quinta-feira, 18 de fevereiro de 2021

PPP. EMISSÃO. UMA OBRIGAÇÃO DO EMPREGADOR.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O Empregador, do setor público ou privado, é obrigado a fornecer ao Empregado o PPP, para que este busque, perante o INSS, a possível aposentadoria especial. 

A sentença que segue trata deste problema. 

Boa leitura.


Obs.: Minuta de sentença feita parcialmente pela Assesora Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques.


PROCESSO Nº: 0811010-94.2019.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

AUTOR: E P DA S
ADVOGADO: V T De A C
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZACÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

Sentença tipo A


EMENTA:- PREVIDENCIÁRIO. EMISSÃO DE PERFIL PROFISSIOGRÁFICO PREVIDENCIÁRIO - PPP. DIREITO DO SEGURADO, SOB PENA DE SER CAUSADA DIFICULDADE DESARRAZOADA NA COMPROVAÇÃO DA ATIVIDADE ESPECIAL

-Parcial procedência do pedido.


Vistos etc.

1-Relatório

E P DA S, qualificado na Petição Inicial, ajuizou esta "Ação de Obrigação de Fazer" em 20.06.2019, contra o INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA, na qual pretende a condenação do Réu a "(...) proceder com o fornecimento do Perfil Profissiográfico Previdenciário, para fins de comprovação do período especial trabalhado, junto à Previdência Social (...)". Alegou, em síntese, que: teria sido admitido no INCRA - Unidade Agroindustrial Caxangá, em 22/09/1983, na função de serralheiro, com vínculo celetista; em 12/12/1990, por força do art. 7º da Lei nº 8.162/90, o contrato individual de trabalho teria sido extinto, e o Autor teria passado a fazer parte do regime jurídico único instituído pela Lei nº 8.112/90; recentemente, teria solicitado à Autarquia Ré a elaboração de Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP relativo ao período em que teria exercido a atividade insalubre de ajudante de serralheiro e de serralheiro; todavia, a Ré teria se recusado a elaborar o documento, sob a alegação de que não teria o laudo técnico de condições ambientais da época; o PPP seria indispensável para garantir direito decorrente da relação de trabalho. Teceu outros comentários e requereu, ao final: "l) Seja julgada procedente a presente ação, condenando-se o Réu a proceder com o fornecimento do Perfil Profissiográfico Previdenciário, para fins de comprovação do período especial trabalhado, junto à Previdência Social em até 30 dias, sob pena de multa de R$500,00 por dia de descumprimento; II) Seja o Réu condenado ao pagamento das custas e honorários advocatícios; III) A citação do Réu, na pessoa de seu representante legal, para, querendo, contestar a presente ação, sob pena de confissão e revelia; IV) A produção de todos os meios de provas no direito admitidas, que desde logo ficam protestadas e requeridas; V) A concessão dos benefícios da Justiça Gratuita, nos termos da Lei 1.060/50." Atribuiu valor à causa e juntou instrumento de procuração e documentos.

Concedido, à parte autora, o benefício da assistência judiciária gratuita e determinada a citação do Réu.

Regularmente citado, o INSTITUTO NACIONAL DE COLONIZAÇÃO E REFORMA AGRÁRIA - INCRA apresentou Contestação  na qual alegou, em síntese, que: quanto ao exercício das atividades de Ajudante de Garagem, Ajudante de Serralheiro e Serralheiro, não constaria na pasta funcional do Autor quaisquer informações acerca da exposição a agentes nocivos, nem laudo técnico; apenas constaria uma declaração acerca de atividade insalubre, no entanto, com a ressalva de que o INCRA não disporia de Laudo Técnico Pericial; diante da inexistência de LTCAT, não haveria documento técnico possível de subsidiar um eventual PPP; sustentou a impossibilidade de conversão de tempo especial prestado no serviço público; aduziu que o direito ao benefício de Aposentadoria Especial não se confundiria com o direito à conversão do tempo especial em comum; e acrescentou que o recebimento de insalubridade, por si só, não geraria direito ao reconhecimento de tempo de serviço especial. Teceu outros comentários e requereu, ao final: a improcedência dos pedidos e, ante o princípio da eventualidade, a aplicação da isenção de custas e que os honorários advocatícios fossem fixados em conformidade com a Súmula nº 111 do STJ. Protestou o de estilo e apresentou documentos.

O Autor apresentou Réplica,  na qual refutou os fundamentos lançados na Contestação do INCRA, e pugnou pela realização de prova pericial, nomeando-se Engenheiro de Segurança do Trabalho para emitir laudo técnico-pericial acerca da atividade desempenhada pelo Autor.

2- Fundamentação

2.1- Do requerimento de realização de prova pericial formulado pelo Autor

A prova pericial é utilizada sempre que houver necessidade de conhecimento técnico ou científico para esclarecer determinados fatos da causa.

Fixada essa premissa tenho que, no caso em apreço, a prova pericial mostra-se desnecessária, pois o reconhecimento de atividade especial não faz parte do pedido da presente ação, que se restringe na obtenção da condenação do Réu em obrigação de fazer, consistente em fornecer Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP  ao Autor.

Não prospera, pois,  o requerimento do Autor de realização de perícia técnica para a emissão de laudo técnico-pericial acerca da atividade desempenhada pelo Autor.

2.2- Do mérito

Pretende-se, com esta ação, a condenação do Réu a fornecer o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ao Autor, para fins de comprovação, junto à Previdência Social, de período trabalhado nas funções de ajudante de serralheiro e na função de serralheiro, por ele reputado de natureza especial.

A Lei nº 8.213/91, que disciplina o Regime Geral de Previdência Social - RGPS, no art. 58, s §§1º e 4º, estabelece que a comprovação da exposição do segurado aos agentes nocivos será feita mediante formulário, na forma estabelecida pelo INSS, emitido pela empresa ou seu preposto, com base em laudo técnico de condições ambientais expedido por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.

Atualmente (a partir de 1º de janeiro de 2004), o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP é o formulário que deve conter o histórico laboral do trabalhador, com os dados administrativos (descrição das atividades exercidas), os registros ambientais, dentre outros dados destinados a prestar informações ao INSS relativas à efetiva exposição a agentes nocivos.  

No âmbito da administração pública federal, após o ajuizamento de diversos mandados de injunção, o Supremo Tribunal Federal proferiu decisão paradigmática no MI 721, publicada em 30.11.2007, assegurando-se a aplicação subsidiária das regras sobre aposentadoria especial previstas no RGPS, para as atividades prestadas por servidor público vinculado ao Regime Próprio de Previdência Social - RPPS.

Na sequência, a Suprema Corte editou a Súmula Vinculante nº 33, com o seguinte teor:

"Aplicam-se ao servidor público, no que couber, as regras do regime geral da previdência social sobre aposentadoria especial de que trata o artigo 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, até a edição de lei complementar específica." (Publicado no DJe em 24/04/2014).

Consta no site do STF[1] que essa Súmula decorreu dos seguintes julgados:

"A aposentadoria especial de servidor público portador de deficiência é assegurada mediante o preenchimento dos requisitos previstos na legislação aplicável à aposentadoria especial dos segurados do Regime Geral de Previdência Social, até que seja editada a lei complementar exigida pelo art. 40, § 4º, II, da CF/1988. (...) 2. A eficácia do direito à aposentadoria especial objeto do art. 40, § 4º, da CF/1988 exige regulamentação mediante lei complementar de iniciativa privativa do presidente da República, de modo que cabe ao Supremo Tribunal Federal, ex vi do art. 102, I, q, da Lei Maior, o julgamento do mandado de injunção impetrado com o objetivo de viabilizar o seu exercício.
[MI 4.158 AgR-segundo, rel. min. Luiz Fux, P, j. 18-12-2013, DJE 34 de 19-2-2014.]

MANDADO DE INJUNÇÃO. APOSENTADORIA ESPECIAL DO SERVIDOR PÚBLICO. ART. 40, § 4º, DA CF/1988. AUSÊNCIA DE LEI COMPLEMENTAR A DISCIPLINAR A MATÉRIA. NECESSIDADE DE INTEGRAÇÃO LEGISLATIVA. 1. Servidor público. Investigador da polícia civil do Estado de São Paulo. Alegado exercício de atividade sob condições de periculosidade e insalubridade. 2. Reconhecida a omissão legislativa em razão da ausência de lei complementar a definir as condições para o implemento da aposentadoria especial. 3. Mandado de injunção conhecido e concedido para comunicar a mora à autoridade competente e determinar a aplicação, no que couber, do art. 57 da Lei 8.213/1991.
[MI 795, rel. min. Cármen Lúcia, P, j. 15-4-2009, DJE 94 de 22-5-2009.]".

No caso em apreço, com a contestação apresentada, o Réu anexou informação do "Serviço de Desenvolvimento Humano" da Autarquia, esclarecendo que "não consta na pasta funcional LTCAT - laudo técnico de condições ambientais do trabalho, passível de subsidiar um eventual PPP."(G.N.)

Ora, é certo que, do laudo técnico de condições ambientais do trabalho são extraídas as informações para elaborar o PPP; no entanto, embora inexistente o LTCAT na pasta funcional do ora Autor, não pode ser recusada a emissão do PPP sob tal argumento, pois se trata de documento necessário à análise do direito ao tempo especial de serviço do Autor, pelo INSS, como já dito.

Das informações que serão colocadas no PPP, o INSS concluirá se o Autor terá ou não direito ao benefício da aposentadoria especial.

Note-se que a confecção do documento (PPP) e o fornecimento ao Autor é obrigação do Empregador, de forma que o Réu não pode se escusar a fazê-lo.

Além disso, o servidor (ou ex-servidor) não pode ser penalizado pela ausência ou demora na entrega de tal documento, que deve ser produzido pelo Réu e repassado ao Autor.

Nesse mesmo sentido, a Instrução Normativa nº 1, de 22 de julho de 2010, atualizada pela INS SPPS nº 3, de 23/05/2014, que dispõe "(...) sobre  os parâmetros a serem observados pelos Regimes Próprios de Previdência Social da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios na análise do direito à concessão da aposentadoria especial de que trata o art. 40, § 4º, inciso III da Constituição Federal, em cumprimento à Súmula Vinculante nº 33 ou nos casos em que o servidor público esteja amparado por ordem concedida em Mandado de Injunção, pelo Supremo Tribunal Federal." (G.N.), estabelece, no Parágrafo único do seu art. 8º, que o formulário será emitido pelo órgão ou entidade responsável pelos assentamentos funcionais do servidor público no correspondente período de exercício das atribuições do cargo.

Pois bem, com essas considerações, o pleito do Autor será parcialmente acolhido, apenas para determinar ao Réu que forneça ao Autor o documento solicitado (PPP), do período em que trabalhou no INCRA, na função de ajudante de serralheiro e também como serralheiro.  

Obviamente, no momento da elaboração do PPP o Ente Público observará as normas administrativas que regem o assunto, e fará constar, se existentes,  os riscos/agente nocivos aos quais o Autor esteve exposto durante o exercício das duas mencionadas atividades laborais, e a respectiva intensidade, dentre outros registros que devem constar no documento.

3 - Dispositivo

Ante todo o exposto,

3.1- indefiro o pedido do Autor formulado na Réplica de produção de prova pericial;

3.2- julgo parcialmente procedente o pleito do Autor e determino que o Réu, no prazo de 30 (trinta) dias, disponibilize o Perfil Profissiográfico Previdenciário - PPP ao Autor, relativo ao período em que exerceu as funções de ajudante de serralheiro e de serralheiro no INCRA, sob pena de aplicação de multa mensal, no valor de R$ 1.100,00(hum mil e cem reais), atualizados semestralmente pelo IPCA-E, mais juros de mora, observado, quando a estes, os índices do manual de cálculos do CJF, que incidirão sobre o valor já monetariamente atualizado, sem prejuízo da responsabilização pessoal do Servidor e/ou da respectiva Chefia do INCRA, no campo administrativo, civil e penal.

Condeno o Réu ao pagamento de honorários advocatícios, os quais fixo equitativamente no importe de R$ 1.000,00 (hum mil reais), nos termos do art. 85, § 8°, do CPC, com correção monetária mensal, a partir da mês seguinte ao da intimação desta sentença, pelos índices do IPCA-E, mais  juros de mora de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados da data do trânsito em julgado desta sentença ou de acórdão que a mantenha(§ 16 do art. 85 do CPC) e incidentes sobre o valor já monetariamente corrigido.

Finalmente, dou este processo por extinto, com resolução do mérito(art. 487, I, CPC).

Sentença não sujeita ao reexame necessário (art. 496, § 3°, inciso I, do CPC).

R.I.

Recife, 18.02.2021.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE.


(rmc)

 _____________________________________

[1] Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/menuSumario.asp?sumula=1941

Acesso em 18.02.2021.

 

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