Por Francisco Alves dos Santos Jr.
Na decisão que segue, debate-se quanto à aplicação da Súmula 345 do STJ após o Código de Processo Civil de 2015, em vigor, bem como da impossibilidade de um advogado que não atuou na fase de conhecimento cobrar os honorários advocatícios sucumbenciais de tal fase.
Boa leitura.
PROCESSO Nº: 0810949-73.2018.4.05.8300 - CUMPRIMENTO DE
SENTENÇA
EXEQUENTE: M P C DE V
ADVOGADO: M J F
EXECUTADO: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
EXEQUENTE: M P C DE V
ADVOGADO: M J F
EXECUTADO: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
Decisão
1. Relatório
Trata-se de
cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública, com base em título coletivo
formado nos autos do processo nº 2007.34.00000424-0, transitado em julgado em
21/02/2018 (que tramitou na 15ª Vara Federal do Distrito Federal, tendo como
substituto processual o SINDICATO NACIONAL DOS AUDITORES FISCAIS DA RECEITA
FEDERAL), movido por M P C DE V, por meio de
advogado particular habilitado, contra a UNIÃO FEDERAL, objetivando o
cumprimento da obrigação de pagar total de R$ 755.281,84 (setecentos e
cinquenta e cinco mil, duzentos e oitenta e um reais e oitenta e quatro
centavos), conforme planilha acostada. Requereu: a) o arbitramento de
honorários advocatícios relativos à fase de conhecimento (art. 85 § 4º do CPC),
bem como à fase de cumprimento de sentença (Sum. 345 do STJ); b) intimação da
União Federal (art. 535 do CPC). Requereu, também, a prioridade da Lei nº
10.741/13, por ter mais de 80 anos.
A autora firma ser pensionista de falecido auditor fiscal da Receita Federal do Brasil, pelo que faria jus ao direito reconhecido, em grau de recurso, no Superior Tribunal de Justiça, a saber: " (...) o pagamento da GAT desde sua criação pela Lei 10.910/2004 até sua extinção pela Lei 11.890/2008".
2.1 - Merece ser deferido o pleito de tramitação prioritária, considerando a comprovada idade da autora.
2.2 - Quanto ao
pedido de arbitramento de honorários advocatícios relativos à fase de
conhecimento, deve ser rejeitado de plano porque, referidos honorários são
devidos, tão-somente, ao advogado do sindicato substituto que trabalhou naquela
fase e assim mesmo se constar do título judicial em execução.
2.3 - Com relação
aos honorários relativos à fase de cumprimento de sentença (sum. 345 do STJ),
tenho que mencionado pleito não merece acolhida, porque os precedentes
judiciais que deram origem a essa Súmula (cuja redação, data maxima venia,
não é das melhores), admitia essa verba honorária, na vigência do CPC de
1973, apenas quando o título judicial executivo tivesse sido extraído de
ação civil pública ou de ação coletiva, nas modalidades do Código de Proteção e
Defesa do Consumidor, relativamente a direitos difusos, coletivos ou
individuais homogêneos, nos quais os direitos são reconhecimentos apenas
genericamente, sem delimitação de verba honorária, cabendo a sua apuração na
fase executiva e não sentido foi o julgado que deu origem a essa Súmula.
Com efeito, o
primeiro julgado do E. Superior Tribunal de Justiça que tratou do assunto e que
gerou outros precedentes e a instituição dessa Súmula, foi o acórdão do EREsp
nº 691.563(2005/010767-0).
Eis sua ementa:
"PROCESSO CIVIL. AÇÃO COLETIVA AJUIZADA POR SINDICATO. A
execução de sentença proferida em ação coletiva ajuizada por sindicato difere
da execução de sentença proferida em ação individual; nela há cognição a
respeito da identificação do exequente como beneficiário do direito já
reconhecido e acerca da liquidação do débito. Embargos de divergência
conhecidos e providos.".
Como essa ementa
não é muito clara, vejamos a íntegra do voto do d. Relator, Ministro Ari
Pargandler, que foi aprovado por unanimidade pela Corte Especial do referido E.
Tribunal:
"EXMO.
SR. MINISTRO ARI PARGENDLER (Relator):
A
divergência está comprovada.
Com
efeito, lê-se no acórdão embargado:
"Conforme
deixei anotado na decisão agravada, o mais recente entendimento firmado pelo
Superior Tribunal que vem sendo aplicado em iterativos julgados de ambas as Turmas
integrantes da Terceira Seção dá conta de que, nas execuções movidas contra a
Fazenda Pública por ela não embargadas e iniciadas após o advento da Medida
Provisória nº 2.180-3501, não é cabível, a teor do art. 1º-D da Lei nº 9.49497,
condenação a honorários advocatícios, tendo sido tal entendimento, inclusive,
confirmado pela Corte Especial no julgamento dos EREsp-623.718, da relatoria do
Ministro José Delgado, sessão de 17.11.04.
Esse
posicionamento, segundo a jurisprudência do Superior Tribunal, é de ser adotado
mesmo naqueles casos - a exemplo do deste processo - em que se executa sentença
proferida em ação ajuizada por sindicato. Ainda segundo a nossa jurisprudência,
somente está excetuada da incidência do art. 1º-D da Lei nº 9.49497 a execução
de título judicial que provenha de ação civil pública, o que, contudo, não é o
caso dos autos" (fl. 189).
Já no acórdão indicado
como paradigma (EREsp nº 475.566, PE) está dito:
"... A despeito de ser conhecida como um processo executivo, a
ação em que se busca a satisfação do direito declarado em sentença de ação
civil coletiva não é propriamente uma ação de execução típica. As sentenças
proferidas no âmbito das ações coletivas para tutela de direitos individuais
homogêneos, por força de expressa disposição do Código de Defesa do Consumidor
(Lei nº 8.07890, art. 95), são condenatórias genéricas. Nelas não se especifica
o valor da condenação nem a identidade dos titulares do direito
subjetivo. A carga condenatória, por isso mesmo, é mais limitada do que a
que decorre das demais sentenças condenatórias. Sobressai nelas a carga de
declaração do dever de indenizar, transferindo-se para a ação de cumprimento a
carga cognitiva relacionada com o direito individual de receber a indenização.
Assim, a ação de cumprimento não se limita, como nas execuções comuns, à
efetivação do pagamento. Nelas se promove, além da liquidação do valor se for o
caso, o juízo sobre a titularidade do exeqüente em relação ao direito material,
para somente então se passar aos atos propriamente executivos.
Ora, a regra do art. 1º-D da Lei nº 9.49497 destina-se às execuções
típicas do Código de Processo Civil, não se aplicando à peculiar execução da
sentença proferida em ação civil pública" (fl. 220).
Então, não é o
caso destes autos, na qual a ação, embora proposta por Entidade de Classe,
tinha conteúdo de ação comum, com vários Autores, uma ação plúrima, com pedidos
específicos, inclusive de fixação de verba horária. Por outro lado, mesmo que
se entenda que se trata de ação coletiva, a respectiva sentença não teve
conteúdo genérico, pelo contrário, teve conteúdo bem específico e nela foi
fixada a verba honorária sucumbencial que, inclusive, deverá ser executada pelo
Advogado que abriu a ação.
Cabe
ainda registrar que a execução por grupos de Substituídos Processuais decorreu
de decisão judicial do Juiz do processo de conhecimento, para evitar prejuízos à
defesa da Executada nesta fase executiva, Não trouxe nenhum adendo quanto à
apuração do valor de cada Substituído Processual, havendo mera execução de sentença
de conteúdo específico, por simples
cálculo do Contador.
Dissertando a
respeito desse assunto, no acórdão de efeito repetitivo nos Embargos de
Declaração o Recurso Especial nº 1.336.62-PE(2012/0156497-7), o d. Relator, o
Ministro Og Fernandes, de forma clara e cirúrgica, assim se expressou:
"Alega
a Parte Embargante que teria havido omissão no aresto prolatado na presente
demanda quanto à incidência do precedente firmado para os casos de sentenças
judiciais cujo trânsito em julgado se operou em ações coleitvas. Para tanto,
invoca premissas estabelecidas nos seguintes julgados: AgRg no REsp 489.348/PR,
Rel. Ministro Teori Albino Zavascki, Primeira turma; REsp 1.247.150/PR, Rel.
Ministro Luis Felipe Salomão, Corte Especial; REsp 1.666.600/RJ, Rel. Ministro
Herman Benjamin, Segunda turma.
Os casos
tratados nas ações coletivas reportadas nos julgados citados dizem respeito
àquelas situações em que a condenação se faz de forma genérica, ou seja, apenas
e tão somente foi atribuída à Parte Demandada a responsabilidade pelos danos causados
- reconhecidos pelo título judicial então proferido -,cuja individualização
depende de um novo acertamento, desta feita,a ser efetivado no âmbito de ações
individuais.
Não é disso
que tratam as demandas em que são substituídas nos processos dezenas e centenas
de pessoas - geralmente, servidores públicos -, nas quais não há necessidade de
nenhuma fase de acertamento posterior dos danos reconhecidos na decisão
transitada em julgado.
É que,
nesses caso, não mais se discute sobre a condição de servidor daqueles
substituídos (até porque se reporta a uma questão meramente documental),
cuidando-se, pura e simplesmente, de efetivação dos cálculos devidos. E, para
isso, a norma processual não exige mais qualquer procedimento de liquidação de
sentença, aliás, como já exaustivamente fundamentado no âmbito do aresto, ora
embargado.
No caso dos
precedentes invocados pela Parte Embargante, em todos, considerou-se
imprescindível a fase de liquidação de sentença, até porque Haia a necessidade,
inclusive, de apurar-se "a titularidade do crédito", bem como se
tratou de situação em que a sentença era de condenação genérica.
Aliás, o
paradigma representado pelo REsp 1.247.150/PR sequer pode ser invocado por
similaridade, visto que tal julgamento foi proferido em ação coletiva sob o
enfoque do Código de Defesa do Consumidor, por via da qual, conforme assentado,
foi fixada "a responsabilidade pelos danos causados", prescindindo
que, nas ações individuais posteriores, seja reconhecida a ligação subjetiva
daquela coisa julgada com o postulante individual.
Tal situação nada tem a ver com os casos em que
são perquiridas diferenças vencimentais, por exemplo, nos quais inexiste dúvida
sobre a quem é devida a verba e quanto aos mesmos índices a ser aplicados.
Portanto, nessas hipóteses, diferentemente do que consta nos precedentes
invocados, inexiste necessidade de liquidação de sentença, porquanto não se
trata de qualquer fato novo a ser provado nem há necessidade de arbitramento
acerca da extensão do dano reconhecido na coisa julgada.".(Negritei)
Nesse mesmo sentido, julgado da Corte
Especial do Superior Tribunal de Justiça, sob efeito repetitivo, no
Recurso Especial - REsp nº 1.648.238-RS(2017/0010433-8), já na vigência do
Código de Processo Civil de 2015, verbis:
"4. A
interpretação que deve ser dada ao referido dispositivo é a de que, nos casos
de cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública em que a relação jurídica
existente entre as partes esteja concluída desde a ação ordinária, não caberá a
condenação em honorários advocatícios se não houver a apresentação de
impugnação, uma vez que o cumprimento de sentença é decorrência lógica do mesmo
processo cognitivo."
Nessa situação, o pleito para fixação de
verba honorária, à luz da Súmula 345 do STJ, não merece acolhida.Ademais, o novo CPC em seu § 7º do art. 85, dispõe que não serão devidos honorários no cumprimento de sentença promovido contra a Fazenda Pública, na hipótese de expedição de precatório, desde que não tenha sido impugnado.
Mencionado dispositivo amolda-se ao § 1º do art. 523 do mesmo diploma processual, levando à segura conclusão que, na execução de sentença, só caberá verba honorária de 10%(dez por cento) caso haja resistência ao pagamento do valor nela fixado e apenas sobre o valor controverso.
Regras constitucionais não admitem que o
Judiciário revoguem esses dispositivos legais, porque apenas o Poder
Legislativo poderia fazê-lo.
Posto Isso:
3.1 - defiro o pedido de prioridade na tramitação do feito, com base no art. art.
1.048, I do NCPC e que a Secretaria faça as anotações de praxe.
3.2 - indefiro o pedido de apuração e pagamento da verba honorária da fase de
conhecimento, porque pertencente ao Advogado que atuou na mencionada fase;
3.3 - indefiro o pedido de fixação de verba honorária à luz da Súmula 345 do
STJ;
3.4 - recebo, com as exceções dos subitens 3.2 e 3.3 supra, o pedido executivo
de cumprimento de sentença contra a Fazenda Pública, e determino a
intimação da UNIÃO para, querendo, apresentar impugnação nos próprios autos, no
prazo de 30 (trinta) dias (art. 535 do CPC/15), atentando-se para o pedido de
isenção da contribuição para o PSS.
3.5 - defiro que, oportunamente, se faça a pleiteada retenção dos honorários
contratuais por ocasião da expedição das requisições de pagamento, considerando
as autorizações veiculadas nas procurações e o respectivo percentual;
Intimem-se.Recife, 12.11.2018
Francisco Alves dos Santos Jr
Juiz Federal, 2ª Vara-PE.