terça-feira, 27 de abril de 2021

MUNICÍPIO. AQUISIÇÃO DE POSTES, FIOS, ETC., DE EMPRESA DE ELETRICIDADE PRIVADA DE FORMA COMPULSÓRIA, POR FORÇA DE RESOLUÇÃO DA ANEEL. ACORDO. HOMOLOGAÇÃO COM RESSALVAS ORÇAMENTÁRIAS.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Matérias públicas bem interessantes são debatidas na sentença que segue: contratação de advogado por Município, sem licitação pública; Resolução da ANEEL que obriga Municípios a adquirem de Empresas Privadas de Eletricidade toda a rede elétrica do território municipal. O problema da Lei de Diretrizes Orçamentárias e da Lei do Orçamento Anual do Município, que autorize o Prefeito a realizar essa despesa ou a firmar acordo judicial com a Empresa Privada de Eletricidade e com a ANEEL. Homologação judicial do acordo com as ressalvas das regras constitucionais e especialmente da Lei de Responsabilidade Fiscal, a Lei Complementar 101, de 2000, e o Decreto-lei 201, de 1967, que trata do impeachment de Prefeitos e Vereadores e dos seus crimes de responsabilidade e comuns no exercício da atividade pública. 

Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0807411-89.2015.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

AUTOR: MUNICIPIO DE SAO VICENTE FERRER
ADVOGADO: P G D De R e outro
ADVOGADO: R M De A
ADVOGADO: C G D J
RÉU: COMPANHIA ENERGETICA DE PERNAMBUCO e outro
ADVOGADO: D D De M F
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)



SENTENÇA TIPO B


EMENTA: CONTRATAÇÃO DE ADVOGADO POR MUNICÍPIO. TRANSAÇÃO. HOMOLOGAÇÃO COM RESSALVAS LEGAIS. EXTINÇÃO DO PROCESSO, COM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.

- Município  que tenha ou não tenha Procuradoria, só poderá contratar advogado por meio de licitação pública, ressalvados os casos de "notório saber".

-Homologação de acordo firmado entre o Município-autor , a CELPE e a ANEEL, com ressalvas legais, e com extinção do processo, com resolução do mérito, conforme art. 487, III, b,  do CPC.


Vistos, etc.

1. Breve Relatório

O MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER, pessoa jurídica de direito público, qualificado na inicial, ajuizou ação de rito ordinário com pedido de antecipação de tutela, "inaudita altera pars" em face da COMPANHIA ENERGÉTICA DE PERNAMBUCO - CELPE e da AGENCIA NACIONAL DE ENERGIA ELETRICA - ANEEL,  objetivando obter prestação jurisdicional liminar para: (a) exonerar o Município Autor de assumir a obrigação de receber e administrar o próprio sistema de iluminação pública, anteriormente mantido pela CELPE, até o advento da Resolução Normativa ANEEL nº 479/2012  que haveria transferido os sistemas de iluminação pública que estivessem registrado como Ativo Imobilizado em Serviço - AIS da distribuidora de energia elétrica (CELPE) para a pessoa jurídica de direito público competente; (b) obrigar a CELPE a reassumir a operação do sistema de iluminação pública do município; (c) obrigar a ANEEL a adotar medidas cabíveis a fim de suspender a aplicabilidade da mencionada resolução, bem como comunicar à CELPE da referida suspensão dos efeitos do dispositivo, inclusive comprovando, nos autos, as providências tomadas neste intento. No mérito, pugnou pela confirmação da medida liminar requerida, com reconhecimento da inconstitucionalidade incidental do art. 218 da Resolução Normativa nº 414/10, tanto na sua redação originária como na redação dada pela Resolução Normativa n° 479/12, ambas expedidas pela ANEEL. Inicial instruída com procuração e documentos. Atribuiu a causa o valor de R$ 1.000,00 (hum mil) reais.

Alegou o Município Autor, em síntese, que a Resolução Normativa nº 479/12 seria medida contra os cofres do Município, uma vez que seria manifesta a sua incapacidade em assumir a responsabilidade pela iluminação pública considerando que não disporia de recursos financeiros, técnica, condições estruturais e pessoais para manter o sistema de iluminação pública municipal, ante a complexidade da atividade; o serviço público de iluminação estaria sendo prestado há mais de 50 anos por diversas concessionárias espalhadas por todo pais, fato que mostraria imensa vantagem considerando o "saber fazer" das concessionárias, observando que tal decisão acarretaria reflexos financeiros a ser repassados e custeados pela coletividade; o estado de precariedade dos ativos imobilizados a serem transferido à administração do município (lâmpadas, luminárias, reatores, bulbos, braços, postes). Teceu comentários sobre outros institutos legais.

Decisão sob Id. 4058300.1469227,  na qual foi deferido  o pedido de antecipação da tutela, para suspender "os efeitos das resoluções 414, de 15.09.2010, e 479, de 03.04.2012, da Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL, para todos os fins de direito, desobrigo o Município-autor de observá-las, e determino que a Companhia Energética de Pernambuco - CELPE continue com o seu patrimônio, bem como cuidando da respectiva manutenção, com a finalidade de continuar prestando regulares serviços de fornecimento de energia elétrica ao Município-autor, sob as penas do respectivo contrato e da legislação que trata do assunto. Determinou-se, ainda, que a Agência Nacional de Energia Elétrica - ANEEL abstenha-se de punir o Município-autor por não se submeter às tais referidas Resoluções, sob pena de ser submetida a multa, a favor do referido Município, sem prejuízo da responsabilização administrativa, civil e penal do seu Dirigente ou Servidor que venha a dar azo à fixação de tal multa, que será retroativa à data do descumprimento desta decisão".

Foi noticiada a interposição de Agravo de Instrumento (Id. 4058300.1535679).

A ANEEL e a CELPE apresentaram contestações (Vide Ids. 4058300.1532883 e  4058300.1563661.

Réplicas sob Ids. 4058300.1563661 e 4058300.1823902.

Noticiado o descumprimento da decisão que deferiu o pedido (Id. 4058300.1948450).

Após "razões finais" apresentadas pela CELPE (Id. 4058300.2947573), esse Juízo, chamando a atenção para possível irregularidade na contratação de escritório de advocacia, pelo Município-autor, determinou a intimação para prestar esclarecimentos (com ciência ao Ministério Público do Estado de Pernambuco e ao Tribunal de Constas do Estado de Pernambuco), em seguida abrindo vista dos autos ao Ministério Público Federal para adotar as medidas pertinentes (Id. 3473359).

Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal pugnou pela procedência dos pedidos formulados na inicial (Id. 4058300.3653914).

Termo de Transação Extrajudicial, datado de 14/09/2017, e celebrado entre a CELPE e o MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER/PE (Id. 4058300.4361932).

A ANEEL não apresentou objeção ao termo de transação celebrado entre a CELPE e o MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER/PE (Id. 4058300.4811239).

Decisão sob Id. 4058300.5119688, na qual se determinou a intimação do Município-Autor  "para esclarecer em qual Lei Municipal está assentada a referida transação, tendo em vista que referida transação implica em aumento de suas despesas e, como se sabe, isso só pode ocorrer se houver previsão na respectiva Lei de Diretrizes Orçamentárias e na Lei do Orçamento Anual".

Determinou-se, ainda, remessa dos autos ao MPF, oportunamente, para manifestação.

O Ministério Público Federal solicitou esclarecimentos sobre a presença do Município de Aliança/PE no Parágrafo Segundo, da Cláusula Segunda, do Termo de Transação Extrajudicial (Id. 5652171).

O MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER/PE mencionou que, em vez de "Município de Aliança/PE", o correto seria "Município de São Vicente Férrer/PE" (erro material), enquanto a CELPE pediu pra desconsiderar o referido parágrafo, pois não dizia respeito ao Município de São Vicente Férrer/PE (Ids. 4058300.7997931 e 4058300.8016515).

O Ministério Público Federal insistiu para que o MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER/PE enfrentasse o questionamento sobre Lei autorizativa da transação pactuada com a CELPE (Id. 4058300.8607891).

Em face da ausência de notícias acerca de medida adotada pelo Ministério Público Estadual e/ou Tribunal de Contas do Estado acerca da contratação de escritório de advocacia pelo MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER/PE, aparentemente sem licitação pública, este Juízo determinou nova comunicação àqueles órgãos. Ordenou, também, nova intimação do MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER/PE, como requerido pelo Ministério Público Federal (Id. 4058300.9573357).

O MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER/PE apresentou petitório, esclarecendo: a) que, à época do ajuizamento da ação, havia um movimento de diversos Municípios pernambucanos ajuizando ações no mesmo sentido (por exemplo, Goiana, Timbaúba, Araripina, Bodocó e Bom Conselho); b) que, em determinado momento, a tese autoral chegou a prosperar no Judiciário (como demonstra a concessão da tutela de urgência, nesta demanda), mas, com o tempo, surgiram as sentenças reconhecendo a legalidade do art. 218 da Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010, panorama hoje tido como pacificado no Tribunal Regional Federal da 5ª Região; c) aliás, além de reconheceram a legalidade da Resolução Aneel, ao final condenaram os Municípios-autores ao pagamento de honorários sucumbenciais, entendimento esposado pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região; d) vislumbrando a possibilidade de se ver derrotado na presente lide, tendo que pagar honorários sucumbenciais, entendeu mais vantajoso ao Erário Municipal pactuar o Termo de Transação Extrajudicial em questão, o qual, ao final, trouxe, em verdade, economia para Ente municipal, desonerando-o do pagamentos dos honorários sucumbenciais sobre a previsível condenação; e) salientou ainda que a assunção, pelo Município, dos ativos de iluminação pública que outrora integravam o patrimônio da Celpe, conquanto possa implicar incremento de despesa, não decorreu de iniciativa do ente municipal (Id. 4058300.9795470)

Instado a se manifestar, o Ministério Público Federal não se opôs à homologação (Id. 4058300.16325296).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.2. Da representação do Município

Toda e qualquer Autoridade que tome ciência de indícios de alguma irregularidade administrativa, é obrigada a comunicar aos Órgãos competentes, para as devidas providências.

Conforme já consignado na decisão sob Id. 4058300.9573357, constato haver indícios de que o Sr. Prefeito do Município-autor contratou Advogados para representação judicial do Município autor sem a devida licitação pública (pelo menos não há nos autos a respectiva prova, tampouco a prova do respectivo contrato).   

Como se sabe, qualquer Unidade da Federação pode e deve ter o Órgão Procuradoria, para a defesa judicial e extrajudicial dos seus interesses e, na ausência desse Órgão, pode contratar Escritório de Advocacia ou Advogado, mas, para tanto, tendo em vista regras constitucionais e legais vigentes, só poderá fazê-lo por licitação pública, uma vez que nessa seara não existe a figura legal denominada de "notória especialização", que poderia dispensar a licitação(inciso II do art. 25 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993, e, principalmente, o respectivo § 1º).

A Revista CONJUR, de 17.12.2017, noticiou que o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco - TCE/PE já se posicionara, em julgado pioneiro, sobre esse assunto e não afastou a necessidade de licitação, exceto para contratação de jurista de notório saber jurídico.

Obviamente, como está na Lei e como já decidiu o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco - TCE/PE, para casos muito especiais, o Município poderá contratar, sem licitação, mas por meio do processo administrativo próprio, jurista de notória especialidade para um parecer ou até mesmo para funcionar como advogado, mas essa notória especialidade tem que ser clara e sem necessidade de delongas para a sua comprovação, o que não parece ser o caso dos autos.

Aliás, o Estado de Pernambuco teve a sua Constituição alterada pela Emenda Constitucional nº 45, de 130.502019, com inclusão de dispositivo tratando especificamente desse assunto, verbis:

"Art. 81-A. No âmbito dos Municípios, bem como de suas autarquias e fundações públicas, o assessoramento e a consultoria jurídica, bem como a representação judicial e extrajudicial, serão realizadas pela Procuradoria Municipal. (AC)

§ 1º As atribuições da Procuradoria Municipal poderão ser exercidas, isolada ou concomitantemente, através da instituição de quadro de pessoal composto por procuradores em cargos permanentes efetivos ou da contratação de advogados ou sociedades de advogados. (AC)

§ 2º No caso de opção pela instituição de quadro de pessoal serão observadas as seguintes regras: (AC)

I - os procuradores municipais serão organizados em carreira, cujo ingresso dependerá de aprovação em concurso público de provas e títulos, com a participação da Ordem dos Advogados do Brasil em todas as suas fases; e, (AC)

II - A Procuradoria Municipal terá por chefe o Procurador-Geral do Município, cuja forma e requisitos de investidura serão definidos em lei municipal. (AC)

§ 3º A contratação de advogados ou sociedades de advogados pelos entes municipais obedecerá aos ditames da legislação federal que disciplina as normas para licitações e contratos da Administração Pública. (AC)

§ 4º As Câmaras Municipais poderão instituir Procuradorias Legislativas, nos moldes previstos no § 1º, para o desempenho das funções de assessoramento e consultoria jurídica, bem como p ara a representação judicial e extrajudicial. (AC)

§ 5º A representação judicial da Câmara Municipal pela Procuradoria Legislativa ocorrerá nos casos em que seja necessário praticar em juízo, em nome próprio, atos processuais na defesa de sua autonomia e independência frente aos demais Poderes e órgãos constitucionais." (AC)".

O assunto não é desconhecido do Superior Tribunal de Justiça, cuja 2ª Turma teve oportunidade de decidir a respeito do assunto, no qual determinado Prefeito e determinado Advogado foram enquadrados no art. 12 da Lei de Improbidade Administrativa (Lei 8.429, de 1992), porque o primeiro contratou o segundo para representar judicialmente o Município sem licitação pública, para serviços advocatícios que não se enquadravam na denominada "notória especialidade", com a agravante de que o Município tinha o Órgão Procuradoria Jurídico-Judicial.[1].

Mais recentemente a 1ª Seção dessa Corte Superior manteve mencionado entendimento, no sentido de que Município não pode contratar escritório de advogado particular, tampouco advogado particular, sem a devida  licitação pública[2].

É verdade que o assunto encontra-se sob repercussão geral no  Supremo Tribunal Federal, nos autos do RE 656.558, cujo julgamento (ainda não concluído) teve início no dia 14/06/2017, pautado para julgamento em 16.06.2021, conforme consta no site do STF[3]

Então, enquanto a Suprema Corte não decidir a matéria, prevalecem os acima invocados julgados do Superior Tribunal de Justiça, especialmente o último, que é da sua 1ª Seção.

E, enquanto isso, os Senhores  Prefeitos devem privilegiar a moralidade pública, não contratando advogados ou escritórios de advocacia particulares sem licitação pública, tenha o Município, ou não, Procuradoria devidamente constituída.

Registro que inúmeros fatos como este foram comunicados ao Ministério Público Federal, em outras ações, e este opinou, no Declínio de Atribuições nº 35/2017/PRM/STA, Ref. N.F n] 1.26.003.000107/2017-12, com base nos Enunciados nºs 2 e 4 da 1ª Câmara de Coordenação e Revisão do Ministério Público Federal, que, doravante, a comunicação deveria ser feita aos mencionados Órgãos Estaduais, aos quais competem as providências supra.

Registro ainda que em um  dos  inúmeros casos que comuniquei ao Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco - TCE/PE, recebi da d. Procurador-Geral do Ministério Público de Contas de Pernambuco, DD Dra. GERMANA GALVÃO CAVALCANTI AUREANO, o Ofício TCMPCO-MP 631/2018, informando-me que fora expedido "Alerta de Responsabilização" à Prefeitura do Município de Brejão, pelo Relator das contas, d. Conselheiro Ranilson Brandão Ramos, via Ofício TC/GC02 nº 00188/2018.

Mencionado Ofício chegou-me com cópia de todo o procedimento, inclusive,  do referido "Alerta de Responsabilização", do qual destaco o seguinte trecho:

"Frente ao exposto, urge a necessidade de promover a regularização da representação processual do Município nos autos da aludida Ação Ordinária, Processo nº 0807193-58.2018.4.05.8300, dada a notícia extraída do Ofício 091/2018-GAB, enviado a este Órgão Ministerial e subscrito pela Prefeita, da existência de, ao menos, um procurador nos quadros do Município de Brejão, alertando para as consequências oriundas da não adoção da medida ora determinada, ficando V. Exa exortada da responsabilização por possíveis danos ao erário municipal, ressalvando que este Tribunal não acolherá alegações de desconhecimento dos fatos consignados pelo Ministério Público de Contas, quando da eventual apresentação de defesa.".

Então, reitere-se a diligência  no sentido de remeter para o TC/PE e para o Órgão do MPE que atua no TC/PE cópia desta decisão, para que tomem ciência, para os fins legais. 

2.2. Do pedido de homologação de acordo extrajudicial

Trata-se de ação ordinária com pedido de tutela provisória ajuizada pelo MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FÉRRER/PE em face da COMPANHIA ENERGÉTICA DE PERNAMBUCO - CELPE e AGÊNCIA NACIONAL DE ENERGIA ELÉTRICA - ANEEL, buscando provimento jurisdicional: a) que desobrigue o autor a receber e administrar o sistema de iluminação pública, então estabelecida no art. 218 e ss da Resolução Administrativa ANEEL nº 414/2010; b) que obrigue a CELPE a se abster de transferir ao autor o sistema de iluminação pública registrado como Ativo Imobilizado em Serviço (AIS), com base no art. 218 da Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010; c) que a obrigue a CELPE a reassumir a operação do sistema de iluminação pública cujos AIS foram transferidos para a parte autora, com base no art. 218 da Resolução Administrativa ANEEL nº 414/2010; d) que obrigue a ANEEL a adotar as medidas cabíveis a fim de suspender a aplicabilidade do art. 218 da Resolução Administrativa ANEEL nº 414/2010, na redação original e naquela conferida pela Resolução Administrativa ANEEL nº 479/2012, considerada sua inconstitucionalidade e/ou ilegalidade; e e) que obrigue a ANEEL a comunicar à CELPE a suspensão da aplicabilidade do mencionado dispositivo normativo.

Deferido o pleito antecipatório, foi noticiado, em sucessivo, acordo extrajudicial para fins de homologação (Id. 4058300.4361932), tendo este Juízo solicitado os esclarecimentos listados no despacho sob Id. 4058300.5119688 no sentido do Município Exequente em qual "Lei Municipal está assentada a referida transação, tendo em vista que referida transação implica em aumento de suas despesas e, como se sabe, isso só pode ocorrer se houver previsão na respectiva Lei de Diretrizes Orçamentárias e na Lei do Orçamento Anual".

Em resposta, o Município-Autor alegou o seguinte, na petição sob Id. 4058300.9795470:

"À época da propositura da presente Ação Ordinária, diversos Municípios que compartilhavam do mesmo entendimento, também recorreram ao Judiciário na tentativa de se desobrigarem de receber tais ativos, a exemplo de Goiana (Proc. nº 0808276- 15.2015.4.05.8300), Timbaúba (Proc. nº 0807971-31.2015.4.05.8300), Chã de Alegria (Proc. nº 0800248-24.2016.4.05.8300), Araripina (Proc. nº 0801303-10.2016.4.05.8300), Bodocó (Proc. nº 0800348-76.2016.4.05.8300) e Bom Conselho (Proc. nº 0801468-57.2016.4.05.8300).

Esta tese prosperou em um primeiro momento, tanto é que na presente ação foi concedida a antecipação da tutela pleiteada, mantendo o Município/Autor desobrigado de receber os ativos das Concessionárias de Serviços de Energia Elétrica e arcar com a respectiva manutenção, até o julgamento do mérito da presente ação.

Todavia, nada obstante o sucesso inicial da tese, as sentenças de mérito proferidas nestas ações não só reconheceram a legalidade da Resolução Aneel sob açoite, obrigando, por conseguinte, os municípios a assumirem os ativos de iluminação pública e arcarem com a sua manutenção, como também os condenaram ao pagamento de honorários sucumbenciais, entendimento esposado pelo Egrégio Tribunal Regional Federal da 5ª Região, conforme se depreende das decisões ora acostadas (Docs. 01 a 06).

Neste cenário, tendo em vista a jurisprudência - já àquela época - dominante no sentido de reconhecer a legalidade do artigo 218 da Resolução Normativa ANEEL nº 414/2010, as chances de êxito do Município/Autor na presente ação eram nulas (sobretudo em face do entendimento pacificado pelo TRF5), de modo que se fez necessário repensar a estratégia e aceitar o Acordo Extrajudicial proposto pela CELPE, a fim de evitar, ao menos, a condenação em honorários sucumbenciais. 

Em outras palavras, o Acordo Extrajudicial firmado entre as Partes na data de 14.09.2017 trouxe uma economia para o Município, em razão do mesmo se desonerou do pagamento dos honorários sucumbenciais incidentes sobre uma previsível condenação.

Demais disso, cabe ressaltar que a assunção, pelo Município/Autor, dos ativos de iluminação pública que outrora integravam o patrimônio da CELPE (parte Ré na presente Ação), nada obstante implicar em incremento de despesa, não decorreu de iniciativa do Ente Municipal, que adotou todas as cautelas possíveis para se desobrigar desta despesa.

Contudo, em face do entendimento jurisprudencial acerca da temática, o acordo firmado com vistas à pôr fim à presente ação representou, em ultima análise, uma economia para os cofres municipais, uma vez que não somente antecipou um resultado que fatalmente viria (ainda que em segunda instância), como afastou a possibilidade de condenação em honorários advocatícios sucumbenciais.

Ante o exposto, o Município/Autor requer homologação do Acordo Extrajudicial acostado aos autos (Id. 4058300.4361928) e a consequente extinção da presente ação com julgamento do mérito, em face da transação realizada entre as parte."

O Ministério Público Federal, por sua vez, no parecer sob Id. 4058300.16325296, não observou  óbice à homologação da transação extrajudicial avençada entre as partes (Id. 4058300.16325296).

Insta registrar que, conforme relatado no item 1 desta Sentença, o Ministério Público Federal solicitou esclarecimentos sobre a presença do Município de Aliança/PE no Parágrafo Segundo, da Cláusula Segunda, do Termo de Transação Extrajudicial (Id. 5652171).

O MUNICÍPIO DE SÃO VICENTE FERRER/PE mencionou que, em vez de "Município de Aliança/PE", o correto seria "Município de São Vicente Férrer/PE" (erro material), enquanto a CELPE pediu pra desconsiderar o referido parágrafo, pois não dizia respeito ao Município de São Vicente Férrer/PE (Ids. 4058300.7997931 e 4058300.8016515).

Diante de tais esclarecimentos, o acordo a ser homologado deverá desconsiderar  o Parágrafo Segundo, da Cláusula Segunda, do  referido Termo de Transação Extrajudicial sob Id. 4058300.4361932, conforme esclarecido, por não ser o Município de Aliança-PE parte neste processo.

2.3. Da homologação propriamente dita

Em face dos esclarecimentos ofertados pelo Município na petição sob Id. 4058300.9795470 e ausência de objeção por parte do MPF sob Id. 4058300.16325296, o pleito de homologação transação deverá ser deferido, com a ressalva de que qualquer despesa para o Municóipio-autor, decorrente de tal acordo, só poderá ser efetuada se autorizada por Lei do seu Poder Legislativo, sob pena de responsabilidade do respectivo Prefeito, nos termos das regras da vigente Constituição da República, da Lei Complementar nº 101, de 2000, e do Decreto-lei nº 201, de 1967, com todas as respectivas alterações.

Obviamente, a fiscalização da execução do acordo ora homologado caberá, primeiramente, à Câmara Municipal do Município-autor e, num segundo plano, ao já mencionado importante Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco, bem como ao Ministério Público Estadual, com assento nesse Tribunal, os quais receberão cópia desta Sentença para tal fim.

A homologação,  com ressalva, da mencionada transação firmada pelas Partes, leva à extinção deste processo, com julgamento do mérito, nos termos do art. 487, III, do CPC, limitando-se o judiciário a homologar o acordo celebrado entre os contendores.

Sublinhe-se, finalmente, que no acordo ora homologado resta expressamente excluído o  Parágrafo Segundo, da sua Cláusula Segunda, conforme consignado no item 2.2 supra.

3. Dispositivo

3.1 -     determino que a Secretaria remeta novamente cópia desta sentença, instruída com a petição inicial, procuração, diploma de Prefeito e Termo de Posse do Prefeito na respectiva Prefeitura, para o Tribunal de Constas do Estado de Pernambuco - TCE/PE e para a representação do Ministério Público Estadual que tem assento nesse Tribunal de Contas, para os fins legais pertinentes, inclusive para os fins do subitem 2.3 desta sentença.

E que a Secretaria deste Juízo também remeta cópia desta sentença para a Presidência da Mesa Diretora da Câmara Municípal do Município-autor igualmente para os fins indicados no subitem 2.3 da sua fundamentação.

3.2. Com fulcro no art. 487, inciso III, b, do Código de Processo Civil, homologo o acordo sob 4058300.4361932, com as ressalvas indicadas nos subitens 2.2  e 2.3 da fundamentação supra, para todos os fins de direito;

3.3. Custas e honorários devidos na forma do acordo homologado.

3.4. Após o trânsito em julgado, dê-se baixa, e caso esta sentença/acordo não seja cumprida, a Parte que se sentir prejudicada deverá dar início à respectiva execução, via cumprimento de sentença, na forma preconizada no art. 523 e seguintes do CPC e, se contra a Fazenda Pública, na forma preconizada no art. 535 e seguintes do mesmo diploma processual. 

Registre-se. Intimem-se, com urgência, por se tratar de processo incluído na META 2.

Recife, 27.04.2021

Francisco Alves dos Santos Junior                            

Juiz Federal da 2ª Vara (PE)

(lsc)

________________________________________

[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 2ª Turma. Relator Ministro Humberto Martins. Recurso Especial - REsp nº 1..368.129/GO, julgado em 27/10/2015, publicado no Diário da Justiça Eletrônico - DJe de 12/02/2016).

[2] __________________________. 1ª Seção. Embargos de Divergência no REsp nº 1.192.186 - PR (2009/0096181-3). Relator para o Acórdão Ministro Og Fernandes. Julgado em 26.06.2019, in Diário Justiça Eletrônico - DJe de 10.08.2019.

[3] Disponível em

http://portal.stf.jus.br/processos/detalhe.asp?incidente=4138258

Acesso em 24.04.2021


MANDADO DE SEGURANÇA. BANCA EXAMINADORA DE CONCURSO. LEGITIMIDADE PASSIVA.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Assunto importante na sentença que segue: impetra-se mandado de segurança contra ato da Banca Examinadora do Concurso, na pessoa do seu Presidente, e não contra o Dirigente do Ente que receberá as pessoas aprovadas no concurso. 

Boa leitura.


Obs.: sentença pesquisada e minutada pela Assessora Maria Patrícia Pessoa de Luna.



PROCESSO Nº: 0813902-73.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL

IMPETRANTE: D L P L G
ADVOGADO: D T P L
IMPETRADO: CONSELHO FEDERAL DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL
AUTORIDADE COATORA: PRESIDENTE DO CONSELHO FEDERAL DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL - COFFITO
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)


 

Sentença Tipo C


EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. CERTAME PÚBLICO. EXAME DE CONHECIMENTO PARA A CONCESSÃO DO TÍTULO DE ESPECIALIDADE PROFISSIONAL EM FISIOTERAPIA. AUTORIDADE COATORA. ILEGITIMIDADE PASSIVA. 

- A Parte Impetrante impugna ato realizado pela Banca Examinadora da executora do certame, responsável pela elaboração, aplicação e avaliação das provas.

- Extinção do processo, sem resolução do mérito, por ilegitimidade passiva ad causam.

 

Vistos etc.

1. Relatório

D L P L G, qualificada na Inicial, impetrou, em 21/07/2019, este "MANDADO DE SEGURANÇA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA", em face de ato pretensamente coator que teria sido praticado pelo Ilmo. PRESIDENTE DO CONSELHO FEDERAL DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL - COFFITO. Alegou, em síntese, que: seria fisioterapeuta, bacharela em Fisioterapia pela Universidade Federal de Pernambuco - UFPE, com conclusão do curso no primeiro semestre de 2014 e com colação de grau em 27/08/2014; Mestre em Fisioterapia, também pela UFPE, com colação de grau em 01/06/2017; e Osteopata, pelo -  IDOT, com certificação em setembro de 2014; teria prestado o Exame de Conhecimento para Concessão de Registro do Título de Especialista nas Áreas de Fisioterapia em osteopatia, promovido pelo COFFITO, tendo como banca examinadora o Instituto Excelência (mera executora); a impetrante, conforme o previsto no item 1.2 do Edital do Exame ("A seleção para as especialidades de que trata este Edital compreenderá exame para aferir conhecimentos e habilidades, mediante aplicação de provas objetiva, discursiva e de títulos, de caráter eliminatório"), teria obtido aprovação nas provas objetiva e discursiva, porém, para sua surpresa, tendo em vista que teria anexado todos os documentos em conformidade com o Edital em tela, teria sido reprovada na última fase, isto é, na prova de títulos; inconformada, teria interposto recurso, conforme item 10.18 do Edital; referido Instituto Excelência (executora do certame) teria indeferido o referido recurso por ter considerado que a formação em Osteopatia da Impetrante teria sido iniciada antes do término do curso de Fisioterapia; a banca examinadora (Instituto Excelência) teria incorrido em erro, demonstrando que não teria procedido com a análise correta no que tange às datas constantes nos diplomas acostados pela impetrante;  a impetrante não teria iniciado a sua formação em Osteopatia antes de concluir a sua graduação em Fisioterapia; certamente, a banca examinadora (Instituto Excelência), contratada pela autoridade impetrada (COFFITO) teria levado em consideração, ao analisar o Diploma de Graduação, a data da expedição do Diploma e não a data da Colação de Grau; necessário que seja concedida a segurança aqui pleiteada, para que seja julgado procedente o Mandado de Segurança impetrado, determinando que seja procedida a concessão do Título de Especialista junto ao COFFITO, tendo em vista que a Impetrante teria sido aprovada em todas as fases do Exame de Conhecimento para Concessão de Registro do Título de Especialista nas Áreas de Fisioterapia em Osteopatia. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final: "1) A concessão da medida liminar, "inaudita altera parte", determinado a Impetrada que proceda com a Concessão de Registro do Título de Especialista nas Áreas de Fisioterapia em osteopatia. 2) Intime-se a autoridade coatora para que no prazo legal esteja apta a prestar as informações necessárias; 3) A intimação do representante do Ministério Público, para acompanhamento dos pressupostos processuais; 4) A condenação da Impetrada ao pagamento de honorários sucumbenciais, nos termos do art. 85, § 1º do NCPC; 5) A TOTAL PROCEDÊNCIA da ação, para que finalmente seja concedido, em definitivo, a Segurança pretendida, para o fim de: reconhecer o DIREITO líquido e certo da Impetrante, qual seja, o direito de obter a Concessão de Registro do Título de Especialista nas Áreas de Fisioterapia em osteopatia, junto ao Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional - COFFITO (IMPETRADA)  em razão de que a impetrante fora reprovada diante de evidente erro praticado pela banca examinadora (Instituto Excelência), contratada pela autoridade impetrada, no que tange a equivocada análise dos documentos acostados pela impetrante, conforme já demonstrado". Deu valor à causa. Inicial instruída com procuração e documentos.

Decisão proferida em 22/07/2019 (id. 4058300.11239670), na qual se determinou a intimação da Parte Impetrante para promover/comprovar o pagamento das custas iniciais; bem como para acostar prova do ato atribuído à impetrada.

A Parte Impetrante, em atenção ao despacho supra, apresentou manifestação (id. 4058300.11327440), pugnando pela juntada dos comprovantes do pagamento das custas processuais e da denegação administrativa, esclarecendo a respeito deste último que se trata de recurso interposto pelo site do Instituto Excelência.

Ato ordinatório emitido em 29/08/2019 (id. 4058300.11630167), no qual se intimou a Parte Impetrante para "apresentar o boleto de pagamento das custas processuais iniciais cujo código consta no documento Identificador: 4058300.11327442".

A Parte Impetrante pugnou pela juntada do boleto de pagamento das custas processuais iniciais (id. 4058300.11811486).

Decisão proferida em 17/09/2019 (id. 4058300.11828277), na qual se postergou a apreciação do pedido de concessão de medida liminar para depois da apresentação das Informações da DD Autoridade apontada como coatora; determinada a notificação da Autoridade apontada como coatora para prestar informações, bem como ciência ao órgão de representação judicial do Conselho Impetrado; e vista ao MPF, para o r. parecer legal.

A Autoridade apontada como coatora, o Ilmo. Sr. Presidente do Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional - COFFITO, apresentou Informações (id. 4058300.13011296). Preliminarmente, esclareceu que foi delegada a realização do certame ao Instituto Excelência, nos termos da Resolução COFFITO 377/2010, cabendo ao Conselho Federal apenas acompanhar o processo; e suscitou inadequação da via eleita. No mérito, discorreu sobre a regulamentação pertinente à especialidade profissional de Fisioterapia em Osteopatia; o objetivo da impetrante seria que fosse considerada como graduada a partir da colação de grau de seu curso de graduação em fisioterapia, ocorrida em 08/2014, interpretação diversa daquela aplicada pela banca examinadora responsável pelo certame, a qual teria entendido que a profissional só poderia ser considerada como graduada a partir da expedição do respectivo diploma, o que teria ocorrido em 11/2014; segundo a legislação geral que rege a educação nacional, em especial no que tange à educação superior, apenas o diploma comprovaria a formação recebida por seu titular, devendo este ser expedido por instituições universitárias; entendendo-se como correto o julgamento realizado pelo INSTITUTO EXCELÊNCIA com aplicação estrita do texto legal, não se podendo admitir como válido curso que fora iniciado antes da conclusão da graduação. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final: "...que sejam acatadas as argumentações fáticas e jurídicas culminando na inevitável denegação na ordem pleiteada vez que, em síntese, o que a impetrante almeja é, na verdade, a realização, pelo Poder Judiciário, de interpretação do instrumento convocatório do Exame Nacional de Especialidades para lhe atribuir direito que nitidamente não possui, não sendo possível a concessão da segurança requerida visto que não há direito líquido e certo, tampouco ato de autoridade pública e, menos ainda, ato eivado de abuso ou ilegalidade".

O Ministério Público Federal ofertou seu r. parecer, esclarecendo o motivo pelo qual "deixa de se manifestar nos presentes autos, sem prejuízo de que esse entendimento seja revisto em face de fato superveniente que torne necessária a sua intervenção (id. 4058300.13663193).

Decisão proferida em 15/10/2020 (id. 4058300.16270370), na qual se determinou a intimação da Parte Impetrante para, se fosse o caso, corrigir o defeito apontado pela Autoridade impetrada, indicando a(s) Autoridade(s) coatora(s) que entender por correta(s), bem como a pessoa jurídica da qual faz parte a apontada Autoridade, sob as penas da lei.

Certificado o decurso de prazo sem manifestação da Parte Impetrante (id. 4058300.17131769).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1 - Da ilegitimidade passiva da Autoridade apontada como coatora

Neste mandado de segurança, pugna a Impetrante por provimento jurisdicional para que se determine à Autoridade apontada como coatora que lhe conceda o registro do Título de Especialista em Osteopatia no CONSELHO FEDERAL DE FISIOTERAPIA E TERAPIA OCUPACIONAL - COFFITO.

Narra a Impetrante, em apertada síntese, que prestou o Exame de Conhecimento para Concessão de Registro do Título de Especialista nas Áreas de Fisioterapia em Osteopatia, promovido pelo COFFITO, tendo como banca examinadora o Instituto Excelência, sendo aprovada nas provas objetiva e discursiva, porém, embora tenha anexado todos os documentos em conformidade com o noticiado Edital, fora reprovada na prova de títulos.

Inconformada com o resultado da prova de títulos, interpôs recurso administrativo dirigido ao Instituto Excelência, sendo o mesmo indeferido por ter sido verificado pela banca examinadora que "... a formação em Osteopatia foi iniciada ANTES do término do curso de Fisioterapia o que invalida o item A obrigatório" (id. 4058300.11327443).

Sustenta a Impetrante que a banca examinadora teria incorrido em erro por ter considerado que a formação da Impetrante na especialidade de Osteopatia teve início antes de concluir a graduação em Fisioterapia. Aduz que a banca examinadora (Instituto Excelência), certamente, levou em consideração, ao analisar o Diploma de Graduação (id. 4058300.11229087), a data da expedição do Diploma (14/11/2014) e não a data da Colação de Grau (27/08/2014).

Por sua vez, a DD. Autoridade apontada como coatora, ao apresentar suas Informações (id. 4058300.13011296), esclareceu, preliminarmente, que foi delegada a realização do certame ao Instituto Excelência, nos termos da Resolução COFFITO 377/2010, cabendo ao Conselho Federal apenas acompanhar o processo, não lhe sendo atribuída qualquer outra função, seja de confecção, seja de correção ou guarda das provas, e conclui afirmando que "...qualquer irregularidade que porventura possa vir a ser constatada na realização do exame de conhecimento deverá ser atribuída ao INSTITUTO EXCELÊNCIA, não tendo o Conselho Federal qualquer responsabilidade sobre tais falhas na prestação do serviço prestado pelo Instituto".

Pois bem.

Como se sabe, deve figurar no polo passivo da ação mandamental a autoridade que dispõe de competência para, se for o caso, corrigir a ilegalidade impugnada (§3º do art. 6º da Lei 12.016/2009).

No caso concreto, observa-se, tanto dos fatos narrados na petição inicial, como da análise dos documentos acostados, que a Parte Impetrante impugna ato realizado pela Banca Examinadora do Instituto Excelência, responsável pela elaboração, aplicação e avaliação das provas, apesar de o Exame Nacional ter sido realizado pelo Conselho Federal de Fisioterapia e Terapia Ocupacional - COFFITO.

Note-se que foi delegada pelo Conselho Impetrado a realização do certame ao Instituto Excelência, nos termos da Resolução COFFITO 377/2010, conforme consta das informações apresentadas e do Edital acostado (id. 4058300.13011296 e 4058300.11327441).

Assim sendo, como a pretensão da Impetrante é a desconsideração da avaliação de sua prova de títulos, a fim de que possa obter o registro do título de Especialista em Osteopatia no COFFITO, tem-se que a prática do ato incumbe à executora do certame, isto é, a Banca Examinadora do Instituto Excelência, que teria, na avaliação dos documentos, reprovado a Impetrante no certame em apreço.

Nesse sentido, confiram-se os precedentes do Col. STJ, aplicáveis mutatis mutandis ao presente caso:

"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL. CONCURSO PÚBLICO. PRETENSÃO ANULAÇÃO DE QUESTÕES. INDICAÇÃO DO ESTADO COMO AUTORIDADE IMPETRADA. FALTA DE LEGITIMIDADE. COMPETÊNCIA DA BANCA EXAMINADORA. ACÓRDÃO RECORRIDO EM HARMONIA COM A ORIENTAÇÃO JURISPRUDENCIAL DO STJ. RECURSO ESPECIAL A QUE SE NEGA PROVIMENTO. AGRAVO INTERNO DOS PARTICULARES A QUE SE NEGA PROVIMENTO.

1. Cuida-se, na origem, de ação ordinária proposta contra o Estado do Espírito Santo objetivando a a anulação de questões do Concurso Público para provimento do cargo de Promotor de Justiça Substituto do Estado do Espírito Santo, a fim de efetivar a inscrição definitiva dos recorrentes.

2. Conforme anteriormente afirmado, muito embora o concurso público tenha sido realizado pelo Ministério Público, a executora do certame era o CESPE, responsável pela elaboração e aplicação das provas.

Desse modo, se a pretensão do ora recorrente é a rediscussão de questões do certame, tem-se que a prática do ato incumbe à executora do certame, isto é, a Banca Examinadora, e não ao Estado ou Ministério Público, que não ostenta legitimidade ad causam. Precedentes: RMS 51.539/GO, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, DJe 11.10.2016; e AgRg no RMS. 37.924/GO, Rel. Min. MAURO CAMPBELL MARQUES, , DJe 16.4.2013.

3. Ressalta-se, ademais, que o precedente citado pelos recorrentes, o AgRg no RESp. 1.360.363/ES, de relatoria do Min. OG FERNANDES, no qual ficou consignado que tratando-se de ação ordinária na qual se discute a exclusão de candidato de concurso público, a legitimidade passiva do Estado do Espírito Santo evidencia-se na medida em que é a entidade responsável pela realização, regulamentação e organização do certame, não se amolda ao caso em comento.

4. Verifica-se que o supracitado recurso trata da exclusão de candidato em razão de critérios subjetivos do edital, cujo Estado é responsável pela regulamentação. O caso dos autos, por outro lado, questiona a anulação de questões formuladas pela banca examinadora, ou seja, questiona a correta execução da prova pela entidade contratada, sendo esta, portanto, a parte legítima.

5. Agravo Interno dos Particulares a que se nega provimento.

(AgInt no REsp 1448802/ES, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA TURMA, julgado em 30/09/2019, DJe 03/10/2019)"[1]

"ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONCURSO PÚBLICO. ILEGITIMIDADE PASSIVA. AUTORIDADE COATORA.

1. A autoridade coatora, para fins de impetração de Mandado de Segurança, é aquela que pratica ou ordena, de forma concreta e específica, o ato ilegal, ou, ainda, aquela que detém competência para corrigir a suposta ilegalidade. Inteligência do art. 6º, § 3.º, da Lei 12.016/2009.

2. Na hipótese em exame, constata-se que, muito embora o concurso público tenha sido realizado pela Secretaria de Estado de Gestão e Planejamento do Estado de Goiás, a executora do certame era a Fundação Universa, responsável pela elaboração e aplicação das provas.

3. Desse modo, se a pretensão da impetrante é a desconsideração da avaliação psicológica, tem-se que a prática do ato incumbe à executora do certame, isto é, a Banca Examinadora da Fundação Universa, e não à Autoridade Pública (Secretário de Estado), que para tal situação não ostenta legitimidade ad causam.

4. Portanto, não foi correta a indicação da autoridade coatora, notadamente porque não poderia ele corrigir o procedimento apontado como ilegal, pois não detinha competência para a prática do ato.

5. Com efeito, a jurisprudência do STJ entende que, nessas situações, o Mandado de Segurança deve ser dirigido contra o ato da banca examinadora, no caso, a Universa, de modo que o Secretário de Estado não teria legitimidade passiva para sanar as ilegalidades suscitadas na ação mandamental.

6. Recurso Ordinário não provido.

(RMS 51.539/GO, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 22/09/2016, DJe 11/10/2016)"[2]          (G.N.)

Com essas considerações, tenho que não foi correta a indicação da autoridade coatora, notadamente porque não poderia o Sr. Presidente do COFFITO corrigir o procedimento apontado como ilegal, in casu, proceder a uma correta avaliação da prova de títulos da Impetrante, pois não detinha competência para a prática do ato impugnado.

Destaco ainda que, instada a corrigir o defeito apontado pela Autoridade impetrada, indicando a(s) Autoridade(s) coatora(s) que entendesse por correta(s), a Parte Impetrante quedou-se inerte, conforme certificado nos autos (id. 4058300.17131769).

Ante o acima exposto, é o caso de extinguir o processo, sem resolução do mérito, por ilegitimidade passiva da Parte Impetrada.

2.2 - Outrossim, ante a extinção do processo sem resolução do mérito, por ilegitimidade passiva ad causam, resta prejudicada a apreciação da preliminar de inadequação da via eleita suscitada pela d. Autoridade Impetrada.

3. Dispositivo

Posto isso, de ofício, indefiro a petição inicial(art. 330, II, CPC) e extingo o processo, sem resolução do mérito, por ilegitimidade passiva ad causam da pessoa  indicada como Autoridade coatora(art. 485, I e VI, §3º, CPC).

Custas ex lege.

Sem honorários, ex vi art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009.

Dê-se ciência do inteiro teor desta Sentença à DD Autoridade Impetrada.

Registre-se. Intimem-se.

Recife, 27.04.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal da 2ª Vara da JFPE


(mppl)

______________________________________________________

[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 1ª Turma. AgInt no REsp 1448802/ES, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, julgado em 30/09/2019, in DJe 03/10/2019.

Disponível em

https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201400870203&dt_publicacao=03/10/2019

Acesso em 26.04.2021

[2] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 2ª Turma. RMS 51.539/GO, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN,  julgado em 22/09/2016, in DJe 11/10/2016.

Disponível em

https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201601889220&dt_publicacao=11/10/2016

Acesso em 26.04.2021

domingo, 25 de abril de 2021

ALUNO-APRENDIZ. CONTAGEM DO TEMPO, PERANTE O INSS, PARA FINS DE APOSENTADORIA.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O ex-Aluno-aprendiz, ainda que tenha tido remuneração indireta quando ostentava essa qualidade, tem o direito de contar o respectivo tempo de estudo para fins previdenciários, perante o INSS. 

Na sentença que segue, essa matéria é detalhadamente debatida. 

Boa Leitura. 



Obs.: pesquisa e sentença minutada pela Assessora  Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques


 PROCESSO Nº: 0800847-26.2017.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

AUTOR: SANDRO AIRES DE OLIVEIRA
ADVOGADO: Yonara De Freitas Dantas
RÉU: ESTADO DE PERNAMBUCO. e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

Sentença tipo A


Ementa. PREVIDENCIÁRIO. ALUNO-APRENDIZ.


-Aluno-aprendiz. Tempo do curso, ainda que com remuneração indireta(alimentação, fardamento e material didático), às expensas da UNIÃO, conta-se para fins previdenciários, cabendo ao INSS realizar a respectiva averbação, conforme legislação de regência.

-O ex-Aluno-aprendiz poderá, no futuro, pedir certidão ao INSS para aproveitamento desse tempo no Ente  em que trabalha, ainda que este tenha Regime de Próprio de Previdência Social, como o Estao de Pernambuo.

-Precedente do Tribunal de Contas da UNIÃO - TCU e do Superior Tribunal de Justiça.

-Ilegtimidade passiva ad causam do Esto de Pernambuco.

-Procedência do pedido contra o INSS..


Vistos, etc.

1-Relatório

SANDRO AIRES DE OLIVEIRA, qualificado na Petição Inicial, ajuizou esta ação em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS e do ESTADO DE PERNAMBUCO, na qual busca o reconhecimento e a averbação do tempo de serviço descrito na Certidão nº 01/2016, que teria anexado aos autos, relativo ao período (anos de 1985 e 1986) em que teria sido aluno-aprendiz na Escola Industrial de Arcoverde, no total de 550 (quinhentos e cinquenta) dias de atividades letivas, a fim de que possa ser computado para posterior aposentadoria; salientou que as despesas com os alunos aprendizes eram suportadas pelo orçamento da União; a não aceitação da certidão apresentada implicaria violação ao art. 19, II d CRFB/88. Teceu outros comentários e requereu, ao final, a citação dos Réus e a concessão do benefício da Justiça Gratuita; a procedência do pedido para "(...) condenar as Rés a reconhecerem e averbarem o tempo de serviço descrito na CERTIDÃO Nº 01/2016, anexa, estudou nos anos de 1985 e 1986 na ESCOLA INDUSTRIAL DE ARCOVERDE, como ALUNO-APRENDIZ de PRÁTICAS COMERCIAIS E PRÁTICA INTEGRADA DO LAR, cursando 550 (quinhentos e cinquenta) dias de atividades letivas, a fim de que possa ser ele computado para posterior aposentadoria.". Atribuiu valor à causa e juntou instrumento de procuração e documentos.

Proferida Decisão na qual foi concedido à Parte Autora o benefício da Justiça Gratuita, bem como o prazo de 15 (quinze) dias para que emendasse a Petição Inicial com o demonstrativo de cálculos a indicar como chegou ao apontado valor da causa, sob pena de indeferimento.

Decisão por via da qual este Juízo entendeu por bem determinar a intimação pessoal do Autor para fins de emenda à Inicial.

Petição da Parte Autora na qual alegou que indicou o valor de R$ 58.000,00 porque se outro valor fosse dado à presente Demanda, cuja pretensão consiste na inserção do tempo como menor aprendiz, seriam os autos remetidos para o Juizado Especial, onde a Demanda do Autor já tinha sido indeferida de plano, sob fundamento de incompetência do mencionado Juízo.

Determinada a remessa dos autos à Contadoria do Juízo para que fosse apurado o valor econômico da demanda, caso o feito viesse a ser julgado procedente; a Contadoria apresentou parecer/informação estimando o valor da causa em R$101.610,00.

O ESTADO DE PERNAMBUCO apresentou Contestação na qual arguiu, preliminarmente, sua ilegitimidade passiva ad causam, sob o argumento de que a ação deveria ter sido proposta em face da Fundação de Aposentadorias e Pensões dos Servidores do Estado de Pernambuco - FUNAPE; e a impossibilidade jurídica do pedido pois existiria vedação legal e constitucional para o pleito do Autor; aduziu que a certidão apresentada não passaria de mera declaração não vinculante, pois seria apenas depoimento produzido unilateralmente, sem a participação dos réus. No mérito, alegou, em síntese, que o Autor não faria jus à contagem do tempo como aluno aprendiz para fins previdenciários, haja vista que não teria sido remunerado com recursos provenientes do Estado, de forma direta, mesmo porque o período que pretenderia averbar para aposentadoria seria posterior à vigência da Lei N° 3.552/59; inexistiria fundamento jurídico que amparasse a pretensão deduzida; ao final, requereu: "a) a extinção do processo sem resolução de mérito em face das preliminares acima suscitadas; b) no mérito, caso superadas as citadas preliminares, sejam julgados TOTALMENTE IMPROCEDENTES os pedidos elencados na inicial e o demandante condenado ao pagamento dos ônus sucumbenciais." Protestou o de estilo.

O INSS apresentou manifestação acerca do parecer da Contadoria, na qual alegou, em suma, que: o Autor alcançaria 5 anos 02 meses e 19 dias, considerando os períodos contidos no CNIS vertidos para o RGPS; acrescentando os períodos de Aluno aprendiz o autor alcançaria 6 anos 11 meses, e não faria jus à Aposentadoria; para o reconhecimento de tempo de contribuição de Aluno Aprendiz seria necessário atender ao contido nos arts. 76, 77 e 78 da IN Nº 77/2015 e art.60 e inciso XXII do Decreto nº 3.048/99. Juntou documentos.

O Autor apresentou Réplica à Contestação do Estado de Pernambuco e rechaçou os argumentos ali lançados.

Decisão na qual foi fixada a competência desta 2ª Vara Federal para processar e julgar o feito, ante o parecer da Contadoria sob o id. 6368718, no qual se informa que o valor da causa seria estimado em R$ 101.610,00, e determinou-se que a Secretaria efetuasse a alteração do valor da causa para o indicado no referido parecer; ademais, determinou a citação do INSS.

O INSS apresentou Contestação na qual arguiu preliminar de ilegitimidade passiva ad causam. No mérito, alegou, em suma, que, na certidão acostada aos autos, em momento algum constaria a existência de vínculo empregatício nos termos exigidos pelas normas regulamentares e pela jurisprudência; portanto, não seria possível o seu cômputo para fins de aposentadoria; portanto, os pedidos do Autor deveriam ser julgados improcedentes, e requereu: de forma eventual e subsidiária: "a) seja acolhida a PRELIMINAR suscitada e, caso ultrapassada, seja o pedido julgado IMPROCEDENTE, por não possuir a parte autora direito subjetivo à revisão perseguida; b) a condenação do Autor, em qualquer caso, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios; c) na eventual hipótese de condenação do INSS, que os juros de mora e a correção monetária fixados de acordo com a Lei nº 9.494/97, com a nova redação dada pela Lei nº 11.960/09 e que o termo final da condenação seja fixado em 01/11/17; d) sejam os honorários advocatícios fixados nos termos do art. 85 e ss. do CPC, respeitada a Súmula 111/STJ." Protestou o de estilo e juntou documentos.

O Autor apresentou Réplica à Contestação do INSS; em seguida, juntou documentos e requereu a intimação dos Réus para manifestação; e, na sequência, informou que não teria mais provas a produzir.

O INSS apresentou manifestação aos documentos apresentados pelo Autor, ratificou a contestação apresentada, e afirmou não ter provas a produzir.

O Estado de Pernambuco requereu juntada da documentação que informa que o pleito do Autor foi deferido administrativamente, atestando o tempo de aluno aprendiz limitado a 00 (zero) ano, 11 (onze) meses e 26 (vinte e seis dias), e pugnou pela extinção do feito sem julgamento de mérito, por perda do objeto. Juntou documentos.

O INSS não se opôs à extinção do processo sem resolução do mérito, em cota lançada nos autos.

Enquanto o Autor mais uma vez rebateu a preliminar de ilegitimidade passiva arguida pelo INSS, pois, segundo afirmou, seria atribuição do INSS o reconhecimento do tempo vindicado como aluno aprendiz; como a Autarquia estaria se negando ao dito reconhecimento, pelo fato de o Autor ser servidor ou empregado púbico federal, restaria evidente o interesse do Autor e a legitimidade do INSS para figurar no feito; aduziu que o reconhecimento, pelo ESTADO DE PERNAMBUCO, da existência de apenas 11 (onze) messes e 26 (vinte e seis) dias, não alteraria o pedido contido na Inicial e não autorizaria a extinção sem mérito da mesma, haja vista que os 550 (quinhentos e cinquenta) dias de atividades letivas, superariam os 220 (duzentos e vinte) dias letivos) do ano escolar. Ao final, pugnou pela procedência total do pedido.

É o relatório, no essencial.

Fundamento e decido.

2 - Fundamentação

2.1 - Preliminar de ilegitimidade passiva ad causam arguida pelos Réus INSS e ESTADO DE PERNAMBUCO

Não merece acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam arguida pelo INSS.

Inicialmente, importante frisar que o Autor, na Inicial, não informa se pretende se aposentar, futuramente, pelo Regime Geral de Previdência Social - RGPS ou pelo Regime Próprio de Previdência Social - RPPS.

Nesse cenário, considerando que o Autor pretende averbar o tempo em que atuou como aluno-aprendiz na Escola Industrial de Arcoverde, caberá ao INSS, em caso de procedência do pedido, averbar o tempo de serviço e, a pedido do segurado, emitir a correlata Certidão, na qual devem constar os intervalos reconhecidos. Sucessivamente, o segurado poderá averbar a referida certidão, se assim pretender, junto ao Ente ou Órgão estadual ou federal ao qual estiver vinculado, caso intente se aposentar pelo Regime Próprio de Previdência Social.

Outrossim, somente após a emissão da Certidão de Tempo de Serviço/Contribuição pelo INSS,  Autarquia Previdenciária/Ré, é que poderá surgir o interesse de agir do Autor com relação ao Estado de Pernambuco, caso o Ente Estadual apresente resistência em proceder à averbação do tempo de serviço reconhecido perante o INSS.

E, nessa hipótese, a respectiva ação deve ser proposta no Juízo Estadual pertinente.

Com essas considerações, é o caso de reconhecer, de ofício, a ausência de interesse processual do Autor perante o Estado de Pernambuco, tendo em vista o pleito formulado na Inicial, de reconhecimento e averbação de tempo de serviço como aluno-aprendiz, cuja atribuição pertence ao INSS e, consequentemente, acatar a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam arguida pelo mencionado Estado-réu.

Ante a ilegitimidade passiva do Estado de Pernambuco, resta prejudicada a preliminar de "impossibilidade jurídica" do pedido levantada por sua defesa.

2- Mérito

O Autor busca o reconhecimento e a averbação do tempo de serviço descrito na Certidão nº 01/2016, relativo aos anos de 1985 e 1986, em que estudara na Escola Industrial de Arcoverde, como aluno-aprendiz, para fins de posterior contabilização em futura aposentadoria.

O aluno-aprendiz é o estudante que frequentou escola pública profissional ou escola técnica  federal, escola equiparada (industrial/técnica,mantida e administrada pelos Estados ou DF), voltadas à formação profissional do estudante, o qual, por ter recebido remuneração, mesmo indireta, à conta do orçamento público, tem direito à averbação do período correspondente como tempo de serviço, para fins previdenciários.

Sobre o tema, cumpre destacar o seguinte aresto do E. STJ, in verbis:

"PREVIDENCIÁRIO. AÇÃO RESCISÓRIA. ALUNO-APRENDIZ. ESCOLA TÉCNICA FEDERAL. CONTAGEM. TEMPO DE SERVIÇO. POSSIBILIDADE. REMUNERAÇÃO. EXISTÊNCIA. SÚMULA N.º 96 DO TCU. PRECEDENTES DESTA CORTE. AÇÃO RESCISÓRIA JULGADA IMPROCEDENTE.

1. O tempo de estudante como aluno-aprendiz em escola técnica pode ser computado para fins de complementação de tempo de serviço, objetivando fins previdenciários, em face da remuneração percebida e da existência do vínculo empregatício.

2. O reconhecimento do tempo de serviço, prestado em época posterior ao período de vigência do Decreto-Lei nº 4.073/42, é possível, pois suas legislações subsequentes, quais sejam, Lei nº 3.552/59, 6.225/79 e 6.864/80, não trouxeram nenhuma alteração no tocante à natureza dos cursos de aprendizagem, nem no conceito de aprendiz.

3. Restou comprovado o atendimento da Súmula 96/TCU, que determina que nas instituições públicas de ensino, necessário se faz a comprovação da retribuição pecuniária à conta do Orçamento, admitindo-se, como tal, o recebimento de alimentação, fardamento, material escolar e parcela de renda auferida com a execução de encomendas para terceiros.

4. Ação rescisória julgada improcedente"[1]. [Destaquei].

Importante salientar que o Decreto nº 3.048, em seu art. 188-G, considera como tempo de contribuição o tempo exercido na condição de aluno-aprendiz, assim como a Instrução Normativa nº 77/2015, do INSS, estabelece a possibilidade de se computar, como tempo de serviço/contribuição, o período de aprendizado profissional realizado até 16/12/1998, data da vigência da EC nº 20/98, que proibiu a contagem de tempo de serviço ficto.

No caso em apreço, o Autor trouxe os seguintes documentos com a finalidade de comprovar o tempo de serviço em que atuou como aluno-aprendiz na Escola Industrial de Arcoverde, nos períodos de 28/02/1985 a 18/12/1985 e de 03/02/1986 a 22/12/1986, no total de 550 dias de atividades letivas:

I) Certidão nº 01/2016 emitida pela Direção da Escola Industrial de Arcoverde, na qual se atesta o tempo total de 550 dias de atividades letivas; o recebimento, pelo Autor, de fardamentos, alimentação e materiais didáticos, como remuneração indireta; as despesas com os alunos-aprendizes faziam parte do Orçamento da União; e que a Escola deixou de ser Artesanal a partir do ano de 1976.

Note-se que, embora tenha deixado de ser "Artesanal", a referida Istituição de Ensino passou a ser "Industrial", conforme se observa do papel timbrado no qual está consignada a certidão, e também da declaração vertida na Certidão nº 01/2019 expedida pela Direção da Escola Industrial de Arcoverde, na qual consta a informação de que a referida Escola deixou de ser classificada como Artesanal e passou a ser de ensino industrial.

II)Declaração (Declaração nº 120/2019) emitida pela Gerência de Gestão de Pessoas da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco, na qual foi reconhecido o tempo de serviço de 11 meses e 26 dias de "tempo de aluno".

Vê-se que o próprio Estado de Pernambuco já reconheceu o tempo de Aluno-Aprendiz no total de 11 meses e 26 dias.

III)Certidão nº 01/2019 expedida pela Direção da Escola Industrial de Arcoverde no qual se atesta o tempo total de 587 dias de atividades letivas tendo, assim o labor, como aluno aprendiza, ocorrido durante todo o período letivo, conforme fichas individuais e/ou histórico escolar; a contraprestação em razão de encomendas de terceiros; o recebimento, pelo Autor, de fardamentos, alimentação e materiais didáticos, como remuneração indireta, faziam parte do Orçamento da União; e que a referida Escola deixou de ser classificada como Artesanal e passou a ser de ensino industrial;

IV) Parecer nº 019/2019, emitido pela a Gerência de Gestão de Pessoas da Secretaria de Justiça e Direitos Humanos de Pernambuco, na qual foi reconhecido o tempo de serviço de 11 meses e 26 dias e à anotação do tempo de "Aluno Aprendiz".

Pois bem, à luz dos documentos apresentados, conclui-se que, durante o período de aprendizado, houve retribuição ao Autor consubstanciada em auxílios materiais (alimentação, fardamento e materiais didáticos); mencionadas despesas eram custeadas por orçamento público (Orçamento da União); o recebimento do auxílio material ocorria em contraprestação ao labor desenvolvido pelo Aluno-Aprendiz; e, finalmente, houve o recebimento de remuneração por serviço prestado a terceiros (encomendas de terceiros).

Assim, resta claro o direito ao reconhecimento do tempo em que o Autor atuou como aluno-aprendiz na Escola Industrial de Arcoverde, nos períodos de 28/02/1985 a 18/12/1985 e de 03/02/1986 a 22/12/1986, no total de 550 dias de atividades letivas, e o direito à averbação respectiva para futura utilização pelo segurado, se assim pretender.

3- Dispositivo

Posto ISSO:

3.1- Acolho a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam arguida pelo Estado de Pernambuco e, com relação a este indefiro a petição inicial(art. 330, II, CPC) e extingo o processo, sem resolução do mérito (CPC, art. 485, VI), dando por prejudicada a preliminar de "impossibilidade jurídica do pedido" levantada na defesa desse Réu,

3.2- Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam arguida pelo INSS;

3.3- Julgo procedente o pedido formulado na Petição Inicial, e condeno o INSS a reconhecer e a averbar o tempo de serviço dos períodos de 28/02/1985 a 18/12/1985 e de 03/02/1986 a 22/12/1986, no total de 550 (quinhentos e cinquenta) dias, em que o Autor atuou como Aluno-Aprendiz na Escola Industrial de Arcoverde e que lhe forneça a respectiva certidão, caso venha a requrerer.

Outrossim, condeno a Parte Autora ao pagamento da verba honorária ao Procurador do Estado de Pernambuco, que arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (art. 85, §4º, III), ficando, todavia, a cobrança da verba sucumbencial submetida à condição suspensiva do § 3º do art. 98 do CPC, pelo prazo de cinco anos nele fixado, porque está o Autor em gozo do benefício da Assistência Judiciária.

Finalmente, condeno o INSS ao pagamento de verba honorária ao(à) Patrono(a) da Parte Autora,  que arbitro em 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (art. 85, §§ 2º e 4º, III), desde a data da citação até adata da expedição do(s) requsititório(s), conforme STF, Plenário, RE 579-431/RS] e STJ, Corte Especial, QO no REsp nº 1665599RS Questão de Ordem no REsp nº 2017/0086957-6, Tema Repetitivo 291, atualização essa que deverá ser feita pelo setor próprio do TRF5R, conforme Resolução nº 2017/00458 do CJF-RES, de 04 de outubro de 2017.

R.I.

Recife, 25.04.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

(rmc)



[1] BRASIL. SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA. AR 1.480/AL, Rel. Ministra MARIA THEREZA DE ASSIS MOURA, TERCEIRA SEÇÃO, julgado em 15/12/2008, DJe 05/02/2009.