sexta-feira, 23 de outubro de 2020

ITCMD – SOBRE BENS NO EXTERIOR

 

      Por Francisco Alves dos Santos Júnior*       

  

 

Reza a vigente Constituição da República:

“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos sobre:         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou direitos;         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

§ 1º O imposto previsto no inciso I:         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)

I - relativamente a bens imóveis e respectivos direitos, compete ao Estado da situação do bem, ou ao Distrito Federal

II - relativamente a bens móveis, títulos e créditos, compete ao Estado onde se processar o inventário ou arrolamento, ou tiver domicílio o doador, ou ao Distrito Federal;

III - terá competência para sua instituição regulada por lei complementar:

a) se o doador tiver domicilio ou residência no exterior;

b) se o de cujus possuía bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no exterior;

IV - terá suas alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal;”.(Destaquei)

A Lei Complementar prevista no inciso III do § 1º do art. 155 da vigente Constituição da República, acima transcrito, nunca foi editada. 

Na ausência desse tipo de Lei, ficam os Estados impedidos de instituir esse imposto sobre as situações descritas nas alíneas do referido inciso?

Há julgados do Supremo Tribunal Federal, relativamente a outras situações em que a Lei Complementar ainda não foi editada, no sentido de que enquanto houver a omissão do Congresso Nacional, o Ente Tributante pode, por Lei própria, instituir o tributo, inclusive com as regras gerais que deveriam constar da Lei Complementar não editada pelo Congresso  Nacional.

E como exemplo podemos indicar o acórdão do Recurso Extraordinário nº  236.931-8/SP[1], relativo ao Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor – IPVA, cuja Lei Complementar exigidas pelas alíneas “a” e “b” do inciso III do art. 146 da Constituição, fixando as respectivas regras gerais, inclusive com delimitação do seu fato gerador, da sua base de cálculo e da figura do Contribuinte, nunca foi editada pelo Congresso Nacional,  e, no entanto, todos os Estados e o Distrito Federal o instituíram por Lei própria. Nesse acórdão, a 1ª Turma  da Suprema Corte concluiu que a Lei do Estado de  São Paulo, pela qual se instituiu o IPVA,  não era inconstitucional, porque, com base nas regras do § 2º do art. 24 da mencionada vigente Constituição da República, os Estados, o Distrito Federal e os  Municípios gozam de competência suplementar, enquanto não exercida pela UNIÃO, no estabelecimento de regras gerais da competência desta, até que a UNIÃO exerça a sua competência, providenciando, perante o Congresso  Nacional, a edição da Lei Complementar pertinente, hipótese em que as Leis das demais Unidades da Federação, que tenham tratado da  matéria, ficarão suspensas(§ 3º do mencionado art. 24).   

Esse entendimento foi mantido por essa 1ª Turma em vários outros julgados.

No que foi seguida por sua 2ª Turma, conforme se vê, por exemplo, no Recurso Extraordinário – RE 414.259 AgR, verbis:

             “Ementa

EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. IPVA. LEI ESTADUAL. ALÍQUOTAS DIFERENCIADAS EM RAZÃO DO TIPO DO VEÍCULO.

1. Os Estados-membros estão legitimados a editar normas gerais referentes ao IPVA, no exercício da competência concorrente prevista no artigo 24, § 3º, da Constituição do Brasil.

2. Não há tributo progressivo quando as alíquotas são diferenciadas segundo critérios que não levam em consideração a capacidade contributiva. Agravo Regimental a que se nega provimento.”[2].

Pois bem.

Se, quanto à necessidade de Lei Complementar, que ainda não veio a lume,  esse mesmo entendimento se aplica, ou não, às situações relativas à incidência do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação – ITCMD, nas situações descritas nas alíneas do acima transcrito inciso  III  do § 1º do art. 155 da vigente Constituição da República,  encontra-se sub judice,  sob repercussão geral,  no Plenário da Suprema Corte,  desde agosto de 2015, no aguardo de julgamento.

Eis a ementa do julgado da Suprema  Corte, no qual se  decidiu pela  submissão do tema à repercussão geral:

“RE 851.108 RG/SP - SÃO PAULO

REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO

Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI

Julgamento: 25/06/2015

Publicação: 20/08/2015

Órgão julgador: Tribunal Pleno

Repercussão Geral – Admissibilidade

Publicação

PROCESSO ELETRÔNICO DJe-163 DIVULG 19-08-2015 PUBLIC 20-08-2015

Partes

RECTE.(S) : ESTADO DE SÃO PAULO PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SÃO PAULO RECDO.(A/S) : VANESSA REGINA ANDREATTA ADV.(A/S) : REGINA MARIA PEREIRA ANDREATTA

Ementa

EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO. REPERCUSSÃO GERAL. ITCMD. BENS LOCALIZADOS NO EXTERIOR. ARTIGO 155, § 1º, III, LETRAS A E B, DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI COMPLEMENTAR. NORMAS GERAIS. COMPETÊNCIA PARA INSTITUIÇÃO. É de se definir, nas hipóteses previstas no art. 155, § 1º, III, letras a e b, da Constituição, se, ante a omissão do legislador nacional em estabelecer as normas gerais pertinentes à competência para instituir imposto sobre transmissão causa mortis ou doação de quaisquer bens ou direitos (ITCMD), os Estados-membros podem fazer uso de sua competência legislativa plena com fulcro no art. 24, § 3º, da Constituição e no art. 34, § 3º, do ADCT.

Decisão

Decisão: O Tribunal, por unanimidade, reputou constitucional a questão. O Tribunal, por unanimidade, reconheceu a existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada. Ministro DIAS TOFFOLI Relator

Indexação

- VIDE EMENTA.

Legislação

LEG-FED CF ANO-1988 ART-00024 INC-00001 PAR-00003 ART-00155 INC-00001 PAR-00001 INC-00002 INC-00003 LET-A LET-B CF-1988 CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED ADCT ANO-1988 ART-00034 PAR-00003 PAR-00004 ATO DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS LEG-EST LEI-010705 ANO-2000 ART-00004 INC-00002 LET-B LEI ORDINÁRIA, SP LEG-EST DEC-046655 ANO-2002 ART-00003 DECRETO, SP

Tema

825 - Possibilidade de os Estados-membros fazerem uso de sua competência legislativa plena, com fulcro no art. 24, § 3º, da Constituição e no art. 34, § 3º, do ADCT, ante a omissão do legislador nacional em estabelecer as normas gerais pertinentes à competência para instituir o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis ou Doação de quaisquer Bens ou Direitos - ITCMD, nas hipóteses previstas no art. 155, § 1º, III, a e b, da Lei Maior.

Observação

Número de páginas: 11. Análise: 31/08/2015, JRS.[3]

Será que o Supremo Tribunal Federal, na sua composição Plenária, vai adotar a tese que a sua Primeira Turma,  no já distante ano de 1999, adotou no julgamento do Recurso Extraordinário nº 236.931-8/SP e que também passou a ser adotada por sua 2ª Turma?

A questão envolve muito dinheiro e é do interesse dos Estados e do Distrito Fedral.

Acredito que o Plenário da Suprema Corte vai adotar o entendimento acima consagrado por suas duas Turmas, até mesmo porque não poderiam os Estados e o Distrito Federal se prejudicados pela omissão da UNIÃO e do seu Congresso Nacional na elaboração e publicação da Lei Complementar exigida no referido dispositivo constitucional.

Eduardo Cucolo, na sua coluna do Jornal “Folha de São Paulo”, na edição de hoje(23/10),  noticia que o julgamento desse Recurso Extraordinária, sob repercussão geral, no Plenário do Supremo Tribunal Federal, teria começado no dia de ontem(22/10).

Aguardemos,  pois, o resultado.

 

·       O articulista é graduado em Direito pela FADUSP(1979), pós-graudado pela FDRUFPE, mestrado(2000), Juiz Federal desde 1988, e autor dos livros “Decadência e Prescrição no Direito Tributário  do Brasil, Renovar, Coleção Teses(Rio de Janeiro, 2000), “Finanças Públicas, Orçamento Público e Direito Financeiro”, Livro Rápido(Olinda-PE, 2008) e Direito Tributário do Brasil – Aspectos Gerais do Sistema Tributário  Brasileiro(Livro Rápido, Olinda-PE, 2010) e de inúmeros trabalhos jurídicos publicados em Jornais e Revistas Especializadas. Também é titular do blog jurídico: franciscoalvessantosjr.blogspot.com/



[1] Brasil. Supremo Tribunal Federal. 1ª Turma. Recurso Extraordinário nº 236.031-8/SP. Relator Ministro Ilmar Galvão. ANO-1999. In Diário da Justiça - DJ de 29-10-1999, p.00022. Total de Páginas 10, EMENTÁRIO VOL-01969-06 P. 01145.

[2] ___________________________.2ª Turma. RE 414.259AgR. Relator Ministro Eros Grau. Julgamento em 24.06.2009. Publicado no Diário da Justiça Eletrônico - DJe de 15.08.2008. EMENTÁRIO VOL-02328-05 p.-00931

Disponível em

https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur2641/false

Acesso em 23.10.2020.

[3] ___________________________Pleno. Recurso Extraordinário nº     .Relator Ministro Dias Toffoli. Julgamento em, in Diário Judicial Eletrônico – Dje nº 163,  divulgado em 19-08-2015, publicado em 20-08-2015.

Disponível em

https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/repercussao-geral7622/false

Acesso em 23.10.2020.

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segunda-feira, 19 de outubro de 2020

PENSÃO PARA VIÚVO DE SERVIDORA. STF.

 

STF afasta exigência discriminatória para concessão de pensão a viúvo de servidora

A comprovação de dependência econômica apenas para os homens viola o postulado da igualdade.

19/10/2020 16h50 - Atualizado há

Por unanimidade, o Supremo Tribunal Federal (STF) decidiu que é inconstitucional a exigência de requisitos legais diferenciados para a concessão de pensão por morte de ex-servidores públicos em razão do gênero do beneficiário. De acordo com os ministros, a diferenciação viola o princípio da isonomia entre homens e mulheres. A decisão foi proferida no Recurso Extraordinário (RE) 659424, com repercussão geral (Tema 457), na sessão virtual encerrada no dia 9/10, e orientará a resolução de, pelo menos, 1.700 casos semelhantes tramitando em outras instâncias.

Dependência econômica

O recurso foi interposto pelo Instituto de Previdência do Estado do Rio Grande do Sul (Ipergs) contra decisão do Tribunal de Justiça do estado (TJ-RS) que determinou a concessão de pensão por morte ao cônjuge de uma ex-servidora estadual sem a comprovação de invalidez ou dependência econômica, conforme estava previsto na Lei estadual 7.672/1982, já revogada mas que vigorava no momento do falecimento da servidora. De acordo com a norma, o marido só tinha direito à pensão se for dependente da segurada. No RE, o Ipergs sustentava que a lei não é contrária aos maridos, mas favorável às esposas.

Postulado da igualdade

O relator do recurso, ministro Celso de Mello, observou que a jurisprudência do STF é pacífica no sentido de que a instituição de requisito relativo à comprovação de invalidez do cônjuge do sexo masculino como condição para a concessão de pensão por morte de sua esposa ou companheira servidora pública é contrária ao postulado constitucional da igualdade. O mesmo se aplica, portanto, à exigência de comprovação de dependência econômica. Segundo o ministro, o princípio da isonomia vincula, incondicionalmente, todas as manifestações do Poder Público, de forma a obstar discriminações e extinguir privilégios.

Conceito ultrapassado

Celso de Mello salientou que a presunção de dependência econômica em desfavor da mulher, para justificar a exigência unilateral, é um conceito ultrapassado. Ele apontou que estudos do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea) e da Fundação Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) demonstram a elevação do número de famílias brasileiras chefiadas por mulheres. Destacou, ainda, que a nova legislação do RS sobre o tema (Lei Complementar estadual 15.142/2018) eliminou qualquer fator de discriminação entre homens e mulheres vinculados aos segurados filiados ao respectivo sistema previdenciário.

Tese

A tese de repercussão geral fixada foi a seguinte: “É inconstitucional , por transgressão ao princípio da isonomia entre homens e mulheres (CF, art. 5º, I), a exigência de requisitos legais diferenciados para efeito de outorga de pensão por morte de ex-servidores públicos em relação a seus respectivos cônjuges ou companheiros/companheiras (CF, art. 201, V) ”.

PR/CR//CF