sexta-feira, 29 de novembro de 2013

VALOR DA DESVINCULAÇÃO DE RECEITA DA UNIÃO-DRU NÃO ENTRA NA BASE DE CÁLCULO DO FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS-FPM.

    Por Francisco Alves dos Santos Júnior


   Segue uma sentença de direito constitucional e de direito financeiro, que foi mantida pela 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região e que já se encontra em fase de execução, na qual são debatidas interessantes questões envolvendo a composição da base de cálculo do Fundo de Participação dos Municípios - FPM, bem como a natureza jurídica da verba denominada Desvinculação de Receita da União - DRU e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL.

   Boa leitura!



PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA

 

 

Juiz Federal : Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 2006.83.00.009343-0 - Classe 29 – Ação Ordinária

Autor: MUNICÍPIO DE JOAQUIM NABUCO – PE

Adv.: B R P M, OAB/PE ...

Réu:  UNIÃO FEDERAL (Fazenda Nacional)

 

Registro nº ...........................................

Certifico que registrei esta Sentença  às fls..........

Recife, ...../...../2007.

  

Sentença tipo A

 

 

Ementa: - DIREITO CONSTITUCIONAL. DESVINCULAÇÃO DE RECEITA DA UNIÃO-DRU. NATUREZA JURÍDICA.


A verba decorrente da Desvinculação de Receita da União-DRU, prevista no art. 76 do ADCT da Constituição da República, não tem natureza tributária, não corresponde a adicional de imposto de renda, e não se integra na base de cálculo das verbas que compõem o Fundo de Participação dos Municípios-FPM.


Improcedência.

 
Vistos etc.

MUNICÍPIO DE JOAQUIM NABUCO, qualificado na Inicial, ajuizou, em 06.07.2006, a presente “AÇÃO ORDINÁRIA DECLARATÓRIA COM PEDIDO URGENTE DE TUTELA ANTECIPADA”(sic) em face da UNIÃO (FAZENDA NACIONAL). Alegou, em síntese, que sua principal fonte de receita adviria do Fundo de Participação dos Municípios – FPM, composto por 22,5% do valor arrecadado a título de IR e IPI; que o IR possuiria como um dos fatos geradores o lucro das pessoas jurídicas, que também seria fato gerador da CSLL; que a destinação dada às contribuições sociais é que lhes conferiria o caráter de contribuição social; que as Emendas Constitucionais nºs 27/00 e 42/03 teriam alterado a destinação de 20% dos recursos das contribuições sociais entre 2000 e 2007; que, portanto, se a CSLL teve parte de seus recursos constitucionais desvinculados de órgão, fundo ou despesa, teria adquirido a feição de imposto na parcela que foi desvinculada, e, desse modo, as mencionadas emendas constitucionais teriam criado um adicional do IR transfigurado em CSLL; que o respeito ao FPM seria vital à manutenção da forma federativa de Estado, pois o FPM seria responsável pela receita mais pujante dos municípios, sobretudo os mais pobres; que, com base no disposto na alínea b do inciso I do art. 159 da Constituição/88, o Município-Autor teria direito de perceber sua parcela de FPM, adicionando em seu cálculo os 20% arrecadados a título de CSLL destinados à Conta única do Tesouro Nacional tal qual o IR; que teria direito de perceber sua parcela de FPM, adicionando em seu cálculo os 20% arrecadados a título de CSLL, destinado à Conta Única do Tesouro Nacional tal qual o IR. Teceu outros comentários e requereu: a concessão da tutela antecipada declarando o suposto direito do Município Autor de receber o valor devido pelo repasse do FPM mensal adicionando em sua base de cálculo o valor recolhido a título de CSLL decorrentes da desvinculação de 20% dos recursos arrecadados destinado à Conta Única do Tesouro Nacional; a citação da União; a intimação da União para dar cumprimento à decisão. No mérito, a confirmação do pedido liminar, obrigando a União a repassar os valores a título de CSLL, decorrentes da desvinculação de 20% dos recursos arrecadados desde o início da vigência da EC 27/2000, destinados à Conta Única do Tesouro Nacional, devidamente atualizado pela SELIC; a condenação da parte demandada ao pagamento das custas e honorários advocatícios. Protestou o de estilo. Deu valor à causa e instruiu a Inicial com instrumento de procuração e documentos, fls. 21/30.
O pedido de antecipação da tutela jurisdicional ficou para ser apreciado após a manifestação da União, no prazo de 72 (setenta e duas) horas, fls. 31.
Devidamente intimada, a União manifestou-se às fls. 37/41, pugnando pelo indeferimento do pedido de antecipação da tutela jurisdicional.
Citada, a União apresentou Contestação (fls. 43/47), argüindo prejudicial de prescrição qüinqüenal dos supostos créditos da parte autora, nos moldes do art. 1º do Decreto nº 20.910/32, e requereu a extinção do processo com resolução do mérito. No mérito, alegou, em suma, que, diferentemente do que teria sido alegado na Inicial, as EC nºs 27/00 e 42/03 não teriam criado um adicional de Imposto de Renda; que o art. 76 do ADCT/88 teria criado a denominada Desvinculação das Receitas da União (DRU), que significaria que a própria Constituição prescreveria a possibilidade dos valores arrecadados por meio de tributos fossem aplicados da forma desejada pela União, e, portanto, não teria havido a criação de qualquer adicional de IR; que, para ser criado um adicional de IR seria necessária a promulgação de uma lei e, acaso acatada a tese do Autor, estar-se-ia criando tributo por meio de analogia, o que seria vedado pelo Código Tributário Nacional. Teceu outros comentários e requereu: o acolhimento da prejudicial de prescrição; a improcedência dos pedidos; e a condenação do Autor nas verbas de sucumbência.
O Autor apresentou Réplica, fls. 49/63.
O Autor ingressou com petição juntando cópia de decisão judicial, fls. 65 e 66/81, respectivamente.
Decisão interlocutória pronunciando a prescrição das verbas anteriores a 06.07.2001 e indeferindo o pedido de antecipação da tutela jurisdicional, fls. 82/83.
Cópia da decisão proferida nos autos do IVC nº 2006.83.00.0108615, julgando procedente o pedido, majorando o valor da causa e constatando a desnecessidade de complementação das custas por se tratar de Ente isento, fls. 86.
Instado a dizer se pretendia fazer prova pericial, o Autor ingressou com a petição de fls. 88 pugnando pelo julgamento antecipado da lide.
Vieram os autos conclusos para julgamento.

É o relatório.

Fundamentação

A Desvinculação de Receita da União-DRU(que foi antecedida pelo Fundo Social de Emergência e pelo Fundo de Estabilização Fiscal) consiste em permitir que a UNIÃO utilize 20% de determinadas receitas tributárias, já deduzidas as parcelas das transferências constitucionais obrigatórias dos Estados e dos Municípios, em finalidades sociais, educacionais e de saúde pública, pelo período de 2003 a 2007.

O assunto encontra-se atualmente regido no art. 76 do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias-ADCT da atual Constituição da República, com redação data pela Emenda Constitucional nº. 42, de 19.12.2003.

Eis a íntegra do mencionado dispositivo constitucional:

“Art. 76. É desvinculado de órgão, fundo ou despesa, no período de 2003 a 2007, vinte por cento da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou que vierem a ser criados no referido período, seus adicionais e respectivos acréscimos legais. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)(1)

§ 1º O disposto no caput deste artigo não reduzirá a base de cálculo das transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios na forma dos arts. 153, § 5º; 157, I; 158, I e II; e 159, I, a e b; e II, da Constituição, bem como a base de cálculo das destinações a que se refere o art. 159, I, c, da Constituição. (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)

§ 2o Excetua-se da desvinculação de que trata o caput deste artigo a arrecadação da contribuição social do salário-educação a que se refere o art. 212, § 5o, da Constituição.(Incluído pela Emenda Constitucional nº 27, de 2000)”.
Trata-se, como dito na decisão de fls. 82-83, de mero arranjo administrativo-orçamentário de emergência, transitório, autorizado pelo Legislador Constituinte Derivado, não tendo o resultado dessa operação natureza tributária, porque não se trata de mais um tributo a ser exigido dos Contribuintes.

Com a instituição da Desvinculação de Receita da União-DRU, os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não sofreram qualquer prejuízo, porque o § 1º do art. 76 do ADCT, acima transcrito, estabeleceu que, antes de se fazer o cálculo dos 20% dessa desvinculação de receita, fossem deduzidas as parcelas das transferências constitucionais obrigatórias devidas a essas Unidades da Federação, por força dos artigos 157-159 da Constituição da República.

A tese da petição inicial, segundo a qual a parcela da Desvinculação de Receita da União-DRU incidente sobre o total das receitas da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido,  seria um “adicional de imposto de renda”, data venia  do I. Subscritor da referida peça, não encontra nenhum sustentáculo no nosso direito constitucional-tributário, que exige expressa autorização no texto da Constituição da República para a instituição de qualquer tributo, especificamente adicional de imposto de renda[1] e, se houvesse essa competência constitucional, esse adicional, como bem lembrado na defesa da UNIÃO, para ser exigido, teria que ser instituído por Lei de sua competência, pois não se pode exigir tributo sem observância do princípio da legalidade(art. 150, I, da Constituição da República).(2)
 
E se fosse possível caracterizar referida parcela como adicional de imposto de renda, ainda assim não se poderia obrigar a UNIÃO a integrar o respectivo montante na base de cálculo das verbas que compõem o Fundo de Participação dos Municípios-FPM, porque para tanto teria que haver regra expressa na Constituição da República e não se vê esse “adicional” no rol dos artigos 158 e 159 dessa Carta, quanto trata das transferências constitucionais obrigatórias para os Municípios.

Portanto, não pode prosperar o pedido da petição inicial, no sentido fazer mencionada integração.
 
Conclusão

Posto isso, julgo improcedentes os pedidos desta ação e condeno o Município-Autor em verba honorária, que arbitro em 10%(dez por cento) do valor da causa, fixado em R$ 479.065,00 na decisão lançada nos autos da impugnação ao valor da causa, processo nº. 2006.83.00.01086515, cuja cópia se encontra às fls. 86, atualizado a partir do mês seguinte ao em que referida decisão foi lançada, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, mais juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados, todavia, da data da citação da execução desta sentença(art. 219 c/c art. 730 do Código de Processo Civil), mas sobre o valor já monetariamente corrigido.
 
Sem custas, porque o Município-autor goza de isenção legal.
 
P. R. I.
 
Recife, 07 de dezembro de 2007
 
 
FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
               Juiz Federal, 2ª Vara-PE


 
1 - O caput desse dispositivo do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição está atualmente com a seguinte redação, que lhe foi dada pela Emenda Constitucional nº 68, de 2011:
    "Art. 76. São desvinculados de órgão, fundo ou despesa, até 31 de dezembro de 2015, 20% (vinte por cento) da arrecadação da União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou que vierem a ser criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais.".
   Ou seja, a(o) Chefe do Poder Executivo Federal poderá utilizar-se dessa desvinculação de receita até o final do exercício financeiro de 2015.   
 
2. Como foi lembrado no acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, pelo qual a sentença foi mantida, relatado pelo d. Magistrado de 2º Grau, Dr. Geraldo Apoliano, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 138.284-8/CE, afastou expressamente a tese de que a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido seria um adicional do Imposto de Renda, porque possui base de calculo, alíquota e contribuintes próprios, conforme Lei nº 7.689, de 1988.
 
OBSERVAÇÃO. A sentença acima foi mantida pela 3ª Turma do  Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que modificou apenas o cálculo da verba honorária, para fixá-la na forma prevista no § 4º do art.20 do código de processo civil, na Apelação Cível nº 444.290-PE(2005.83.00.009343-0), julgamento em 20.08.2009, publicação no Diário da Justiça Eletrônico do dia 13.10.2009, não tendo sido admitido o respectivo recurso especial, no qual se questionou apenas quanto à verba honorária,  conforme r. decisão do Presidente do referido Tribunal, datada de 11.11.2010, publicada no Diário da Justiça Eletrônico de 03.12.2010. Certidão de trânsito em julgado datada de 07.06.2011(fl. 188 dos autos do processo).
 




[1] Registre-se que o texto originário da Constituição da República em vigor dava competência , no inciso II do seu art. 155, os Estados da Federação e o Distrito Federal para a instituição de um “adicional de imposto de renda”, que chegou a ser efetivamente instituído por Lei própria, mas esse dispositivo foi revogado pela Emenda Constitucional nº. 3, de 1993.