Por Francisco Alves dos Santos Júnior
Boa leitura!

Segue uma sentença de direito constitucional e de direito financeiro, que foi mantida pela 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região e que já se encontra em fase de execução, na qual são debatidas interessantes questões envolvendo a composição da base de cálculo do Fundo de Participação dos Municípios - FPM, bem como a natureza jurídica da verba denominada Desvinculação de Receita da União - DRU e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL.
Boa leitura!

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE
PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA
Juiz Federal : Francisco Alves dos
Santos Júnior
Processo nº 2006.83.00.009343-0 -
Classe 29 – Ação Ordinária
Autor: MUNICÍPIO DE JOAQUIM NABUCO –
PE
Adv.: B R P M,
OAB/PE ...
Réu:
UNIÃO FEDERAL (Fazenda Nacional)
Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2007.
Sentença tipo A
Ementa: - DIREITO CONSTITUCIONAL. DESVINCULAÇÃO DE RECEITA
DA UNIÃO-DRU. NATUREZA JURÍDICA.
A
verba decorrente da Desvinculação de Receita da União-DRU, prevista no art. 76
do ADCT da Constituição da República, não tem natureza tributária, não
corresponde a adicional de imposto de renda, e não se integra na base de
cálculo das verbas que compõem o Fundo de Participação dos Municípios-FPM.
Improcedência.
Vistos etc.
MUNICÍPIO DE JOAQUIM
NABUCO, qualificado na Inicial,
ajuizou, em 06.07.2006, a presente “AÇÃO ORDINÁRIA DECLARATÓRIA COM PEDIDO
URGENTE DE TUTELA ANTECIPADA”(sic) em face da UNIÃO (FAZENDA NACIONAL). Alegou, em síntese, que sua principal
fonte de receita adviria do Fundo de Participação dos Municípios – FPM,
composto por 22,5% do valor arrecadado a título de IR e IPI; que o IR possuiria
como um dos fatos geradores o lucro das pessoas jurídicas, que também seria
fato gerador da CSLL; que a destinação dada às contribuições sociais é que lhes
conferiria o caráter de contribuição social; que as Emendas Constitucionais nºs
27/00 e 42/03 teriam alterado a destinação de 20% dos recursos das
contribuições sociais entre 2000 e 2007; que, portanto, se a CSLL teve parte de
seus recursos constitucionais desvinculados de órgão, fundo ou despesa, teria
adquirido a feição de imposto na parcela que foi desvinculada, e, desse modo,
as mencionadas emendas constitucionais teriam criado um adicional do IR
transfigurado em CSLL; que o respeito ao FPM seria vital à manutenção da forma
federativa de Estado, pois o FPM seria responsável pela receita mais pujante
dos municípios, sobretudo os mais pobres; que, com base no disposto na alínea b do inciso I do art. 159 da
Constituição/88, o Município-Autor teria direito de perceber sua parcela de
FPM, adicionando em seu cálculo os 20% arrecadados a título de CSLL destinados
à Conta única do Tesouro Nacional tal qual o IR; que teria direito de perceber
sua parcela de FPM, adicionando em seu cálculo os 20% arrecadados a título de
CSLL, destinado à Conta Única do Tesouro Nacional tal qual o IR. Teceu outros
comentários e requereu: a concessão da tutela antecipada declarando o suposto
direito do Município Autor de receber o valor devido pelo repasse do FPM mensal
adicionando em sua base de cálculo o valor recolhido a título de CSLL decorrentes
da desvinculação de 20% dos recursos arrecadados destinado à Conta Única do
Tesouro Nacional; a citação da União; a intimação da União para dar cumprimento
à decisão. No mérito, a confirmação do pedido liminar, obrigando a União a
repassar os valores a título de CSLL, decorrentes da desvinculação de 20% dos
recursos arrecadados desde o início da vigência da EC 27/2000, destinados à
Conta Única do Tesouro Nacional, devidamente atualizado pela SELIC; a
condenação da parte demandada ao pagamento das custas e honorários
advocatícios. Protestou o de estilo. Deu valor à causa e instruiu a Inicial com
instrumento de procuração e documentos, fls. 21/30.
O pedido de antecipação da tutela
jurisdicional ficou para ser apreciado após a manifestação da União, no prazo
de 72 (setenta e duas) horas, fls. 31.
Devidamente intimada, a União
manifestou-se às fls. 37/41, pugnando pelo indeferimento do pedido de
antecipação da tutela jurisdicional.
Citada, a União apresentou
Contestação (fls. 43/47), argüindo prejudicial de prescrição qüinqüenal dos
supostos créditos da parte autora, nos moldes do art. 1º do Decreto nº
20.910/32, e requereu a extinção do processo com resolução do mérito. No
mérito, alegou, em suma, que, diferentemente do que teria sido alegado na
Inicial, as EC nºs 27/00 e 42/03 não teriam criado um adicional de Imposto de
Renda; que o art. 76 do ADCT/88 teria criado a denominada Desvinculação das
Receitas da União (DRU), que significaria que a própria Constituição
prescreveria a possibilidade dos valores arrecadados por meio de tributos
fossem aplicados da forma desejada pela União, e, portanto, não teria havido a
criação de qualquer adicional de IR; que, para ser criado um adicional de IR
seria necessária a promulgação de uma lei e, acaso acatada a tese do Autor,
estar-se-ia criando tributo por meio de analogia, o que seria vedado pelo
Código Tributário Nacional. Teceu outros comentários e requereu: o acolhimento
da prejudicial de prescrição; a improcedência dos pedidos; e a condenação do
Autor nas verbas de sucumbência.
O Autor apresentou Réplica, fls.
49/63.
O Autor ingressou com petição
juntando cópia de decisão judicial, fls. 65 e 66/81, respectivamente.
Decisão interlocutória pronunciando
a prescrição das verbas anteriores a 06.07.2001 e indeferindo o pedido de antecipação da tutela jurisdicional, fls.
82/83.
Cópia da decisão proferida nos autos
do IVC nº 2006.83.00.0108615, julgando procedente o pedido, majorando o valor
da causa e constatando a desnecessidade de complementação das custas por se
tratar de Ente isento, fls. 86.
Instado a dizer se pretendia fazer
prova pericial, o Autor ingressou com a petição de fls. 88 pugnando pelo
julgamento antecipado da lide.
Vieram os autos conclusos para
julgamento.
É o relatório.
Fundamentação
A Desvinculação de Receita da União-DRU(que foi antecedida
pelo Fundo Social de Emergência e pelo Fundo de Estabilização Fiscal) consiste
em permitir que a UNIÃO utilize 20% de determinadas receitas tributárias, já
deduzidas as parcelas das transferências constitucionais obrigatórias dos
Estados e dos Municípios, em finalidades sociais, educacionais e de saúde
pública, pelo período de 2003
a 2007.
O assunto encontra-se atualmente regido no art. 76 do Ato
das Disposições Constitucionais Transitórias-ADCT da atual Constituição da
República, com redação data pela Emenda Constitucional nº. 42, de 19.12.2003.
Eis a íntegra do mencionado dispositivo constitucional:
“Art. 76. É desvinculado de órgão, fundo
ou despesa, no período de 2003
a 2007, vinte por cento da arrecadação da União de
impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já
instituídos ou que vierem a ser criados no referido período, seus adicionais e
respectivos acréscimos legais. (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)(1)
§ 1º O disposto no caput deste artigo não reduzirá a base
de cálculo das transferências a Estados, Distrito Federal e Municípios na forma
dos arts. 153, § 5º; 157, I; 158, I e II; e 159, I, a e b; e II, da
Constituição, bem como a base de cálculo das destinações a que se refere o art.
159, I, c, da Constituição. (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 42, de 19.12.2003)
§ 2o Excetua-se da desvinculação de que trata o caput
deste artigo a arrecadação da contribuição social do salário-educação a que se
refere o art. 212, § 5o, da Constituição.(Incluído
pela Emenda Constitucional nº 27, de 2000)”.
Trata-se, como dito na decisão de fls. 82-83, de mero
arranjo administrativo-orçamentário de emergência, transitório, autorizado pelo
Legislador Constituinte Derivado, não tendo o resultado dessa operação natureza
tributária, porque não se trata de mais um tributo a ser exigido dos
Contribuintes.
Com a instituição da Desvinculação de Receita da União-DRU,
os Estados, o Distrito Federal e os Municípios não sofreram qualquer prejuízo,
porque o § 1º do art. 76 do ADCT, acima transcrito, estabeleceu que, antes de
se fazer o cálculo dos 20% dessa desvinculação de receita, fossem deduzidas as
parcelas das transferências constitucionais obrigatórias devidas a essas
Unidades da Federação, por força dos artigos 157-159 da Constituição da
República.
A tese da petição inicial, segundo a qual a parcela da
Desvinculação de Receita da União-DRU incidente sobre o total das receitas da
Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, seria um “adicional de imposto de renda”, data venia do I. Subscritor da referida peça, não
encontra nenhum sustentáculo no nosso direito constitucional-tributário, que
exige expressa autorização no texto da Constituição da República para a
instituição de qualquer tributo, especificamente adicional de imposto de renda[1]
e, se houvesse essa competência constitucional, esse adicional, como bem
lembrado na defesa da UNIÃO, para ser exigido, teria que ser instituído por Lei
de sua competência, pois não se pode exigir tributo sem observância do
princípio da legalidade(art. 150, I, da Constituição da República).(2)
E se fosse possível caracterizar referida parcela como
adicional de imposto de renda, ainda assim não se poderia obrigar a UNIÃO a
integrar o respectivo montante na base de cálculo das verbas que compõem o
Fundo de Participação dos Municípios-FPM, porque para tanto teria que haver
regra expressa na Constituição da República e não se vê esse “adicional” no rol
dos artigos 158 e 159 dessa Carta, quanto trata das transferências
constitucionais obrigatórias para os Municípios.
Portanto, não pode prosperar o pedido da petição inicial, no
sentido fazer mencionada integração.
Conclusão
Posto isso, julgo
improcedentes os pedidos desta ação e condeno o Município-Autor em verba
honorária, que arbitro em 10%(dez por cento) do valor da causa, fixado em R$
479.065,00 na decisão lançada nos autos da impugnação
ao valor da causa, processo nº. 2006.83.00.01086515, cuja cópia se encontra
às fls. 86, atualizado a partir do mês seguinte ao em que referida decisão foi
lançada, pelos índices do
manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, mais juros de mora legais, à
razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados, todavia, da data da citação da
execução desta sentença(art. 219 c/c art. 730 do Código de Processo Civil), mas
sobre o valor já monetariamente corrigido.
Sem custas, porque o Município-autor
goza de isenção legal.
P. R. I.
Recife, 07 de dezembro de 2007
FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR
Juiz Federal, 2ª Vara-PE
1 - O caput desse dispositivo do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias da Constituição está atualmente com a seguinte redação, que lhe foi dada pela Emenda Constitucional nº 68, de 2011:
"Art. 76. São desvinculados de órgão, fundo ou
despesa, até 31 de dezembro de 2015, 20% (vinte por cento) da arrecadação da
União de impostos, contribuições sociais e de intervenção no domínio econômico, já instituídos ou que vierem a ser
criados até a referida data, seus adicionais e respectivos acréscimos legais.".
Ou seja, a(o) Chefe do Poder Executivo Federal poderá utilizar-se dessa desvinculação de receita até o final do exercício financeiro de 2015.
2. Como foi lembrado no acórdão do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, pelo qual a sentença foi mantida, relatado pelo d. Magistrado de 2º Grau, Dr. Geraldo Apoliano, o Plenário do Supremo Tribunal Federal, no julgamento do Recurso Extraordinário nº 138.284-8/CE, afastou expressamente a tese de que a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido seria um adicional do Imposto de Renda, porque possui base de calculo, alíquota e contribuintes próprios, conforme Lei nº 7.689, de 1988.
OBSERVAÇÃO. A sentença acima foi mantida pela 3ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, que modificou apenas o cálculo da verba honorária, para fixá-la na forma prevista no § 4º do art.20 do código de processo civil, na Apelação Cível nº 444.290-PE(2005.83.00.009343-0), julgamento em 20.08.2009, publicação no Diário da Justiça Eletrônico do dia 13.10.2009, não tendo sido admitido o respectivo recurso especial, no qual se questionou apenas quanto à verba honorária, conforme r. decisão do Presidente do referido Tribunal, datada de 11.11.2010, publicada no Diário da Justiça Eletrônico de 03.12.2010. Certidão de trânsito em julgado datada de 07.06.2011(fl. 188 dos autos do processo).
[1]
Registre-se que o texto originário da Constituição da República em vigor dava competência , no inciso
II do seu art. 155, os Estados da Federação e o Distrito Federal para a
instituição de um “adicional de imposto de renda”, que chegou a ser
efetivamente instituído por Lei própria, mas esse dispositivo foi revogado pela
Emenda Constitucional nº. 3, de 1993.