quarta-feira, 11 de março de 2020

Ato de Gestão. Cessão de local no Aeroporto para fins comerciais.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Em 28.04.2018, publiquei uma sentença, neste blog, tratando do assunto ato de gestão. Hoje, publico outra sentença, tratando de outros fatos, mas que se caracterizam como ato  de gestão, indicando julgados de Tribunais mais recentes.
Boa leitura.



PROCESSO Nº: 0805127-35.2020.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: S L COMERCIO E
ADVOGADO: M F G
IMPETRADO: INFRAERO - EMPRESA BRASILEIRA DE INFRA-ESTRUTURA AEROPORTUARIA
AUTORIDADE COATORA: SUPERINTENDENTE DO AEROPORTO INTERNACIONAL DO RECIFE/GUARARAPES - GILBERTO FREYRE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

Sentença tipo C, registrada eletronicamente.



Ementa: - MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DE GESTÃO.
Não cabe mandado de segurança contra ato de gestão.
Extinção do processo, sem resolução do mérito.


Vistos, etc.

1. Relatório


S L COMÉRCIO E - EPP, qualificada na petição inicial, impetrou este mandado de segurança, em 04.03.2020,  a fim que lhe seja assegurado o direito de manter a exploração do espaço comercial objeto do Contrato Comercial nº 02.2018.014.0005, até que se opere o derradeiro desfecho do presente writ. Teceu outros comentários. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.



2. Fundamentação


A Impetrante objetiva, em apertada síntese, a suspensão do Ato Administrativo n° CSATAAD-2019/04013 e, por conseguinte, seja assegurando o direito de manter a exploração do espaço comercial objeto do Contrato Comercial no 02.2018.014.0005, que versa sobre a concessão de uso de área destinada à exploração comercial de artigos regionais.


Da leitura da documentação carreada aos autos, vê-se que a Impetrante é sociedade empresária com atuação no segmento de comércio varejista de produtos alimentícios em geral, tendo como alvo de atuação a comercialização de bolo de rolo da marca "Casa dos Frios" em espaços comerciais, inclusive em aeroportos.


Pois bem.

A rigor, os atos institucionais, praticados por Superintendentes de Empresa Públicas, podem ser impugnados via mandado de segurança, exceto quando envolve atos de gestão..

A concessão de espaço  destinado à exploração comercial de artigos alimentícios regionais, no âmbito do Aeroporto Internacional dos Guararapes, por meio de contrato, precedido de ato licitatório,  não faz parte das suas atividades institucionais, caracterizando-se como mero ato de gestão.


E, pelo § 2º do art. 1º da Lei nº 12.016, de 2009, não cabe mandado de segurança contra ato de gestão.

Nesse sentido, confiram-se os precedentes abaixo listados, aplicáveis mutatis mutandis ao presente caso:

"ADMINISTRATIVO. PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ATOS DE GESTÃO. - Ao proceder a licitação para concessão de área destinada à comercialização de bebidas e alimentos em aeroporto internacional, atividade que não é objeto de delegação de competência por parte do poder público na Lei nº 5.862/72 - diploma que autorizou e regrou a constituição da INFRAERO -, a empresa pública pratica ato de gestão, cujo controle não pode ser efetuado pela via mandamental. Indeferimento da inicial mantido."

(AMS - APELAÇÃO EM MANDADO DE SEGURANÇA 2001.71.00.006865-0, MARCIANE BONZANINI, TRF4 - TERCEIRA TURMA, DJ 15/09/2004 PÁGINA: 679.)

* * *

"ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ERRO NA MODALIDADE RECURSAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. ART. 244 DO CPC. POSSIBILIDADE. LICITAÇÃO. CONTRATAÇÃO DE PRESTADOR DE SERVIÇOS. ATO DE GESTÃO PRATICADO POR ADMINISTRADOR DE SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. VEDAÇÃO. ART. 1º, PARÁGRAFO 2º DA LEI Nº 12.016/2009. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA PARA IMPUGNAR O ATO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA. PRECEDENTES. APELAÇÃO IMPROVIDA.

1. Apelação interposta contra sentença proferida em sede de mandado de segurança, que extinguiu o processo sem resolução de mérito, reconhecendo a inadequação do remédio constitucional para impugnar ato de gestão de sociedade de economia mista.

2. Nos termos do artigo 244 do Código de Processo Civil, o ato processual somente pode ser considerado nulo e sem efeito se, além de inobservância da forma legal, não tiver alcançado a sua finalidade.  No caso concreto o recurso foi interposto dentro do prazo do apelo e as razões recursais se voltam contra os fundamentos expostos na sentença a quo. Aplica-se no caso o princípio da fungibilidade recursal, por se tratar de hipótese em que o recurso, mesmo não sendo o cabível para atacar a decisão, pode ser considerado válido, uma vez que foram atendidos os demais requisitos objetivos.

3. A Lei nº 12.016/2009 estabelece, em seu artigo 1º, parágrafo 2º, que não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público.

4. Hipótese em que a ação mandamental foi impetrada contra ato de gestor da CHESF - Companhia Hidrelétrica do São Francisco, em Pregão Eletrônico realizado com o fito de contratar um terceiro prestador de serviços, para a realização de obras estruturais. Os serviços a serem realizados, à evidência, não guardam relação direta com a atividade de geração de energia que foi delegada pelo Poder Público à referida Companhia, constituindo-se de ato particular de gestão, que não se confunde com ato de autoridade, requisito necessário para viabilizar seu ataque pela via do mandado de segurança.

5. Ainda que praticado mediante procedimento licitatório, o ato ora impugnado  não pode ser entendido como vinculado à atividade estatal delegada, mas apenas como um mero ato de gestão.

6. Nos termos da súmula nº 333 do C. STJ é cabível o manejo do writ para atacar procedimento licitatório de empresa de economia mista ou empresa pública. Contudo, é pacífico que esse remédio constitucional é cabível contra os atos praticados por dirigentes de tais entidades, desde que tais possam ser reputados como típicos da Administração, entendidos como aqueles oriundos de explícita delegação de competência do Poder Público, o que não se verifica no caso dos autos.

7. Apelação improvida."
(PROCESSO: 00052914820114058300, AC527173/PE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, JULGAMENTO: 27/09/2011, PUBLICAÇÃO: DJE 06/10/2011 - Página 349")

Diante do quadro supra, tenho por inapropriado o uso do mandado de segurança para impugnação do mencionado ato, o que caracteriza a situação estabelecida no inciso IV do art. 485 do vigente Código de Processo Civil c/c o mencionado dispositivo da Lei nº 12.016, de 2009, o que impõe a extinção do processo, sem resolução do mérito.

O § 3º do mencionado art. 485 do CPC autoriza o Juiz, nessa situação, a agir de ofício.

E quando isso acontece, embora ressalvando-se o direito de a Parte Impetrante valer-se dos meios ordinários, nega-se a segurança.

O Legislador transformou em Lei esse entendimento, que vinha sendo adotado desde longa data pelo  Supremo Tribunal Federal, hoje consignado no art. 19 da Lei nº 12.016, de 2009, verbis:

"Art. 19.  A sentença ou o acórdão que denegar mandado de segurança, sem decidir o mérito, não impedirá que o requerente, por ação própria, pleiteie os seus direitos e os respectivos efeitos patrimoniais.".

3. Dispositivo


Posto isso, de ofício, reconheço que o ato ora impugnado diz respeito a um ato de gestão, e não ato de Autoridade, e como contra ato de gestão não cabe a impetração de mandado de segurança, dou este processo por extinto, sem resolução do mérito(§ 2º do art. 1º da Lei nº 12.016, de 2009 c/c art. 485, IV e respectivo § 3º do vigente Código de Processo Civil), com denegação da segurança,  mas ressalvando o direito de a ora Impetrante, pela via judicial própria(procedimento comum), buscar a concretização da sua pretensão. o seu alegado direito, ficando prejudicado o pedido de concessão de medida liminar.

Outrossim, condeno a Impetrante nas custas processuais.

Sem verba honorária(art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009).

Registre-se. Intimem-se.


Recife, 11.03.2020

Francisco Alves dos Santos Júnior





Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE