domingo, 7 de março de 2021

VIGILANTE, COM OU SEM ARMA DE FOGO, FAZ JUS A APOSENTADORIA ESPECIAL. STJ. PRIMEIRA SEÇÃO. EFEITO REPETITIVO.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Há alguns anos estamos decidindo que o Vigilante que trabalha sem arma de fogo corre mais risco que o Vigilante que trabalha com esse tipo de arma, que representa grande parte do seu Equipamento de Proteção Individual - EPI. Antes, a jurisprudência do STJ era no sentido que só portando arma de fogo o Vigilante teria esse direito. Agora, a sua Primeira Seção, em julgado de efeito repetitivo, mudou aquela jurisprudência. Segue a ementa, extraída do site desse Tribunal. 

Boa leitura. 


 REsp 1831377 / PR

RECURSO ESPECIAL
2019/0202898-1
Relator(a)
Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO (1133)
Órgão Julgador
S1 - PRIMEIRA SEÇÃO
Data do Julgamento
09/12/2020
Data da Publicação/Fonte
DJe 02/03/2021
Ementa
I. PREVIDENCIÁRIO. RECURSO ESPECIAL. SISTEMÁTICA DE RECURSOS
REPETITIVOS. ATIVIDADE ESPECIAL. VIGILANTE, COM OU SEM O USO DE ARMA
DE FOGO.
II. POSSIBILIDADE DE ENQUADRAMENTO PELA VIA DA JURISDIÇ]ÃO, COM
APOIO PROCESSUAL EM QUALQUER MEIO PROBATÓRIO MORALMENTE LEGÍTIMO,
APÓS O ADVENTO DA LEI 9.032/1995, QUE ABOLIU A PRÉ-CLASSIFICAÇÃO
PROFISSIONAL PARA O EFEITO DE RECONHECIMENTO DA SITUAÇÃO DE
NOCIVIDADE OU RISCO À SAÚDE DO TRABALHADOR, EM FACE DA ATIVIDADE
LABORAL. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997. INTELIGÊNCIA DOS ARTS.
57 E 58 DA LEI 8.213/1991.
III. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER MERAMENTE
EXEMPLIFICATIVO, DADA A INESGOTABILDIADE REAL DA RELAÇÃO DESSES
FATORES. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS NA REGRA POSITIVA
ENUNCIATIVA. REQUISITOS PARA A CARACTERIZAÇÃO DA NOCIVIDADE.
EXPOSIÇÃO PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE A FATORES DE
RISCO (ART. 57, § 3o., DA LEI 8.213/1991).
IV. RECURSO ESPECIAL DO INSS A QUE NEGA PROVIMENTO, EM HARMONIA COM
O PARECER MINISTERIAL.
1. É certo que no período de vigência dos Decretos 53.831/1964 e
83.080/1979 a especialidade da atividade se dava por presunção
legal, de modo que bastava a informação acerca da profissão do
Segurado para lhe assegurar a contagem de tempo diferenciada.
Contudo, mesmo em tal período se admitia o reconhecimento de
atividade especial em razão de outras profissões não previstas
nestes decretos, exigindo-se, nessas hipóteses provas cabais de que
a atividade nociva era exercida com a exposição aos agentes nocivos
ali descritos.
2. Neste cenário, até a edição da Lei 9.032/1995, nos termos dos
Decretos 53.080/1979 e 83.080/1979, admite-se que a atividade de
Vigilante, com ou sem arma de fogo, seja considerada especial, por
equiparação à de Guarda.
3. A partir da vigência da Lei 9.032/1995, o legislador suprimiu a
possibilidade de reconhecimento de condição especial de trabalho por
presunção de periculosidade decorrente do enquadramento na
categoria profissional de Vigilante. Contudo, deve-se entender que a
vedação do reconhecimento por enquadramento legal não impede a
comprovação da especialidade por outros meios de prova. Aliás, se
fosse proclamada tal vedação, se estaria impedindo os julgadores de
proferir julgamentos e, na verdade, implantando na jurisdição a
rotina burocrática de apenas reproduzir com fidelidade o que a regra
positiva contivesse. Isso liquidaria a jurisdição previdenciária e
impediria, definitivamente, as avaliações judiciais sobre a justiça
do caso concreto.
4. Desse modo, admite-se o reconhecimento da atividade especial de
Vigilante após a edição da Lei 9.032/1995, desde que apresentadas
provas da permanente exposição do Trabalhador à atividade nociva,
independentemente do uso de arma de fogo ou não.
5. Com o advento do Decreto 2.172/1997, a aposentadoria especial
sofre nova alteração, pois o novo texto não mais enumera ocupações,
passando a listar apenas os agentes considerados nocivos ao
Trabalhador, e os agentes assim considerados seriam, tão-somente,
aqueles classificados como químicos, físicos ou biológicos. Não traz
o texto qualquer referência a atividades perigosas, o que à
primeira vista, poderia ao entendimento de que está excluída da
legislação a aposentadoria especial pela via da periculosidade. Essa
conclusão, porém, seria a negação da realidade e dos perigos da
vida, por se fundar na crença - nunca confirmada - de que as regras
escritas podem mudar o mundo e as vicissitudes do trabalho, os
infortúnios e os acidentes, podem ser controlados pelos enunciados
normativos.
6. Contudo, o art. 57 da Lei 8.213/1991 assegura, de modo expresso,
o direito à aposentadoria especial ao Segurado que exerça sua
atividade em condições que coloquem em risco a sua saúde ou a sua
integridade física, dando impulso aos termos dos arts. 201, § 1o. e
202, II da Constituição Federal. A interpretação da Lei
Previdenciária não pode fugir dessas diretrizes constitucionais, sob
pena de eliminar do Direito Previdenciário o que ele tem de
específico, próprio e típico, que é a primazia dos Direitos Humanos
e a garantia jurídica dos bens da vida digna, como inalienáveis
Direitos Fundamentais.
7. Assim, o fato de os decretos não mais contemplarem os agentes
perigosos não significa que eles - os agentes perigosos - tenham
sido banidos das relações de trabalho, da vida laboral ou que a sua
eficácia agressiva da saúde do Trabalhador tenha sido eliminada.
Também não se pode intuir que não seja mais possível o
reconhecimento judicial da especialidade da atividade, já que todo o
ordenamento jurídico-constitucional, hierarquicamente superior,
traz a garantia de proteção à integridade física e à saúde do
Trabalhador.
8. Corroborando tal assertiva, a Primeira Seção desta Corte, no
julgamento do 1.306.113/SC, fixou a orientação de que a despeito da
supressão do agente nocivo eletricidade, pelo Decreto 2.172/1997, é
possível o reconhecimento da especialidade da atividade submetida a
tal agente perigoso, desde que comprovada a exposição do Trabalhador
de forma permanente, não ocasional, nem intermitente. Esse
julgamento deu amplitude e efetividade à função de julgar e a
entendeu como apta a dispensar proteções e garantias, máxime nos
casos em que a legislação alheou-se às poderosas e invencíveis
realidades da vida.
9. Seguindo essa mesma orientação, é possível reconhecer a
possibilidade de caracterização da atividade de Vigilante como
especial, com ou sem o uso de arma de fogo, mesmo após 5.3.1997,
desde que comprovada a exposição do Trabalhador à atividade nociva,
de forma permanente, não ocasional, nem intermitente, com a devida e
oportuna comprovação do risco à integridade física do Trabalhador.
10. Firma-se a seguinte tese: é admissível o reconhecimento da
especialidade da atividade de Vigilante, com ou sem o uso de arma de
fogo, em data posterior à Lei 9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997,
desde que haja a comprovação da efetiva nocividade da atividade, por
qualquer meio de prova até 5.3.1997, momento em que se passa a
exigir apresentação de laudo técnico ou elemento material
equivalente, para comprovar a permanente, não ocasional nem
intermitente, exposição à atividade nociva, que coloque em risco a
integridade física do Segurado.
11. Análise do caso concreto: No caso dos autos, o Tribunal
reconhece haver comprovação da especialidade da atividade, a partir
do conjunto probatório formado nos autos, especialmente, o PPP e os
testemunhos colhidos em juízo. Nesse cenário, não é possível acolher
a pretensão do recursal do INSS que defende a impossibilidade de
reconhecimento da atividade especial de vigilante após a edição da
Lei 9.032/1995 e do Decreto 2.172/1997.
12. Recurso Especial do INSS a que se nega provimento.
Acórdão
Vistos, relatados e discutidos estes autos, acordam os Ministros da
Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, na conformidade dos
votos e das notas taquigráficas a seguir, prosseguindo o
julgamento, após o voto-vista da Sra. Ministra Assusete Magalhães,
por unanimidade, negar provimento ao Recurso Especial, nos termos do
voto do Sr. Ministro Relator. Os Srs. Ministros Mauro Campbell
Marques, Assusete Magalhães (voto-vista), Sérgio Kukina, Regina
Helena Costa, Gurgel de Faria e Herman Benjamin votaram com o Sr.
Ministro Relator.
Ausentes, justificadamente, o Sr. Ministros Francisco Falcão e Og
Fernandes.
Notas
Julgado conforme procedimento previsto para os Recursos Repetitivos
no âmbito do STJ.
Informações Complementares à Ementa
     (VOTO VISTA) (MIN. ASSUSETE MAGALHÃES)
"Eventual inconformismo da parte interessada quanto à tese a
ser firmada no presente julgamento, em razão de dispositivos
constitucionais dependentes de regulamentação, deverá ser deduzida,
pela parte interessada, em sendo o caso, perante o STF, mediante a
utilização da via recursal apropriada.
Observe-se ainda, por oportuno, que o PLC 245/2019, que
'regulamenta o inciso II do § 1º do art. 201 da Constituição
Federal, que dispõe sobre a concessão de aposentadoria especial aos
segurados do Regime Geral de Previdência Social, e dá outras
providências', equipara o risco à integridade física à situação de
efetiva exposição a agentes nocivos químicos, físicos e biológicos
prejudiciais à saúde, ou a associação desses agentes, para fins de
aposentadoria especial, para as atividades que menciona, [...]".
"[...] em casos pontuais, nos quais o segurado pretenda
comprovar atividade especial e tenha esgotado, sem êxito, as
possibilidades de conseguir os documentos exigidos para tal fim,
poderá o julgador, excepcionalmente, admitir outros meios prova, por
exemplo, perícia técnica por similaridade".
Tese Jurídica
"É admissível o reconhecimento da especialidade da atividade de
Vigilante, com ou sem o uso de arma de fogo, em data posterior à Lei
9.032/1995 e ao Decreto 2.172/1997, desde que haja a comprovação da
efetiva nocividade da atividade, por qualquer meio de prova até
5.3.1997, momento em que se passa a exigir apresentação de laudo
técnico ou elemento material equivalente, para comprovar a
permanente, não ocasional nem intermitente, exposição à atividade
nociva, que coloque em risco a integridade física do Segurado".

Veja o Tema Repetitivo 1031
Referência Legislativa
LEG:FED LEI:009032 ANO:1995

LEG:FED DEC:003048 ANO:1999
***** RPS-99 REGULAMENTO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

LEG:FED LEI:010259 ANO:2001
***** LJEF-01 LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS FEDERAIS
ART:00014 PAR:00004

LEG:FED LEI:013105 ANO:2015
***** CPC-15 CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL DE 2015
ART:01036

LEG:FED CFB:****** ANO:1988
***** CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988
ART:00201 PAR:00001 ART:00202 INC:00002

LEG:FED LEI:008213 ANO:1991
***** LBPS-91 LEI DE BENEFÍCIOS DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
ART:00057 PAR:00003 ART:00058 PAR:00004
(ART. 57, § 3º, COM REDAÇÃO DADA PELA LEI 9.032/1995)

LEG:FED DEC:002172 ANO:1997

LEG:FED DEC:053831 ANO:1964
(ITEM 2.5.7. DO ANEXO III)

LEG:FED DEC:083080 ANO:1979
***** RBPS-79 REGULAMENTO DOS BENEFÍCIOS DA PREVIDENCIA SOCIAL

LEG:FED LEI:003807 ANO:1960
***** LOPS-60 LEI ORGÂNICA DA PREVIDÊNCIA SOCIAL
ART:00031
Jurisprudência Citada
(PREVIDENCIÁRIO - TEMPO DE SERVIÇO EXERCIDO EM CONDIÇÕES ESPECIAIS -
DECRETOS 53.831/1964 E 83.080/1979 - IMPOSSIBILIDADE DE
ENQUADRAMENTO PROFISSIONAL - NECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO DA
NOCIVIDADE DA ATIVIDADE)
   STJ - AgInt nos EDcl no AREsp 815198-SP
(PREVIDENCIÁRIO - ATIVIDADE ESPECIAL - AGENTE ELETRICIDADE -
SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997 (ANEXO IV) - ARTS. 57 E 58 DA LEI
8.213/1991 - ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS - CARÁTER
EXEMPLIFICATIVO)
   STJ - REsp 1306113-SC (RECURSO REPETITIVO - TEMA(s) 534)
(PREVIDENCIÁRIO - ATIVIDADE ESPECIAL - VIGILANTE/VIGIA POSTERIOR À
LEI N. 9.032/1995 - COMPROVAÇÃO DA NOCIVIDADE - NECESSIDADE)
   STJ - AgInt no AREsp 1127064-SP,
         REsp 1755261-SP,
         REsp 1410057-RN,
         Pet 10679-RN
(VOTO VISTA - PREVIDENCIÁRIO - ATIVIDADE ESPECIAL - POSTERIOR À
LEI N. 9.032/1995 - COMPROVAÇÃO DA NOCIVIDADE - NECESSIDADE)
   STJ - Pet 9194-PR
(VOTO VISTA - PREVIDENCIÁRIO - CÔMPUTO DE TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL
- RECONHECIMENTO DE TRABALHO SUJEITO A AGENTES NOCIVOS - LAUDO
TÉCNICO PRODUZIDO EM EMPRESA SIMILAR - ADMISSIBILIDADE)
   STJ - REsp 1436160-RS,
         REsp 1656508-PR,
         AgRg no REsp 1427971-RS,
         REsp 1370229-RS
(VOTO VISTA - PREVIDENCIÁRIO - COMPROVAÇÃO DE TEMPO DE SERVIÇO
ESPECIAL - PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO (PPP))
   STJ - Pet 10262-RS