quarta-feira, 13 de abril de 2011

COISA JULGADA. IMPOSSBILIDADE DO JUÍZO, POR ONDE O FEITO TRAMITOU, DAR-SE POR ABSOLUTAMENTE INCOMPETENTE PARA A EXECUÇÃO.

A Juíza Estadual prolatou uma sentença, que foi mantida pelo respectivo Tribunal, tendo o acórdão deste transitado em julgado. O feito desceu à primeira instância para a execução. A Juíza deu-se por absolutamente incompetente e remeteu o feito para o juízo federal, porque se tratava de reajuste de pensão previdenciária, paga pelo INSS. Isso é processualmente possível? Veja o que decidiu o Juiz Federal que recebeu o feito.
Boa leitura!





PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª REGIÃO
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
2ª VARA

Processo nº 0004703-41.2011.4.05.8300
Classe: 29 AÇÃO ORDINÁRIA (PROCEDIMENTO COMUM ORDINÁRIO)
AUTOR: M. A. DE L. S.
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS

C O N C L U S Ã O

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

Recife, 13/04/2011

Encarregado(a) do Setor


D E C I S Ã O

Relatório

Este feito tramitou pela 1ª Vara de Acidentes do Trabalho da Comarca do Recife, da órbita da Justiça Estadual, onde foi julgado em primeira e em segunda instância , tendo o respectivo v. Acórdão transitado em julgado, conforme certidão de fl. 179.

Quando os autos retornaram para início da execução, a d. Magistrada da mencionada Vara, Dra. Jeanine Sodré da Mota, lançou a r. decisão de fls. 131-135, dando-se por absolutamente incompetente e remeteu o feito para esta Justiça Federal, porque relativo a matéria previdenciária(reajuste de pensão), paga pelo Instituto Nacional do Seguro Social – INSS.

Fundamentação

Reza o Código de Processo Civil que a execução de título judicial dá-se no juízo que decidiu a causa no primeiro grau de jurisdição(art. 575-II, Código de Processo Civil).

A d. Magistrada Estadual invocou, na r. decisão mencionada no relatório supra, para dar-se por absolutamente incompetente e remeter o feito para este juízo federal, o art. 113, § 2º do Código de Processo Civil.

Ocorre que, se as Partes não podem alegar incompetência absoluta do juiz depois do trânsito em julgado da sentença por ele proferida(RSTJ 63/303 e REsp 6.176-DF-AgRg, Rel. Min. Dias Trindade, julgado em 12.03.1991, por unanimidade da 3ª Turma, in DJU de 08.04.1991, p. 3.884 ), tampouco suscitá-la na fase de execução da sentença , data maxima venia, por óbvio, o Magistrado também não pode reconhecer-se por absolutamente incompetente quando o feito, por ele julgado, teve a sentença mantida por acórdão do respectivo Tribunal, que transitou em julgado, e já está em fase de execução.
Nota 1 - Apud NEGRÃO, Theotônio & GOUVÊA, José Roberto Federreíra, Código de Processo Civil e Legislação Processual Em Vigor, 35ª Edição, São Paulo: Saraiva, 2003, p. 217[nota 6ª ao art. 113 do Código de Processo Civil].
Nota 2 - Brasil. E. Superior Tribunal de Justiça. 1ª Turma, REsp 114.568-RS, Rel Min. Humberto Gomes de Barros, julgado em 23.06.1998, votação unânime, JU de 24.08.1998, p. 11. Idibdem.

No mesmo sentido, mutatis mutandis, decidiu a 1ª Seção do E. Superior Tribunal de Justiça:

“Transitada em julgado a sentença do juiz federal, já na fase de execução é incabível remeter-se os autos a outro ramo do Poder Judiciário”.
Nota 3 - Brasil. E. Superior Tribunal de Justiça. 1ª Seção. CC 2.800-0-CE, Rel. Min. José de Jesus Filho, julgado em 20.04.1993, votação unânime. DJU de 10.5.1993, p. 8.584.
Apud obra referida na nota de rodapé “1”, p. 651[nota 6ª ao art. 575 do Código de Processo Civil].

E mais recentemente, a 2ª Seção dessa mesma E. Corte, decidiu no mesmo sentido, relativamente à decisão de Juiz Estadual que, depois do trânsito em julgado do título judicial executivo, declinara a competência para órgão de outro ramo do Poder Judiciário, sob alegada incompetência absoluta, verbis:

“CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. COISA JULGADA. SENTENÇA DE MÉRITO COM TRÂNSITO EM JULGADO PROFERIDA PELO JUÍZO ESTADUAL. COMPETÊNCIA PARA O JULGAMENTO DA EXECUÇÃO DA SENTENÇA. APLICAÇÃO DO ART. 575, II, E 584, III C/C 449 DO CPC. I - Presente a coisa julgada, esta prevalece sobre a declaração de incompetência, ainda que absoluta, em observância aos princípios da coisa julgada, segurança jurídica, economia e celeridade processual. II - É competente para processar e julgar a execução de título judicial o Juízo que proferiu a sentença de conhecimento, conforme o disposto nos arts. 575, II, e 584, III c/c 449 do CPC. Conflito de Competência conhecido para declarar a competência do Juízo Suscitado (1ª Vara Cível de Barra Mansa/RJ).
(CC 200701459236, SIDNEI BENETI, STJ - SEGUNDA SEÇÃO, 18/04/2008)”.
Nota 4 - Disponível em www.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?tipo_visualizacao=null&livre=200701459236&b=ACOR

No caso, data maxima venia, apenas se fosse o julgado em execução anulado em ação regressiva(art. 485-II do Código de Processo Civil), é que o próprio Tribunal que o anulasse poderia encaminhar o feito para o Órgão do Poder Judiciário que entendesse por competente.

Então, por todos os ângulos que se examine a questão, data maxima venia, não se sustenta a r. decisão da mencionada d. Magistrada Estadual, pois, além de expressamente previsto no art. 575-II do Código de Processo Civil, resta sedimentado o entendimento jurisprudencial, no sentido de que o julgado executa-se no juízo de primeiro grau onde se prolatou a sentença.

Registro, finalmente, que o conjunto dos entendimentos expressados nas Súmulas 150, 224 e 254 do E. Superior Tribunal de Justiça, tendo em vista os princípios da celeridade e da efetividade processuais, levam à conclusão de que cabe ao Juiz Federal decidir sobre a sua competência, obviamente cabendo ao Juiz Estadual, caso não concorde, levantar Conflito Negativo de Competência perante o E. Superior Tribunal de Justiça.


Conclusão

POSTO ISSO, tenho que não é competente este juízo federal para executar titulo judicial decorrente de coisa julgado de juízo estadual, cabendo a este essa competência, pelo que determino que este feito retorne ao mencionado juízo estadual de origem, para a execução, após baixa neste juízo federal.

Com urgência.

P. I.
Recife, 13 de abril de 2011.

Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE

terça-feira, 12 de abril de 2011

FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS: SUA BASE DE CÁLCULON E OS INCENTIVOS FISCAIS E FINANCEIROS DA UNIÃO.

Segue uma sentença na qual se discute interessante matéria de finanças públicas, no campo das receitas tributárias, envolvendo a fórmula pela qual se calcula os valores que são destinados ao Fundo de Participação dos Municípios, que envolvem transferências constitucionais tributárias obrigatórias da União para os Muncípios.
Como se sabe, a União pode criar, por Lei, incentivos fiscais na área dos seus tributos, mediante isenção, redução de base de cálculo, redução de alíquota e etc, e, também por Lei, pode criar incentivos financeiros(por exemplo, transferências financeiras para determinados fundos). Os primeiros estão no campo do Direito Tributário, os segundos na área do Direito Financeiro.
Os incentivos fiscais e os incentivos financeiros podem ser excluídos do montante da receita do IPI e do IR antes do cálculo dos valores do Fundo de Participação dos Municípios?
É disto que trata a sentença que segue.
Boa leitura!

PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2009.83.00.012653-9 – Classe 029 – Ação Ordinária
Autor: MUNICÍPIO DE LIMOEIRO (OAB-PE 024148 – Jonas Gomes de Moura Neto)
Réu: UNIÃO FEDERAL – FAZENDA NACIONAL (Procurador – Joaquim Dias Filho)

Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2010.

Sentença tipo A


Ementa:- FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS. BASE DE CÁLCULO. OUTROS FUNDOS. DEDUÇÃO DA REPASSE DESTES ANTES DO CÁLCULO DO REPASSE DAQUELE. NÃO CABIMENTO.

A União tem legitimidade constitucional para conceder isenção e outras renúncias fiscais no campo do IPI e do IR, de cunho eminentemente tributário, mesmo que implique em redução do respectivo produto da arrecadação.

Mas a União não pode deduzir do produto da arrecadação desses impostos, após sua contabilização, despesas relativas a repasses para outros Fundos, de cunho financeiro(não tributário), criados por Lei, antes do cálculo e repasse para o Fundo de Participação dos Municípios, repasse este estabelecido em norma constitucional.

Procedência parcial.




Vistos etc.

O MUNICÍPIO DE LIMOEIRO, devidamente qualificado na Inicial, ajuizou, em 14.08.2009, esta ação ordinária contra a UNIÃO – FAZENDA NACIONAL, alegando, em suma, que sem previsão constitucional ou infraconstitucional a União, ao compor o montante do Fundo de Participação dos Municípios – FPM do Município-Autor, procedera à dedução dos benefícios, dos incentivos, das isenções e das restituições fiscais, conforme documentos que teria acostado à inicial; que a parte ré estaria cometendo uma grave ilegalidade, eis que tal procedimento seria inconstitucional; que a atitude da União estaria acarretando ao Autor um prejuízo imensurável, pois o montante do FPM sofrera uma drástica redução. Sustentou, ainda, que 23,5% da arrecadação do IR e do IPI pertencem aos Municípios, tendo a União o dever de arrecadar os referidos impostos e realizar a transferência financeira para o Fundo de Participação dos Municípios; que, entretanto, a Ré ao fazer a transferência do montante arrecadado para o FPM estaria procedendo às deduções dos valores dos benefícios, incentivos e isenções fiscais de IPI e de IR; que a parte ré poderia conceder incentivos fiscais, benefícios, isenções e até perdoar dívidas, contudo da parte que constitucionalmente seria destinada a mesma, não podendo para tanto utilizar-se das receitas que constitucionalmente seria mera arrecadadora e fiscalizadora, eis que tal procedimento ocasionaria um total desequilíbrio na repartição de receitas tributárias; que para que a autonomia política concedida pelo constituinte aos entes federados seja real, efetiva e não apenas virtual, cumpre que se preserve com rigor a sua autonomia financeira, não se permitindo no tocante à repartição de receitas tributárias, qualquer condicionamento arbitrário dos entes responsáveis pelos repasses; que a União estaria utilizando recursos que constitucionalmente pertencem aos Municípios, os quais seriam bastante reduzidos, para conceder favores fiscais para determinadas empresas. Teceu outros comentários. Transcreveu decisões judiciais favoráveis à sua tese. Requereu a concessão de antecipação de tutela para determinar que a União utilizasse para o cálculo da cota parte do FPM do Município de Limoeiro a base de cálculo de 23,5% do produto da arrecadação do IR e do IPI (art. 159, I, “b” e “d” da CF/88), sem a exclusão dos valores de todos os benefícios, incentivos e isenções fiscais de IR e de IPI concedidos pelo Governo Federal; a notificação do Secretário do Tesouro Nacional e do Secretário da Receita Federal do Brasil para cumprimento da ordem, acaso concedida, determinando-se ainda a comprovação contábil do cumprimento da tutela antecipada, sob pena de multa diária; a citação da União; a notificação do Réu para apresentar a documentação requerida no tópico 4 da inicial, com a devida comprovação contábil; a procedência da demanda, confirmando-se a tutela antecipada, para que o montante do FPM para o cálculo da cota parte do Município-Autor seja constituído por 23,5% do produto da arrecadação do IR e do IPI (art. 159, I, “b” e “d” da CF/88) sem a exclusão dos valores de todos os benefícios, incentivos e isenções fiscais de IR e de IPI concedidos pelo Governo Federal; que a União procedesse à devolução de toda a quantia não repassada ao Município-Autor, a título de FPM, nos últimos 05 (cinco) anos, devidamente corrigida, a ser apurado em sede de liquidação de sentença; a notificação do Ministério Público Federal. Protestou o de estilo e atribuiu valor à causa.
Inicial instruída com instrumento de procuração e documentos, às fls. 34-165.
Despacho determinando a livre distribuição do feito, às fls. 166-167.
Decisão fundamentada deferindo em parte o pedido de antecipação de tutela, às fls. 168-171.
A União – Fazenda Nacional ingressou com petição requerendo que fosse promovida sua nova citação/intimação, desta feita observando-se a prerrogativa disposta na Lei nº 11.033/2004, às fls. 175-176.
O Município de Limoeiro noticiou a interposição de agravo de instrumento no E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à fl. 177.
Foi juntado aos autos cópia do Ofício nº 2009.168/PRE noticiando decisão exarada nos autos da Suspensão de Liminar nº 2009.05.00.088900-8 (SL nº 4080 – PE), interposta pela Fazenda Nacional no E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, em que restou deferido o pedido de suspensão para sustar os efeitos da tutela antecipada (fls. 220-224).
A União (Fazenda Nacional) noticiou a interposição de agravo de instrumento no E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, à fl. 234.
A UNIÃO (Fazenda Nacional) apresentou Contestação, às fls. 262-287, aduzindo, em suma, que o FPM constituiria um mecanismo de repartição de receitas tributárias, e sua finalidade seria a transferência de recursos que, conforme a competência tributária, pertencem à União e teriam sido efetivamente arrecadado; que a transferência constitucional de receitas tributárias aos Municípios, composta de 22,5% da arrecadação do IR e do IPI, seria feita com base no real produto da arrecadação; que as restituições de IR, os incentivos fiscais e as deduções ou exclusões determinadas constitucionalmente, a exemplo da prevista no § 1º do art. 159 da CF/88, não comporiam a base de cálculo do FPM porque tais valores não teriam chegado a ingressar no patrimônio da União, eles não seriam considerados receita, não sendo, portanto, classificados como valor arrecadado; o quantum destinado à repartição do FPM, proveniente do IPI e do IR, deveria resultar da aplicação do percentual de 22,5% sobre o produto da arrecadação, incluídos a correção monetária, os juros e as multas, abatidas as restituições, os incentivos fiscais, as parcelas de que tratam os arts. 157, I, e 158, I, da CF/88 e, até 1999, art. 72, I e II do ADCT; que somente poderia ser objeto de repartição a verba tributária efetivamente arrecadada, não sendo nela incluída a decorrente de incentivos fiscais, pois não se levaria em consideração a expectativa da arrecadação, mas sim o que efetivamente ingressara nos cofres da União; que seria com base na receita efetiva de tributos, aí abatidos, ou não considerados, os valores decorrentes de incentivos fiscais, que se realiza a partilha. Aduziu acerca do sistema de repartição de receitas na modalidade indireta; do caráter extrafiscal do IPI e IR; da necessária observância ao pacto federativo; da exclusão dos incentivos fiscais; da inaplicabilidade da decisão proferida no RE 572.762/SC ao presente caso; da inaplicabilidade do RE 572.762/SC diante da diferença dos sistemas de repartição; do ativismo judicial e a insegurança jurídica. Sustentou, ainda, que a procedência do pedido poderá afastar toda uma sistemática de arrecadação e distribuição de tributos, tudo estruturado nos mais específicos parâmetros constitucionais e legais; que a concessão de antecipação de tutela em ações desse tipo traria em seu bojo potencial risco de grave lesão à economia e à ordem públicas, posto que implicará numa decisão que não se harmoniza com a ordem jurídica, bem como o impacto mensal da decisão em nível nacional, haja vista que o sistema não faria a implementação apenas em relação a um Município, importando um acréscimo de R$ 20.500.00,00 (vinte milhões e quinhentos mil reais), consoante informação técnica da Secretaria do Tesouro Nacional em anexo à Contestação; que na parcela do FPM representaria um acréscimo de R$ 4,6 milhões reais, apenas no mês de abril, totalizando no ano o valor de R$ 55.200.000,00 (cinqüenta e cinco milhões e duzentos mil reais); que a decisão judicial pretendida causa um enorme prejuízo para a União, não só no aspecto da ordem econômica, mas também no que tange à ordem pública, compreendida no âmbito da ordem administrativa em geral. Teceu outros comentários. Requereu a improcedência dos pedidos, condenando-se o Autor na verba honorária arbitrada no máximo legal. Protestou o de estilo e pediu deferimento.
Cópia de decisão proferida nos autos do agravo de instrumento 101.335/PE, 2009.05.00.090146-0, interposto pela União(Fazenda Nacional), deferindo o pedido de suspensão da decisão agravada (fls. 289-292 e 297-300).
Cópia do v. Acórdão relativo ao agravo de instrumento indicado no parágrafo anterior, no qual a 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, deu provimento(fls. 335-340.
Réplica à Contestação, às fls. 304-328.

É O RELATÓRIO.
PASSO A DECIDIR.

FUNDAMENTAÇÃO

Assim fundamentei a decisão inicial, acostada às fls. 168-171, na qual concedi parcialmente o pedido de antecipação da tutela:

1. Não tenho dúvida que estamos diante de uma matéria de direito financeiro, que envolve a distribuição das receitas tributárias, tratadas nos arts. 157 a 162 da Constituição da República e em algumas regras do seu Ato das Disposições Constitucionais Tributárias.

2. No v. Acórdão do Plenário C. Supremo Tribunal Federal , invocado na petição inicial, cuja íntegra, inclusive dos votos dos Ministros dessa Corte, foi juntada e se encontra às fls. 87-121, houve análise e julgamento dos reflexos de incentivo dado pelo Estado de Santa Catarina, no campo financeiro(e não tributário) do ICMS, consistente em técnica estabelecida no art. 25 e no § 2º do art. 26 da Lei nº 1.490 daquele Estado, transcritos no voto do Min. Cezar Peluso(fls. 111-112), que transcrevo:
“Art. 25 – A liberação das parcelas mensais obedecerá o seguinte:
I – após o recolhimento do ICMS no prazo legal pela empresa, o FADESC repassará o valor da parcela ao agente financeiro, no prazo máximo de 15 dias, contado da data do respectivo recolhimento;
II – o agente financeiro repassará o valor da parcela à empresa, no prazo máximo de 2 dias,contado da data do recebimento dos recursos do FADESC”.
E o art. 26, § 2º, diz o seguinte:
“Art. 26 – (...).
§ 2º - Não caberá liberação quando a empresa não recolher o ICMS no prazo regulamentar”.
Mencionado Ministro, analisando esse dispositivo, assim concluiu;
“Noutras palavras, o ICMS entra na contabilidade do Estado. O Estado tira o dinheiro, repassa-o para o FADESC e este o repassa à empresa. Então, o que o Estado está fazendo – a levar a sério o que está aqui no acórdão do Tribunal de Santa Catarina – é uma fraude à Constituição, porque o Estado deduz, do montante do produto total da arrecadação do ICMS, o valor correspondente aos repasses. (...). Ou seja, altera a base de cálculo do que pertence aos Municípios.”.
Deflui-se desse esclarecedor voto que realmente não se trata de um incentivo tributário, mas sim de um incentivo financeiro. Ou seja, não houve isenção tributária, tampouco redução de alíquota ou de base de cálculo do ICMS. Vale dizer, não houve uma renúncia tributária, pois o Estado arrecadou todo o valor do imposto e depois o utilizou em operação financeira. Dessa forma, ao deduzir o valor desse incentivo financeiro do montante da arrecadação do ICMS para, só depois, calcular os 25% que o inciso IV do art. 158 da Constituição da República assegura aos Municípios, incidiu em gritante inconstitucionalidade.
Portanto, corretíssimo o entendimento do Plenário do C. Supremo Tribunal Federal a respeito da inconstitucionalidade da mencionada prática do Estado de Santa Catarina.

3. No presente caso, o Município-autor quer, via antecipação de tutela, que se determine à União que calcule sua cota-parte do FPM sobre os valores do IPI e do IR, considerando valores de isenções, benefícios e incentivos fiscais, como se tais valores tivessem sido arrecadados
Não há dúvida que a União tem competência plena para legislar sobre o IPI e IR(art. 153 da Constituição da República c/c o Parágrafo Único do art. 6º do Código Tributário Nacional).
Não há nenhuma regra na Constituição da República que a impeça de, por meio de Lei específica(§ 6° do art. 150 dessa Carta), conceder qualquer tipo de benefício e/ou incentivo fiscal com relação a esses tributos.
Há inúmeras formas de a Fazenda Pública renunciar a receita tributária. Caso essa renúncia se concretize, por exemplo, por mera isenção do IPI, isso implicará em redução da arrecadação desse imposto, e não haverá entrada nos cofres da União da respectiva parcela, de forma que o montante do IPI, para os fins de distribuição para o FPM, também sofrerá redução.
E se isso acontece, não se estará diante de um problema jurídico-tributário, mas sim de problema político-financeiro-administrativo, que deve ser resolvido nesse campo.
Lembro que, quando do advento da Lei Complementar nº 87, de 1996, a União passou a pagar aos Estados uma compensação financeira, para repor a perda de receita do ICMS, que deixou de ser arrecada na exportação de produtos primários e semi-elaborados, negociada no Congresso Nacional e consignada em texto dessa Lei Complementar. Mas, mesmo que não tivesse sido criada essa compensação financeira, mencionada Lei não seria inconstitucional, porque tinha, como tem, respaldo na alínea “e” do inciso XII do § 2º do art. 155 da Constituição da República.
Relativamente a esse tipo de renúncia fiscal, a União terá apenas mais uma obrigação legal, que é a prevista no inciso V do § 2º do art. 4º da Lei Complementar 101, 04.05.2000, a famosa Lei de Responsabilidade Fiscal, verbis:
“Art. 4o A lei de diretrizes orçamentárias atenderá o disposto no § 2o do art. 165 da Constituição e:
I – (...).
§ 1o Integrará o projeto de lei de diretrizes orçamentárias Anexo de Metas Fiscais, em que serão estabelecidas metas anuais, em valores correntes e constantes, relativas a receitas, despesas, resultados nominal e primário e montante da dívida pública, para o exercício a que se referirem e para os dois seguintes.
§ 2o O Anexo conterá, ainda:
I – (...).
II – (...).
III – (...).
IV – (...).
V - demonstrativo da estimativa e compensação da renúncia de receita e da margem de expansão das despesas obrigatórias de caráter continuado.”
Ou seja, a União terá que demonstrar no denominado Anexo de Metas Fiscais, que acompanhará o projeto de Lei de Diretrizes Orçamentária, como compensará a perda de receita em decorrência das noticiadas renúncias fiscais. Note-se que essa Lei não obriga que a compensação de receita terá que ser do mesmo tributo, mas sim no total das receitas, no caso, das receitas correntes.
E o Chefe do Poder Executivo da União deve ter atendido essa exigência, pois, como se sabe, todos os anos está vindo à luz uma nova Lei de Diretrizes Orçamentárias.
Se não tivesse feito essa demonstração, certamente os cultos Parlamentares do nosso Congresso Nacional não teriam transformado em Lei referidos projetos.

4. No entanto, a autorização legal para que os Contribuintes do IR indiquem parte do IR que têm a pagar para determinado fundo, como o PIN , PROTERRA, etc, gera fenômeno financeiro semelhante ao do incentivo do Estado de Santa Catarina, analisado no item “2” supra, pois a receita total do IR devido entra nos cofres da União, é contabilizada e, posteriormente, repassada para tais Fundos o percentual previsto em Lei.
E o documento de fl. 64 demonstra com clareza que é exatamente assim que ocorre.
Então, mutatis mutandis, apenas com relação aos repasses que a União faz para tais fundos(PIN, PROTERRA, etc.), é que se aplica o acima referido v. julgado do C. Supremo Tribunal Federal, cabendo assim parcial antecipação da tutela.

Decidiram os d. Magistrados da 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no v. acórdão do Agravo de Instrumento acima referido, que a União, antes de calcular a parcela que deve repassar para o Fundo de Participação dos Municípios-FPM, pode deduzir do produto da arrecadação do IR e do IPI, já contabilizado, as parcelas destinadas a outros Fundos, tipo PIN, PROTERRA e etc., criados por Lei, porque, segundo argumentaram, a regra constitucional que trata do assunto estabeleceria que o valor do repasse do FPM deve ser calculado “com base no produto da arrecadação, e não na receita bruta, ...”.
Data maxima venia, não há diferença, no caso, entre “produto da arrecadação”, expressão utilizada nos artigos 158 e 159 da Constituição da República, e “receita bruta”.
Na verdade, no caso em debate, confundem-se.
O que, data maxima venia, não se pode admitir é que a União crie, por Medidas Provisórias e por Leis Ordinárias, outros Fundos, de cunho financeiro(extrai-se da contabilidade pública o quantum para repasse)e os financie com parte das receitas constitucionais dos Municípios, obtidas via Fundo de Participação dos Municípios-FPM, por força dos referidos arts. 158 e 159 da Constituição da República.
A vingar mencionada tese, data maxima venia, a União, a médio prazo, poderá, fazendo favores a um universo de interesses, não poucas vezes eleitoreiros, esvaziar totalmente o Fundo de Participação dos Municípios-FPM, criando, por Medidas Provisórias e por Leis Ordinárias, às custas deste, inúmeros outros Fundos, como os acima apontados(PIN, PROTERRA e etc.), de forma que esvaziaria de uma vez por todas o Fundo de Participação dos Municípios-FPM, o qual, nos últimos tempos, vem sofrendo grande redução em face das isenções do IPI dadas pela União, isenções essas constitucionalmente legítimas, porque tributárias, conforme analisadas no item “3” da decisão acima transcrita.
Assim e tendo em vista o d. entendimento do C. Supremo Tribunal Federal. indicado no item “2” da decisão cima transcrita, o qual, mutatis mutandis, aplica-se ao presente caso, data maxima venia dos d. Magistrados da 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, tenho por bem manter a decisão inicial deste juízo.

Conclusão:

Posto isso, julgo parcialmente procedentes os pedidos desta ação e condeno a União a calcular a cota-parte do Fundo de Participação dos Municípios-FPM do Município-autor sobre o produto da arrecadação do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza e sobre o produto da arrecadação do Imposto sobre Produtos Industrializados antes de deduzir dessas arrecadações as parcelas que devem ser repassadas para outros Fundos, tipo PIN, PROTERRA e etc, sob pena de pagamento de multa, a favor do Município-Autor, correspondente a 30%(trinta por cento)do valor da indevida redução da sua cota-parte no FPM, sem prejuízo da execução forçada da diferença entre o valor realmente devido e o valor reduzido e também sem prejuízo da responsabilização funcional(improbidade administrativa), civil e criminal do Servidor ou Dirigente que der azo ao pagamento dessa multa.
Outrossim, condeno a União a repassar para o Município-autor as diferenças da sua cota-parte do Fundo de Participação dos Municípios-FPM de períodos anteriores, nos quais os respectivos cálculos foram feitos sobre o produto da arrecadação dos mencionados impostos reduzido das parcelas repassadas para os outros Fundos acima referidos, observada a prescrição qüinqüenal, com correção monetária pelos índices do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal, incidentes a partir dos respectivos vencimento e acrescidos de juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados da mesma data e incidentes sobre o valor já monetariamente corrigido, sendo que a correção monetária e os juros, a partir do advento da Lei nº 11.960, de 2009, serão calculados na forma nela prevista.
Finalmente, condeno a União em verba honorária, que, ante o esforço e dedicação dos Advogados do Município-autor, Drs. Jonas Gomes de Moura Neto e Jorge Carriço Marinho de Souza, arbitro em 15%(quinze)por cento do valor total das diferenças que venham a ser apuradas, na forma do art. 475-B do Código de Processo Civil, ou por outra forma que venha a ser fixada na execução desta Sentença.
De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição.

P.R.I.

Recife, 18 de agosto de 2010.


Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal da 2ª Vara/PE