Por Francisco Alves dos Santos Júnior
A Alfândega do Estado de Pernambuco(Brasil) flagrou uma operação estranha: a Empresa brasileira importa alho da CHINA por preço muito superior ao que ela obtém revendendo esse produto no mercado brasileiro. E os valores envolvidos na operação de aquisição são em montante bem superior ao valor do capital social dessa Empresa. Então, as mercadorias foram apreendidas para averiguação. A Empresa impetrou este mandado de segurança, buscando a liberação das mercadorias, via medida liminar, que foi negada. Após o julgamento, publicaremos, como Capítulo II, a sentença.
Boa leitura.
PROCESSO
Nº: 0801718-45.2020.4.05.8302 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: M C A DE F E A E
ADVOGADO: F P N De C M e outro
IMPETRADO: UNIAO FEDERAL/FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
D E C I S Ã O
1. Breve Relatório
M C A DE F E A E, qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança com pedido
de Medida Liminar em face do INSPETOR-CHEFE DA ALFÂNDEGA DO PORTO DE SUAPE.
Aduziu, em apertada síntese, que: no desempenho de seus objetivos contratuais -
Comercialização e Importação de Frutas e Alho - visando garantir o
desenvolvimento de suas atividades normais, teria realizado operação de
importação de alho fresco, oriundo da Republica Popular da China; realizaria,
com frequência, a importação de alho fresco, recolhendo todos os impostos e
encargos, daí decorrentes, agindo sempre dentro da legalidade; fora
surpreendida com a interrupção dos despachos aduaneiros, constantes das
Declarações de Importação nº 2012215857, 2012786307, 2013114116 e
2013338502, retendo 133.855,00 quilogramas de alho fresco, sob a inusitada
suspeita de que as entradas relativas a essas importações totalizarariam
valores maiores do que suas vendas ao mercado interno, sugerindo que a
renda bruta (vendas menos importações) não seria capaz de sustentar sua
atividade econômica, conforme termo de inicio de ação fiscal n° 027/2020, ora
anexa; segundo a Autoridade Fiscal, sua suspeita se justificaria pelo simples
fato de o valor total de venda ser inferior ao custo da aquisição da
mercadoria, o que não possuiria, em seu entender, sentido lógico para uma
atividade comercial perene, que deveria manter margem de lucro para o setor da
atividade econômica; nem sempre a atividade de importação seria lucrativa, pois
dependeria, quase que totalmente, do câmbio, em dólar; no caso dos autos, a
Autoridade sequer teria justificado efetivamente o motivo das suspeitas,
declarando exclusivamente que o impetrante estaria amargando prejuízos;
além de a acusação ser realizada de forma inopinada, sem qualquer
documento probatório que respaldasse a referida conclusão, mas tão-somente a
rasa menção a prejuizos na venda do alho, demonstrando, assim, que não haveria
qualquer Segurança Jurídica na fiscalização; a Impetrante teria apresentado
toda a documentação referente a importação, recolhido todas as taxas e impostos
e, mesmo assim, as mercadorias, que seriam perecíveis, ainda seguiriam retidas
no Porto de Suape, conforme descrição ali constante; a Impetrante estaria com
toneladas de mercadorias perecíveis paradas nos navios, aguardando a
apuração dos Fiscais; seria desnecessária a retenção das mercadorias para tal
apuração; o Impetrante já estaria pagando mais de R$ 24.000,00 (vinte e quatro
mil reais) a título de deposito, somado a "Demuge", taxa paga por
conteiner, no importe de R$ 200,00 por dia; não seria razoável, tampouco LEGAL,
que a Impetrante fosse coagida a concordar com a determinação da fiscalização
de reter 133.855,00 quilogramas de alho fresco, com conteiners que já
estão parados no Porto de Suape há 43 (quarenta e três) dias, enquanto aguarda,
indefinidamente, que os fiscais realizem o procedimento fiscal, que poderia
durar meses e, d'outra banda, as mercadorias retidas seriam perecíveis por se
tratar de alho fresco; não seria justo que a Impetrante fosse penalizada
podendo perder sua mercadoria; os produtos retidos seriam essenciais para a
manutenção da atividade da impetrante que já amargaria os efeitos da apreensão
em sua saúde financeira, já abalada pela crise ocasionada pela Pandemia; o
Superior Tribunal de Justiça e o Supremo Tribunal Federal já teriam
pacificado entendimento de que as suspeitas não seriam causa de retenção
de mercadorias, uma vez que a Receita Federal teria os meios legais para
cobrança que entendesse como devida, por meio de AUTO DE INFRAÇÃO; as suspeitas
da Autoridade Fazendária não seriam causa de pena de perdimento de mercadorias,
mas apenas aplicação de multa e cobrança da diferença tributária, pelo que a
retenção da carga para coação ao pagamento de multas e tributos se mostraria
totalmente inconstitucional; em que pese o entendimento dos Tribunais
Superiores, entendimento, inclusive sumulado, proibindo tal conduta do Fisco,
teria necessitado impetrar o presente Mandado de Segurança para ver declarado o
direito líquido e certo à consecução regular de sua atividade empresarial,
através do desembaraço de seus produtos importados, sem que fosse coagida a
concordar, sem o devido processo legal, que tivesse praticado infrações
dissociadas da realidade material dos fatos; por se tratar de produto
perecível, assim como, pela sempre longa duração do processo administrativo,
para apuração do susposto ilícito, não seria razoável que as importações da
Impetrante fossem paralisadas até a conclusão do procedimento, que deveria,
indispensavelmente, propiciar ao importador o direito ao contraditório e à
ampla defesa, através de um regular processo administrativo, aliado ao fato de
que as mercadorias já se encontrariam retidas há mais de 40 (quarenta) dias,
acarretando, ainda, pesadas despesas de armazenagem. Teceu outros comentários.
Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, fosse concedida a medida liminar
para:
"a) determinar à Autoridade Coatora que pratique, imediatamente,
todos os atos necessários ao desembaraço aduaneiro das mercadorias
consubstanciadas nas Declarações de Importação nº 2012215857, 2012786307,
2013114116 e 2013338502, devendo, caso entenda necessário, prosseguir com a
lavratura de auto de infração como forma de oportunizar à Impetrante o
contraditório e ampla defesa acerca das alegações de prática de subfaturamento,
caso esse seja o único óbice;
b) Ao final, seja confirmada a medida liminar, por sentença, para
declarar o direito da Impetrante em desembaraçar as mercadorias
consubstanciadas na Declaração de Importação nº
2012215857, 2012786307, 2013114116 e 2013338502, independentemente de
qualquer suspeita que não esteja sendo discutida através do devido processo legal,
caso seja o único óbice."
Decisão sob Id. 4058302.16009652, proferida pelo
MM. Juiz TIAGO ANTUNES DE AGUIAR, sob o argumento de que seria caso de
incompetência funcional do Juízo Federal da Subseção Judiciária de Caruaru-PE,
logo caso de incompetência absoluta.
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação
2.1. Considerações Preliminares
2.1.1 - Da Autuação da DD Autoridade
De início, proceda a Secretaria à inclusão do Ilmo.
Sr. INSPETOR-CHEFE DA ALFÂNDEGA DO PORTO DE SUAPE na condição de autoridade
coatora, uma vez que assim foi indicado na petição inicial. Deve a
Secretaria, ainda, fazer as anotações pertinentes no sistema, eis que inexiste
a prevenção acusada pelo Pje.
2.1.2 - Da competência do Juízo
Data maxima venia do d. Magistrado Federal TIAGO ANTUNES DE AGUIAR,
Juiz de uma das Varas de Caruaru-PE, onde se encontra sediada a
Impetrante, uma Turma do STF e precedente do STJ, mudando antigo
entendimento jurisprudencial, passaram a admitir que o mandado de segurança
pode ser impetrado no local de residência/sede do(a) Impetrante, ainda
que as Autoridades apontadas como coatoras estejam sediadas em outras ou em
outra localidade, como no presente caso.
O Pleno do TRF-5ªRegião remou um certo tempo contra
esse entendimento, no entanto, em r. julgado mais recente, em caso
específico envolvendo benefício previdenciário, alinhou sua jurisprudência
ao que têm decidido as mencionadas Cortes de cúpula do Judiciário Brasileiro, verbis:
"PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE
COMPETÊNCIA. MANDADO DE SEGURANÇA. IMPETRAÇÃO DESTINADA À OBTENÇÃO DE
BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO E AO PAGAMENTO DE ATRASADOS. AJUIZAMENTO NO DOMICÍLIO
DO SEGURADO-IMPETRANTE, DIVERSO DA SEDE DA AUTORIDADE APONTADA COMO COATORA.
POSSIBILIDADE. INTERPRETAÇÃO PACIFICADA PELO STF E PELO STJ. ACESSO À
JUSTIÇA E AO SERVIÇO PREVIDENCIÁRIO. TECNOLOGIA DA INFORMAÇÃO.
1. No caso, trata-se de definir a quem compete
processar e julgar o mandado de segurança impetrado contra ato imputado a
servidor do INSS, que foi ajuizado pelo impetrante no foro do seu domicílio,
tendo o Juízo a quem os autos foram distribuídos (21ª/PE - suscitado) afirmado
a sua incompetência absoluta e determinado a remessa à Vara com jurisdição
abrangente do Município em que sediada a autoridade apontada como coatora
(14ª/PB - suscitante).
2. Não é nova a jurisprudência do STF, no sentido
de que as causas intentadas contra a União poderão ser aforadas na Seção
Judiciária em que for domiciliado o autor, naquela onde houver ocorrido o
ato/fato que originou a demanda, onde esteja situada a coisa litigiosa ou,
ainda, no Distrito Federal, aplicando-se aos mandados de segurança impetrados
contra autoridade pública federal a regra do art. 109, parágrafo 2º, da CF/88,
admitindo-se, assim, a impetração no foro de domicílio do impetrante (cf. RE nº
509.442 AgR/PE, Relatora: Ministra ELLEN GRACIE, julgado em 03.08.2010).
3. Em julgamento sob a sistemática da repercussão
geral, o STF definiu tese jurídica de que "a regra prevista no parágrafo
2º do art. 109 da Constituição Federal também se aplica às ações movidas em
face das autarquias federais" (Tema nº 374).
4. Nessa linha, vem entendendo o STJ pela
possibilidade de ajuizamento do mandado de segurança no domicílio do
impetrante, ainda que não corresponda à sede da autoridade apontada como
coatora.
5. No entanto, o Pleno do TRF5 consolidou a sua
jurisprudência em sentido diferente, ou seja, de que, "em se tratando de
mandado de segurança, a competência para processamento e julgamento é absoluta,
estabelecida de acordo com a sede funcional da autoridade coatora". Este Tribunal considera que
"o Juízo que está na sede da autoridade impetrada tem muito mais
facilidade na obtenção de acesso à documentação pertinente ao processo, bem
como de obter o cumprimento de medidas liminares. Essa é a tese comprometida
com a funcionalidade e que, portanto, deve prevalecer" (CC nº
0811813-48.2019.4.05.0000, Relator: Desembargador Federal PAULO ROBERTO DE
OLIVEIRA LIMA, julgado em 03/10/2019). Em igual pegada: "Em que pese a 1ª
Seção do STJ ter passado a entender que 'o mandado de segurança pode ser
impetrado no foro do domicílio do autor, ainda que a sede funcional da
autoridade coatora seja diversa da do impetrante, devendo prevalecer a opção
prevista na Constituição no art. 109, parágrafo 2º à infraconstitucional'
(AINTCC-2016/0324596-5, rel. Min. Francisco Falcão, 1ª Seção, DJe 22.06.2017),
o Plenário deste TRF da 5ª Região optou conscientemente por manter a
jurisprudência tradicional, isto é, que em se tratando de mandado de segurança
a competência, de caráter absoluto, define-se pela sede funcional da autoridade
coatora. [...] Firmada a jurisprudência após intensos debates, o Pleno desta
Corte deve mantê-la estável, íntegra e coerente, nos moldes do art. 926 do
CPC/2015, independentemente da posição pessoal de seus integrantes" (CC nº
0807491-82.2019.4.05.0000, Relator: Desembargador Federal RUBENS CANUTO,
julgado em 01/07/2019). Exatamente nessa direção, veja-se o recente precedente
do Plenário: CC nº 0815302-93.2019.4. 05.0000, Relator: Desembargador Federal
MANOEL ERHARDT, julgado em 27/01/ 2020, unânime.
6. O entendimento do Plenário conduziria ao
reconhecimento da competência da 14ª Vara/PB. No entanto, a particularidade do
caso concreto impõe o amadurecimento da posição do TRF5 sobre a matéria.
7. Segundo consta dos autos originários, o
impetrante jamais se dirigiu à Agência do INSS localizada em Teixeira/PB; o seu
requerimento administrativo foi protocolado na Agência do INSS, localizada na
Avenida Mário Melo, no bairro de Santo Amaro, em Recife/PE. Mesmo as
informações complementares que foram exigidas do segurado pelo INSS foram
prestadas junto à unidade da autarquia previdenciária em Recife/PE, porque o
INSS autoriza que o comparecimento para atendimento se dê na Agência mais próxima
do domicílio do requerente. Mais ainda, de acordo com os documentos acostados,
todos os vínculos laborais do impetrante se deram no Estado de Pernambuco, a
maior parte deles na cidade do Recife/PE (e as correspondentes rescisões,
idem). Sequer o impetrante é paraibano. A questão é que, uma vez protocolado o
requerimento administrativo, ele passa a uma fila nacional, podendo ser
vinculado, independentemente da localização, a uma Agência do INSS diversa
daquela que recebeu o requerimento administrativo. Em decorrência dessa
sistemática, no caso concreto, o pleito administrativo do impetrante foi
decidido por servidor da Gerência Executiva do INSS em Teixeira/PB.
8. Nessas circunstâncias, não é razoável se exigir
do segurado que se desloque para a Paraíba, para fins de ajuizamento do mandado
de segurança, sequer servindo, na hipótese, a justificativa da facilidade de
acesso às informações necessárias ao julgamento da demanda. Se, em tempos de
tecnologia avançada, havia certa dificuldade de manter essa motivação da
proximidade à fonte dos dados informativos, para vincular a propositura do
mandado de segurança na sede da autoridade coatora, essa razão perde ainda
maior robustez diante da nova sistemática de atendimento e julgamento dos pedidos
administrativos de benefício previdenciário.
9. O mandado de segurança é remédio constitucional
destinado a confrontar ato ilegal ou abusivo da autoridade administrativa, de
modo que a interpretação das regras de impetração do mandamus não deve privilegiar
aquela pessoa sobre a qual pesam as imputações de ilegalidade ou abusividade.
Em outros termos, não se coaduna com o Texto Constitucional de 1988 a exegese
que dificulta ao cidadão o acesso ao Poder Judiciário, na defesa de direito
alegadamente líquido e certo, supostamente violado pela Administração Pública,
dificultando, inclusive, nessa ordem de ideias, o acesso ao próprio serviço
previdenciário essencial.
10. Conflito conhecido, para declarar competente o
Juízo Federal suscitado (21ª Vara/ PE), de domicílio do segurado. (PROCESSO: 08005516720204050000,
CC - Conflito de Competencia - , DESEMBARGADOR FEDERAL ÉLIO WANDERLEY DE
SIQUEIRA FILHO, Pleno, JULGAMENTO: 13/03/2020, PUBLICAÇÃO:) G.N.”[1]
Pois
bem, embora o caso dos autos não envolva, como no acórdão paradigma do Pleno do
E. TRF-5ª Região, benefício previdenciário, impõe-se reconhecer, todavia,
que mencionada Corte modificou a sua jurisprudência, de forma que estão
superados os entendimentos das Turmas desse Tribunal, cujos julgados foram
invocados por referido d. Magistrado Federal.
Também,
ainda data maxima venia do referido d. Magistrado Federal de
Caruruaru-PE, não é caso de competência absoluta, é tanto que a Parte
Impetrante pode escolher o foro que lhe for mais confortável e,
certamente, menos oneroso.
Todavia,
para que este processo não fique "passeando" entre Caruaru-PE e esta
bela Capital do Estado de Pernambuco, e ainda considerando que se trata de
competência relativa e a que a Parte Impetrante não recorreu da noticiada
r. decisão do d. Juiz Federal de Caruaru-PE, tenho por bem firmar a competência
deste Juízo Federal, ou seja, desta 2a Vara Federal de Pernambuco.
2.2 Do Mérito e da Medida Liminar
A concessão de medida liminar em Mandado de
Segurança pressupõe a presença de um conjunto probatório que demonstre a
plausibilidade das alegações do impetrante, em grau compatível com a medida
requerida, aliado a um fundado e justo receio de dano irreparável ou de difícil
reparação ao objeto da demanda decorrente do tempo para o regular transcurso do
processo.
No caso vertente, a medida liminar requerida
consubstancia-se na determinação de que a Autoridade Coatora que pratique,
imediatamente, todos os atos necessários ao desembaraço aduaneiro das
mercadorias consubstanciadas nas Declarações de Importação nº 2012215857,
2012786307, 2013114116 e 2013338502, devendo, caso entenda necessário,
prosseguir com a lavratura de auto de infração como forma de oportunizar à Impetrante
o contraditório e ampla defesa acerca das alegações de prática de
"subfaturamento"[2], caso esse seja o único óbice.
Pois bem.
É verdade que a Súmula 323 do Supremo Tribunal
Federal impede a apreensão de mercadorias como meio coercitivo para pagamento
de tributos. A apreensão somente seria devida, portanto, a título de
medida preparatória a resguardar eventual aplicação da pena de perdimento de
bens, nas hipóteses cabíveis.
No caso em análise, a Impetrante defende, no corpo
da Inicial, de forma categórica, que a Autoridade coatora não teria,
sequer, justificado efetivamente o motivo das suspeitas, declarando
exclusivamente que o impetrante estaria amargando prejuízos.
Entretanto, da leitura do TERMO DE INÍCIO DE
AÇÃO FISCAL nº 027/2020 (Id. 4058302.16007057), vê-se que a autoridade
alfandegária assim pontuou:
"Ainda que as atividades econômicas decorrentes do comércio
exterior revelem saldo deficitário durante o período analisado, poderia se
cogitar que a empresa tivesse recursos próprios oriundos da atividade de
comércio atacadista (CNAE 4633-8-01) com aquisição de mercadorias no mercado
interno para continuar financiando as importações que se seguiram. Entretanto,
não há registros de vendas de mercadorias que não sejam as importadas. Além
disso seu capital social, alterado de 250 mil reais para 500 mil reais em maio
de 2020, se totalmente integralizado, é bem inferior ao recurso necessário para
o financiamento de mais de 2 milhões reais de importações concretizadas nos
meses subsequentes, sem levar em consideração aquelas que se encontram em
despacho e pré-despacho.
Diante desse cenário, vislumbra-se, em tese, que os recursos para o
custeio das suas importações podem não ter amparo no resultado da atividade
comercial declarada.
Convém ponderar ainda que a empresa importou nos últimos três meses 218
toneladas de produtos. As datas das notas de saída permitem inferir que as
mercadorias deveriam passar por algum estabelecimento para fins de estoque e
segregação previamente à distribuição aos clientes em diversas datas.
Entretanto, de acordo com a Guia de Recolhimento do FGTS e de Informações à
Previdência Social (GFIP) declarada, não constam empregados na folha de pessoal
da matriz e filial. Também não constam registros de aquisição de bens
patrimoniais, móveis e equipamentos para a atividade logística, o que sugere
haver uma incompatibilidade entre o volume de mercadorias e sua capacidade
operacional. Diante dos fatos constatados, e para a apuração da regularidade da
importação e a instrução do procedimento fiscal, INTIMO o contribuinte para
atender, no prazo de 30 (trinta) dias, contado da ciência deste termo, as
seguintes exigências:
1)APRESENTAR contrato social da empresa e de todas as suas alterações,
devidamente registrados na Junta Comercial;
2)COMPROVAR, mediante a apresentação de documentação idônea, a origem, a
disponibilidade e a transferência dos recursos necessários à integralização do
capital social;
3)APRESENTAR os seguintes documentos, para comprovação do efetivo
funcionamento da empresa:
3.1 Faturas de contas de energia elétrica e água dos últimos seis meses;
3.2 Contrato(s) de locação de imóvel(is) e de pagamentos do aluguel dos
últimos seis meses;
3.3 Relacionar os nomes dos funcionários, cargo e CPF;
3.4 Fotografia da fachada do estabelecimento do importador;
3.5 Fotografia do interior do estabelecimento do importador;
4)APRESENTAR extratos de movimentação de todas as contas correntes
bancárias e aplicações financeiras da empresa importadora no período de 11/2019
a 09/2020;
5)APRESENTAR extratos de movimentação de todas as contas correntes
bancárias e aplicações financeiras do único sócio/dirigente José Aguinaldo
Cabral. CPF: 843.907.514-68 no período de 09/2019 a 09/2020;
6)APRESENTAR as faturas comerciais e proforma, os contratos de câmbio e
seus respectivos comprovantes de liquidação relativos às DIs e ao Conhecimento
de Carga Eletrônico listados na Tabela 01 (DIs atuais) e Tabela 02 (DIs já
desembaraçadas).
7)INFORMAR se as operações cambiais (Tabelas 01 e 02), ou parte delas,
foram financiadas com recursos de terceiros.
Em caso positivo, APRESENTAR as provas desse financiamento, por meio de
instrumento de contrato de financiamento ou de empréstimo, o qual deverá
conter:
7.1 Identificação dos participantes da operação: devedor,
fornecedor, financiador, garantidor e assemelhados;
7.2 Descrição das condições de financiamento: prazo de pagamento do
principal, juros e encargos, margem adicional, valor de garantia, respectivos
valores-base para cálculo, e parcelas não financiadas; e 7.3 Forma de prestação
e identificação dos bens oferecidos em garantia;
8)INFORMAR se os pagamentos de tributos/multas/despesas referentes às
DIs listadas na Tabela 01 e 02 foram realizados mediante débito em conta
corrente de titularidade do contribuinte.
Caso tais pagamentos, ou parte deles, não tenham sido suportados por
conta corrente do contribuinte, INFORMAR:
8.1 Os dados da(s) conta(s) corrente(s) originária(s) dos recursos
empregados nesses pagamentos (banco, agência, número da conta corrente);
8.2 O titular dessa(s) conta(s) (CPF/CNPJ e nome); e
8.3 A relação do titular dos recursos com o contribuinte,
acompanhada de documentação que a comprove;
9)INFORMAR os possíveis clientes (compradores) (CPF/CNPJ e nome) para as
mercadorias objeto das DIs e CE da Tabela 01; APRESENTAR informações detalhadas
a respeito da relação comercial, o(s) contrato(s) eventualmente firmado(s), os
pedidos feitos e correspondências, e-mails e quaisquer outros documentos que
registraram as negociações; 10)APRESENTAR os Relatórios de Operações de Câmbio
e Transferências Internacionais em nome do CNPJ da fiscalizada e do CPF
sócio/dirigente José Aguinaldo Cabral, no ano de 2020, os quais podem ser
extraídos gratuitamente no Sistema Registrato do Banco Central do
Brasil.".
Então, a DD Autoridade apontada como coatora não só
justificou, como demonstrou que há algo de estranho nas atividades importadoras
da Impetrante, a ser apurado na via administrativa, pois com tão pequeno capital
social, não se sabe como consegue tanto dinheiro para importar alho tão caro da
CHINA para revendê-lo por preço bem abaixo aqui no BRASIL.
Certamente, nas suas investigações, os
Técnicos da Repartição à qual a DD. Autoridade apontada como coatora encontra-se
vinculada, aplicarão as regras que envolve o complexo problema dos "preços
de transferência", para entender essa engenharia econômico-financeira e
tomar, no final, as providências pertinentes.
Oxalá, tudo se apure de forma favorável
à ora Impetrante.
Mas o certo é que não se trata de um mero problema
tributário, como quis fazer crer a Impetrante na sua longa petição inicial, e o
alegado direito da ora Impetrante, neste momento processual, não é
liquido, muito menos certo.
Assim, prima facie, não vislumbro, de
plano, ilegalidade, nem abuso de poder na atuação da DD Autoridade
apontada como coatora, situação essa que afasta a existência do fumus boni
iuris e impossibilita a concessão da pretendia medida liminar.
3. Dispositivo
Posto isso:
3.1 - Preliminarmente, determino que a Secretaria
tome as providências indicadas no subitem 2.1.supra e firmo a competência
deste Juízo para esta causa;
3.,2 - Indefiro o pleito de concessão de medida
liminar;
3.3 - Notifique-se a DD. Autoridade apontada como
coatora para apresentação de informações (art. 7º,I, da Lei nº 12.016, de 2009)
e dê-se ciência desde writ ao órgão de representação judicial da UNIÃO
(Fazenda Nacional), no caso, a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional em
Recife-PE, para os fins do inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009.
3.4 - Decorrido o prazo para as Informações, com ou
sem elas, remetam-se os autos para o MPF, para o r. parecer legal, bem como
para outras providências legais que entender por pertinentes.
Intimem-se. Cumpra-se, COM URGÊNCIA.
Recife, 24.09.2020.
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara/PE
(lsc)
________________________________________________________
[1] BRASIL. TRUBINAL REGIONAL FEDERAL - 5ª
REGIÃO.
Disponível em: https://www4.trf5.jus.br/Jurisprudencia/JurisServlet?op=exibir&tipo=1
Acesso em: 03/08/2020.
[3] Pelo que entendi da petição inicial, parece-me
caso de superfaturamento(aquisição por preço superior ao preço de venda no
Importador) e não de subfaturamento, como alegado pela Impetrante. Prima
facie, parece que a questão envolve o problema de preço de
transferência("transfering price"), tratado na Lei nº 9.430,
de 1996, art. 18 e seguintes. .