quarta-feira, 6 de novembro de 2013

MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DE GESTÃO DE ADMINISTRADOR DE SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. NÃO CABIMENTO. INDEFERIMENTO DA PETIÇÃ INICIAL E NEGAÇÃO DA SEGURANÇA. PRECEDENTE DO E. TRF/5ªR

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

A vigente Lei nº 12.016, de 2009, que regulamenta o mandado de segurança, veda, no § 2º do seu art. 2º,  sua utilização para impugnar ato de gestão comercial de Administrador de empresas públicas, sociedade de econmia mista e concessionárias de serviços públicos.
 
No presente caso, a Empresa Impetrante utilizou-se do mandado de segurança para impugnar um ato de gestão comercial de um Administrador da CHESF, empresa estatal constituída na forma de sociedade de economia mista.
 
Então, houve o indeferimento da petição inicial, sem resolução do mérito, negando-se a segurança, mas ressalvando-se o direito de a ora Impetrante utilizar-se da via ordinária.
 
Boa leitura.
 
 


2ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO

PROCESSO Nº: 0803651-06.2013.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA
IMPETRANTE: M T R INDUSTRIA E COMERCIO LTDA - EPP
ADVOGADO: ROBERTO CARDONE
IMPETRADO: CHESF - COMPANHIA HIDRO ELETRICA DO SÃO FRANCISCO (e outro)
 

 

SENTENÇA REGISTRADA ELETRONICAMENTE

Sentença tipo C

 

Ementa: - MANDADO DE SEGURANÇA. ATO DE GESTÃO.

Ato de gestão comercial, praticado por Administrador de sociedade de economia mista, não pode ser impugnado via mandado de segurança (§ 2º do art. 1º da Lei nº 12.016, de 2009).

Indeferimento da petição inicial. Extinção do processo, sem resolução do mérito.

 

Vistos, etc.

1.                              Breve Relatório

   MTR – I E C LTDA, qualificada na Inicial, impetrou o presente MANDADO DE SEGURANÇA com pedido de concessão de Medida Liminar “inaudita altera parte” contra ato que adjetiva de ilegal, praticado pelo Senhor CHEFE DO DEPARTAMENTO DE COMPRAS E CONTRATAÇÕES – DCC, Célio Alves da Silva, da COMPANHIA HIDRO ELÉTRICA DO SÃO FRANCISCO – CHESF, bem como em face da Empresa T S D LTDA. Inicialmente, teceu comentários sobre a legitimidade passiva do Impetrado, do pretenso direito líquido e certo, mencionando, ainda, que:   em 02/04/2013, a autoridade impetrada teria determinado a abertura de Edital para licitação na modalidade Pregão Eletrônico - PG – 1.90.2013.1900, para o registro de preços e aquisição de 2 (dois) Monitores Digitais, nos termos e condições constantes no Edital e seus anexos; após uma análise minuciosa em relação a todos os pontos e especificações previstos no Edital, a Impetrante teria detectado diversos vícios no tocante à indicação e especificações técnicas dos produtos indicados no edital a serem licitados, vícios esses que não teriam sido sanados inobstante ao fato de haver Impugnado o Edital, situação que poderia acarretar a anulação do procedimento licitatório; referidos vícios diriam respeito à remissão do aludido instrumento convocatório aos mesmos objetos de licitação do Edital anteriormente convocado pela autoridade impetrada, que por seu turno, apenas diferenciou a nomenclatura dos bens licitados fazendo constar no novo edital Monitores Digitais, quando na realidade seriam referentes aos mesmos objetos do edital de licitação anterior – PG – 1.90.2011.0850, que estaria sub judice perante o Tribunal Regional da 5ª Região, a empresa T S D LTDA., ganhadora no Pregão Eletrônico - PG – 1.90.2013.1900, teria impetrado o Mandado de Segurança perante essa Justiça Federal, ação processada sob o nº. 0006350-71.2011.05.8300, objetivando a anulação do certame PG – 1.90.2011.0850, em razão de ter sido vencedora a empresa ora impetrante naquele certame, teria alegado que os produtos da empresa impetrante não atenderiam as especificações técnicas contidas no edital da licitação anterior - PG – 1.90.2011.0850, e assim, não poderiam ser aceitos; a licitação anterior teria sido paralisada por ordem judicial estando, o primeiro Edital Licitatório sub judice, até o presente momento; o primeiro Edital que estaria sub judice, teria apresentado as descrições nos termos especificados na Inicial; da leitura dos objetos acima transcritos, haveria de se notar que a finalidade de ambos os resuiltadosteria sido a mesma em ambos os certames, ou seja, os objetos pretendidos pela Chesf foram licitados 2 (duas) vezes; a empresa Impetrante teria impugnado o edital de licitação PG – 1.90.2013.1900, em razão das inconsistências narradas, porém, seus argumentos não teriam sido atacados pela autoridade impetrada, razão pela qual teria se determinado o prosseguimento do certame, sendo certo que na sessão de disputa ocorrida em 02/05/2013 à empresa ora impetrante foi a PRIMEIRA COLOCADA, e após convocada apresentou os TODOS os documentos exigidos em edital para a adjudicação; não obstante a entrega pela vencedora de TODOS os documentos necessários para a conclusão do ato, em 21/08/2013, a empresa impetrante fora inabilitada tecnicamente, pois, segundo alegou a autoridade impetrada, teria deixado a empresa vencedora “...de comprovar sua experiência em fornecimento, para empresas congêneres do setor elétrico nacional, de equipamentos similares e compatíveis com o objeto da presente licitação e que estejam operando em instalações com tensões superiores ou iguais a 500KV por período superior a 1 (um) ano, com bom desempenho através de atestado(s) emitido (s) por pessoa jurídica de direito publico ou privado.”; após a inabilitação de outras  QUATRO empresas, a T, em 10/09/2013 fora declarada vencedora do certame, ou seja, do segundo certame.a empresa ora impetrante teria apresentado recurso administrativo, sendo certo que o mesmo fora indeferido pela autoridade impetrada, sob o argumento de falta de habilitação técnica da MTR, nos moldes acima informados, deixando consignado na decisão do recurso, que referido ponto era de fundamental importância, eis que a CHESF já havia vivenciado problemas de ordem técnica com outras empresas que deixaram de atender satisfatoriamente aos interesses da referida companhia; a referida licitação não teria condições de prosseguir legitimamente, uma vez que teria havido o direcionamento da Licitação de forma que a empresa T fosse a vencedora no certame  de modo a ferir a isonomia entre as empresas participantes, isto porque, a autoridade impetrada teria inovado o certame com imposição de comprovação pela vencedora de prévia experiência de fornecimento do bem licitado para empresas congêneres do setor elétrico nacional, com instalações de tensões superiores ou iguais a 550 kV pelo período de 1 ano;  conforme já era do conhecimento do órgão licitante, SOMENTE, a empresa Treetech obtinha referida comprovação, fato que além de restringir a efetiva participação das demais empresas no Certame em situação de igualmente, teria acabado por ferir o princípio da isonomia entre as partes; referido condicionamento do Edital de Licitação teria atentado não só contra princípios da licitação, como também, teria ferido os princípios administrativos e a própria Constituição Federal. Teceu outros comentários, notadamente sobre o ato coator e da presença dos requisitos para a concessão da medida liminar. Pugnou, ao final, pela, concessão da tutela liminar, com base nos art. 5º, inciso XXXV, da CF, e 7º, inciso III, da Lei n. 12.016, para fins de suspender liminarmente o ato que habilitou a empresa T SERVIÇOS na Licitação, e que indeferiu o recurso da impetrante, suspendendo-se, por seu turno, o Procedimento Licitatório – Pregão Eletrônico - PG-1.90.2013.1900, e seus efeitos, até decisão final a ser proferida nesta ação. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

 Fundamentação

O § 2º do art. 1º da Lei nº 12.016, de 2009, não admite a impetração de mandado de segurança contra ato de gestão comercial de Administrador de sociedade de economia mista. .

No presente caso, busca-se a suspensão liminar do ato de Administrador da CHESF, sociedade de economia mista, que habilitou a empresa T SERVIÇOS na Licitação de fins comerciais, noticiada nos autos, e que indeferiu o recurso da impetrante, no qual pugnou pela suspensão do referido ato.

            Seria esse um ato de gestão?

THEMISTOCLES BRANDÃO CAVALCANTI, que foi professor de direito público da antiga Universidade do Brasil e procurador da república, no seu conhecido “Tratado de Direito Administrativo”, volume I, ensinava que a discussão sobre ato de império, que seria o ato administrativo propriamente dito, e ato de gestão, surgiu no direito francês, sendo que LAFERRIÈRE assim procurava delimitar a distinção material entre ambos: seria de gestão os atos pelos quais a Autoridade procurava prover a Administração Pública das receitas e cuidar da aplicação nas respectivas despesas; já os atos de império consistiriam nos atos pelos quais a Administração Pública executa as Leis e obriga sua observância, e ainda aqueles que visam regular a marcha e o funcionamento do serviço público, relativamente aos quais o Poder Judiciário não poderia intervir, porque próprios do Poder Executivo. Mas, advertia, já naquela época(o seu livro é de 1960), que ROGER BONNARD, também na França, não admitia essa distinção, por diversos motivos, principalmente porque era impossível estabelecer-se uma perfeita distinção dessas duas modalidades de atos. Lembrou ainda DUGUIT, segundo o qual, quando a Administração intervém tem uma peculiaridade que é a de prover o funcionamento do serviço público e esse é o característico que define o ato administrativo, qualquer que seja ele.[1][1]

Parece-me que a conclusão do grande DUGUIT era e é induvidosamente a mais correta.

No entanto, o nosso Legislador brasileiro deixou-nos o problema e por isso, à luz do nosso direito atual, temos que resolvê-lo.

Na prática atual do direito brasileiro, muitos atos podem ser enquadrados como de império e de gestão, mas alguns são induvidosamente de império e outros induvidosamente de gestão.

Por exemplo, a elaboração final do projeto de Lei do orçamento público, é sem dúvida um ato de império, privativo do Chefe do Poder Executivo. A transformação desse projeto em Lei é um ato de império, exclusivo do Poder Legislativo. A resolução de demandas, envolvendo essa Lei, é um ato de império, exclusivo do Poder Judiciário.

Mas a realização das despesas, decorrentes dessa Lei, quer seja por parte do Poder Executivo, do Poder Legislativo ou do Poder Judiciário, decorrentes de atos de cada um desses Poderes, não tenho dúvidas de que se trata de um ato de gestão.

Ora, o ato de realizar licitação para aquisição de monitores digitais, por parte do Diretor de uma Estatal, sem dúvida nenhuma é ato de gestão, quer seja para atividade fim da Empresa que dirige, quer seja para atividades secundárias, pois estará apenas executando determinada dotação orçamentária aprovada para a Empresa.

Mutatis mutandis, aplica-se ao presente caso sentença que lancei nos autos do Processo nº 0005291-48.2011.4.05.8, Classe 126, Mandado de Segurança, tendo por Impetrante ENERGIA EMPREENDIMENTOS LTDA Adv.: Dr. Antonio Nunes Virgínio Jr, OAB-BA 00018658, e por Impetrado o DIRETOR-PRESDENTE DA COMPANHIA HIDRO ELÉTRICA DO SÃO FRANCISCO – CHESF, sentença essa que foi mantida pela 2ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, sob a relatoria do d. Magistrado de 2º Grau, Dr. Francisco Barros Dias, verbis:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. MANDADO DE SEGURANÇA. ERRO NA MODALIDADE RECURSAL. APLICAÇÃO DO PRINCÍPIO DA FUNGIBILIDADE. ART. 244 DO CPC. POSSIBILIDADE. LICITAÇÃO. CONTRATAÇÃO DE PRESTADOR DE SERVIÇOS. ATO DE GESTÃO PRATICADO POR ADMINISTRADOR DE SOCIEDADE DE ECONOMIA MISTA. VEDAÇÃO. ART. 1º, PARÁGRAFO 2º DA LEI Nº 12.016/2009. INADEQUAÇÃO DA VIA ELEITA PARA IMPUGNAR O ATO. EXTINÇÃO DO PROCESSO. CONFIRMAÇÃO DA SENTENÇA. PRECEDENTES. APELAÇÃO IMPROVIDA.

1. Apelação interposta contra sentença proferida em sede de mandado de segurança, que extinguiu o processo sem resolução de mérito, reconhecendo a inadequação do remédio constitucional para impugnar ato de gestão de sociedade de economia mista.

2. Nos termos do artigo 244 do Código de Processo Civil, o ato processual somente pode ser considerado nulo e sem efeito se, além de inobservância da forma legal, não tiver alcançado a sua finalidade.  No caso concreto o recurso foi interposto dentro do prazo do apelo e as razões recursais se voltam contra os fundamentos expostos na sentença a quo. Aplica-se no caso o princípio da fungibilidade recursal, por se tratar de hipótese em que o recurso, mesmo não sendo o cabível para atacar a decisão, pode ser considerado válido, uma vez que foram atendidos os demais requisitos objetivos.

3. A Lei nº 12.016/2009 estabelece, em seu artigo 1º, parágrafo 2º, que não cabe mandado de segurança contra os atos de gestão comercial praticados pelos administradores de empresas públicas, de sociedade de economia mista e de concessionárias de serviço público.

4. Hipótese em que a ação mandamental foi impetrada contra ato de gestor da CHESF - Companhia Hidrelétrica do São Francisco, em Pregão Eletrônico realizado com o fito de contratar um terceiro prestador de serviços, para a realização de obras estruturais. Os serviços a serem realizados, à evidência, não guardam relação direta com a atividade de geração de energia que foi delegada pelo Poder Público à referida Companhia, constituindo-se de ato particular de gestão, que não se confunde com ato de autoridade, requisito necessário para viabilizar seu ataque pela via do mandado de segurança.

5. Ainda que praticado mediante procedimento licitatório, o ato ora impugnado  não pode ser entendido como vinculado à atividade estatal delegada, mas apenas como um mero ato de gestão.

6. Nos termos da súmula nº 333 do C. STJ é cabível o manejo do writ para atacar procedimento licitatório de empresa de economia mista ou empresa pública. Contudo, é pacífico que esse remédio constitucional é cabível contra os atos praticados por dirigentes de tais entidades, desde que tais possam ser reputados como típicos da Administração, entendidos como aqueles oriundos de explícita delegação de competência do Poder Público, o que não se verifica no caso dos autos.

7. Apelação improvida.(PROCESSO: 00052914820114058300, AC527173/PE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO BARROS DIAS, Segunda Turma, JULGAMENTO: 27/09/2011, PUBLICAÇÃO: DJE 06/10/2011 - Página 349)

2. Mesmo quando se indefere petição inicial, em mandado de segurança, com extinção do processo, sem resolução do mérito, segundo o pacífico entendimento jurisprudencial, tem que se negar a segurança, ficando, todavia, ressalvado o direito de o Impetrante discutir a matéria pela via ordinária.

3. Conclusão

POSTO ISSO, indefiro a petição inicial e dou processo por extinto, sem resolução do mérito, negando a segurança, sem prejuízo de a ora Impetrante rediscutir a matéria na via ordinária.

Custas na forma da lei.

Sem honorários, ex vi art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009.

No momento próprio, determino sejam os autos arquivados, após regular baixa na Distribuição.

P.R.I.

Recife, 06 de novembro de 2013. .

 

           Francisco Alves dos Santos Júnior

                Juiz Federal, 2ª Vara-PE

 

 

 

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