Por Francisco Alves dos Santos Júnior
O Presidente Fernando Henrique Cardoso, em 1995, apresentou projeto de Lei e conseguiu, no Congresso Nacional, a sua conversão em Lei, por meio da qual passou a obrigar os Aposentados que voltam a trabalhar, para complementar os parcos proventos de aposentadoria, a pagar contribuição previdenciária, sem contraprestação de benefício pela Previdência Social Pública, quando cessarem definitivamente de trabalhar. A matéria foi ao Judiciário e o Supremo Tribunal Federal findou por considerar constitucional essa exigência tributária.
Na sentença que segue, conta-se toda a história.
Boa leitura.
PROCESSO Nº: 0819084-74.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: N A R P
ADVOGADO: V S C J
RÉU: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
AUTOR: N A R P
ADVOGADO: V S C J
RÉU: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
SENTENÇA TIPO A
EMENTA:- DIREITO CONSTITUCIONAL-TRIBUTÁRIO. CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA DEVIDA POR APOSENTADO QUE VOLTA A TRABALHAR. TEMA 1065 DO STF.
Os
Tribunais, inclusive o STF, concluíram não ser inconstitucional a
contribuição previdenciária prevista no § 4º do art. 12 da Lei 8.212, de
1991, exigida de aposentado que volta a trabalhar, porque teria por
base o princípio da solidariedade e o sistema previdenciário brasileiro
não seria mutualista, sinaglmático.
Improcedência.
1. Relatório
N A R P, qualificado na petição inicial, ajuizou, em
21.12.2018, esta AÇÃO DECLARATÓRIA DE INEXISTÊNCIA DE OBRIGAÇÃO DO
APOSENTADO PARA CONTRIBUIR COM A PREVIDÊNCIA SOCIAL CUMULADA COM
REPETIÇÃO DE INDÉBITO. Requereu, preliminarmente, os benefícios da
Justiça Gratuita bem como prioridade na tramitação do feito. Aduziu, em
síntese, que: o Autor teria requerido a sua aposentadoria em
10/02/2007, na modalidade aposentadoria por tempo de contribuição,
código 42 e na época contava com mais de 35 anos de contribuição; o seu
benefício atualmente teria o número 1212191061, espécie 42, com DIB de
10/02/2007; mesmo se aposentando, não teria obtido a renda desejada e
teria sido compelido a retornar ao mercado de trabalho, continuando,
desta forma, a recolher contribuições ao INSS em virtude de seu
registro de trabalho e em decorrência de ser contribuinte obrigatório
da Previdência; analisando a sua CTPS, seria possível verificar que
teria contribuído após a sua aposentadoria, sendo cabível a
restituição, pois não teriam trazido qualquer benefício ao Autor; teria
havido uma cobrança judicial no montante de R$39.000,00 (trinta e nome
mil reais), valor este que, em absoluto, não teria havido retorno ao
Autor; o que se discutiria nesta demanda seria a restrição
injustificada do ponto de vista constitucional, que um contribuinte
obrigatório da Previdência Social sofre pelo fato de ser aposentado;
tal restrição dar-se-ia por conta da redação do §2º do art. 18 da Lei
8.213/91, nos termos ali transcritos; além de violar determinados
direitos fundamentais em espécie, tal prescrição normativa contida no
§2º do art. 18 da Lei 8.213/91, acabaria também por violar o próprio
regime jurídico dos direitos fundamentais estabelecido pela
Constituição da República de 1988; a Previdência Brasileira seria
regida pelo princípio CONTRIBUTIVO X RETRIBUTIVO, no qual TODA
contribuição deveria reverter em retribuição, o que não ocorreria no
caso em tela; exigir contribuição e em troca assegurar o salário
maternidade e reabilitação profissional se mostraria um escárnio com o
aposentado; a única finalidade adotada pelo legislador ao prever o §2º
do art. 18 da Lei 8.213/91 teria sido arrecadatória, ignorando por
completo a pessoa do aposentado diante de suas eventuais contingências
no decorrer do labor. Teceu outros comentários. Transcreveu
precedentes. Pugnou, ao final, pela :
"A concessão, in limine, da tutela antecipada para suspender a cobrança das contribuições previdenciárias do Requerente a partir do próximo mês, expedindo-se o necessário aos órgãos competentes, conforme art. 300 e seguintes do Código de Processo Civil; 3.1. Ou, de forma subsidiária, a concessão, in limine, da tutela antecipada para que a Empregada deposite em juízo os valores alusivos à contribuição previdenciária descontada do Requerente, nos termos do art. 300 e seguintes do Código de Processo Civil. 4. A citação da União (Fazenda Nacional) no endereço constante do preâmbulo, com os benefícios legais, para, querendo, contestarem a presente ação, conforme art. 335 do Código de Processo Civil, sob pena de serem reputados como verdadeiros os fatos aqui alegados, nos termos do art. 344, do Código de Processo Civil, dentro dos limites aplicados à Fazenda Pública; 5. A declaração de inexistência da obrigação do aposentado de contribuir com a previdência social, com base nos argumentos expostos na causa de pedir.".
Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.
Decisão de 21.01.2019, sob id. 4058300.9703257,
na qual neguei o pedido de concessão liminar de tutela provisória de
urgência para suspender a exigibilidade da contribuição em debate.
A
União pugnou pela renovação da citação (Id. 4058300.9758996), com
direcionamento para o seu órgão competente de representação, qual seja, a
Procuradoria da Fazenda Nacional, nos termos do art. 38 da Lei
Complementar nº. 73/93, o que foi deferido (Id. 4058300.10916122).
A
União (Fazenda Nacional) ofertou Contestação, aduzindo, em apertada
síntese, que: com relação ao salário ou outra forma de remuneração
pelo trabalho prestado e realizado por aposentado que volta ao mercado
e pratica atividade profissional remunerada, obviamente que haveria
incidência tributária, pois seria realizado o fato gerador da
contribuição e não haveria qualquer norma que desonerasse esta
remuneração; tal incidência satisfaria o princípio da solidariedade e
seus corolários, os objetivos constitucionais da equidade na forma de
participação no custeio e da diversidade da base de financiamento.
Teceu outros comentários e pugnou, ao final, pela decretação de
improcedência dos pedidos (Id. 4058300.11295497).
Certificado o decurso de prazo sem apresentação de réplica (Id. 4058300.13300891).
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação
2.1 - No
presente caso, o Autor quer receber em restituição os valores que
pagou a título de contribuição previdenciária para o INSS, embora já
estivesse aposentado, e não recebeu nenhum tipo de benefício
previdenciário, nem mesmo a título complementar da aposentadoria que já
recebia, depois que parou definitivamente de trabalhar.
Informa
o Autor que requereu a sua aposentadoria em 10/01/2007, na modalidade
aposentadoria por tempo de contribuição, código 42 e na época contava
com mais de 35 anos de contribuição. Historiou que, mesmo se
aposentando, não teria obtido a renda desejada, tendo sido compelido a
retornar ao mercado de trabalho, continuando, por conseqüência, a
recolher contribuições ao INSS em virtude de seu registro de trabalho e
em decorrência de ser contribuinte obrigatório da Previdência.
2.2 - Pois bem.
A
questão está disciplinada pelo artigo 2º da Lei nº 9.032, de 1995,
época em que era Presidente Fernando Henrique Cardoso[1], que
acrescentou ao art. 12 da Lei nº 8.212, de 1991, o parágrafo 4º,
verbis:r:
"Art. 2º A Lei nº 8.212, de 24 de julho de 1991, passa a vigorar com as seguintes alterações:
"Art. 12. ................................................................
§ 4º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que estiver exercendo ou que voltar a exercer atividade abrangida por este regime é segurado obrigatório em relação a essa atividade, ficando sujeito às contribuições de que trata esta lei, para fins de custeio da Seguridade Social. (grifei).".
Desde
os primeiros casos semelhantes a este que apreciei e julguei, sempre
sustentei que esse tributo mais se parece com um imposto de renda não autorizado na Constituição,
como sustentaram, na época do seu advento, alguns
jus-tributaristas, eis que se trata de um tributo incidente sobre a
renda e que se enquadra na definição de imposto, delineada no art. 16
do Código Tributário Nacional, porque sem qualquer caráter
retributivo, como seria próprio das Taxas e das Contribuições em geral,
e também se enquadra no art. 43 desse mesmo Código, quando trata do
fato gerador do imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza.
Mas
findou por prevalecer, nos Tribunais do Brasil, a tese de que aqui não
se adotou o sistema mutualista, de forma que seria certo que as
Contribuições para a Previdência Social não pressupoem necessariamente
contraprestação em forma de benefício. E que a contribuição para o
regime de previdência não possui caráter meramente retributivo, ou
seja, não representa uma relação sinalagmática, com equivalência entre
as prestações vertidas e aquelas percebidas quando da inatividade.
E
arrematam os teóricos dessa tese favorável à Autarquia
Previdenciária, que o sistema da previdência em questão seria regido
pelo princípio da solidariedade, mediante o qual a contribuição
recolhida reverte em favor de todo o sistema, sem se cogitar de uma
exata contrapartida, em prestações específicas ou proporcionais, em
face dos aportes efetuados.
Com
base nesses fundamentos, o § 2º do art. 18 da Lei nº 8.213/91 foi
alterado pelas Leis nº 9.032/95 e 9.528/97 para estabelecer que o
Aposentado que retorne ao exercício de atividade vinculada ao regime
geral fará jus apenas aos benefícios de salário-família e à reabilitação
profissional, mas não a um novo benefício, tampouco a uma
complementação do benefício de aposentadoria que já está a receber.
Eis o teor do dispositivo:
"Art. 18. O Regime Geral de Previdência Social compreende as seguintes prestações, devidas inclusive em razão de eventos decorrentes de acidente do trabalho, expressas em benefícios e serviços:(...)§ 2º O aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social-RGPS que permanecer em atividade sujeita a este Regime, ou a ele retornar, não fará jus a prestação alguma da Previdência Social em decorrência do exercício dessa atividade, exceto ao salário-família e à reabilitação profissional, quando empregado. (Redação dada pela Lei nº 9.528, de 1997).".
Então,
em nome da "solidariedade", o Cidadão trabalhador aposentado, que
volta a trabalhar, também volta a pagar a contribuição previdenciária,
sem caráter retributivo, ou seja, sem direito à complementação do seu
benefício previdenciário quando parar definitivamente de trabalhar, ou a
um novo benefício previdenciário proporcional do período
pós-aposentadoria até a data que deixar de trabalhar, fazendo jus
apenas ao salário família, se ainda tiver filhos na idade que se
permita perceber esse benefício, e, no caso de doença que o inabilite
para a sua atividade, o direito de ser reabilitado para exercer outra
função.
Então,
a sua contribuição previdenciária, nessa nova fase da sua vida, será
destinada ao respectivo sistema previdenciário, que servirá para ajudar
esse sistema a manter os benefícios de todos os Segurados, dentro da
ótica do princípio da solidariedade.
Os Tribunais Regionais Federais logo acolheram essas teses dos Defensores da Previdência Social Pública.
Eis um do julgados do TRF4R a respeito do assunto:
"EMENTA: CONTRIBUIÇÃO PREVIDENCIÁRIA. APOSENTADO QUE RETORNA À ATIVIDADE LABORAL. SOLIDARIEDADE SOCIAL.É legítima a incidência de contribuição previdenciária sobre a remuneração percebida pelo segurado em razão do retorno à atividade laboral após a concessão de aposentadoria pelo Regime Geral de Previdência Social, o que está em conformidade com o princípio da Solidariedade Social.".(TRF4, AC 5054576-89.2013.4.04.7100, SEGUNDA TURMA, Relator RÔMULO PIZZOLATTI, juntado aos autos em 18/03/2015),
E
a Suprema Corte também enveredou por essa seara, de forma que em
27/09/2019, quando julgou o ARE 1.224.327, sob repercussão geral, Tema 1065, concluiu:
"É constitucional a contribuição previdenciária devida por aposentado pelo Regime Geral de Previdência Social (RGPS) que permaneça em atividade ou a essa retorne.".
Assim,
sem maiores delongas e com as ressalvas do meu entendimento, vejo-me
obrigado a decretar a improcedência dos pleitos autorais, por força do art. 927, III do CPC.
3. Dispositivo
Posto
isso, julgo improcedentes os pedidos, condeno a Parte Autora nas
custas processuais e em verba honorária que, considerando a
simplicidade do caso, arbitro em 10%(dez por cento) do valor da causa,
atualizado(correção monetária e juros de mora) na forma e pelos
índices do manual de cálculos do CJF, até a data do pagamento, mas
submetido a respectiva exigência à condição suspensiva, pelo prazo de
cinco anos, do § 3º do art. 98 do vigente CPC, e dou por extinto este
processo nos termos do art. 487, I do CPC.
Registrada, intimem-se.
Recife, 27.06.2020.
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara/PE
(lsc)
[1]
O Presidente Ferenando Henrique Cardoso, ainda vivo, sempre foi
considerado um político de esquerda, mas, durante os seus dois mandatos
presidenciais, os Servidores Públicos e os Aposentados sofreram grandes
perdas com as modificações feitas nas Leis Administrativas e
Previdenciárias do Brasil.
Interessante
é que depois dele veio o Luis Inácio Lula da Silva, também considerado
de esquerda, o qual elaborou projeto de Emenda Constitucional, que deu
origem à Emenda Constitucional 41, de 2003, pela qual os Aposentados do
Serviço Público passaram a ser obrigados a pagar contribuição
previdenciária sobre valores que recebam além do piso da Previdência
Social Geral. Um verdadeiro Imposto de Renda sobre parte dos Proventos
desses Aposentados.
Logo, os Trabalhadores brasileiros em geral
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