sexta-feira, 1 de setembro de 2017

REGISTRO DE ARMA DE FOGO. RENOVAÇÃO. MEMBRO DO MINISTÉRIO PÚBLICO. DISPENSA DE EXAME PSICOLÓGICO.





Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Renovação do registro de arma de fogo, pertencente a Membros do Ministério Público, que estejam na ativa ou aposentados, necessita  da submissão destes a exame psicológicos destes?
A decisão que segue discute esta matéria. 
Boa leitura. 

Obs.: decisão pesquisada e minuta pela Assessora Luciana Simões Correa de Albuquerque.



PROCESSO Nº: 0811335-40.2017.4.05.8300 - PROCEDIMENTO 
COMUM
AUTOR: P F DE A
ADVOGADO: E S R V e outros
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

D E C I S Ã O

Ementa: - O próprio Estatuto do Desarmamento, no caput de seu art. 6º, determina "ser proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria".

  1. Breve Relatório

P F DE A, qualificado na Inicial, ajuizou esta Ação de Procedimento Comum com pedido de tutela de urgência em desfavor da UNIÃO. Aduziu, em síntese, que: contaria atualmente com 76 (setenta e seis) anos e seria Promotor de Justiça do Estado de Pernambuco aposentado; diante do contido no previsto no artigo 42 da Lei Federal nº 8.625/93, deteria o direito ao porte de arma, independentemente de licença ou autorização; a validade do registro da arma de fogo do demandante teria expirado no último dia 08/01/2017, ocasião em que deu início aos procedimentos para renovação do registro de sua arma de fogo; o demandante teria sido surpreendido com a informação de que, sem justificativa legal plausível e por mera interpretação interna do órgão, o Departamento do Polícia Federal estaria exigindo do interessado, para a renovação do registro da arma de fogo dos membros do Ministério Público e da Magistratura (apenas), a realização do exame de aptidão psicológica; o art. 42 da Lei 8.625 de 1993, Lei Orgânica Nacional do Ministério Público, seria claro ao estabelecer que os membros da instituição, promotores e procuradores, possuem porte de arma válido em todo o território nacional, independentemente de quaisquer atos formais de licença ou autorização; em 2003, fora editada a Lei 10.826/2003 (Estatuto do Desarmamento), impondo os requisitos da capacidade técnica e realização de exame psicológico para portar arma de fogo, mas que tais exigências não se aplicariam aos membros do Ministério Público, que possuiriam uma regulamentação própria; o exercício das funções do Ministério Público seria atividade de risco, sendo essencial à garantia do porte de arma funcional; seria inconstitucional a alteração de lei complementar (Estatuto do MP) por lei ordinária (Estatuto do Desarmamento); o registro seria condição sine qua non para o porte e, se este deve observar as disposições das Leis Orgânicas do Ministério Público, não poderiam ser exigidos requisitos adicionais para o registro. Teceu outros comentários e requereu, liminarmente, que não fosse exigido exame de aptidão psicológica para renovação do registro de suas armas de fogo, com a confirmação na sentença de mérito. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.

Exarada decisão determinando a intimação da parte contrária acerca do pedido antecipatório (Id. 4058300.3702483).

A União (Fazenda Nacional) apresentou Contestação (Id. 4058300.3749086). Defendeu, em apertada síntese, que: a finalidade precípua do Estatuto do Desarmamento, norma específica sobre o tema, teria sido a diminuição de oferta de armas de fogo em circulação no país, trazendo disposições rígidas para a obtenção da autorização estatal para a compra e, mais excepcionalmente ainda para o porte de arma de fogo; em linhas gerais, apenas aos entes que lidariam com a segurança pública, privada ou nacional, a lei original teria reservado a faculdade de possuir e portar arma; após a devida comprovação por parte de seus membros, de possuírem habilidade técnica e psicológica para portá-la (ordinariamente através da aprovação em cursos de formação profissional, como seria o caso dos integrantes dos órgãos policiais, das Forças Armadas e de empresa de segurança privada); especificamente  sobre o registro de arma de fogo, disporia o art. 4º da Lei nº10.826/03 "Art. 3o É obrigatório o registro de arma de fogo no órgão competente. Parágrafo único. As armas de fogo de uso restrito serão registradas no Comando do Exército, na forma do regulamento desta Lei. Art. 4o Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos: I - comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos; (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008) II - apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa; III - comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei.(...) § 8o Estará dispensado das exigências constantes do inciso III do caput deste artigo, na forma do regulamento, o interessado em adquirir arma de fogo de uso permitido que comprove estar autorizado a portar arma com as mesmas características daquela a ser adquirida. (Incluído pela Lei nº 11.706, de 2008); ao se regulamentar o referido dispositivo, teria sido editado o Decreto nº 5.123/04, o qual teria previsto, expressamente, em seu artigo 12:  Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá: (...) VII - comprovar aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestada em laudo conclusivo fornecido por psicólogo do quadro da Polícia Federal ou por esta credenciado; a comprovação para a capacidade técnica e de aptidão psicológica para o registro de arma de fogo possuiria fundamento legal  e específico, pelo que escorreita seria a atuação dos agentes da Polícia Federal quando exige de todos os cidadãos, inclusive membros do Ministério Público;  que a questão sobre uma aparente colisão entre as disposições do Estatuto do Desarmamento e a Lei Orgânica do Ministério Público (art. 42) não seria nova, tendo o Superior Tribunal de Justiça, reiteradamente, validado a postura do Departamento da Polícia Federal ao exigir a comprovação de aptidão técnica e psicológica para membros do Parquet; o Superior Tribunal de Justiça, em anterior julgado, de forma detalhada, teria confirmado a legitimidade e legalidade da exigência dos requisitos para obtenção o registro de armas de fogo por parte de membros do Ministério Público, bem como fez a exata distinção entre o registro de arma e porte de arma (sublimado na petição inicial); a ementa desse paradigmático julgado do STJ, o qual, apesar de se referir à comprovação de capacidade técnica, seria aplicável mutatis mutandis, ao caso dos autos; por mais que se esforce o autor em tentar estender a previsão do art. 42 da Lei Orgânica do Ministério Público (restrita a porte de arma) de sorte a contemplar o registro, não haveria como sustentar o seu raciocínio de "quem pode o mais, pode o menos"; o porte e o registro de arma de fogo seriam categorias distintas, merecendo tratamento distintos, tal como explicitado no julgado do Superior Tribunal de Justiça, transcritos na Contestação,caberia ao legislador, quando da edição da lei nº 8.625/93, dispensar os membros do Ministério Público das exigências referentes ao registro de arma;  se não o fez seria porque teria entendido que tal matéria poderia ser disciplinada em outra norma legal; ao silenciar sobre o registro de arma, o legislador teria colocado os membros do Ministério Público em igualdade com os demais cidadãos em relação à devida observância das exigências do Poder Público; os exames de aptidão psicológica para o registro de armas em nada poderiam interferir em suas prerrogativas funcionais, tampouco atentariam contra suas garantias institucionais;  o exame de capacidade psicológica para o registro de arma de fogo se trataria de um critério objetivo para a aferir se o cidadão (independentemente de sexo, raça, idade, profissão etc.) apresentaria condições de ser possuidor de uma arma de fogo, sem oferecer risco para si mesmo e para a sociedade; a demonstração de capacidade psicológica seria uma exigência objetiva, cuja razão se de ser repousaria na necessidade de garantir segurança à sociedade de que aqueles que vão manusear uma arma estão aptos a tanto; tal exigência seria dotada de razoabilidade e proporcionalidade, por óbvio, em nada viria a macular as prerrogativas dos membros do Parquet; ao contrário disso, a obtenção da aprovação no exame psicológico para o registro de arma conferiria respeitabilidade aos membros do Ministério Público, porquanto restaria demonstrada a questão de que todos seriam iguais perante a Lei (art. 5º, II, da CF/88);  o exame psicotécnico ao qual seriam submetidos, uma única vez, os candidatos ao cargo de promotor de justiça, em nada se assemelharia ao exame de capacidade psicológica previsto no Estatuto do Desarmamento; o art. 60 da Resolução CNJ 75/2009, que tratou dos concursos de ingresso nas carreiras do Ministério Público teria mencionado que, na hipótese de aprovação no psicotécnico, e ainda que eventualmente se atendam aos requisitos estabelecidos no ato normativo de regência da Polícia Federal para o registro e renovação de registro de arma de fogo, a bateria de instrumentos de avaliação psicológica utilizados na aferição das características de personalidade e habilidades específicas para manuseio de arma de fogo deveria ser periodicamente  aplicada para o registro e renovação de registro de arma de fogo, em período não superior a 05 (cinco) anos, conforme disciplina o parágrafo 2º do Artigo 16 do Decreto 5.123/04; até mesmo a questão alusiva à dispensa prevista no art. 4º, § 8º, do Estatuto do Desarmamento, suscitada na inicial, teria sido enfrentada  no Recurso Especial - 1.327,796; sobre o tema em exame, o Supremo Tribunal Federal já teria tido a oportunidade de se pronunciar na Ação Originária nº 1.429/DF2, quando analisou pleito similar formulado por uma associação de magistrados; a Ministra Ellen Gracie teria mencionado a necessidade e justificativa, notadamente quanto à questão da segurança, das condicionantes impostos pela Polícia Federal no que toca ao registro de armas de fogo.  Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes, notadamente os REsp 1.606.433 e 1.327.796, bem como a Ação Originária nº 1.429/DF2. Pugnou, ao final, fosse a ação julgada  totalmente improcedente, pelos fundamentos acima ponderados condenando a parte autora nos ônus sucumbênciais.

A parte autora pugnou pela apreciação do pleito antecipatório e juntou cópia de decisão favorável à sua tese (Id. 4058300.3850483).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.
2. Fundamentação


2.1 - Nos termos do art. 300 do Código de Processo Civil, a concessão da tutela de urgência exige a presença dos elementos: a) que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano; b) ou o risco ao resultado útil do processo.

Trata-se de medida excepcional, utilizada apenas quando houver urgência na obtenção de determinados efeitos que somente seriam alcançados ao final do processo. A excepcionalidade decorre do fato de se tratar de medida concedida antes que se instaure o regular contraditório, de modo que a urgência afirmada permita conceder antecipadamente alguns efeitos fáticos da sentença de procedência, desde que haja meios de prova para, mediante cognição sumária, constatar-se a verossimilhança das alegações, bem como seja possível reverter o provimento antecipado (art. 300, §3º, do CPC).

Além disso, revela-se necessário que a medida seja juridicamente possível.

No caso em análise, o Autor é promotor de justiça aposentado e sustenta a ilegalidade da exigência, por parte da Polícia Federal, de comprovação de capacidade técnica (avaliação psicológica) para a renovação do registro da sua arma de fogo. 

No corpo da petição inicial, justifica o periculum in mora no fato da validade do registro da arma de fogo ter expirado no último dia 08/01/2017, ocasião em que deu início aos procedimentos para renovação do registro de sua arma de fogo, quando, então,  deparara-se com a exigência de comprovação de capacidade técnica (avaliação psicológica), exigência esta que reputou ilegal, pelos motivos expostos no relatório desta decisão.

Pois bem.

Apesar de conhecer os precedentes do Supremo Tribunal Federal e Superior Tribunal de Justiça mencionados no corpo da Contestação, nos quais são feitas distinções entre porte e registro de arma, validando a exigência de capacidade técnica como requisito para o registro da arma, ainda que o interessado tenha porte por força de lei  (prerrogativa funcional), tenho que a matéria comporta solução diversa, pelos motivos a seguir expedidos:

A Constituição Federal determina que os estatutos do Poder Judiciário e do Ministério Público sejam objeto de leis complementares (art. 93, caput; 128, § 5º; 129, § 4º - EC 45/04).


Para o Poder Judiciário, a Lei Complementar nº 35/79, recepcionada pela Carta Política de 1988, cumpre esse papel e estabelece o porte de arma como prerrogativa do magistrado, nos seguintes termos: "Art. 33 - São prerrogativas do magistrado: (...) V - portar arma de defesa pessoal".


Também os membros do Ministério Público detêm o porte de arma funcional como prerrogativa, por força de leis complementar e ordinária.


A Lei Complementar nº 75/93, que é o Estatuto do Ministério Público da União, prevê:


Art. 18. São prerrogativas dos membros do Ministério Público da União: I - institucionais: (...) e) o porte de arma, independentemente de autorização;


E a Lei nº 8.625/93 - Lei Orgânica Nacional do Ministério Público (LONMP) - contém a seguinte previsão no "CAPÍTULO VI, Das Garantias e Prerrogativas dos Membros do Ministério Público":


Art. 42. Os membros do Ministério Público terão carteira funcional, expedida na forma da Lei Orgânica, valendo em todo o território nacional como cédula de identidade, e porte de arma, independentemente, neste caso, de qualquer ato formal de licença ou autorização.


A mesma Lei 8.625/93 determina:


Art. 80. Aplicam-se aos Ministérios Públicos dos Estados, subsidiariamente, as normas da Lei Orgânica do Ministério Público da União.
Vê-se que os artigos 18 da LC 75/93 e 42 da LONMP conferem aos membros do MP a prerrogativa de portar arma de defesa pessoal, sem prever qualquer requisito para o exercício. Trata-se de um porte de arma especial, que constitui verdadeira prerrogativa funcional e que está imune às restrições regulamentares e legais.
O Estatuto do Desarmamento ((Lei 10.826/2003), por sua vez, estabelece que:


Art. 10. A autorização para o porte de arma de fogo de uso permitido, em todo o território nacional, é de competência da Polícia Federal e somente será concedida após autorização do Sinarm. § 1o A autorização prevista neste artigo poderá ser concedida com eficácia temporária e territorial limitada, nos termos de atos regulamentares, e dependerá de o requerente: I - demonstrar a sua efetiva necessidade por exercício de atividade profissional de risco ou de ameaça à sua integridade física; II - atender às exigências previstas no art. 4o desta Lei; III - apresentar documentação de propriedade de arma de fogo, bem como o seu devido registro no órgão competente.






O art. 4º deste Estatuto, assim prevê:


Art. 4o Para adquirir arma de fogo de uso permitido o interessado deverá, além de declarar a efetiva necessidade, atender aos seguintes requisitos: I - comprovação de idoneidade, com a apresentação de certidões negativas de antecedentes criminais fornecidas pela Justiça Federal, Estadual, Militar e Eleitoral e de não estar respondendo a inquérito policial ou a processo criminal, que poderão ser fornecidas por meios eletrônicos; (Redação dada pela Lei nº 11.706, de 2008)  II - apresentação de documento comprobatório de ocupação lícita e de residência certa;  III - comprovação de capacidade técnica e de aptidão psicológica para o manuseio de arma de fogo, atestadas na forma disposta no regulamento desta Lei.

Não há qualquer previsão legal na legislação específica do Ministério Público que obriga os seus membros a preencherem os requisitos dos art. 4º e 6º da Lei 10.826/2003, supratranscritos.
O próprio Estatuto do Desarmamento, no caput de seu art. 6º, determina "ser proibido o porte de arma de fogo em todo o território nacional, salvo para os casos previstos em legislação própria".

Com efeito, tem-se que o Estatuto do Desarmamento é lei geral e de hierarquia distinta, não podendo revogar nem restringir a prerrogativa específica atribuída aos promotores, prevalecendo a presunção legal estabelecida pelo estatuto dos membros do MP quanto à higidez do impetrante para portar arma para defesa pessoal, o que aliás é bastante apropriado se considerarmos as responsabilidades e os riscos que o exercício da função impõe.
A renovação do registro da arma, para os membros do Ministério Público e do Poder Judiciário, deve ser entendido apenas como forma de controle administrativo, pelos Órgãos de Segurança, das pessoas que são portadoras de arma de fogo, bem como para o pagamento da respectiva taxa(tributo) para o Ente público custear as despesas com esse controle.






Ademais, embora regularmente instada, a UNIÃO não trouxe para os autos nenhuma notícia de que o Impetrante tenha algum antecedente que manche a sua capacidade de ter registrada, como sua, uma arma de fogo, ou que a impedisse de portá-la para defesa pessoal. 
Por outro lado, sabe-se da incapacidade das Polícias brasileiras, federais e estaduais, de impedir o tráfico de armas, bem como o seu uso por malfeitores, e ainda de dar a devida segurança a todos os cidadãos, situação essa que coloca a vida dos cidadãos de bem em perene situação de risco, e especialmente dos que exercem cargos públicos cujas atividades têm por escopo punir esses malfeitores, de forma que abster os Membros dessas categorias profissional-públicas, que exercem ou exerceram esses cargos, de ter em seu nome registrada arma de fogo, para defesa pessoal, corresponderia a um absurdo contrassenso, principalmente quando, como demonstrado, há Leis específicas que lhes dão o poder-dever-direito de portar esse tipo de arma para defesa pessoal. 
Finalmente, não diviso ferimento ao princípio constitucional da isonomia, como alegado pela UNIÃO na sua contestação, pois essas pessoas que exercem ou exerceram mencionados cargos, não se igualam aos cidadãos de bem comuns,  e é exatamente por isso que recebem tratamento legal diferenciado, sendo sempre bom relembrar que esse princípio constitucional consiste exatamente em permitir que se dê tratamento desigual aos desiguais e igual àqueles que se igualam. 



Nesse sentido, confiram-se os precedentes que se seguem, aplicáveis mutatis mutandis ao presente caso:


EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. PORTE DE ARMA DE FOGO. MEMBROS DO MINISTÉRIO PÚBLICO. ART. 18 DA LEI COMPLEMENTAR 75/93. LEI 10.826/2003 (ESTATUTO DO DESARMAMENTO), ART. 4º-III. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 23/2005-DG/DPF. 1. Os membros do Ministério Público não estão sujeitos à comprovação de capacidade técnica para o manuseio de arma de fogo como requisito para obtenção do respectivo porte, exigência essa prevista genericamente no art 4º-III do Estatuto do Desarmamento. 2. A Lei Complementar 75/93, no art. 18, inciso I, alínea "e" estabelece que é prerrogativa do membro do Ministério Público o porte de arma independentemente de autorização, não podendo a legislação ordinária ou regulamentação administrativa restringir essa prerrogativa ou estabelecer requisitos diferentes daqueles previstos na norma complementar quanto aos magistrados, que são submetidos ao estatuto previsto no artigo 93 da Constituição quanto aos encargos, prerrogativas, direitos e deveres. 3. Ainda que a limitação administrativa imposta aos magistrados pelo Departamento de Polícia Federal por meio da Instrução Normativa nº 23/2005-DG/DPF (prova de capacidade técnica de manuseio da arma) esteja sendo dirigida ao registro periódico da arma e não ao seu porte propriamente dito, o efeito prático é o mesmo, pois não haverá porte regular de arma se não houver seu registro regular. 4. Tendo a LC 75/93 instituído o porte de arma de fogo como prerrogativa específica atribuída aos membros do MP, prevalece a presunção legal por ela estabelecida quanto à higidez do procurador para portar arma para defesa pessoal. 5. Apelação provida para conceder a segurança.   (TRF4, AC 5035735-75.2015.404.7100, QUARTA TURMA, Relator CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 07/12/2015).
 

EMENTA: DIREITO ADMINISTRATIVO. MAGISTRATURA. PORTE DE ARMA DE FOGO. LOMAN, ART. 33-V. LEI 10.826/2003 (ESTATUTO DO DESARMAMENTO), ART. 4º-III. INSTRUÇÃO NORMATIVA Nº 23/2005-DG/DPF. 1. Os membros da magistratura nacional não estão sujeitos à comprovação de capacidade técnica para o manuseio de arma de fogo como requisito para obtenção do respectivo porte, exigência essa prevista genericamente no art 4º-III do Estatuto do Desarmamento. 2. A Lei Orgânica da Magistratura - LOMAN, que é lei complementar, no art. 33-V estabelece que é prerrogativa do magistrado portar arma de defesa pessoal, não podendo a legislação ordinária ou regulamentação administrativa restringir essa prerrogativa ou estabelecer requisitos diferentes daqueles previstos na norma complementar quanto aos magistrados, que são submetidos ao estatuto previsto no artigo 93 da Constituição quanto aos encargos, prerrogativas, direitos e deveres. 3. Ainda que a limitação administrativa imposta aos magistrados pelo Departamento de Polícia Federal por meio da Instrução Normativa nº 23/2005-DG/DPF (prova de capacidade técnica de manuseio da arma) esteja sendo dirigida ao registro periódico da arma e não ao seu porte propriamente dito, o efeito prático é o mesmo, pois não haverá porte regular de arma se não houver seu registro regular. 4. Tendo a LOMAN instituído o porte de arma de fogo como prerrogativa específica atribuída aos magistrados, prevalece a presunção legal por ela estabelecida quanto à higidez do magistrado para portar arma para defesa pessoal. (TRF4 5008267-93.2016.404.7200, QUARTA TURMA, Relator CANDIDO ALFREDO SILVA LEAL JUNIOR, juntado aos autos em 22/08/2017)






Diante de todo o narrado, tenho por presente a plausibilidade do direito alegado.

O perigo da demora também se evidencia pela ineficácia da medida se deferida apenas ao final, que a validade do registro de propriedade da arma do demandante já venceu, conforme noticiado na inicial.
3. Conclusão 


Diante de tal contexto, defiro a tutela provisória de urgência de antecipação e determino que a UNIÃO, por seu Órgão Departamento de Policia Federal loca, providencie imediatamente a renovação do registro da arma de fogo do Autor, sem dele exigir qualquer exame de aptidão psicológica, ou algo semelhante, sob as penas da Lei. 

Quanto ao mais, intime-se a parte para, querendo,  apresentar réplica.

Após, conclusos.


Recife, 01 de setembro de 2017.

Francisco Alves dos Santos Júnior




Juiz Federal, 2ª Vara/PE

quinta-feira, 31 de agosto de 2017

PRESCRIÇÃO. CONTRATO. INADIMPLÊNCIA. VENCIMENTO ANTECIPADO DAS PRESTAÇÕES FALTANTES. MANUTENÇÃO DO TERMO INICIAL DA FLUÊNCIA DO PRAZO PRESCRICIONAL: DIA SEGUINTE AO VENCIMENTO DA ÚLTIMA PARCELA DO CONTRATO ANTES DO VENCIMENTO ANTECIPADO. PRECEDENTES DO STJ.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Segue sentença que trata da prescrição de obrigação contratual civil, à luz de sedimentado entendimento de Turmas do Superior Tribunal de Justiça, posterior ao vigente Código Civil de 2002. 
Boa leitura. 

Obs.: pesquisa feita pelo Assessor Marcos Eduardo França Rocha.



PROCESSO Nº: 0803621-63.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTORA: C M DE A T
ADVOGADO: L A Da S e outro
RÉS: EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)





  Sentença tipo B





EMENTA: CONTRATO. INADIMPLÊNCIA. ANTECIPAÇÃO DAS PRESTAÇÕES VINCENDAS. INÍCIO DA FLUÊNCIA DO PRAZO DE PRESCRIÇÃO. VERBA HONORÁRIA. CONDIÇÃO SUSPENSIVA.
A antecipação do vencimento das prestações vincendas, em decorrência de inadimplência do Devedor, não modifica o início da fluência do prazo de prescrição da pretensão do Credor, que continua sendo o dia seguinte ao do vencimento da última prestação do contrato, como se a antecipação não tivesse ocorrido.
Verba honorária fixada no mínimo legal, com cobrança submetida à condição suspensiva, em face do gozo da assistência judiciária da Parte Autora, pelo tempo fixado n§ 3º do art. 98 do vigente Código de Processo Civil.
Improcedência.



Vistos, etc.

1. Relatório



C M T DE C P propôs a presente ação declaratória de prescrição da dívida contra a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA e a EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA, requerendo, preliminarmente, a concessão do benefício da justiça gratuita. Aduziu, em síntese, que: o Sr. ÂNGELO DE COIMBRA PINTO, em 29/10/1991, teria firmado contrato por instrumento particular de compra e venda, mútuo com obrigações e quitação, consoante espécie de adesão, figurando como cessionária e credora hipotecária a Caixa Econômica Federal, tendo como vendedora do mencionado imóvel a Construtora O M Ltda.; o contrato seria de um financiamento imobiliário para aquisição da casa própria, pactuado no âmbito do Sistema Financeiro da Habitação - SFH (Lei nº 4.380/64), vinculado ao Plano de Equivalência Salarial por Categoria Profissional - PES, com prazo de financiamento em 19 anos; a Autora teria se separado do Sr. Â DE C P,  ficando cordado na separação que a Autora ficaria na posse do referido imóvel, motivo pelo qual estaria movendo a presente ação, requerendo que seja reconhecida a prescrição da dívida já que conforme a cláusula 29ª  do contrato teria ocorrido a antecipação da dívida com o seu inadimplemento, estando a Autora inadimplente desde o dia 28/02/1994; o pagamento do financiamento só teria sido realizado até a 27ª prestação, em 28/02/1994, devido a um litígio existente entre a construtora O M e a Caixa Econômica Federal, processo nº 93.0008067-9, que estaria em tramitação na 10º Vara Federal; a partir do momento em que a última parcela teria sido paga, teria ocorrido a antecipação da dívida desde o seu inadimplemento, qual seja, a 27ª prestação, contando a partir dali o prazo prescricional da dívida; a ré teria restado inerte em realizar a cobrança da dívida, ocorrendo, portanto, a prescrição quinquenal da dívida exigida pela ré. Teceu outros comentários. Requereu a concessão da tutela antecipada para suspender a execução enquanto não for julgado o mérito da presente demanda; existiria em andamento um processo para revisão contratual do contrato celebrado entre o Sr. Ângelo de Coimbra Pinto e a CEF sob o nº 0020456-77.2007.4.05.8300, contudo a revisão contratual não teria sido realizada; requer, portanto, a concessão da tutela antecipada para suspender a execução extrajudicial, a qual pretenderia promover a ré, enquanto não for realizada a revisão contratual conforme o processo de nº 0020456-77.2007.4.05.8300, já que, realizada a execução extrajudicial, o processo supracitado perderia o seu sentido de existir. Ao final, requereu: a) citação da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL e da EMGEA EMPRESA GESTORA DE ATIVOS, b) que seja declarada a prescrição da dívida e dos juros na forma código civil artigo 206, § 3º, III e § 5º, I; c) procedência da Ação, com a condenação da Requerida, nas custas processuais, honorários advocatícios em 20%, e demais cominações legais, sem exceção. Protestou o de estilo. Deu valor à causa. Instruiu a Inicial com instrumento de procuração e documentos.



Decisão (ID. 4058300.2000465), na qual foi concedido os benefícios da justiça gratuita e foi indeferido o pedido de tutela provisória de urgência.



A CAIXA apresentou contestação (ID. 4058300.2106780). No mérito esclareceu que o contrato habitacional teve sua assinatura em 29.10.1991, com recursos do FGTS, com prazo de amortização de 240 meses, taxa de juros de 10,5% a.a., sem cobertura pelo FCVS e com garantia hipotecária, oportunidade na qual pugnou pela força obrigacional do contrato de mútuo firmado entre a parte Autora e o Agente Financeiro; que ao contrário do afirmado pela autora, o prazo pra reconhecimento da prescrição do dívida não tem como início da sua contagem a data da última parcela não paga e sim a data em que findaria o contrato; que o contrato possui 92 prestações em atraso, referentes ao período entre janeiro de 1994 até agosto de 2001, totalizando uma dívida de R$ 847.820,25. Ao final, pugnou pela total improcedência dos pedidos e a condenação da autora em honorários advocatícios.



A parte autora apresentou réplica (ID. 4058300.2264793), e reiterou os termos de sua petição inicial.



Vieram os autos conclusos.



É o relatório. 
Fundamento e decido.



2. Fundamentação
Alega a Autora:
"Como se sabe o Art. 206 do CC, traz previsão acerca da prescrição senão vejamos:"Art. 206. Prescreve: § 5º Em cinco anos: I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular; § 3º Em três anos: III - a pretensão para haver juros, dividendos ou quaisquer prestações acessórias, pagáveis, em períodos não maiores de um ano, com capitalização ou sem ela;[...]".Portanto, verifica-se que a dívida foi antecipada desde 28.02.1994, com o inadimplemento do pagamento o que ensejou na antecipação da dívida conforme a cláusula vigésima nona do contrato celebrado, o que enseja o pedido de prescrição por inércia do credor."
Primeiro, incide apenas a o prazo de prescrição quinquenal do inciso I do § 5º do art. 206 do Código Civil, porque o que está em discussão são as prestações, como um todo, inclusive dos juros de mora, do contrato em questão. Aqui, os juros de mora são meros acessórios do principal.
Só incidiria o prazo de prescrição trienal do inciso III do § 3º do mesmo artigo, se estivesse em cobrança apenas juros de mora, isoladamente, o que, como se vê nos autos, não é o caso.
Teria havido a prescrição quinquenal do inciso I do § 5º do art. 206 do vigente Código Civil?
Examinemos o caso.
É sabido que o termo inicial para fluência do prazo prescricional não é a data da celebração do contrato de crédito (29.10.1991), mas sim a data de vencimento da dívida e se a dívida encontra-se em prestações mensais, por anos a fio, a fluência desse prazo só se inicia após a data da última prestação.
Não importa que, por força de cláusula do contrato, haja vencimento antecipado das prestações que faltam, quando, como no caso dos autos, houver atraso em uma única prestação(Cláusula Décima Nona), que no caso ocorreu em 28.02.1994, quando a Parte Autora deixou de honrar a 27.ª (vigésima sétima) prestação.



Todavia, essa antecipação das prestações vincendas não modificou o marco inicial da prescrição, que continuou sendo o dia seguinte à data do vencimento da última prestação contratual
E nesse sentido firmou-se o entendimento do Superior Tribunal de Justiça, conforme precedentes cujas ementas transcrevo a seguir:

"ADMINISTRATIVO. CONTRATO. INADIMPLÊNCIA. ANTECIPAÇÃO DO VENCIMENTO. PRAZO DE PRESCRIÇÃO. MANUTENÇÃO DO TERMO INICIAL.

1. Trata-se de ação monitória referente ao contrato de abertura de crédito para financiamento estudantil em que a origem afastou a prescrição reconhecida pelo juízo de primeiro grau.
2. Esta Corte pacificou seu entendimento no sentido de que, mesmo diante do vencimento antecipado da dívida, subsiste inalterado o termo inicial do prazo de prescrição - no caso, o dia do vencimento da última parcela, 10.2.2008. Precedentes.
3. Note-se, ainda, que a ninguém é admitido valer-se da própria torpeza. Ora, entender em favor da antecipação do prazo em questão beneficiaria o próprio devedor que criou o óbice para o recebimento do crédito. 4. Recurso especial não provido.".
Nota 1 - Brasil. Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma. Recurso Especial(REsp) nº 1.247.168/RS, Relator Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES,  julgado em 17/05/2011, Diário Judicial Eletrônico - DJe de 30/05/2011
"PROCESSUAL. EXECUÇÃO. PRESCRIÇÃO. TERMO INICIAL. VENCIMENTO ANTECIPADO. IMPROPRIEDADE.
I. O vencimento antecipado do contrato não antecipa o termo inicial da prescrição da ação de execução em favor dos inadimplentes, que deram causa à rescisão.
II. Agravo improvido."
Nota 2 - _________________________4ª Turma. Relator Ministro Aldir Passarinho Júnior, Agravo Regimental(AgRg) no Recurso Especial(REsp) nº 802688/RS 2005/0203397-9 - Ministro ALDIR PASSARINHO JUNIOR, julgado em  28/11/2006, publicado no Diário Judicial - DJ  de  26.02.2007 p. 604.

E esse entendimento das Turmas desse E. Tribunal continua, pois em julgado recente da sua 3ª Turma consta:
"1. A jurisprudência desta Corte de Justiça tem reiterado o entendimento de que o vencimento antecipado do contrato de financiamento imobiliário por inadimplemento do devedor não altera o termo inicial da prescrição, o qual deve ser contado do término da avença nos termos em que estipulado.
2. Agravo interno a que se nega provimento".
Nota 3 - ______________________3ª Turma. Agint nos EDcl no REsp nº 1.635.172/PR, Relator Ministro MARCO AURÉLIO BELLIZZE, julgado em 04.05.2017, Diário da Justiça Eletrônico - DJe de 18.05.2017.
Na "Planilha de Evolução do Financiamento" acostado (ID. 4058300.2102656), consta que o contrato em questão estaria atrasado desde 28.02.1994.

A data de vencimento da última parcela (240) estava prevista para o dia 29.10.2011, de tal sorte que o prazo de prescrição da dívida encerrar-se-ia em 29.10.2016 (inciso I do § 5º do art. 206 do Código Civil).

Com a propositura desta ação, em 18.05.2016, a Devedora das prestações do referido contrato, a ora Autora, findou por reconhecer a dívida, causando, assim, a interrupção da fluência do prazo de prescrição, conforme inciso VI do art. 202 do Código Civil.
Caso a ora Autora tivesse esperado por mais 5(cinco) meses e alguns dias, teria, de fato,  ocorrido a prescrição.

Conclui-se, então, que não ocorreu a alegada prescrição.
A simplicidade do caso autoriza fixar a verba honorária, à luz do § 2º do art. 85 do vigente Código de Processo Civil, qual seja, no mínimo legal de 10%(dez por cento) do valor da causa, atualizado(correção monetária e juros de mora) a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal - CJF.


3. Dispositivo


Posto isso, julgo improcedentes os pedidos desta ação e extingo o processo com resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil.

Condeno a Parte Autora nas custas e em verba honorária e arbitro esta no mínimo legal, qual seja, 10%(dez por cento) do valor da causa, atualizado na forma acima indicada;  todavia, como a Autora está em gozo do benefício da denominada Justiça Gratuita,  à luz do § 3º do art. 98 do mencionado diploma processual, submeto a respectiva cobrança à condição suspensiva pelo período ali fixado.
Sentença não sujeita ao reexame necessário art. 496, inciso I, do Código de Processo Civil.


Recife,  31 de agosto de 2017. 



Francisco Alves dos Santos Junior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

mef