de serviços e multas."
          A OAB, ora Exequente, como a Fazenda Pública e as demais Autarquias Corporativas, tem o privilégio legal de apurar os seus créditos e de expedir o seu próprio título de crédito, mas para tanto tem que observar a liturgia das respectivas regras legais e administrativas.
            O art. 9º da Resolução nº 4, de 2003, do Conselho da própria ora Exequente, estabelece que a OAB-PE, antes da propositura da ação executiva judicial,  tem que, previamente, notificar o(a) Advogado(a) devedor para negociação da dívida no prazo de 30(trinta)dias e, apenas na hipótese de não haver um acordo, é que a OAB-PE poderá extrair a referida Certidão de Crédito e propor a ação executiva.
              O Juiz, para deferir o pedido da petição inicial da ação executiva da OAB-PE tem
            Essa faseà qual a própria ora Exequente se impôs por meio da referida Resolução, corresponde, na área da Fazenda Pública, à fase do prévio lançamento tributário, previsto com rigor no Código Tributário Nacional e na Lei das Execuções Fiscais.
que, antes, no chamado juízo de procedibilidade, verificar se o mencionado devido processo normativo administrativo foi observado, até mesmo porque envolve o direito da ampla defesa e do contraditório na via administrativa.
             Não pode o(a) Advogado(a), acusado de devedor, ser surpreendido com o Oficial de Justiça na sua porta, antes de ter sido chamado por sua Ordem de Classe para a devida negociação e até mesmo para possível defesa administrativa.
            Não consta, nos autos, nenhuma comprovação de que essa prévia medida administrativa foi devidamente observada.
             
             Conclusão

            Posto isso,  sob as penas do art. 321 e respectivo Parágrafo Único do CPC,  concedo à OAB-PE, ora Exequente, o prazo legal de 15(quinze)dias para  juntar a comprovação da prévia notificação administrativa do ora Executado para a negociação prevista no art. 9º da sua Resolução 4, de 2003.

                  Intime-se.
                  Recife, 05.11.2018.