sábado, 27 de junho de 2020

APOSENTADO QUE VOLTA A TRABALHAR, TAMBÉM VOLTA A PAGAR CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA, SEM CONTRAPRESTAÇÃO DA PREVIDÊNCIA SOCIAL. E ISSO É CONSTITUCIONAL, SEGUNDO A SUPREMA CORTE.

Por Francisco Alves dos Santos  Júnior

O Presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1995, apresentou projeto de Lei e conseguiu, no Congresso Nacional, a sua conversão  em Lei, por meio da qual passou a obrigar os  Aposentados que voltam a trabalhar, para complementar os parcos proventos de aposentadoria,  a pagar contribuição previdenciária, sem contraprestação de benefício pela Previdência Social Pública, quando cessarem definitivamente de trabalhar.  A matéria foi ao Judiciário e o Supremo Tribunal Federal findou por considerar constitucional essa exigência tributária.
Na sentença que segue, conta-se toda a história.
Boa  leitura. 



PROCESSO Nº: 0819084-74.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: N A R P
ADVOGADO: V S C J
RÉU: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
SENTENÇA  TIPO A
EMENTA:- DIREITO CONSTITUCIONAL-TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DEVIDA POR APOSENTADO QUE VOLTA A TRABALHAR. TEMA 1065 DO STF.
Os Tribunais, inclusive o STF, concluíram não ser inconstitucional a contribuição previdenciária prevista no § 4º do art. 12 da Lei 8.212, de 1991, exigida de aposentado que volta a trabalhar, porque teria  por base o princípio da solidariedade e o sistema previdenciário brasileiro não seria mutualista, sinaglmático.
Improcedência.

1. Relatório



N A R P, qualificado na petição inicial, ajuizou, em 21.12.2018,  esta AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO DO APOSENTADO PARA CONTRIBUIR COM A PREVIDÊNCIA SOCIAL CUMULADA COM REPETIÇÃO DE INDÉBITO. Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita bem como prioridade na tramitação do feito. Aduziu, em síntese, que: o Autor teria requerido a sua aposentadoria em 10/02/2007,  na modalidade aposentadoria por tempo de contribuição, código 42 e na época contava com mais de 35 anos de contribuição; o seu benefício atualmente teria o número 1212191061, espécie 42, com DIB de 10/02/2007; mesmo se aposentando, não teria obtido a renda desejada e teria sido compelido a retornar ao mercado de trabalho, continuando, desta forma, a recolher contribuições ao INSS em virtude de seu registro de trabalho e em decorrência de ser contribuinte obrigatório da Previdência; analisando a sua CTPS, seria possível verificar que teria contribuído após a sua aposentadoria, sendo cabível a restituição, pois não teriam trazido qualquer benefício ao Autor; teria havido uma cobrança judicial no montante de R$39.000,00 (trinta e nome mil reais), valor este que, em absoluto, não teria havido retorno ao Autor; o que se discutiria nesta demanda seria a restrição injustificada do ponto de vista constitucional, que um contribuinte obrigatório da Previdência Social sofre pelo fato de ser aposentado; tal restrição dar-se-ia por conta da redação do §2º do art. 18 da Lei 8.213/91, nos termos ali transcritos;  além de violar determinados direitos fundamentais em espécie, tal prescrição normativa contida no §2º do art. 18 da Lei 8.213/91, acabaria também por violar o próprio regime jurídico dos direitos fundamentais estabelecido pela Constituição da República de 1988; a Previdência Brasileira seria regida  pelo princípio CONTRIBUTIVO X RETRIBUTIVO, no qual TODA contribuição deveria reverter em retribuição, o que não ocorreria no caso em tela; exigir  contribuição e em troca assegurar o salário maternidade e reabilitação profissional se mostraria um escárnio com o aposentado; a única finalidade adotada pelo legislador ao prever o §2º do art. 18 da Lei 8.213/91 teria sido arrecadatória, ignorando por completo a pessoa do aposentado diante de suas eventuais contingências no decorrer do labor. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, pela :
"A concessão, in limine, da tutela antecipada para suspender a cobrança das contribuições previdenciárias do Requerente a partir do próximo mês, expedindo-se o necessário aos órgãos competentes, conforme art. 300 e seguintes do Código de Processo Civil;  3.1. Ou, de forma subsidiária, a concessão, in limine, da tutela antecipada para que a Empregada deposite em juízo os valores alusivos à contribuição previdenciária descontada do Requerente, nos termos do art. 300 e seguintes do Código de Processo Civil. 4. A citação da União (Fazenda Nacional) no endereço constante do preâmbulo, com os benefícios legais, para, querendo, contestarem a presente ação, conforme art. 335 do Código de Processo Civil, sob pena de serem reputados como verdadeiros os fatos aqui alegados, nos termos do art. 344, do Código de Processo Civil, dentro dos limites aplicados à Fazenda Pública; 5. A declaração de inexistência da obrigação do aposentado de contribuir com a previdência social, com base nos argumentos expostos na causa de pedir.".
Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.
Decisão de 21.01.2019, sob id. 4058300.9703257, na qual neguei o pedido de concessão liminar de tutela provisória de urgência para suspender a exigibilidade da contribuição em debate.
A União pugnou pela renovação da citação (Id. 4058300.9758996), com direcionamento para o seu órgão competente de representação, qual seja, a Procuradoria da Fazenda Nacional, nos termos do art. 38 da Lei Complementar nº. 73/93, o que foi deferido (Id. 4058300.10916122).
A União (Fazenda Nacional) ofertou Contestação, aduzindo, em apertada síntese, que:  com relação ao salário ou outra forma de remuneração pelo trabalho prestado e realizado por aposentado que volta ao mercado e pratica atividade profissional remunerada, obviamente que haveria incidência tributária, pois seria realizado o fato gerador da contribuição e não haveria qualquer norma que desonerasse esta remuneração; tal incidência satisfaria o princípio da solidariedade e seus corolários, os objetivos constitucionais da equidade na forma de participação no custeio e da diversidade da base de financiamento. Teceu outros comentários e pugnou, ao final, pela decretação de improcedência dos pedidos (Id. 4058300.11295497).
Certificado o decurso de prazo sem apresentação de réplica (Id. 4058300.13300891).
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação



2.1 - No  presente caso, o Autor quer receber em restituição os valores que pagou a título de contribuição previdenciária para o INSS, embora já estivesse aposentado, e não recebeu nenhum tipo de benefício previdenciário, nem mesmo a título complementar da aposentadoria que já recebia,  depois que parou definitivamente de trabalhar.  
Informa o Autor que requereu a sua aposentadoria em 10/01/2007, na modalidade aposentadoria por tempo de contribuição, código 42 e na época contava com mais de 35 anos de contribuição. Historiou que, mesmo se aposentando, não teria obtido a renda desejada, tendo sido compelido a retornar ao mercado de trabalho, continuando, por conseqüência, a recolher  contribuições ao INSS em virtude de seu registro de trabalho e em decorrência  de ser contribuinte obrigatório da Previdência.
2.2 - Pois bem.
A questão está disciplinada pelo artigo 2º da Lei nº 9.032, de 1995, época em que era Presidente Fernando Henrique Cardoso[1],  que acrescentou ao art. 12 da Lei nº 8.212, de 1991, o parágrafo 4º, verbis:r:





"Art. 2º A Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, passa a vigorar com as seguintes alterações:

"Art. 12. ................................................................

§ 4º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata esta lei, para fins de custeio da Seguridade Social. (grifei).".







Desde os primeiros casos semelhantes a este que apreciei e julguei, sempre sustentei que esse tributo mais se parece com um imposto de renda não autorizado na Constituição, como sustentaram, na época do seu advento, alguns jus-tributaristas, eis que se trata de um tributo incidente sobre a renda e que se enquadra na  definição de imposto, delineada no art. 16 do Código Tributário  Nacional, porque sem qualquer caráter retributivo, como seria próprio das Taxas e das Contribuições em geral,  e também se enquadra no art. 43 desse mesmo Código, quando trata do fato gerador do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza.
Mas findou por prevalecer,  nos Tribunais do Brasil, a tese de que aqui não se adotou o sistema mutualista, de forma que seria certo que as Contribuições para a Previdência Social não pressupoem necessariamente contraprestação em forma de benefício. E que a contribuição para o regime de previdência não possui caráter meramente retributivo, ou seja, não representa uma relação sinalagmática, com equivalência entre as prestações vertidas e aquelas percebidas quando da inatividade.

E arrematam os teóricos dessa tese favorável à Autarquia  Previdenciária, que o sistema da previdência em questão seria regido pelo princípio da solidariedade, mediante o qual a contribuição recolhida reverte em favor de todo o sistema, sem se cogitar de uma exata contrapartida, em prestações específicas ou proporcionais, em face dos aportes efetuados.





Com base nesses fundamentos, o § 2º do art. 18 da Lei nº 8.213/91 foi alterado pelas Leis nº 9.032/95 e 9.528/97 para estabelecer que o Aposentado que retorne ao exercício de atividade vinculada ao regime geral fará jus apenas aos benefícios de salário-família e à reabilitação profissional, mas não a um novo benefício, tampouco a uma complementação do benefício de aposentadoria que já está a receber. 
Eis o teor do dispositivo:





"Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:
(...)
§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social-RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997).".





Então, em nome da "solidariedade", o Cidadão trabalhador aposentado, que volta  a trabalhar, também volta a pagar a contribuição previdenciária, sem caráter retributivo, ou seja, sem direito à complementação do seu benefício previdenciário quando parar definitivamente de trabalhar, ou a um novo benefício previdenciário proporcional do período pós-aposentadoria até a data que deixar de trabalhar, fazendo  jus apenas ao salário família, se ainda  tiver filhos na  idade que se permita perceber esse benefício, e, no caso de doença que o inabilite para a sua atividade, o direito de ser reabilitado para exercer outra função. 
Então, a sua contribuição previdenciária,  nessa nova fase da sua vida, será destinada ao respectivo sistema  previdenciário, que servirá para ajudar esse sistema a manter os benefícios de todos os Segurados, dentro da ótica do princípio da solidariedade.
Os Tribunais  Regionais Federais logo acolheram essas teses dos Defensores da Previdência Social Pública.
Eis  um do julgados do TRF4R a respeito do assunto:

"EMENTA: CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. APOSENTADO QUE RETORNA À ATIVIDADE LABORAL. SOLIDARIEDADE SOCIAL.
É legítima a incidência de contribuição previdenciária sobre a remuneração percebida pelo segurado em razão do retorno à atividade laboral após a concessão de aposentadoria pelo Regime Geral de Previdência Social, o que está em conformidade com o princípio da Solidariedade Social.".
(TRF4, AC 5054576-89.2013.4.04.7100, SEGUNDA TURMA, Relator RÔMULO PIZZOLATTI, juntado aos autos em 18/03/2015),






E a Suprema Corte também enveredou por essa seara, de forma que  em 27/09/2019, quando julgou o ARE 1.224.327, sob repercussão geral, Tema 1065, concluiu:   
"É constitucional a contribuição previdenciária devida por aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que permaneça em atividade ou a essa retorne.".

Assim, sem maiores delongas e com as ressalvas do meu entendimento, vejo-me obrigado a decretar a improcedência dos pleitos autorais, por força do art. 927, III do CPC.

3. Dispositivo








Posto isso, julgo improcedentes os pedidos, condeno a Parte Autora nas custas processuais e em verba honorária que, considerando a simplicidade do caso, arbitro  em 10%(dez por cento) do valor da causa, atualizado(correção monetária e juros de mora) na forma e pelos índices  do manual de cálculos  do CJF, até a data do pagamento,  mas submetido a respectiva exigência à condição suspensiva, pelo prazo de cinco anos, do § 3º do art. 98 do vigente CPC,  e dou por extinto este processo nos termos do art. 487, I do CPC.


Registrada, intimem-se.

Recife, 27.06.2020.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

(lsc)
[1] O Presidente Ferenando Henrique Cardoso, ainda vivo, sempre foi considerado um político de esquerda, mas, durante os seus dois mandatos presidenciais, os Servidores Públicos e os Aposentados sofreram grandes perdas com as modificações feitas nas  Leis Administrativas e Previdenciárias do Brasil.
Interessante é que depois dele veio o Luis Inácio Lula da Silva, também considerado de esquerda, o qual elaborou projeto de Emenda Constitucional, que deu origem à Emenda Constitucional 41, de 2003, pela qual os Aposentados do Serviço Público passaram a ser obrigados a pagar contribuição previdenciária sobre valores que recebam além do piso da Previdência Social Geral. Um verdadeiro Imposto de Renda sobre parte dos Proventos desses Aposentados.

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