sexta-feira, 9 de março de 2018

IMUNIDADE RECÍPROCA. AUTARQUIA FEDERAL GOZA DE IMUNIDADE DO IPTU. ESCRITURA PÚBLICA NÃO REGISTRADA. IRRELEVÂNCIA.


Por Francisco Alves dos Santos Jr

Dedico a sentença que segue ao saudoso jus-tributarista baiano ALIOMAR DE ANDRADE BALEEIRO, de cuja obra bebi os meus primeiros aprendizados no campo do direito constitucional-tributário e que, por sinal, invoco no mencionado ato judicial. 

Discute-se, na mencionada sentença, vários assuntos importantes de direito, a saber: no campo do direito processual civil, quanto à competência ou incompetência do Juizado Especial Cível Federal e da nova normatização do fenômemo da conciliação; no campo do direito  constitucional-tributário,  envolvendo o princípio constitucional da federação, a imunidade recíproca, a caracterização da propriedade do imóvel por parte de Autarquia Federal para gozo dessa imunidade, etc.

Boa leitura.  


PROCESSO Nº: 0815992-25.2017.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: CONSELHO REGIONAL DE BIOMEDICINA - 2 REGIÃO
ADVOGADO: George Luiz Vidal Wanderley
RÉU: MUNICÍPIO DO RECIFE.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL)




SENTENÇA TIPO A


EMENTA: - CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. COMPETÊNCIA JUDICIAL IMUNIDADE RECÍPROCA. IPTU.

-Compete ao Juiz da Vara Cível Comum Federal apreciar e julgar ação ordinária, proposta por Autarquia Federal, na qual procura desconstituir lançamento tributário, relativo ao  IPTU, realizado por Município(interpretação sistemática  do inciso I  do art. 6º e do inciso III do § 1º do art. 3º da Lei nº 10.259, de 12.07.2001).
-A Autarquia Federal que exibe escritura pública de aquisição de imóvel e nele exerce as suas atividades institucionais, em prol da Comunidade, há muitos anos, sem nenhum questionamento quanto a sua situação de proprietária, é de fato considerada proprietária, mesmo que não tenha tido a cautela de registrar a respectiva escritura no competente Cartório de Registro de Imóveis.
-As Autarquias gozam da denominada imunidade recíproca, relativamente  aos Impostos, quanto ao patrimônio, renda e serviços, conforme regra do art.150, VI, "a" e respectivo § 2º da vigente Constituição da República, regra constitucional essa calcada no princípio constitucional básico da federação. .-Concessão da tutela provisória de urgência de antecipação.-Procedência.


Vistos, etc.

1. Breve Relatório

Trata-se de "AÇÃO ANULATÓRIA DE DÉBITO" proposta perante a 33ª Vara Federal/PE, em 24/10/2017, pelo CONSELHO REGIONAL DE BIOMEDICINA DA 2ª REGIÃO - CRBM em face do MUNICÍPIO DO RECIFE, objetivando, em sede de tutela de urgência, fosse determinado ao Réu "a imediata expedição de Declaração de Imunidade do Imóvel localizado na Rua Gervásio Pires, n.º 1075, Soledade, em Recife-PE, desde a data de sua aquisição pelo CRBM2, em 16/05/2005, com a respectiva certidão negativa de débitos e, por conseguinte, a desconstituição de todo e qualquer débito eventualmente incidente sobre o referido imóvel junto à Prefeitura Municipal do Recife, em face do Princípio da Imunidade Recíproca".
Decisão proferida em 23/01/2018, na qual foi firmada a competência desta Vara para processamento e julgamento do presente feito; indeferido o pedido de tutela provisória de urgência de antecipação, formulado na petição inicial e determinada a realização de audiência de conciliação pelo CEJUSC, nos termos do art. 334 do CPC (Identificador nº  4058300.4629182).
Designada Audiência de Tentativa de Conciliação, no Centro de Conciliação -CEJUSC, para o dia 05 de abril de 2018, às 14:00 horas (Identificador nº 4058300.4634497).
O MUNICÍPIO DO RECIFE apresentou contestação (identificador nº 4058300.4813966). Inicialmente, arguiu a inexistência de interesse conciliável, incidindo na espécie o inciso II do § 4º do art. 334 do vigente CPC. Suscitou preliminarmente a incompetência absoluta deste Juízo e, como prejudicial de mérito, a prescrição quinquenal. No mérito, alegou, em síntese, que: não haveria prova nos autos de que o imóvel em discussão seja efetivamente de propriedade da Autora; a mesma teria anexado apenas a escritura de compra e venda do bem, mas dela não se veria a chancela de seu registro no cartório imobiliário; que não haveria prova da quitação dos tributos municipais anteriores à data da sua lavratura (setembro de 2011); a imunidade buscada restringir-se-ia a impostos (art. 150, VI, "a" e § 2º, da CF), não alcançando as taxas; ainda que imune fosse ao IPTU, a Autora não faria jus à certidão de regularidade fiscal em razão dos débitos em aberto relativos às taxas da antiga TLP, atual TRSD, cobrada em razão do serviço de recolhimento e tratamento de resíduos sólidos; com relação à declaração de prescrição dos créditos tributários de IPTU mencionados na atrial, referentes aos exercícios de 2005 a 2010, não haveria que se falar em prescrição, vez que todos os créditos teriam sido devidamente executados ou parcelados. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pelo reconhecimento da incompetência absoluta deste juízo, com consequente extinção do feito sem resolução de mérito ou com remessa dos autos ao juízo competente; e, no mérito, pela total improcedência dos pleitos autorais. Protestou o de estilo.
A Parte Autora atravessou petição, requerendo reconsideração da decisão proferida em sede de tutela de urgência, para determinar à PMR a expedição/fornecimento de CND, destacando-se nessa certidão o período anterior a 14/09/2011 (Identificador nº 4058300.4822812).

2. Fundamentação

2.1 - Matérias Preliminares

2.1.1 - O Município, ora Réu, levanta preliminar de incompetência  absoluta deste Juízo, porque, em razão do valor, este feito deveria ser apreciado  e julgado por uma das Varas do Juizado Especial Cível Federal.
Embora, neste particular, tenha havido preclusão, porque a competência  deste Juízo foi firmada na decisão inicial, sob identificador nº 4058300.4629182, contra a qual não houve interposição de agravo de instrumento, volto a examinar essa matéria, com fundamentação jurídico-legal mais detalhada.
Numa análise isolada da regra do inciso III  do § 1º do art. 3º da Lei nº 10.259, de 12.07.2001, compete ao  Juizado Especial Cível Federal apreciar e julgar ações, com valor até 60(sessenta)salários mínimos, quando se tratar de desconstituição de lançamento tributário federal. Como se busca a desconstituição de lançamentos tributários municipais, ainda que se analisasse a questão só por essas óticas, a competência seria deste Juízo Federal Cível Comum.
Por outro lado, o inciso I do art. 6º da mesma Lei não admite que as Autarquias Federais figurem como Autoras em quaisquer tipos de ações perante o Juizado Especial Cível Federal, tendo que propor tais ações perante este Juízo Federal Cível Comum.
Então, por qualquer ângulo que se examine a questão, chega-se à fácil conclusão que esta preliminar, levantada pelo Município do Recife, ora Réu, não merece acolhida.

2.1.2 - Diante da manifestação do Município Réu, em sua contestação (identificador nº 4058300.4813966), no sentido de que não iria se conciliar no presente feito, tendo em vista que os interesses em tela são insusceptíveis de harmonização (§ 4º, II, do art. 334, do CPC), devo cancelar a determinação para realização de audiência de tentativa de conciliação, devendo a Secretaria deste Juízo providenciar, junto ao Centro de Conciliação - CEJUS,  o cancelamento da Audiência de Tentativa de Conciliação, designada para o próximo dia 05 de abril de 2018, conforme se vê no Identificador nº 4058300.4634497.

2.2 - Mérito

2.2.1 - Da Prescrição
O Conselho, ora Autor, argumenta na petição inicial que a pretensão executória do Município, ora Réu, relativamente aos créditos IPTU, estaria prescrita, porque se tratam de créditos de 2005, 2006, 2007, 2008, 2009 e 2010, de forma que mesmo que não houvesse a pretendida imunidade tributária, ainda assim não poderia ser cobrados, em face da alegada prescrição.
Rebate o Município, ora Réu, alegando que a sua pretensão executória, com referência a mencionados créditos, não estaria prescrita, porque realizara a tempo e modo o lançamento e, após este, antes do advento da prescrição, propusera a respectiva cobrança judicial.
Tenho que assiste razão ao Município, ora Réu, porque o Conselho, ora Autor, não demonstrou porque teria ocorrido a prescrição.
O Município, ora Réu, por sua vez, alega que prescrita estaria a pretensão do Conselho, ora Autor, porque só propusera esta ação quando já transcorrido mais de cinco anos do lançamento do IPTU em questão.
Esta exceção de prescrição do Município, ora Réu, não merece, sequer, ser conhecida, porque se havia a imunidade, a ser debatida no subtópico seguente desta fundamentação, não há que se falar em prescrição da pretensão do Autor, para barrar a mencionada exigibilidade, em face da completa nulidade do ato de lançamento do referido imposto, indicando como Contribuinte o Conselho, ora Autor, em face da ausência de obrigação, em face da vedação constitucional.

2.3 - Das Questões de Fato e Jurídicas do Mérito Propriamente Dito

2.3.1 - Da Qualidade de Proprietário e da Abrangência da Imunidade Recíproca

Questão preliminar, o Conselho, ora Autor, prova com a escritura que acostou nos autos ser o real proprietário do imóvel em questão?
O Município, ora Réu, sustenta que não, porque referida escritura não estaria registrada no Cartório de Registro de Imóveis.
No entanto, o Município, ora Réu, lançou o IPTU, indicando como Contribuinte o Conselho, ora Autor, como a considerá-lo o titular do referido imóvel.
É verdade que pelo Artigo 34 do Código Tributário Nacional arvora-se nessa qualidade, contribuinte do IPTU, o proprietário, o titular do domínio útil ou o seu possuidor a qualquer título.
No caso, a imunidade constitucional, da alínea "a" do inciso VI do art. 150 e respectivo § 2º da vigente Constituição da República é apenas para a propriedade da Autarquia, ora Autora. Trata-se de uma imunidade com força objetiva(para a propriedade), mas com maior força subjetiva(para a pessoa jurídica de direito público, que dela pode gozar).
E o Município, titular do poder-dever de lançar e cobrar o IPTU, pode escolher qualquer uma das pessoas acima indicadas como Contribuinte(nesse sentido, Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 1ª Seção, Recurso Espeical - REsp nº 1.111.202/SP, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 10.06.2009, publicado no Diário Judiciário Eletrônico - DJe de 18.06.2009, disponível em http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=475078&repetitivos=REPETITIVOS&&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true, acesso em 08.03.2018), entendimento esse que foi objeto da Súmula 399 dessa mesma Corte, com o seguinte texto: "Cabe à legislação municipal estabelecer o sujeito passivo do IPTU", obviamente, observando a regra do acima invocado art. 34 do Código Tributário Nacional. 
Persiste a questão: a partir de que momento o contribuinte do IPTU passa a ser considerado proprietário do imóvel?. 
Não tenho dúvidas quanto a isso: a partir do momento em que ele firma escritura pública de aquisição do imóvel, pois adquire, assim, os atributos de proprietário, bem como os respectivos deveres. 
O registro no Cartório de Registro de Imóveis dá ao adquirente do imóvel apenas mais uma garantia de que o imóvel é inquestionavelmente seu e evita que os ex-proprietários o alienem para outrem.
Figura também como uma garantia para Terceiros, que assim podem evitar a aquisição de imóvel que já foi alienado.
Mas, de posse da escrit8ura pública, com a posse direta do imóvel, e indicando o respectivo endereço para as suas atividades, há longo tempo, sem nenhum questionamento quanto ao título de proprietário por Terceiro, como vem ocorrendo há muito tempo como o Conselho, ora Autor, não há porque duvidar da sua qualidade de proprietário.
Nesse sentido, há precedente do TRF4R, o qual, mutatis mutandis, aplica-se confortavelmente ao presente caso, verbis:
"EMENTA: TRIBUTÁRIO. EMBARGOS À EXECUÇÃO FISCAL. IPTU. LEGITIMIDADE PASSIVA. ESCRITURA PÚBLICA DE COMPRA E VENDA DE IMÓVEL. AUSÊNCIA DE REGISTRO. IMUNIDADE RECÍPROCA. 1. Segundo a jurisprudência do STJ, tanto o promitente comprador (possuidor a qualquer título) do imóvel quanto seu proprietário/promitente vendedor (aquele que tem a propriedade registrada no Registro de Imóveis) são contribuintes responsáveis pelo pagamento do IPTU (REsp 1.110.551/SP, 1ª Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, DJe de 18.6.2009, recurso submetido à sistemática prevista no art. 543-C do CPC). 2. No entanto, comprovada a alienação do imóvel, com a posterior quitação integral do preço, o simples fato de não ter sido registrada tal transferência na matrícula do imóvel não acarreta a responsabilidade tributária do alienante, que já não mais detém a posse ou a propriedade sobre o imóvel. 3. Mesmo que se atribuísse à autarquia federal a condição de proprietária do imóvel, a cobrança do IPTU não teria êxito, considerando a imunidade tributária recíproca traçada no artigo 150, VI, a, c/c §2º, da CF/88, esta também causa de pedir dos presentes embargos. 4. Apelo do Município improvido." (Brasil. Tribunal Regional Federal da 4ª Região, TRF4, 1ª Turma, Apelação Cível - AC nº 5030459-68.2012.4.04.7100, Relator Desembargador Federal Joel Ilan Paciornik, juntado aos autos em 16/04/2015, Disponível em  https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/citacao.php?doc=TRF408566050, Acesso em  08/03/201).
Não há dúvida, pois, que o Conselho, ora Autor, é proprietário do imóvel em questão, desde a data acima assinalada, não tendo o Município, ora Réu, feito nenhuma prova em sentido contrário, tendo até norteado nesse sentido, quando lançou o IPTU o indicando como Contribuinte.
Ademais, há um precedente da 2ª Turma do Superior Tribunal de Justiça no qual se concluiu, interpretando um acórdão do Tribunal de Justiça do Rio de Janeiro, da seguinte forma:
"O Tribunal de origem concluiu pelo direito à imunidade, encartada no art. 150, VI, "a" e seu § 2º, da CF/88, ou seja, analisu a demanda sob enfoque constitucional. Asseverou, nesse esteio, que o conceito de patrimônio tal como prevê o art. 150, § 2º, da CF, é amplo, não estando limitado à propriedade "stricto sensu", assim como consignou que o fato gerador do IPTU não é só o domínio, mas também a posse", mantendo o julgado do Tribunal de Origem, que reconhecera imunidade à OAB, então considerada Autarquia Federal.[1]
E essa ideia de que a Unidade da Federal e suas Autarquias não podem ser obrigadas a pagar impostos às outras Unidades da Federação, decorre do princípio constitucional básico da federação(v. subtópico seguinte, onde, a esse respeito, invoca-se a lição do saudoso e sempre atual Aliomar de Andrade BALEEIRO), presente em antigos julgados do Supremo Tribunal Federal, referidos por esse autor no Apêndice da nona edição da sua obra(v. nota de rodapé 2 abaixo), a saber: no RE nº 70.268/GB(antigo Estado da Guanabara), de 27.08.1970, a 1ª Turma da Suprema Corte reconheceu a imunidade recíproca ao antigo INPS, relativamente a aquisição de terreno para planos de habitação por ele empreendidos.
No RE 70.572/BA a 1ª Turma dessa Suprema Corte, em 28.09.1971, destacando a amplitude desse tipo de imunidade, chegou a firmar o entendimento no sentido de que a imunidade recíproca 'é norma tutelar do cidadão e não tanto da Pessoa de Direito Público destinatária da exceção constitucional.".[BALEEIRO, 1977, p. 600].
Ora, se é assim, com muito maior razão tem-se que se reconhecer a imunidade do Conselho, ora Autor, que, além da posse, do exercício de suas atividades no imóvel, a favor da Comunidade, comprovou, com a exibição de escritura pública, que é efetivamente proprietário "strito sensu" do imóvel em debate.

2.3.2 - A Tutela Provisória de Urgência e do Mérito


Quanto ao pedido de reconsideração formulado pela Parte Autora (Identificador nº 4058300.4822812), cabem as considerações que seguem.
Melhor examinando o pedido da petição inicial,concluo que de fato ele envolve as parcelas do IPTU anteriores e posteriores à data, comprovada nos autos, da aquisição do imóvel em questão, qual seja, 14.09.2011.
Eis a íntegra do mencionado pedido: 
"b) a concessão de liminar inaudita autera pars para determinar ao Réu a imediata expedição de Declaração de Imunidade do Imóvel localizado na Rua Gervásio Pires, n.º 1075, Soledade, em Recife-PE, desde a data de sua aquisição pelo CRBM2, em 16/05/2005, com a respectiva certidão negativa de débitos e, por conseguinte, a desconstituição de todo e qualquer débito eventualmente incidente sobre o referido imóvel junto à Prefeitura Municipal do Recife, face ao Princípio da Imunidade Recíproca, aqui invocado;".

E extrai-se da decisão inicial, na qual o pedido de concessão liminar de tutela provisória de urgência de antecipação foi negado, acostada sob identificador nº 4058300.4629182, que ali se entendeu que a Autora, sendo Autarquia Federal, goza da imunidade do mencionado Imposto, relativamente as suas propriedades imóveis. E, com relação ao período anterior à data da aquisição, em face das ressalvas, lançadas pelo Titular do Cartório na respectiva escritura, no sentido de que se lhe foram comprovadas as quitações de tal imposto, não pode o Conselho, ora Autor, ser cobrado de tais parcelas, em face da regra do caput do art. 130 do vigente Código Tributário Nacional.
E, realmente, não poderia haver outro entendimento, à luz da alínea "a" do inciso VI do art. 150 e do seu respectivo § 2º do Código Tributário Nacional, o qual se encontra calcado no princípio constitucional básico da federação, segundo o qual as Unidades da Federação não podem cobrar imposto umas das outras.
Aliás, como lembra o saudoso jurista baiano Aliomar de Andrade BALEEIRO[2], que foi Ministro do Supremo Tribunal Federal e um dos maiores tributaristas do Brasil, com base nesse princípio da federação a nossa primeira Constituição Republicana, a de 1891, estabelecia, no seu art. 10, a imunidade recíproca para todo tipo de tributo e não apenas para impostos.
E, REPITO, pela escritura acostada sob identificadores nºs 4058300.4235796 e 4058300.4235804, em face das demais circunstâncias acima debatidas, não há dúvida que o Conselho, ora Autor, adquiriu mencionado imóvel na data acima indicada e nessa escritura o Titular do Cartório atestou que lhe foram exibidos os documentos relativos ao pagamento de todos os tributos até aquela data, o que afasta a responsabilidade do Conselho, ora Autor, com referência aos tributos eventualmente devidos até 14.09.2011, conforme regra do art. 130 do mencionado Código Tributário.
Então tem o Conselho, ora Autor, relativamente ao IPTU, direito de obter certidão negativa de débito do período anterior, em face do consignado na referida escritura, bem como do período posterior, porque, a partir de então, em face da regra constitucional acima indicada, o imóvel passou a ser não tributável, em face da imunidade, de cunho subjetivo, concedido a todas as Autarquias da UNIÃO, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios pelo Legislador Constituinte de 1988, imunidade essa que, aliás, já constava do texto da Constituição anterior. .
Também tem o Conselho, ora Autor, o direito ao gozo da mencionada imunidade para os períodos posteriores à mencionada data da aquisição, com relação a qualquer imposto que incida sobre o referido imóvel, porque, como se sabe, a imunidade figura como uma barreira constitucional à tributação, introduzida na Carta Magna, por motivos político-adiministrativos que a justificaram, mormente o respeito ao princípio da federação, à época da edição da mencionada Carta.
E, ao contrário do alegado pelo Município, ora Réu, o Conselho, ora Autor, não está a pleitear imunidade para taxas, mas apenas para o IPTU, conforme se extrai do seguinte trecho da causa petendi da petição inicial:
"A supracitada casa se encontra assente sob terreno da Prefeitura do Recife, e para que seja lavrada a escritura definitiva de compra e venda, bem como o seu registro no RGI competente, faz-se mister que seja declarada a sua imunidade, evitando-se, deste modo, o paradoxo de vir a uma Autarquia Federal pagar IPTU, em virtude do Princípio da Imunidade Recíproca."
É verdade que na mencionada peça, no trecho acima transcrito, se pede a "desconstituição de todo e qualquer débito eventualmente incidente sobre o referido imóvel junto à Prefeitura Municipal do Recife, ...", mas esse pleito, por óbvio, deve ser interpretado à luz da causa petendi da referida petição, até mesmo porque a petição inicial tem que ser vista como um todo e não em partes isoladas.
E, em razão do mencionado dispositivo constitucional, a imunidade em debate diz respeito apenas aos impostos incidentes sobre o imóvel em questão, não abrangendo as taxas, por ser a referida regra constitucional específica para impostos.
Visível, pois, a probabilidade do direito e o risco de, se não concedido liminarmente, causar prejuízo de difícil reparação à Parte Autora, cabendo, pois, a reconsideração da decisão inicial, acima referida, na parte em que se denegou a concessão liminar da tutela provisória de urgência de antecipação.

2.3.3 - Da verba honorária
Extrai-se, do acima fundamentado, que foi mínima a sucumbência do Autor, apenas a data em que pode ser considerado proprietário, sem sofrer nenhum ônus quanto ao tributo(imposto) em debate, de forma que apenas o Município, ora Réu, deve ser condenado a pagar verba honorária a favor do(a) Patrono(a) do Autor.
E, considerando o esforço e dedicação do Patrono do Autor, que lutou tenazmente pelos interesses do seu Cliente, tenho que a verba honorária deva ser fixada no percentual equivalente ao mínimo legal + 20%(por exemplo, se enquadrável no inciso II do § 3º do art. 85 do vigente CPC, teremos 8% + 20% de 8% = 9,60%), observadas as regras fixadoras de patamares de valores desse § 3º e as regras de apuração dos §§ 4º e 5º desse artigo de Lei. 

3. Dispositivo
Posto isso:
3.1 - Preliminarmente:
3.1.1 - rejeito a preliminar de incompetência  deste Juízo Federal, levantada na contestação do Município, ora Réu;
3.1.2 - determino que a Secretaria providencie, com urgência, o cancelamento da Audiência de Tentativa de Conciliação, designada para o próximo dia 05 de abril de 2018, no Centro de Conciliação - CEJUSC (Identificador nº 4058300.4634497), em face da declaração do  Município, ora Réu, na sua contestação, que não teria interesse em conciliar-se com a Autarquia, ora Autora.
3.2 - No mérito:
3.2.1 - rejeito as exceções de prescrição, levantadas pelas duas Partes;
3.2.2 - reconsidero a decisão inicial, acima referida, na parte em que se negou o pedido de concessão liminar da tutela provisória de urgência de antecipação e, considerando que se encontram presentes os requisitos do art. 300 e respectivos parágrafos do vigente Código de Processo Civil, concedo à Parte Autora mencionada tutela, em caráter liminar, e determino que o Município, ora Réu, forneça imediatamente ao Autor as mencionadas certidões negativas, relativamente ao imóvel indicado na petição inicial,  e,
3.2.3 - julgo parcialmente procedentes os pedidos desta ação, reconhecendo que, à luz da prova dos autos, o Conselho, ora Autor, adquiriu a propriedade do imóvel acima referido em 14.09.2011, conforme escritura pública acima invocada e acostada nos autos, passando a ter direito ao gozo da imunidade recíproca com relação ao IPTU referente a tal imóvel, e condeno o Município, ora Réu, a observar essa imunidade, bem como os efeitos da referida escritura com relação aos períodos a ela anteriores, cancelando todo e qualquer lançamento e cobrança do IPTU,  nos quais tenha indicado o ora Autor como Contribuinte/Devedor, sob pena de pagamento de multa, a favor do Autor, no montante mensal de R$ 5.000,00(cinco mil reais), com atualização(correção monetária, IPCA-E, e juros de mora, 0,5% ao mês)[3], até a data da expedição do respectivo requisitório constitucional[4 ]sem prejuízo da responsabilização pessoal do Servidor e/ou respectiva Chefe imediato, no campo administrativo, civil e criminal. 
3.3 - Finalmente, condeno o Município, ora Réu, a pagar ao Patrono do Conselho, ora Autor, verba honorária, na forma consignada no subitem 2.3.3 da fundamentação supra.
3.4 - Deixo de submeter esta sentença ao duplo grau de jurisdição, porque presente a situação prevista no inciso I do § 3º do art. 496 do vigente Código de Processo Civil.

Registre-se. Intimem-se.

Recife, 09 de março de 2018.
Francisco Alves dos Santos Jr.
  Juiz Federal, 2a Vara-PE

(PL)



Nota de Rodapé
[1] - Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 2ª Turma. AgRG no AG nº 1.061.875/RJ, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Julgado em 20.11.2008, publicado no Diário Judiciário Eletrônico - DJe de 16.12.2008. Disponível em http://www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=1061875&&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true, acesso em 09.03.2018.
[2] ´In Direito Tributário Brasileiro, 9ª Edição Revista e Acrescida de Apêndice. Rio de Janeiro, Forense, 1977, p. 87.
[3] - O Plenário do STF, no julgamento do RE 870.947/SE, sob repercussão geral, tema 810, concluiu que, mesmo depois da Lei 11.960, de 2009, continua válido o índice de correção monetária IPCA-E.
Brasil Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário -  RE nº  870947/SE, Repercussão Geral. Tema 810. Relator Ministro Luiz Fux. Julgado em 20.09.2017. Ainda não publicado.
Disponível em:
http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=870947&classe=RE-RG&codigoClasse=0&origem=JUR&recurso=0&tipoJulgamento=M
Acesso em 26.09.2017.
[4] - Brasil. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário nº 579.431/RS.. Relator Ministro Presidente, julgado em 13.03.2008. DJe nº 202, divulgado em 23.10.2008, publicado em 24.10.2008[Repercussão Geral julgada em 19.04.2017.
Disponível em: http://www.stf.jus.br/portal/cms/verNoticiaDetalhe.asp?idConteudo=341137.
Acesso em 24.04.2017. 

terça-feira, 6 de março de 2018

O ICMS E O ISS ENTRAM NA COMPOSIÇÃO DA BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E DA CSLL

Por Francisco Alves dos Santos Júnior
 
Na decisão que segue, firmou-se o entendimento de que não pode ser aplicado o entendimento do Plenário do Supremo Tribunal Federal, consignado no acórdão relativo ao Recurso Extraordinário - RE nº nº 574.706/PR, que, na repercussão geral, gerou o Tema 69, com relação às bases de cálculo do Imposto de Renda da Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, pelas razões consignadas na respectiva fundamentação.
 
Boa leitura.  
 
PROCESSO Nº: 0802547-03.2018.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA
IMPETRANTE: NE C E S DE O C E
ADVOGADO: R S P
IMPETRADO: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO. e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
 
 
D E C I S Ã O 
 
1. Breve Relatório 
 
NE C E S DE O C E, empresa qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança Preventivo, com pedido de liminar, contra o Ilmo. Sr. Delegado da Receita Federal do Brasil ePor m Recife/PE. Aduziu, em síntese, que: no exercício regular de suas atividades sociais, a Impetrante, uma sociedade limitada, estaria sujeita, por força da legislação vigente, ao recolhimento do Imposto de Renda de Pessoa Jurídica ("IRPJ") e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido ("CSLL"), através da sistemática do lucro presumido, instituídos pelas Leis nºs 9.430/96 e 7.869/88, respectivamente; os referidos tributos estariam sendo recolhidos com a inclusão do Imposto sobre Circulação de Mercadorias e Serviços ("ICMS") / Imposto sobre Serviço - ISS em suas bases de cálculo, devido a interpretação equivocada das normas infraconstitucionais que o cerceiam, que acabariam por violar o conceito de faturamento ou receita definido no artigo 195, inciso I, "b", da CF, seja com a redação antes da Emenda Constitucional n.° 20/98, seja pela redação conferida pela citada Emenda; nesse contexto, teria sido justamente esta a conclusão alcançada pelo Plenário do STF ao julgar o Tema nº 69 das Repercussões Gerais, no último dia 15/03/2017, em sessão amplamente acompanhada e divulgada pela mídia, e por meio da qual o Supremo teria fixado a tese cujo enunciado não deixaria qualquer dúvida sobre seu alcance; o ICMS não comporia a base de cálculo das contribuições do PIS e da COFINS, por não se enquadrar no conceito constitucional de receita ou faturamento de pessoa jurídica; os Egrégios Tribunais Pátrios devido a extensa circulação do referido julgamento pelos veículos de imprensa - noticiado no Informativo do STF nº 857 - 13 a 17 de março de 2017 - sob a óptica do artigo 927, inciso III, do NCPC, já estariam aplicando tal decisão paradigma e inclusive para situações análogas como a exclusão do ISS das bases de cálculo das Contribuições ao PIS e da COFINS, assim como para o IRPJ/CSLL, o que demonstraria o quão patente seria  o vício constitucional abaixo demonstrado. Teceu comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, pela concessão de medida liminar , nos termos do artigo 7º, inciso III, da Lei nº. 12.016/2009 e do art. 151, inc. IV, do CTN, para que fosse suspensa a exigibilidade do crédito tributário relativo ao montante equivalente ao ICMS/ISS excluído da base de cálculo do IRPJ e da CSLL apurados pela Impetrante. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.

2. Fundamentação

A concessão de liminar em mandado de segurança exige a concorrência dos dois pressupostos legais: a relevância do fundamento (fumus boni juris) e  o perigo de um prejuízo se do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida caso, ao final, seja deferida (periculum in mora).
Como se deduz da inicial, a Impetrante  pretende aplicar o entendimento manifestado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, consignado no acórdão relativo ao Recurso Extraordinário - RE nº 574.706/PR, em repercussão geral, para ter atendida a sua pretensão de se suspender a exigibilidade do crédito tributário relativo IRPJ e da CSLL sobre o valor do ICMS.
2.2.1 - Eis o teor da ementa e da tese de repercussão geral do invocado julgado da Suprema Corte:
"RE 574706 / PR - PARANÁ
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a):  Min. CÁRMEN LÚCIA
Julgamento:  15/03/2017           Órgão Julgador:  Tribunal Pleno

Publicação
ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-223 DIVULG 29-09-2017 PUBLIC 02-10-2017
Parte(s)
RECTE.(S) : IMCOPA IMPORTAÇÃO, EXPORTAÇÃO E INDÚSTRIA DE ÓLEOS LTDA ADV.(A/S) : LUIS AUGUSTO DE OLIVEIRA AZEVEDO E OUTRO(A/S) ADV.(A/S) : ANDRÉ MARTINS DE ANDRADE RECDO.(A/S) : UNIÃO PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DA FAZENDA NACIONAL
Ementa 
EMENTA: RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM REPERCUSSÃO GERAL. EXCLUSÃO DO ICMS NA BASE DE CÁLCULO DO PIS E COFINS. DEFINIÇÃO DE FATURAMENTO. APURAÇÃO ESCRITURAL DO ICMS E REGIME DE NÃO CUMULATIVIDADE. RECURSO PROVIDO.
1. Inviável a apuração do ICMS tomando-se cada mercadoria ou serviço e a correspondente cadeia, adota-se o sistema de apuração contábil. O montante de ICMS a recolher é apurado mês a mês, considerando-se o total de créditos decorrentes de aquisições e o total de débitos gerados nas saídas de mercadorias ou serviços: análise contábil ou escritural do ICMS.
2. A análise jurídica do princípio da não cumulatividade aplicado ao ICMS há de atentar ao disposto no art. 155, § 2º, inc. I, da Constituição da República, cumprindo-se o princípio da não cumulatividade a cada operação.
3. O regime da não cumulatividade impõe concluir, conquanto se tenha a escrituração da parcela ainda a se compensar do ICMS, não se incluir todo ele na definição de faturamento aproveitado por este Supremo Tribunal Federal. O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS. 3. Se o art. 3º, § 2º, inc. I, in fine, da Lei n. 9.718/1998 excluiu da base de cálculo daquelas contribuições sociais o ICMS transferido integralmente para os Estados, deve ser enfatizado que não há como se excluir a transferência parcial decorrente do regime de não cumulatividade em determinado momento da dinâmica das operações.
4. Recurso provido para excluir o ICMS da base de cálculo da contribuição ao PIS e da COFINS.
Decisão
Após o voto da Relatora, Ministra Cármen Lúcia (Presidente), dando provimento ao recurso extraordinário, no que foi acompanhada pelos Ministros Rosa Weber, Luiz Fux, Ricardo Lewandowski e Marco Aurélio, e os votos dos Ministros Edson Fachin, Roberto Barroso e Dias Toffoli, negando provimento ao recurso, o julgamento foi suspenso para colher os votos dos Ministros Gilmar Mendes e Celso de Mello na próxima assentada. Falaram: pela recorrente, o Dr. André Martins de Andrade e o Dr. Fábio Martins de Andrade; pela recorrida, o Dr. Fabrício da Soller, Procurador-Geral da Fazenda Nacional; e, pela Procuradoria-Geral da República, o Vice-Procurador-Geral da República, Dr. José Bonifácio Borges de Andrada. Plenário, 09.03.2017. Decisão: O Tribunal, por maioria e nos termos do voto da Relatora, Ministra Cármen Lúcia (Presidente), apreciando o tema 69 da repercussão geral, deu provimento ao recurso extraordinário e fixou a seguinte tese: "O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins". Vencidos os Ministros Edson Fachin, Roberto Barroso, Dias Toffoli e Gilmar Mendes. Nesta assentada o Ministro Dias Toffoli aditou seu voto. Plenário, 15.3.2017.".

Nota 2
Disponível em
http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.asp?s1=%28RE%24%2ESCLA%2E+E+574706%2ENUME%2E%29+OU+%28RE%2EACMS%2E+ADJ2+574706%2EACMS%2E%29&base=baseAcordaos&url=http://tinyurl.com/aelef8p
Acesso em 31.01.2018.
Note-se que, na repercussão geral, adotou-se a TESE 69, que destaco:
"O ICMS não compõe a base de cálculo para incidência do PIS e da COFINS".
2.2.2 - Esse d. julgado poderia ser estendido para  a CSLL e IRPJ?
Eis a definição legal de receita bruta, consignada no art. 224 e respectivo Parágrafo Único do Regulamento do Imposto de Renda, aprovado pelo Decreto nº 3.000, de 1999:
"Art. 224.  A receita bruta das vendas e serviços compreende o produto da venda de bens nas operações de conta própria, o preço dos serviços prestados e o resultado auferido nas operações de conta alheia (Lei nº 8.981, de 1995, art. 31).
Parágrafo único.  Na receita bruta não se incluem as vendas canceladas, os descontos incondicionais concedidos e os impostos não cumulativos cobrados destacadamente do comprador ou contratante dos quais o vendedor dos bens ou o prestador dos serviços seja mero depositário (Lei nº 8.981, de 1995, art. 31, parágrafo único).".
Note-se que só não entra na composição da receita bruta o valor dos impostos não cumulativos, cobrados destacadamente do comprador ou contratante e dos quais o vendedor dos bens ou o prestador dos serviços seja mero depositário.
Não é o caso do ICMS, o qual não é cobrado destacadamente na nota Fiscal do Fornecedor, como sói acontecer, por exemplo, com o IPI - Imposto sobre Produtos Industrializados, pois o ICMS faz parte integrante e indissociável do preço, eis que também faz parte da sua base cálculo, conforme a regra que segue da Lei Complementar nº 87, de 1996, que traça as regras gerais sobre o ICMS, verbis:
" Art. 13 (...).
§ 1º Integra a base de cálculo do imposto, inclusive na hipótese do inciso V do caput  deste artigo:      (Redação dada pela Lcp 114, de 16.12.2002)
I - o montante do próprio imposto, constituindo o respectivo destaque mera indicação para fins de controle;"
Ou seja, o ICMS é apenas indicado na nota fiscal do Fornecedor para fins de mero controle, mas não destacado, nesse documento fiscal, tampouco é cobrado de forma destacada, porque já incluído na respectiva base de cálculo, no preço da mercadoria, pois é calculado "por dentro",  diferentemente do IPI, que é calculado "por fora" e é cobrado de forma destacada, à parte do preço do produto.
Num exemplo simples: imaginemos uma mercadoria submetida a ICMS sob alíquota de 17% e IPI de 10%. Se o preço da mercadoria fosse R$ 100,00, seria indicado como valor do ICMS, num quadro próprio do corpo da nota fiscal, a quantia de R$ 17,00. E a quantia de R$ 10,00, relativa ao IPI, logo abaixo do preço, de forma que o valor total seria de R$ 110,00. Note-se, o ICMS já fazia parte do preço da mercadoria e foi cobrado dentro do próprio preço, já o IPI foi calculado à parte e cobrado "por fora", sendo adicionado ao preço da mercadoria.
Este, o IPI, não faz parte da receita bruta. Aquele, o ICMS, faz parte.
2.2.3- Do IRPJ e CSLL
Por sua vez, em relação ao IRPJ e à CSLL, que, na apuração pelo lucro presumido, caso da Impetrante, têm por base de cálculo o resultado da aplicação de um determinado percentual sobre o valor da receita bruta, não vejo como excluir dessa receita bruta o valor do ICMS, para só depois apurar a base de cálculo daqueles tributos.
Não há base legal para isso, pelas razões expostas acima.
Com efeito, pela Lei só não entra na composição da receita bruta os impostos não cumulativos e cobrados destacadamente nas notas fiscais, como ocorre, por exemplo, com o IPI. E, conforme vimos, o ICMS, embora não cumulativo, não é cobrado destacadamente, uma vez que faz parte indissociável do próprio preço, sendo indicado na nota fiscal apenas para mero controle do Fisco. Aliás, também como vimos acima, o ICMS incide sobre o seu próprio valor.
Se este Órgão Judicial atendesse a esse pleito da Impetrante, estaria ferindo a regra do § 6º do art. 150 da Constituição da República, segundo a qual qualquer tipo de desoneração tributária só pode ser concedida por Lei específica.  Vale dizer, esse Órgão Judicial estaria usurpando as funções do Chefe do Poder Executivo Federal que, por força da redução de receitas, tem competência exclusiva para iniciativa da elaboração da Lei(art. 165 da Constituição) e do Poder Legislativo, na confecção da Lei de iniciativa do Chefe do Poder Executivo.
Ademais, não há como aplicar, quanto ao IRPJ e CSLL, o  entendimento da Suprema Corte consignado no RE nº 574.706/PR, porque específico para COPIS-PASEP e COFINS, contribuições voltadas para a saúde pública.
2.2.4. Da aplicação do entendimento do RE nº574.706/PR ao ISS
A Impetrante também pediu que se aplique o entendimento do mencionado julgado da Suprema Corte com relação ao Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza - ISSQN, regido pela Lei Complementar 116, de 2003, da competência dos Municípios, e pelas Leis de cada Município. 
Ou seja, quer também que se retire da base de cálculo do IRPJ e da CSLL
Data venia, isso não me parece possível.
Primeiro, porque o argumento de que o valor relativo ao ISS não é da Empresa, mas sim do Município, é apenas em parte verdadeiro, porque entra na receita bruta da Empresa, compõe o seu preço e finda por ser repassado para o Cliente da Empresa. Na verdade, quem paga, finalisticamente esse tributo, é 0 Cliente da Empresa e esta apenas o repassou para o Município. 
Se não entrasse na composição da receita bruta, seria bom, porque a Empresa poderia cobrar um valor menor do seu Cliente pelos serviços prestados(e isso é uma prova de que esse imposto é indireto), mas essa exclusão depende de Lei e o Judiciário não pode legislar, conforme acima demonstrado.
Segundo, o ISS, embora seja submetido ao lançamento poro  homologação e um imposto indireto, porque repassado no preço dos serviços,  bem parecido, pois, com o ICMS, tem o restante da sua estrutura jurídico-legal e constitucional bem diversa, pois não é um imposto não cumulativo, tampouco o seu valor faz parte da sua própria base de cálculo(v. no subitem supra o detalhamento sobre a estrutura jurídico-legal do ICMS), pelo que, segundo a definição de receita bruta, acima estudado, não pode ser dela extraído.
Ora, constata-se na ementa do mencionado Recurso Extraordinário - RE nº 574.706/PR, transcrita no subitem 2.2.1 acima, toda a sua fundamentação foi voltada para o ICMS, um imposto estadual,  tendo em vista a sua estrutura jurídico-legal e constitucional, especialmente o princípio da não cumulatividade ao qual se submete, não tendo, pois, como estender para o ISS, imposto municipal, não submetido à não cumulatividade,  esse julgado da Suprema Corte.
Diante de todo o exposto, o indeferimento do pleito liminar é medida que se impõe.

3. Conclusão

Diante de todo o exposto:
3.1 - Indefiro o pedido de concessão de medida liminar.
3.2 -Notifique-se a DD. Autoridade coatora, para apresentação de informações (art. 7º,I, da Lei nº 12.016, de 2009) e também que se dê ciência desde writ ao órgão de representação judicial da UNIÃO(a Procuradoria Geral da Fazenda Nacional em Recife-PE), para os fins do inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009.
3.3 - No momento oportuno, encaminhem-se os autos ao Ministério Público Federal
3.4 - Sucessivamente, voltem-me os autos conclusos para julgamento;
 Intimem-se. Cumpra-se.

Recife, 06.03.2018

Francisco Alves dos Santos Júnior
  Juiz Federal, 2aVara-PE.