sexta-feira, 28 de junho de 2019

A LEI TRIBUTÁRIA E SEUS EFEITOS IMEDIATOS NO CAMPO DA COMPENSAÇÃO.

Por Francisco  Alves dos Santos Júnior

Na sentença que segue, discute-se um importante problema do direito tributário, à luz da jurisprudência do Supremo Tribunal Federal: os efeitos imediatos da Lei Tributária nova frente aos direitos dos Contribuintes,  no campo da compensação.
Boa Leitura.  



Obs.: Sentença pesquisada e minutada pela Assessora Luciana Simoes Correa de Albuquerque



PROCESSO Nº: 0812733-85.2018.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: O G G LTDA
ADVOGADO: A C F De O
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DRF) EM RECIFE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)



Sentença Tipo A, registrada eletronicamente.

Vistos, etc. 
EMENTA: - TRIBUTÁRIO. EFEITOS DA LEI NOVA.
A Lei Tributária nova, relativa à compensação, entra em vigor imediatamente(precedente do Supremo Tribunal Federal).
Cassação da Medida Liminar. 
Negação da Segurança.  

1. Breve Relatório

O G G LTDA, qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança com pedido de liminar em face do Sr. DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL (DRF) EM RECIFE. Aduziu, em síntese, que: seria uma sociedade limitada que teria como objeto social a fabricação e comercialização de equipamentos industriais, incluindo grupos geradores, componentes de grupo geradores, peças, e painéis elétricos, locação de grupos geradores, manutenção de equipamentos, projetos e instalações e representação comercial e reparação, manutenção e locação em equipamentos industriais; a empresa apuraria seu Imposto de Renda (IRPJ) e a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) com base no Lucro Real com recolhimentos por estimativa mensal; a Impetrante teria optado pelo recolhimento por estimativa no exercício de 2016 e apurou ao final do exercício os valores equivalente a R$285.358,06(duzentos e oitenta e cinco mil, trezentos e cinquenta e oito reais e seis centavos) referente a Imposto de Renda de Pessoa Jurídica (IRPJ) e R$ 87.284,88 (oitenta e sete mil, duzentos e oitenta e quatro reais e oitenta e oito centavos) referente a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL), ambos a recolher; seria detentora de crédito acumulado das contribuições relativas ao Programa de Integração Social (PIS) e Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social (COFINS), vinculados a receita de exportação, escriturados em sua contabilidade referente ao período de fevereiro de 2016, créditos estes passíveis de compensação com débitos de IRPJ e CSLL, para a realização de compensação/abatimento de créditos em débitos relativos a tributos federais; teria realizado,  em 2017, tanto um pedido de ressarcimento, quanto de compensação para os débitos de IRPJ e CSLL referente ao exercício de 2016, contudo, devido a erro no cruzamento de suas declarações, a operação teria que ser refeita; para a quitação das estimativas de IRPJ/CSLL referentes a 2016, a Impetrante teria realizado o pedido de ressarcimento por meio do programa PER/DCOMP sob o nº 15324.15023.310818.1.1.19-6420, transmitido em 31.08.2018, solicitando o pedido de ressarcimento (PER) do crédito no valor de R$ 440.181,52 (quatrocentos e quarenta mil, cento e oitenta e um reais e cinquenta e dois centavos) referente a fevereiro de 2016; ao tentar transmitir a declaração de compensação3 (DCOMP) para os débitos relativos a IRPJ e CSLL Lucro Real Estimativa, para surpresa da Impetrante, o sistema teria retornado com a mensagem "ERRO! VALIDADOR PERDCOMP. A TRANSMISSÃO NÃO FOI CONCLUÍDA. É vedada a compensação de débitos de estimativa do IRPJ ou da CSLL, conforme art. 74 da Lei nº 9.430 de 1966, com redação dada pela Lei nº 13.670 de 2018."; teria sido publicada, em 30.05.2018 a Lei nº 13.670/18, alterando o art. 74, §3º da Lei 9.430/96 para incluir o inciso IX, segundo o qual as empresas não poderão quitar seus débitos de estimativa de IRPJ e CSLL por meio de compensação (PER/DCOMP), sendo obrigadas a realizar o pagamento em dinheiro destes débitos: "Art. 6º A Lei nº 9.430, de 27 de dezembro de 1996, passa a vigorar com as seguintes alterações: "Art. 74. (...) § 3º Além das hipóteses previstas nas leis específicas de cada tributo ou contribuição, não poderão ser objeto de compensação mediante entrega, pelo sujeito passivo, da declaração referida no § 1o: (...) IX - os débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) apurados na forma do art. 2º desta Lei";  tal conduta arbitrária e ilegal além de ter ocorrido no meio do exercício fiscal, desrespeitando flagrantemente diversos princípios do direito tributário para a cobrança imediata de impostos, também está sendo aplicada para os casos anteriores a edição da Lei nº 13.670/18, retroagindo seus efeitos, conduta condenável pelo Direito Tributário; o momento da referida alteração teria se dado no dia 30.05.2018 (em meio ao feriado nacional de corpus christi); a União teria achado uma forma de compensar a queda da arrecadação, prejudicando a Impetrante no seu direito de compensar seus débitos de IRPJ e CSLL, obrigando-a ilegalmente a passar a desembolsar em espécie recurso não previsto para este fim, comprometendo severamente seu planejamento fiscal e econômico; ao limitar a compensação de débitos anteriores a sua vigência a alteração legal teria ferido  o princípio da irretroatividade em matéria tributária. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela concessão da liminar para determinar que seja deferida medida liminar, para determinar que a Receita Federal do Brasil providencie a regular recepção do pedido de compensação constante no Anexo 03 da presente.  Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.

Decisão, SOB Id. 4058300.6207506, na qual se concedeu a medida liminar.  

A União (Fazenda Nacional) noticiou a interposição de Agravo de Instrumento (Id. 4058300.6273380).

A União (Fazenda Nacional) apresentou Contestação. Aduziu, em apertada síntese, que: ao contrário do alegado pela impetrante, o fato de os créditos tributários serem anteriores à produção de efeitos da Lei n. 13.670/2018, de modo algum configura direito adquirido; haveria, no máximo, expectativa de direito compensatório; não se poderia confundir o fato gerador do direito à compensação (existência de um débito e um crédito compensáveis e seu correspondente encontro de contas) com o fato gerador dos tributos compensáveis; as regras de compensação poderiam ser alteradas com aplicabilidade imediata sem que isso configurasse surpresa, como já reconhecido jurisprudencialmente à época da MP 449/2008. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela denegação da segurança (Id. 4058300.6273379).

Ceritficado o decurso de prazo sem que fossem apresentadas as Informações (Id. 4058300.6423367).

Foi mantida a decisão agravada e determinada a remessa dos autos ao MPF (Id. 4058300.6423798).

O Ministério Público Federal não se manifestou sobre o mérito da questão (Id. 4058300.8897579).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

Busca a parte autora provimento jurisdicional antecipatório no sentido de se reconhecer o direito à manutenção do regime de apuração da contribuição previdenciária patronal nos moldes do art. 8° da Lei n° 12.546/11 até o final de 2018, conforme opção efetuada em janeiro/2018 . Pugna, ao final, que seja confirmada a medida liminar concedida para determinar a regular recepção e processamento do pedido de compensação constante no anexo 03 da presente, uma vez qu a Lei 13.670/18, no seu sentir, não possuiria eficácia retroativa.

Pois bem.

No que aqui pertine, a  Lei n.12.546/11 estabelece verbis:

"Art. 8º  Poderão contribuir sobre o valor da receita bruta, excluídas as vendas canceladas e os descontos incondicionais concedidos, em substituição às contribuições previstas nos incisos I e III do caput do art. 22 da Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, as empresas que fabricam os produtos classificados na Tipi, aprovada pelo Decreto no 7.660, de 23 de dezembro de 2011, nos códigos referidos no Anexo I."           (Redação dada pela Lei nº 13.161, de 2015)     (Vigência).

Com advento Lei 13.161/15,  introduziu-se a possibilidade de os contribuintes  optarem, irretratavelmente, pela forma de recolhimento sobre a folha de salários ou sobre a receita bruta, opção que, uma vez feita,  deveria ser observada no restante do ano-calendário, a teor do § 13 do  art. 9º da Lei 12.546/11,  verbis:

"§ 13.  A opção pela tributação substitutiva prevista nos arts. 7o e 8o será manifestada mediante o pagamento da contribuição incidente sobre a receita bruta relativa a janeiro de cada ano, ou à primeira competência subsequente para a qual haja receita bruta apurada, e será irretratável para todo o ano calendário.".                      (Incluído pela Lei nº 13.161, de 2015)     (Vigência)

Esta opção, porém, veio a ser limitada, em grande medida, pelo advento da Lei 13.670/18, que assim preceituou:

Art. 11.  Esta Lei entra em vigor:

I - no primeiro dia do quarto mês subsequente ao de sua publicação, quanto aos arts. 1º e 2º, e ao inciso II do caput  do art. 12; e

II - na data de sua publicação, quanto aos demais dispositivos.

Art. 12.  Ficam revogados:


II - os seguintes dispositivos da Lei nº 12.546, de 14 de dezembro de 2011:            (Vigência)

a) o inciso II do caput  do art. 7º;

b) as alíneas "b" e "c" do inciso II do § 1º, os §§ 3º a 9º e o § 11 do art. 8º; e

c) os Anexos I e II.

Ou seja, a edição da Lei n. 13.670/18  implicou a exclusão da possibilidade  de algumas atividades econômicas, entre elas, as exercidas pela Impetrante,  de recolher a  contribuição patronal  tendo como base de cálculo a receita bruta, devendo fazê-lo sobre a folha de pagamento/salário, a partir de 1º de setembro de 2018.

Em princípio, embora nos termos do §13 do art. 9º da Lei 12.546/11, a opção pela tributação substitutiva manifestada mediante o pagamento da contribuição incidente sobre a receita bruta relativa a janeiro de cada ano fosse irretratável para todo o ano-calendário, houve alteração no regime jurídico tributário.

E, em se tratando de regime tributário, não há qualquer empecilho a que o Legislador o altere, a qualquer tempo, desde que respeitados os parâmetros constitucionalmente estabelecidos, uma vez que não há que se falar em direito  adquirido a qualquer regime tributário.

A opção feita pelo contribuinte acerca da tributação com base na folha de salários ou na receita bruta é irretratável desde que a referida sistemática de tributação permaneça vigente ao longo do ano. Mas a irretratabilidade - dirigida ao contribuinte e ao fisco - não obsta  que o Legislativo a modifique, como fez.

Acresça-se que a Lei 13.670/18, ao excluir a atividade econômica exercida pela impetrante da opção de calcular a contribuição previdenciária sobre a receita bruta, observou o disposto no § 6º do art. 195 da Constituição,  que, em âmbito constitucional, confere observância ao princípio da segurança jurídica em matéria de tributação.

Nesse sentido, confira-se o precedente que se segue:

TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. DÉBITOS RELATIVOS AO RECOLHIMENTO MENSAL POR ESTIMATIVA DO IRPJ E CSLL. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. COMPENSAÇÃO. VEDAÇÃO. ART. 74, PARÁGRAFO 3º, DA LEI Nº 9.430/96, COM REDAÇÃO PELA LEI Nº 13.670/18. LEGALIDADE E CONSTITUCIONALIDADE.

1. Trata-se de apelação interposta por TECIDOS E RETALHOS CAPIBARIBE LTDA contra sentença proferida pelo Juízo da 37ª Vara Federal/PE, que denegou a segurança impetrada, na qual a impetrante objetivava afastar a limitação introduzida ao artigo 74, parágrafo 3º, inciso IX, da Lei nº 9.430/1996 pela Lei nº 13.670/2018, garantindo-lhe o direito de utilizar os créditos referentes ao IRPJ e à CSLL, atinentes ao exercício 2018, recolhidos na modalidade de pagamento por estimativa mensal sobre receita bruta. A apelante alega, em apertada síntese: 1) ilegalidade e inconstitucionalidade da aplicação do inciso IX do parágrafo 3º do art. 74 da Lei nº 9.430/96, com a redação conferida pelo art. 6º da Lei nº 13.670/18; 2) violação ao direito adquirido e aos princípios da confiança, segurança jurídica, anterioridade e retroatividade.

2. A Lei n. 13.670/18 alterou o inciso IX do parágrafo 3º do art. 74 da Lei nº 9.430/96, vedando  a compensação de débitos de IRPJ e CSLL às pessoas jurídicas que optarem pelo pagamento de referidos tributos mês a mês, através de base de cálculo estimada (artigo 2º da Lei n. 9.430/96), nos seguintes termos: "os débitos relativos ao recolhimento mensal por estimativa do Imposto sobre a Renda das Pessoas Jurídicas (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) apurados na forma do art. 2º desta Lei." 

3. Sobre alterações de regras alusivas ao regime de compensação, o STF mantém entendimento de que não há direito adquirido a regime jurídico. (RE 706240, Min. Ricardo Lewandowski, 2ª Turma, DJe 15/08/2014)

4. A compensação, como forma de extinção do crédito tributário prevista no artigo 170 do CTN, deve obedecer à lei vigente no momento do encontro de contas entre os recíprocos débito e crédito da Fazenda e do contribuinte. (REsp 1.164.452/MG, 1ª Seção, Min. Teori Zavascki, julgado em 25/08/2010).

5. Dessa forma, a Lei n. 13.670/18 aplica-se às compensações posteriores à data da sua publicação, ainda que o saldo que se pretenda compensar tenha origem em saldo negativo apurado anteriormente.

6. Não se vislumbra ofensa ao princípio da confiança e da segurança jurídica, porque o crédito apurado pelo contribuinte é passível de compensação pelas demais formas previstas na legislação, bem como de restituição. Além disso, a alteração promovida pela Lei nº 13.670/18, ainda que no curso do exercício fiscal, não impôs restrição à opção pelo pagamento de IRPJ e CSLL com base em estimativas mensais, o que, acaso ocorrido, poder-se-ia questionar violação de tais institutos.

6. Também não há ofensa ao princípio da anterioridade, porque não se trata de instituição ou aumento de tributo, tampouco isenção tributária, mas, sim, de modificação da forma de extinção do crédito tributário por meio de compensação, não havendo porque se falar em ilegalidade ou inconstitucionalidade da alteração legislativa, quanto ao disposto no art. 150 da CF/88.

7. Destarte, ausente o direito líquido e certo vindicado, a solução jurídica deve convergir, de fato, para a denegação da segurança.

8. Apelação improvida.


(PROCESSO: 08079374520184058302, DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADO, 1º Turma, JULGAMENTO: 05/02/2019, PUBLICAÇÃO: )


EMENTA: AGRAVO DE INSTRUMENTO. MANDADO DE SEGURANÇA. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA SOBRE A RECEITA BRUTA. ALTERAÇÃO LEGISLATIVA. LEI Nº 13.670. ANTERIORIDADE NONAGESIMAL. OBSERVÂNCIA. SURPRESA AO CONTRIBUINTE. NÃO VERIFICAÇÃO. 1. Respeitada a anterioridade nonagesimal não há falar em maltrato ao princípio da não-surpresa ao contribuinte, pois a anterioridade visa justamente à noticiar o contribuinte, com antecedência razoável, da alteração legislativa decidida pelo entre tributante. 2. Não se vislumbra qualquer malferimento aos princípio da segurança jurídica até porque a irretratabilidade foi cometida apenas ao contribuinte como forma de regular o controle fiscal. 3. Agravo de instrumento improvido. (TRF4, AG 5028085-29.2018.4.04.0000, SEGUNDA TURMA, Relator SEBASTIÃO OGÊ MUNIZ, juntado aos autos em 12/09/2018)

Diante de todo o exposto, reformulo a respeitável decisão sob identificador 4058300.6207506 para denegar a segurança requestada.

3. Dispositivo

POSTO ISSO, com base na fundamentação legal supra, julgo improcedentes os pedidos desta ação mandamental, revogo a r. decisão pela qual se concedeu a medida  liminar e denego a segurança requestada.

Sem honorários, ex vi art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009.

Finalmente, com urgência, oficie-se ao Exmo. Sr. Desembargador Federal, relator do Agravo de Instrumento noticiado nos autos, remetendo copia desta Sentença, bem como para a DD Autoridade apontada como coatora.

Registre-se. Intimem-se.

Recife, 28.06.2019
Francisco Alves dos Santos Júnior
  Juiz Federal, 2ª Vara Federal/PE(lsc)

Nenhum comentário:

Postar um comentário