sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

COLÉGIOS FEDERAIS. EXAME DE SELEÇÃO. EXIGÊNCIA NÃO PREVISTA EM LEI. PRECEDENTE DO STJ.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Assunto de grande importância é tratado na sentença que segue: Colégios Federais podem impor em seus editais exigências não previstas em Lei, nos exames vestibulares, nos quais os candidatos são crianças? No presente caso, a exigência consistiu em que a criança candidata teria que ter cursado no ano anterior ao da matrícula no Colégio Federal o 5º Período e, caso tivesse cursado o 6º Período, ficaria impedida de matricular-se, mesmo que se encontrasse entre os concorrentes classificados?
Boa leitura. 

Obs.: sentença pesquisada e minutada pela Assessora 
Luciana Simoes Correa de Albuquerque

PROCESSO Nº: 0800229-13.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: M. L. D. A. F.
REPRESENTANTE(PAIS): E D V De A
ADVOGADO: Kátia Rejane Santa Cruz De Souza
REPRESENTANTE(PAIS): E
IMPETRANTE: M. E. D. S. L.
REPRESENTANTE(PAIS): E S Da S
ADVOGADO: Kátia Rejane Santa Cruz De Souza
REPRESENTANTE(PAIS): J A M
IMPETRANTE: B. A. M.
REPRESENTANTE(PAIS): J A M
ADVOGADO: Kátia Rejane Santa Cruz De Souza
REPRESENTANTE(PAIS): J A L J
IMPETRANTE: G. L. D. A. L.
REPRESENTANTE(PAIS): J De A L J
ADVOGADO: Kátia Rejane Santa Cruz De Souza
REPRESENTANTE(PAIS): E D V DE A
IMPETRADO: UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO
AUTORIDADE COATORA: PRÓ-REITOR PARA ASSUNTOS ACADÊMICOS DA UFPE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

Sentença tipo A

EMENTA:- ADMINISTRATIVO. MATRÍCULA NO COLÉGIO APLICAÇÃO DA UFPE.

Não há Lei autorizando o obstáculo consignado no edital em questão para acesso ao Colégio Aplicação, consistente em não poder ter cursado o 6º ano no exercício anterior àquele em que pretende ingressará no mesmo 6º ano do mencionado Colégio.
Eventual retardo na via estudantil do(a) candidato(a) é um assunto individual que diz respeito a ele(a) e a sua família.
            Concessão da segurança.             

Vistos, etc.
1. Breve Relatório

M E DA S L e OUTRAS TRÊS,  qualificadas na Inicial, representadas pelos genitores ali especificados,  impetraram este Mandado de Segurança com pedido Liminar  contra ato do DD PRÓ-REITOR PARA ASSUNTOS ACADÊMICOS DA UFPE, Sr. P S A DE G. Aduziram, em síntese, que: as Impetrantes contariam com 11(onze) e 12 (doze) anos de idade e estariam cursando  o 6º ano, conforme documentação anexa; as Impetrantes seriam exímias estudantes e teriam interesse em ingressar no Colégio de Aplicação, através de processo seletivo para ingresso no 6º ano do Ensino Fundamental para 2019; o Edital, em sua introdução, bem como na cláusula 2.4, proibiria que as Impetrantes ingressassem no Colégio de Aplicação, uma vez que já estariam cursando o 6º ano, e segundo edital, seria necessário estar em 2018, cursando o 5º ano do  Ensino Fundamental; no entanto, o próprio edital, no item 2.1, disciplinaria, que para ingressar no 6º ano, crianças ou adolescente deveriam ter nascido entre 01/01/2006 a 31/12/2009, e no presente caso, os Impetrantes estariam dentro  dessa faixa etária; há mais de dois anos, as Impetrantes, mesmo sendo pessoas pobres, estariam fazendo cursinhos preparatórios, para obter êxito nas provas, e serem matriculadas, o que infelizmente não poderia acontecer, tendo em vista a limitação do edital; as Impetrantes teriam sido aprovadas no referido certame, conforme lista de remanejamento anexa; mesmo aprovadas, estariam impedidas de ser matriculadas no Colégio de Aplicação, por conta de proibição constante no edital,  os candidatos aptos (aprovados- remanejados)  ao 6º ano do ensino fundamental do Colégio de Aplicação, deveriam realizar a matricula de 14 a 18 de janeiro do  corrente ano. Teceram outros comentários. Pugnaram, ao final, fosse assegurada aos Impetrantes as matriculas para o ingresso no 6º ano do ensino Fundamental para 2019 - Colégio de Aplicação do Centro de Educação da UFPE, RECIFE/PE.  Protestaram o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.
Foi proferida decisão deferindo o pleito liminar requestado (Id. 4058300.9682995).
A UFPE pugnou pela juntada de documento alusivo ao cumprimento da determinação judicial (Id. 4058300.9710172).
Certificado o decurso de prazo sem manifestação da autoridade coatora (Id. 4058300.11018700).
O Ministério Público Federal se manifestou pela denegação da segurança (Id. 4058300.11170101).
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação
Conforme consignado na decisão sob identificador 4058300.9682995, nos termos do art. 5º, LXIX da Constituição de 1988 e do art. 1º da Lei nº 12.016/09, conceder-se-á mandado de segurança para proteger direito líquido e certo, não amparado por habeas-corpus ou habeas-data, quando o responsável pela ilegalidade ou abuso de poder for autoridade pública ou agente de pessoa jurídica no exercício de atribuições do Poder Público.
No caso em tela, as Impetrantes ingressaram com mandado de segurança para efetuar a matrícula para cursar o 6º ano do ensino fundamental do Colégio de Aplicação.
Quanto às condições para participar do processo de seleção, dispõe o Edital:
2. CONDIÇÕES PARA PARTICIPAR DO PROCESSO DE SELEÇÃO
2.1. Idade: Somente podem participar do processo seletivo as crianças e adolescentes nascidos de 01/01/2006 a 31/12/2009.
2.2. CPF: No ato de preenchimento do formulário eletrônico de solicitação de inscrição, será exigido o número do CPF do
candidato.
2.3. Carteira de Identidade: No ato de preenchimento do formulário eletrônico de solicitação de inscrição, será exigido o número
da carteira de identidade do candidato.
2.4. Nível de escolaridade: Estar, em 2018, cursando o 5º ano conforme a Lei nº 11.274/2006 e Resolução n° 24/2017 do Conselho Coordenador de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFPE. Com base no entendimento da Lei nº 9.394/1996, a Resolução 24/2017, do Conselho Coordenador de Ensino, Pesquisa e Extensão da UFPE vetará a matrícula de candidatos, eventualmente aprovados no certame, caso estes estejam cursando ou que já tenham cursado integralmente o 6º ano do Ensino Fundamental até 31 de dezembro de 2018.

De fato, o edital do certame determina, nos termos transcritos acima, que será eliminado o candidato que não tivesse nascido "de 01/01/2006 a 31/12/2009"  e o candidato que já tivesse concluído o 6º ano em 2018, pois teria que "Estar, em 2018, cursando o 5º ano ...".
Tenho sempre muita cautela quando se trata de conceder medida liminar contra regra editalícia, porque finda por ser uma intervenção do Judiciário na seara administrativa.
Por isso, só o faço quando a regra do edital entra em confronto com alguma regra constitucional ou legal.
O referido requisito idade, exigido no Edital, está de acordo com a Legislação Brasileira relativa à educação, mas não há em nenhuma Lei regra estabelecendo o requisito de estar cursando o 5º no ano anterior(no caso,   em 2018), para matricular-se no ano seguinte(no caso, em 2019),  em Colégio Público Federal.
Então, prima facie, tenho que a disposição prevista no item "2.4" do edital, ao impor mencionada exigência, restritiva de acesso a Instituição Pública Federal de Ensino, data venia,   viola o direito constitucional de acesso à educação básica e fundamental, previsto, principalmente, nos artigos 205 e 206 da Constituição Federal, e viola o princípio constitucional da legalidade, agasalhado no inciso II do art. 5º da mesma Carta, segundo a qual ninguém poderá fazer ou deixar de fazer algo senão em virtude de Lei, princípio esse repetido no art. 37 da mesma carga, quando se refere ao direito administrativo.
Se as Impetrantes, mesmo já tendo cursado a série do Ensino Fundamental para a qual pretendem a vaga, decidem arcar com o ônus de ter a sua formação escolar atrasada em um ano, em nome da oportunidade de matricular-se em uma escola de melhor qualidade de ensino, como o é o Colégio de Aplicação da UFPE, objetivando uma educação de ponta, o fazem no pleno gozo de seus direitos e garantias constitucionalmente previstos, não sendo admissível tê-los restringidos por norma editalícia, sem base em regra constitucional ou em Lei.
Se as Impetrante tivessem idade inferior à mínima exigida no Edital, aí sim teria que prevalecer o Edital, porque mencionada exigência teria base legal, firmada em Lei que foi recentemente considerada constitucional pelo STF.
Mas impedir que tenham acesso ao referido Estabelecimento de Ensino Federal, porque já cursaram o 6º ano, uma vez que irão começar os seus estudos em tal Estabelecimento de Ensino Federal exatamente no 6º ano, data venia, além da falta de amparo constitucional e legal, não tem nenhum sentido lógico, pois é até melhor, porque certamente terão maior aproveitamento, uma vez que irão rever parte de matérias já vistas e certamente outras matérias que para elas serão novidades.
Há de se registrar, a título de complementação, que reputo inexistir quebra do princípio da isonomia, tendo em vista que a matéria exigida no teste de seleção se resume ao conteúdo dado até o quinto ano. Assim, o fato de já terem cursando o 6º ano em nada influenciou na realização do teste quanto aos demais candidatos.
O Tribunal Regional Federal - 5ª Região manifestou-se, reiteradas vezes, no mesmo sentido acerca da matéria ora debatida, conforme demonstra o seguinte julgado (grifos acrescidos):
ADMINISTRATIVO. ALUNO DO 6º ANO. APROVAÇÃO EM PROCESSO SELETIVO. MATRÍCULA NO COLÉGIO DE APLICAÇÃO DA UFPE. INGRESSO PERMITIDO APENAS AOS CANDIDATOS DO 5º ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL. ITEM 2.4 DO EDITAL. DIREITO DE ACESSO À EDUCAÇÃO. PRECEDENTE DESTA TURMA.
1. Trata-se de apelação interposta contra sentença proferida pelo Juízo Federal da 12ª Vara da SJ/PE,que denegou a segurança que objetivava a matrícula do impetrante e o consequente ingresso no 6º ano do ensino fundamental, em 2019, no Colégio de Aplicação do Centro de Educação da UFPE.
2. O cerne da controvérsia reside em saber se o impetrante, concluinte do 6º ano do ensino fundamental, tem direito a ingressar no Colégio de Aplicação da UFPE para cursar o mesmo ano.
3. Entendeu o Juízo a quo por denegar a segurança, tendo em vista que o Edital n° 19/2018 (de abertura do processo seletivo em questão) dispõe, em seu item 2.4, que o ingresso no 6° ano do ensino fundamental, em 2019, é reservado exclusivamente para estudantes que estejam, em 2018, cursando o 5° ano (sistema de ensino adequado à Lei nº 11.274/2006, que estabelece o ensino fundamental em nove anos).
4. Embora o edital preveja expressamente que o candidato, para participar da seleção para ingresso no sexto ano em 2019 do Colégio de Aplicação, deva cursar o 5º ano do ensino fundamental no ano de 2018, não se mostra razoável obstar a matrícula do impetrante, aprovado no certame dentro do número de vagas, pelo fato de já ter cursando o 6º ano em 2018. Tal entendimento não implica a quebra do princípio da isonomia, porque a matéria exigida no teste de seleção se resume ao conteúdo dado até o quinto ano. Assim, o fato de já ter cursado o 6º ano em nada influencia a realização do teste quanto aos demais candidatos.
5. Quanto ao tema, já se pronunciou esta Primeira Turma no sentido de que "a referida interpretação não malfere o princípio da isonomia, insculpido no art. 5º, da CF, ou mesmo o artigo 205 da Constituição Federal, eis que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família, devendo ser promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. A autonomia didático-científica e administrativa das Universidades prevista no art. 207, da CF, não resta malferida quando se está diante garantia ao direito à educação" (TRF5, APELREEX/PE nº 08001244220154058311, Rel. Des. Fed. Élio Wanderley de Siqueira Filho, Primeira Turma, Julgamento: 07/04/2017).
6. Dessa forma, considerando que o impetrante logrou aprovação no certame dentro das vagas oferecidas, além de atender ao requisito da idade mínima, deve ter assegurado o direito à matrícula e ao ingresso no 6º ano do ensino fundamental do Colégio de Aplicação do Centro de Educação da UFPE para o ano de 2019, excedendo o limite da razoabilidade a cláusula do edital que proíbe o ingresso dos alunos que cursaram ou estejam cursando o 6º ano.
7. Apelação provida.[1]
Ainda, em caso análogo, o Superior Tribunal de Justiça posicionou-se nesse sentido
"RECURSO ESPECIAL Nº 1.499.338 - PE (2014/0309065-6) RELATOR : MINISTRO SÉRGIO KUKINA RECORRENTE : UNIVERSIDADE FEDERAL DE PERNAMBUCO REPR. POR : PROCURADORIA-GERAL FEDERAL RECORRIDO : G V L (MENOR) REPR. POR : M R V L ADVOGADO : KÁTIA REJANE SANTA CRUZ DE SOUZA DECISÃO Trata-se de recurso especial manejado com fundamento no art. 105, III, a, da CF, contra acórdão proferido pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, assim ementado (fl. 108): EMENTA: ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO PARA O COLÉGIO DE APLICAÇÃO. INSCRIÇÃO PARA O 6o ANO. DESNECESSIDADE DE COMPROVAÇÃO QUE O ALUNO ESTEJA CURSANDO O 5o ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL. ARTS. 205 E 206 DA CF/88. DIREITO A EDUCAÇÃO. I - O impetrante - já matriculado no 6o ano do Colégio Integral, se inscreveu no concurso para o Colégio de Aplicação, também para cursar o 6o ano, tendo o seu pedido indeferido, por não haver comprovado que estava cursando em 2013 o 5o ano do Ensino Fundamental. II - A exigência editalícia contida no item 2.2, ao estabelecer que o candidato deve estar cursando o 5o ano, viola os artigos 205 e 206 da CF/88, que garantem a todos o direito à educação. III - Relevante ressaltar que o impetrante preenche o item 2.1 do edital, que prevê como condição para participação no certame, a idade máxima de 12 anos. Precedente: AGTR nº 08021447820134050000. Rel.: Des. Federal Manoel Erhardt. DJ: 20.02.2014). IV - Apelação e remessa oficial improvidas. Opostos embargos declaratórios, foram rejeitados ante a inexistência dos vícios elencados no art. 535 do CPC (fls. 123/126). A parte recorrente aponta violação aos arts. 535 do CPC; 41 da Lei 8.666/93; 3o, I, e 53 da Lei 9.394/96. Para tanto, sustenta que: (I) o acórdão integrativo deveria ser anulado, pois não teria sanado vício indicado nos embargos de declaração; e (II) seria legítima a exigência contida no edital referente ao processo seletivo em tela. O Ministério Público Federal emitiu parecer em que opinou pelo não conhecimento do recurso especial (fls. 180/182). É o relatório. Verifica-se, inicialmente, não ter ocorrido ofensa ao art. 535 do CPC, na medida em que o Tribunal de origem dirimiu, fundamentadamente, as questões que lhe foram submetidas, apreciando integralmente a controvérsia posta nos presentes autos. Ressalte-se que não se pode confundir julgamento desfavorável ao interesse da parte com negativa ou ausência de prestação jurisdicional. Por outro lado, destaca-se da fundamentação do acórdão recorrido o seguinte trecho (fl. 107): O impetrante - já matriculado no 6o ano do Colégio Integral, se inscreveu no concurso para o Colégio de Aplicação, também para cursar o 6o ano, tendo o seu pedido indeferido, por não haver comprovado que estava cursando em 2013 o 5o ano do Ensino Fundamental. A CF/88 em seus artigos 205 e 206 dispõem o seguinte: "Art. 205. A educação, direito de todos e dever do Estado e da família, será promovida e incentivada com a colaboração da sociedade, visando ao pleno desenvolvimento da pessoa, seu preparo para o exercício da cidadania e sua qualificação para o trabalho. Art. 206. O ensino será ministrado com base nos seguintes princípios: I - igualdade de condições para o acesso e permanência na escola;"Entendo que a exigência editalicia contida no item 2.2, ao estabelecer que o candidato deve estar cursando o 5o ano, viola os artigos 205 e 206 da CF/88, que garantem a todos o direito à educação. Ressalte-se, ainda, que o item 2.1 prevê como condição para participação no certame a idade máxima de 12 anos, requisito preenchido pelo impetrante. Assim, verifica-se que o Tribunal de origem decidiu a controvérsia à luz de fundamentos eminentemente constitucionais, matéria insuscetível de ser examinada em sede de recurso especial. A propósito: ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. DESISTÊNCIA OU DESCLASSIFICAÇÃO DE CANDIDATO GERA PARA OS SEGUINTES NA ORDEM DE CLASSIFICAÇÃO DIREITO SUBJETIVO À NOMEAÇÃO. ACÓRDÃO RECORRIDO EM CONSONÂNCIA COM JURISPRUDÊNCIA DO STJ. SÚMULA 83/STJ. PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS. ANÁLISE. IMPOSSIBILIDADE. EXAME DAS REGRAS DO EDITAL. ÓBICE DAS SÚMULAS 5 E 7 DO STJ. 1. O Tribunal a quo decidiu de acordo com jurisprudência desta Corte, no sentido de que a desistência ou desclassificação de candidato gera para os seguintes na ordem de classificação direito subjetivo à nomeação. Incidência da Súmula 83/STJ. 2. Ademais, observa-se que Corte a quo fundamentou sua decisão com base nos princípios constitucionais do direito à educação e da razoabilidade, o que afasta a competência do STJ para rever a conclusão do referido órgão julgador. 3. Outrossim, o Tribunal de origem assentou seu entendimento com base nas normal previstas no edital do certame, o que atrai o óbice das Súmulas 5 e 7 desta Corte. Agravo regimental improvido. (AgRg no REsp 1.417.528/SE, Rel. Ministro HUMBERTO MARTINS, SEGUNDA TURMA, julgado em 3/4/2014, DJe 14/4/2014). Ante o exposto, nego seguimento ao recurso especial. Publique-se. Brasília (DF), 02 de fevereiro de 2015. MINISTRO SÉRGIO KUKINA Relator [2]
Sendo assim, a concessão da segurança é medida que se impõe.
3. Dispositivo
Diante de todo o exposto, ratifico a decisão sob  4058300.9682995) e CONCEDO A SEGURANÇA DEFINITIVA  para fins de assegurar aos Impetrantes o direito de serem matriculadas no 6º ano do ensino Fundamental para 2019 - Colégio de Aplicação do Centro de Educação da UFPE, RECIFE/PE.
Sem honorários sucumbenciais (art. 25, da Lei n.º 12.016/2009).
Sentença sujeita ao duplo grau obrigatório de jurisdição (art. 14, § 1º, Lei n. 12.016/2009). 
Registre-se. Intimem-se.
Recife, 30.01.2020
Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE.
(lsc)
____________________________
[1] Brasil. Tribunal Regional Federal. PROCESSO: 08184273520184058300, AC - Apelação Civel - , DESEMBARGADOR FEDERAL ROBERTO MACHADO, 1º Turma, JULGAMENTO: 09/09/2019, sem indicação de veículo de publicação.
Acesso em 22/01/2020
[2] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. STJ - REsp: 1499338 PE 2014/0309065-6, Relator: Ministro SÉRGIO KUKINA, Data de Publicação: DJ 04/02/2015.

Acesso em 22/01/2020

quinta-feira, 30 de janeiro de 2020

Quando não se deve utilizar o Mandado de Segurança.




Por Francisco Alves dos Santos Júnior
Na sentença abaixo publicada, constata-se que nem sempre se pode utilizar do Mandado de Segurança para pleitear algum alegado direito. Esse procedimento judicial no direito brasileiro não permite a sua utilização quanto existem fatos que necessitam ser comprovados por outros documentos que não foram acostados com a petição inicial, ou pelo depoimento pessoal do Impetrante, diligências em determinados locais e ainda possível ouvida de Testemunhas, ainda que por indicação do Juiz, como as referidas em documentos constantes dos autos. 
E, em situações como a acima descrita, resta ao Juiz indeferir a petição inicial e extinguir o mandado de segurança, sem resolução do mérito, ressalvando ao Impetrante buscar a sua pretensão pela via judicial próprio, sendo que no caso a mais apropriada seria o procedimento comum. 
Boa leitura. 




PROCESSO Nº: 0809017-16.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: I F DOS S C
ADVOGADO: O I F N
IMPETRADO: CONSELHO REGIONAL DE EDUCACAO FISICA DA 12 REGIAO PERNAMBUCO/ALAGOAS - CREF12/PE-AL
AUTORIDADE COATORA: PRESIDENTE SR. LÚCIO FRANCISCO ANTUNES BELTRÃO NETO
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



Sentença tipo C, registrada eletronicamente





EMENTA: - MANDADO DE SEGURANÇA. DILAÇÃO PROBATÓRIA.


Se restam dúvidas sobre a real frequência do Impetrante em curso presencial na noticiada IES e como não cabe dilação probatória nos estreitos limites do Mandado de Segurança, cabe a extinção do processo, sem resolução do mérito, ressalvando-se o esgotamento da via judicial ordinária, na qual o Impetrante poderá, com a respectiva largueza probatória, provar a lisura da sua formatura.

Extinção do processo, sem resolução do mérito. 



Vistos etc.

1. Relatório

I F DOS S C, qualificado na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança, com pedido de liminar, em face do CONSELHO REGIONAL DE EDUCAÇÃO FÍSICA DA 12ª REGIÃO, neste ato representada pelo seu Presidente Sr. Lúcio Francisco Antunes Beltrão Neto. Inicialmente, discorreu sobre a injusta resistência encontrada pelos professores e profissionais de Educação Física ao solicitarem a inclusão de categoria junto aos Conselhos Profissionais. Aduziu, em apertada síntese, que: o óbice apresentado pelo Conselho Regional de Educação Física da 12ª Região cingiria-se à anômala fiscalização que a autarquia profissional viria promovendo em face das instituições de ensino, justificando seus atos em suposta prudência, ultrapassando o prazo de resposta previsto para expedir as cédulas profissionais; o injusto óbice levantado pelas autoridades coatoras viria causando prejuízos à parte impetrante, impossibilitando-a de trabalhar, fazendo-se mister o reconhecimento da ilegalidade da fiscalização promovida, assim como a imediata expedição de sua cédula profissional permitindo-lhe exercer a profissão cursada seguindo todas as formalidades legais. Teceu outros comentários. Transcreveu dispositivos legais e ementas de decisões judiciais. Pugnou, ao final, fosse concedida liminarmente a segurança pleiteada:  "1 - Conceder, em análise dos autos, a segurança pretendida inaudita altera pars, em sede LIMINAR, reconhecendo, consoante o disposto no inciso III do artigo 7° da Lei 12.016/09, a ilegalidade da fiscalização anômala promovida pelo Conselho Regional de Educação Física da 12.ª Região, fazendo prevalecer o conteúdo da Nota Técnica 387/2014 - SERES/MEC, determinando a imediata expedição, caso a procedência de seu diploma seja o único óbice, da cédula profissional da parte impetrante, permitindo-lhe exercer a profissão cursada" (sic). No mérito, requereu: "4 - Conceder a segurança pleiteada, reconhecendo, consoante o disposto no inciso III do artigo 7° da Lei 12.016/09, a ilegalidade da fiscalização anômala promovida pelo  Conselho Regional de Educação Física da 12.ª Região, fazendo prevalecer o conteúdo da Nota Técnica 387/2014 - SERES/MEC, determinando a imediata expedição, caso a procedência de seu diploma seja o único óbice, da cédula profissional da parte impetrante, permitindo-lhe exercer a profissão cursada" (sic). Inicial instruída com procuração e documentos.

R. despacho proferido em 30/05/2019 (id. nº 4058300.10710824), no qual se determinou a intimação do Impetrante para ofertar esclarecimentos referentes à tramitação do processo indicado no sistema PJe como prevento (PJe nº 0800608-27.2019.4.05.8308S), cujos autos eletrônicos foram remetidos para a Seção Judiciária do Ceará.

A Parte Impetrante, em atenção ao r. despacho supra, apresentou manifestação (id. nº 4058300.10787851).

Decisão proferida em 05/07/2019 (id. nº 4058300.11083111), na qual foi determinada a intimação do Impetrante para acostar nos autos comprovante do noticiado pedido de desistência formulado no Mandado de Segurança nº 5029601-30.2019.4.02.5101, em trâmite na 1ª Vara Federal do Ceará.

Em cumprimento à decisão supra, a Parte impetrante pugnou pela juntada da petição postulando a desistência do feito em trâmite na Seção Judiciário do Ceará, bem como a respectiva sentença homologatória (id. nº 4058300.11286702).

R. decisão proferida em 10/09/2019 (id. nº 4058300.11743724), na qual foi indeferida a medida liminar pleiteada, bem como se determinou a notificação da autoridade apontada como coatora para apresentar suas informações legais; ciência ao órgão de representação judicial do mencionado Conselho; e vista ao MPF para o r. parecer legal.

A Autoridade apontada como coatora, o Presidente do Conselho Regional de Educação Física da 12ª Região/PE-AL - CREF12/PE-AL, prestou as informações (id. nº 4058300.12554459). Preliminarmente, suscitou a ocorrência de litispendência; inadequação da via judicial escolhida por ausência de direito líquido e certo. No mérito, alegou, em síntese, que: o Impetrante teria solicitado Registro Profissional junto ao CREF12/PE, tendo alegado ter concluído o curso de Bacharelado em Educação Física na Faculdade Piracanjuba-FAP; administrativamente teria sido realizado procedimento padrão, de buscar, através de ofício, junto às Instituições de Ensino Superior, informações sobre a veracidade dos documentos apresentados, ao que teria sido respondido que o mesmo teria concluído o curso; entretanto, não constaria a informação do "campus" onde havia sido realizado o curso; o questionamento acerca do local onde o Requerente teria cursado/assistido aulas seria pertinente, uma vez que o Impetrante residiria em Petrolina/PE, e o único campus da Instituição emitente dos documentos ficaria em Piracanjuba/GO, cerca de 1600 km; dúvidas acerca da regularidade do curso teriam surgido, no momento em que ao realizar busca no site "e-MEC", teria sido observado que o Ministério da Educação teria autorizado Educação Física apenas presencial, na sede da Instituição; teria sido realizado consulta ao site da Faculdade, onde também constaria a informação de cursos de Educação Física apenas na modalidade presencial; teria sido realizada consulta à DISUP/MEC pelo CREF12/PE através dos OFÍCIOS 165/2019 e 166/2019, sendo respondido que a solicitação de esclarecimentos desta natureza deveria ser enviada à SERES/MEC, o que teria sido realizado, sem reposta até o presente momento, por meio do Ofício 333/2019; em primeiro contato com a Instituição, teria sido informado que os concluintes que haviam solicitado Registro junto ao CREF12/PE, teriam cursado inteiramente "online"; em um segundo contato, o Diretor Acadêmico da Faculdade Piracanjuba-FAP teria informado que o curso tratava de uma complementação (em Bacharelado) para alunos que já possuíam graduação em Licenciatura, sendo que as aulas eram ministradas em locais diversos da sede, sem especificar a forma, o local ou marco regulatório que autorizasse curso fora de Piracanjuba/GO; teria afirmado ainda que essa complementação poderia ser realizada fora da sede da Instituição, haja vista que não ultrapassava 20% da carga horária total do curso presencial; até a presente data, o conselho estaria aguardando resposta dos questionamentos solicitados por e-mail; tendo em vista a improbabilidade de o impetrante ter cursado presencialmente o curso de bacharelado em Educação Física, distante cerca de 1600 km de sua residência, assim como da ausência de autorização do MEC para a realização do curso online, a Comissão de Documentação do Conselho, em reunião realizada no dia 31/05/2019, teria resolvido suspender todos os pedidos de registro que estão na mesma situação, até pronunciamento do MEC, do CONFEF e da Faculdade acerca de tal situação. Discorreu sobre a regulamentação da profissão de Educação Física e sobre a criação, objetivos, competência e jurisdição dos Conselhos Federal e Regionais de Educação Física (sistema CONFEF/CREFs, criado pela Lei Federal nº 9.696, de 1º/09/1998, publicado D.O.U. em 02/09/98). Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pelo acolhimento das preliminares arguídas e que seja negado o pedido de concessão da liminar. Em julgamento definitivo que seja denegada a segurança.

O Ministério Público Federal ofertou seu r. parecer, pugnando pela extinção do feito sem resolução do mérito, diante da inadequação da via processual eleita, nos termos do artigo 485, inciso IV, do CPC c/c § 5º, do artigo 6º da Lei 12.016/2009 (id. nº 4058300.12993693).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2.  Fundamentação

2.1 Preliminares

2.1.1 Da litispendência

A Autoridade apontada como coatora, o Ilmo. Sr. Presidente do Conselho Regional de Educação Física da 12ª Região/PE-AL - CREF12/PE-AL, suscitou, em suas Informações (id. nº 4058300.11898994), preliminarmente, a ocorrência de litispendência com o Mandado de Segurança nº 0808996-40.2019.4.05.8300, que tramita(ou) na MM. 7ª Vara da Justiça Federal/PE.

Esclarece ainda que foram distribuídas várias ações mandamentais, com o mesmo objeto do presente mandamus, que estariam em tramitação por diversas varas desta Seção Judiciária de Pernambuco, relacionadas na petição inicial.

Configura-se litispendência ou a coisa julgada, quando há reprodução de ação idêntica a outra anteriormente ajuizada, adotando, o CPC, a teoria da tríplice identidade de ações, ou seja, são idênticas as demandas que possuem as mesmas partes, a mesma causa de pedir e o mesmo pedido (CPC, art. 337, §§ 1º e  2º).

Há litispendência quando se repete ação que está em curso; há coisa julgada, quando se repete ação que já foi decidida por sentença, de que não caiba recurso (CPC, art. 337, 3º e 4º).

Relativamente à preliminar de litispendência, não assiste razão à Parte Impetrada, porque inexiste identidade de partes.

Desse modo, conforme se observa, embora a causa de pedir e os pedidos possam ser idênticos, a Parte Impetrante é distinta em cada uma das ações relacionadas na inicial, o que afasta a ocorrência de litispendência, que requer para a sua configuração, como dito, tríplice identidade: de partes, de causa de pedir e de pedido.

Não merece acolhida, portanto, a preliminar de litispendência levantada pela Parte Impetrada.

2.1.2 Da Inadequação da via eleita - ausência do direito líquido e certo do Impetrante

Em suas informações, aduz a Autoridade apontada como coatora que a utilização do presente mandado de segurança seria inadequada, pois neste tipo de ação a prova deveria ser pré-constituída, o que não teria ocorrido neste caso, haja vista a necessidade de dilação probatória, uma vez que os documentos acostados a petição inicial não demonstrariam de forma incontroversa o suposto direito líquido e certo do Impetrante.

Afirma que o "ponto principal da discussão está no fato de não existir no momento da solicitação de Registro, e nem até o presente, certeza quando a validade do curso ofertado, haja vista que o mesmo é autorizado pelo MEC para ofertar Educação Física apenas presencialmente, na sua sede, em Goiás. Informações estas, estão disponíveis no site do e-MEC e na própria página da Instituição, sendo que o Impetrante reside e sempre residiu em Pernambuco, conforme documentação por ele apresentada no CREF12/PE, e nos Autos".

Registra ainda que não há sequer um "ato" do Impetrado contra o qual pese a alegação de arbitrariedade, sendo, também neste aspecto, descabido o Mandado de Segurança.

Com efeito, o mandado de segurança é remedium juris para proteção de direito líquido e certo, resultando, porém, de fato comprovado de plano, devendo o pedido vir embasado em provas claras, límpidas, já que, no procedimento do mandamus, é inadmissível a dilação probatória.

Os Conselhos de Categorias Profissionais têm amplos poderes de investigação, quando há algum indício de que aquele que nele pretende se registrar para o exercício da respectiva atividade profissional exibe diploma eivado de dúvidas, como a levantada nas informações da Autoridade apontada como coatora.

O espancamento de tais dúvidas dependeria de provas, tais como: o Impetrante morou na cidade onde se encontra sediada a noticiada IES? Pois, segundo apurou a Autoridade Impetrada, junto a órgãos próprios do Ministério da Educação, mencionada IES só poderia ministrar cursos presenciais.

Isso não está comprovado.

Se o ora Impetrante estudou, presencialmente, na mencionada IES, no Estado de Goiás, por que não juntou comprovantes de despesas de viagens e de hospedagens no local?

Também não há comprovação da presença física do Impetrante às aulas do referido curso.

Nem a forma como pagou as mensalidades ou semestralidades ou anuidades do seu curso.

E etc. e etc. e etc.

Noto que no Ofício, acostado sob id 4058300.12554501, que Autoridade do MEC remeteu para o CREF7ªR, também não houve nenhuma  menção à situação do ora Impetrante, mas se esclareceu que o curso de Educação Física fora autorizado, mas ainda estava em processo para reconhecimento e, quanto a forma  de ser ministrado, remeteu-se o Destinatário ao site do MEC, que foi consultado pela ora Autoridade Impetrada e constatou-se que seria  presencial. 

Como decidir o mérito de questão tão delicada e importante, sem tomar o depoimento do Autor, sem ouvir Dirigentes da mencionada IES, e Testemunhas, nem realizar a colheita de outras provas, como as acima  indicadas, não existentes nos autos?

Tenho que realmente, como bem alegado pela DD Autoridade apontada como coatora,  estamos diante da situação prevista no inciso IV do art. 485 do vigente CPC, que tem a seguinte redação.
"Art. 485 - O juiz não resolverá o mérito quando:

 IV - verificar a ausência de pressupostos de constituição e de desenvolvimento válido e regular do processo".

É que exigências do art. 1º e 6º da Lei 12.016, de 2009, que dizem respeito à prova pré-constituída para o mandado de segurança, não estão de todo atendidas.

Há mais dúvidas do que certezas quanto à formatura legal do ora Impetrante no curso de Educação Física, atividade de alta importância na atualidade, pois esse tipo de profissional lida com pessoas, de todas as idades, na correção de defeitos físicos, no aprimoramento do físico e da mente, na manutenção da saúde físico-mental dos seus clientes e até mesmo no ensino a alunos que poderão vir a ser seus futuros colegas de trabalho.

Então, ninguém pode receber autorização de um Conselho de Categoria Profissional para exercer tão importantes atividades, como pretende o ora Impetrante, se não houver plena certeza da lisura da sua formatura e da obtenção do respectivo diploma, tudo conforme as detalhadas informações da DD Autoridade apontada como coatora.

Esclarece ainda a Autoridade Impetrada que foram requeridas várias solicitações de alunos, com domicílio em Pernambuco, todos egressos do curso de Bacharelado em Educação Física da Faculdade de Piracanjuba - FAP, com sede no estado de Goiás, razão pela qual, considerando ser bastante improvável tais alunos terem cursado presencialmente o curso de Bacharelado em Educação Física, distante cerca de 1.600 km de suas residências, assim como a ausência de autorização do MEC para a realização do curso de Educação Física a distância, a Comissão de Documentação do Conselho Impetrado resolveu suspender todos os pedidos de registro que estão na mesma situação do ora Impetrante, até pronunciamento do MEC, do CONFEF e da Faculdade de Piracanjuba/GO acerca de tal situação (id. nº 4058300.12554481).

Então, resta-me extinguir o processo, sem resolução do mérito, ressalvando-se ao Impetrante a via ordinária, na qual poderá realizar amplas provas no sentido de que realmente foi regular os seus anos de estudo na mencionada IES, ressalva esta hoje estabelecida no art. 19 da Lei nº 12.016, de 2009.

Oxalá, o MPF desperte para questão e peça a devida apuração nas vias legais próprias, até mesmo porque, segundo as Informações da DD Autoridade apontada como coatora, há inúmeros outros casos, envolvendo a mesma IES.

3. Dispositivo

Posto isso, rejeito a preliminar de litispendência, mas acolho a preliminar de impropriedade do meio processual escolhido e, com base na fundamentação jurídico-legal indicada acima, dou este processo por extinto, sem resolução do mérito, denegando a segurança, mas ressalvando ao ora Impetrante a possibilidade de rediscutir o assunto na via judicial ordinária, caso o seu alegado direito não tenha sido fulminado pela decadência ou prescrição.

Custas pelo Impetrante.

Sem verba honorária, ex lege.

Registre-se. Intimem-se.
Recife, 30.01.2020

Francisco Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE



(mppl)

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

SUPERVENIENTE PERDA DE OBJETO. EFEITOS PROCESSUAIS NO MANDADO DE SEGURANÇA.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Quando o mandado de segurança é extinto por superveniente falta de objeto, por ter a Autoridade apontada como coatora, quando o feito judicial já está em andamento, atendido à pretensão da Empresa Impetrante, fica a Pessoa Jurídica de direito público, à qual mencionada Autoridade está vinculada, responsável pelo ressarcimento das custas processuais despendidas pela Impetrante? 

É caso de indeferimento da petição inicial e consequente extinção do processo, sem resolução do mérito ou apenas de extinção do processo, sem resolução do mérito? 

Essa matéria é debatida na sentença que segue, com interpretação do inciso III do art. 330 do vigente Código de Processo Civil e com aplicação do seu art. 90, mesclado com o principio da causalidade. 

Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0812732-66.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: GE POWER & WATER EQUIPAMENTOS E SERVICOS DE ENERGIA E TRATAMENTO DE AGUA LTDA.
ADVOGADO: Alexandre Lira De Oliveira e Outros
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL e outro
AUTORIDADE COATORA: INSPETOR-CHEFE DA INSPETORIA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL NO PORTO DE SUAPE,
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)
Sentença tipo A

Ementa:- RECURSO DE EMBARGOS DE DECLARAÇÃO EM FACE DE SENTENÇA. CONTRADIÇÃO. PERDA SUPERVENIENTE DE OBJETO. PRINCÍPIO DA CAUSALIDADE.
-Constatada a apontada contradição, merecem ser  acolhidos os pedidos formulados no Recurso de Embargos de Declaração.
-Se a Autoridade atende ao pleito do Administrado quando este já impetrou mandado de segurança com o mesmo objetivo, não cabe o indeferimento da petição inicial, mas sim a simples extinção do feito, sem resolução do mérito, responsabilizando-se a Pessoa Jurídica à qual se encontra vinculada mencionada Autoridade pelo ressarcimento das custas despendidas pela(o) Impetrante(princípio da causalidade e regra do art. 90 do vigente Código de Processo Civil). 
-Sem verba honorária(Súmula 512 do STF e art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009).
Provimento


Vistos, etc.


1. Breve Relatório

GE POWER & WATER EQUIPAMENTO E SERVIÇOS DE ENERGIA E TRATAMENTO DE ÁGUA LTDA, qualificado na Inicial,  opôs este recurso de Embargos de Declaração  em face da sentença de ID 4058300.11531479, aduzindo, em apertada síntese, que:  o presente Mandado de Segurança objetivaria a liberação das mercadorias importadas pela embargante e indevidamente retidas pela autoridade coatora, sob alegação de que a carga constaria no sistema Siscarga, como "entrega não permitida", sem que houvesse qualquer motivação ou fundamentação para o devido ato pela autoridade; após a impetração  do mandamus, fora proferido despacho requerendo a prestação de informações pela autoridade coatora, não se analisando, naquele momento, o pedido liminar; quando prestadas as informações, a Autoridade Coatora, bem como a própria Embargante, teriam informado que  as mercadorias teriam sido liberadas; a liberação teria se dado após a impetração do presente Mandado de Segurança, tendo relação precípua com o deslinde na esfera administrativa; intimada a se manifestar, a Embargante  teria confirmado o desembaraço e concordado com a perda superveniente do objeto, requerendo a extinção do feito em resolução do mérito, em razão da perda dos pressupostos de desenvolvimento válido e regular do processo, nos termos do Art. 485, IV, do CPC; teria sido proferida sentença indeferindo a petição inicial como se fosse hipótese de extinção do processo sem resolução de mérito, face à perda superveniente do objeto da ação; ao assim decidir, a r. sentença teria apresentado contradição em seu dispositivo; a sentença teria reputado como causa de indeferimento da petição inicial, a perda superveniente do interesse de agir, motivado pela satisfação da pretensão da Embargante, administrativamente, pela Autoridade Coatora, quando da liberação das mercadorias; não teria a sentença sopesado que o instituto do indeferimento da petição inicial, por ausência de interesse processual, estaria previsto no art. 330, III, do CPC; deveria ser observado na propositura da ação, situação totalmente distinta da ora analisada, em que a ausência de interesse processual apresentou-se no curso da ação; a sentença teria incorrido em contradição ao indeferir a petição inicial, tendo em vista a perda do objeto, uma vez que em sua fundamentação, não disporia sobre o instituto do indeferimento da inicial, mas, sim da perda superveniente do objeto, nos termos do art. 493 do CPC;  pelo princípio da causalidade, deveria ter constado na r. sentença o reembolso das custas pela Fazenda Nacional, tendo em vista que as mercadorias apenas teriam sido liberadas em virtude da impetração do presente writ, haja vista que estariam retidas de maneira ilegal por parte da Impetrada.Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pelo conhecimento e acolhimento dos presentes embargos de declaração, para que fosse sanada a contradição constante na r. sentença embargada e para que constasse, apenas, a extinção do processo sem resolução do mérito, conforme já requerido na petição de Id. 4058300.11276685 e atendendo ao princípio da causalidade, a Fazenda fosse condenada ao reembolso das custas.

A União (Fazenda Nacional) opinou pela decretação de improvimento dos aclaratórios 4058300.12183057.

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação
2.1 - Segundo o art. 1.022 do vigente Código de Processo Civil, os embargos de declaração podem ser manuseados para "esclarecer obscuridade ou eliminar contradição" ou "suprir omissão de ponto ou questão sobre o qual devia se pronunciar o juiz de ofício ou a requerimento" ou, ainda, "corrigir erro material".


Pois bem.
Pugna a Impetrante, ora embargante, pelo conhecimento e acolhimento dos presentes embargos de declaração, para que seja sanada o que considera contradição na r. sentença embargada e para que conste, apenas, a extinção do processo sem resolução do mérito, conforme já requerido na petição de ID 4058300.11276685, e que, atendendo ao princípio da causalidade, a Fazenda seja condenada ao reembolso das custas.
Registro, inicialmente, que a r. sentença embargada é da lavra da d. Magistrada Federal Substituta Dra. Danielli Rodrigues.
Da leitura da r. sentença embargada, colhe-se o seguinte:

"No caso em tela, o Impetrante noticiou o cumprimento administrativo do pleito e a liberação dos bens objeto destes autos (id. 4058300.11276685).

Temos, então, que o Mandado de Segurança foi impetrado em 08/07/19 e em 25/07/19 o Impetrante informou que teve seu pleito cumprido administrativamente.

O artigo 493 do Código de Processo Civil assim dispõe acerca de superveniência de fato novo ocorrido, in verbis:

Art. 493. Se, depois da propositura da ação, algum fato constitutivo, modificativo ou extintivo do direito influir no julgamento do mérito, caberá ao juiz tomá-lo em consideração, de ofício ou a requerimento da parte, no momento de proferir a decisão.

Esse é também o entendimento de vários Tribunais, de acordo com os v. Acórdãos que a seguir passo a citar, in verbis:

"FATO NOVO - APLICAÇÃO DO ART. 462 DO CPC - DECLARAÇÃO DE PERDA DO OBJETO DO PROCESSO - O interesse do autor deve existir no momento em que a decisão é proferida. A regra do art. 462 do CPC não se dirige apenas ao juiz de primeiro grau, mas também ao do Tribunal, quando o fato novo é superveniente à sentença. Processo que se julga prejudicado, por perda de objeto e superveniente desaparecimento do interesse de agir do autor. (TRF 1ª R. - AMS 92.01.02738-9 - DF - 1ª T. - Rel. p/ o Ac. Juiz Hércules Quasímodo - DJU 22.10.1992)
O interesse do autor deve existir no momento em que a sentença é proferida. Se desapareceu antes, a ação terá que ser rejeitada  (JTJ 163/9, JTA 106/391), de ofício e a qualquer tempo (STJ - 3ª Turma, REsp 23.563-RJ-AgRg, rel. Min. Eduardo Ribeiro, j. 19.08.97, negaram provimento, v.u., DJU 15.09.97, p. 44.372)"

Então, tem-se que houve superveniente falta de interesse processual de agir do Impetrante, o que provoca o indeferimento da petição inicial e a extinção do processo, sem resolução do mérito.

Quanto aos honorários, não existem neste tipo de procedimento judicial (Súmula 512 do STF e art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009) e nesse sentido há recente julgado da Suprema Corte, verbis:

RECURSO EXTRAORDINÁRIO COM AGRAVO - ALEGADA VIOLAÇÃO A PRECEITOS INSCRITOS NA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA - AUSÊNCIA DE OFENSA DIRETA À CONSTITUIÇÃO - INVIABILIDADE DO RECURSO EXTRAORDINÁRIO - SUCUMBÊNCIA RECURSAL (CPC/15, ART. 85, § 11) - NÃO DECRETAÇÃO, NO CASO, ANTE A INADMISSIBILIDADE DE CONDENAÇÃO EM VERBA HONORÁRIA, POR TRATAR-SE DE PROCESSO DE MANDADO DE SEGURANÇA (SÚMULA 512/STF E LEI Nº 12.016/2009, ART. 25) - AGRAVO INTERNO IMPROVIDO.
"Cumpre registrar, finalmente, que não incide, no caso em exame, o que prescreve o art. 85, § 11, do CPC/15, ante a inadmissibilidade de condenação em verba honorária, por tratar-se de processo de mandado de segurança (Súmula 512/STF e Lei 12.016/2009, art. 25)"
(ARE 962.080 AgR, rel. min. Celso de Mello, 2ª T, j. 14-10-2016, DJE 239 de 10-11-2016.).

3.  CONCLUSÃO

Posto isso, por perda de objeto decorrente de fato superveniente à propositura desta ação mandamental e consequentemente a superveniente falta de interesse processual de agir do Impetrante, indefiro a petição inicial (art. 330, III do CPC/15) e dou este processo por extinto, sem resolução do mérito (art. 485, I e VI do CPC/15).

Custas ex lege.

Sem honorários nos termos do art. 25 da Lei nº 12.016/2009.


Data maxima venia, houve realmente a apontada contradição entre a fundamentação da r. sentença e o seu dispositivo, pois se a perda do objeto deu-se quando o mandado de segurança já estava em andamento e em decorrência de ato da Autoridade apontada como coatora, que, na tramitação do feito judicial,  findou por atender ao pleito nele consignado, não seria caso de indeferimento da petição inicial, mas sim de simples extinção do processo, sem resolução do mérito. 
É que, como bem argumentado pela Recorrente, conforme se extrai do inciso III do art. 330 do vigente Código de Processo Civil,  a falta de interesse processual de agir só gera indeferimento da petição inicial  quando se faz presente de plano, no início da ação judicial, nunca supervenientemente, principalmente quando a Parte do polo passivo, como no presente caso, ainda que indiretamente, reconhece o pleito da Parte Impetrante e gera a falta de objeto da ação.
No caso, considerando o fato de que a liberação da mercadoria deu-se  após o ajuizamento desta ação mandamental, tem-se que, ainda que indiretamente, a Autoridade apontada como coatora, reconheceu o pleito da Impetrante, liberando as mercadorias, liberação essa que consistia na principal pretensão da petição inicial,  pelo que, à luz do art. 90 do vigente Código de Processo Civil e do princípio da causalidade,  cabe à UNIÃO, pessoa jurídica de direito público à qual se vincula a DD Autoridade apontada como coatora, arcar com o ressarcimento das custas que foram despendidas pela Impetrante, porque foi a mencionada Autoridade que deu causa à impetração deste writ, não havendo que se falar em verba honorária, porque se trata de mandado de segurança, no qual não cabe condenação nesse tipo de verba(Súmula 512 do STF e art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009).

3. Dispositivo

POSTO ISSO,  dou provimento aos pedidos do recurso de embargos de declaração da Impetrante, declaro a r. sentença embargada e, dando a tal recurso efeito infringente do julgado, modifico a fundamentação daquela r. sentença, para que dela passe a constar o consignado na fundamentação supra, e que o seu dispositivo passe a ter o seguinte texto:
"3. Dispositivo
Posto isso, diante da superveniente falta de interesse processual de agir, decorrente da liberação administrativa das mercadorias quando esta ação mandamental já estava em andamento, dou este processo por extinto, sem resolução do mérito(art. 485, VI, CPC) e, pelo princípio da causalidade e da regra do art. 90 do vigente Código de Processo Civil, condeno a UNIÃO a ressarcir as custas processuais que foram recolhidas pela Impetrante, com atualização pelos índices da tabela SELIC, por se tratar de verba tributária
Sem condenação em honorários, por força da Súmula 512 do STF e art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009."
Registrada, intimem-se.
Recife, 17.01.2020
Francisco Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE.

quinta-feira, 9 de janeiro de 2020

DOENÇA GRAVE. PROVENTOS DE APOSENTADORIA. ISENÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA PESSOA FÍSICA. IMPROCEDÊNCIA.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Segue sentença que trata de interessante matéria do direito tributário brasileiro, legislação e jurisprudência, pertinente à isenção do imposto de renda, pessoa física, concedida sobre proventos de aposentadoria para pessoas com doença grave, arrolada em Lei. 
Merece destaque a competente atuação da Procuradora da Fazenda Nacional que atuou no caso, em defesa da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL. 
Preliminarmente, o feito também envolve a questão do direito à Assistência Judiciária e matéria processual, relativa ao que vem a ser Jurisdição Voluntária, Ação Declaratória, etc. 

Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0800840-63.2019.4.05.8300 - OUTROS PROCEDIMENTOS DE JURISDIÇÃO VOLUNTÁRIA
REQUERENTE: A C B
ADVOGADO: V B C Do N
REQUERIDO: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)


Sentença tipo A.
EMENTA: TRIBUTÁRIO.DIFERENÇAS DE PROVENTOS. DOENÇA NÃO ARROLADA EM LEI.
-Segundo a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça, em REsp representativo de controvérsia(art. 543, C, CPC), é taxativo o rol de doenças do art. 6º da Lei nº 7.713, de 1988, não comportando interpretação extensiva.
-A doença indicada pelo Autor não se encontra no rol de doenças desse dispositivo legal, sendo apenas objeto de projeto de lei em tramitação no Congresso Nacional.
-O grande esforço e dedicação da Procuradora da Fazenda Nacional impõem arbitramento de verba honorária acima do mínimo legal, sobre o valor atualizado, pelos índices da tabela SELIC, que se pretendia repetir.
            -Improcedência
Vistos, etc.

1. Breve Relatório

A C B, qualificado na Inicial, ajuizou esta  Ação Declaratória de Isenção de Imposto de Renda, Cumulada com Pedido de Restituição de Indébito, com concessão liminar de Tutela Provisória de Urgência em face da  UNIÃO - FAZENDA NACIONAL.  Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita. Aduziu o Autor, em síntese, que: teria realizado Acordo Judicial na ação tombada sob o nº 0024365-30.2001 (anexa), na qual se buscava receber seus proventos de complementação de aposentadoria; de tal valor, R$ 374.390,08 (trezentos e setenta e quatro mil trezentos e noventa reais e oito centavos), teria sido retido na fonte, correspondente ao IR, valor este indevido, uma vez que o Autor seria portador de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, conforme documentos anexos; o Autor precisaria, e muito, deste dinheiro, retido indevidamente, para custeio do seu tratamento; a complementação de aposentadoria, reforma ou pensão, recebida de entidade de previdência complementar, Fundo de Aposentadoria Programada Individual (Fapi) ou Programa Gerador de Benefício Livre (PGBL) e os valores recebidos a título de pensão em cumprimento de acordo ou decisão judicial, ou ainda por escritura pública, inclusive a prestação de alimentos provisionais recebidos por portadores de moléstia grave deveriam ser considerados isentos. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, pela concessão liminar de tutela provisória de urgência antecipatória, a devolver o desconto do imposto de renda retido na fonte sobre o valor de R$ 374.390,08, sob pena da aplicação de multa diária.
Inicial instruída com procuração e documentos.
Decisão, sob id 4058300.9806900, deferindo provisoriamente os benefícios da Justiça Gratuita e indeferindo o pleito antecipatório.
A União (Fazenda Nacional) apresentou Contestação (Id. 4058300.9981600). Preliminarmente, impugnou o pedido de concessão dos benefícios da Justiça Gratuita, uma vez que  o autor teria realizado tal pedido sob o fundamento que não teria "condições financeiras de arcar com os custos e despesas do processo", mas que não teria juntado qualquer documento que comprovasse a situação de hipossuficiência ou mesmo de risco ao comprometimento das obrigações familiares. No mérito, defendeu que o pedido formulado fosse julgado improcedente, eis que para a concessão da isenção do IR seria necessário que a moléstia indicada fosse uma daquelas previstas em Lei, o que não seria o caso e que, caso estivesse em algum rol legal, necessitaria de submissão do Autor à perícia oficial. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes (Id.4058300.9981600).
A parte autora apresentou réplica, rebatendo os argumentos da defesa e reiterando os termos da Inicial (Id. 4058300.10436674).
Decisão, sob id 4058300.11772556, intimando a parte autora para comprovar, documentalmente, seus gastos e os de sua família, com saúde, educação, moradia etc e apresentar suas duas últimas declarações do IRPF (declaração COMPLETA) para fins de apreciação da impugnação da justiça gratuita.
A parte autora pugnou pela juntada de documento (Id. 4058300.11896603).
É o relatório, no essencial.
Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação

2.1 - Matérias Preliminares.
2.1.1 - Ação de Repetição de Indébito. Jurisdição Contenciosa
Inicialmente, registro que não se trata, como consignado na petição inicial, de ação declaratória, mas sim de ação condenatória, como o é toda ação cuja pretensão principal seja a repetição de alegado indébito. Não há nada a ser meramente declarado, mas sim uma situação que se pretende seja reconhecida, pretensão essa, se acolhida, implicará em condenação da Parte Ré em restituição das parcelas do IR que foram retidas na fonte.
Também não se trata, como indicado pela Parte Autora, de ação de jurisdição voluntária, pois patente a sua feição contenciosa.
Então, preliminarmente e antes de publicar esta sentença, deve a Secretaria fazer as devidas retificações na autuação, principalmente quanto à classe e ao tipo de jurisdição, que é claramente contenciosa.
2.1.2 - Da Impugnação ao Benefício da Justiça Gratuita
Observo que, ante a impugnação ao benefício da justiça gratuita, formulada pela União (Fazenda Nacional) quando da Contestação, a parte autora foi instada a comprovar, documentalmente, seus gastos e os de sua família, com saúde, educação, moradia etc e apresentar suas duas últimas declarações do IRPF (declaração COMPLETA), conforme decisão sob identificador 4058300.11772556, o que não foi integralmente cumprido (vide documentos acostados sob Ids.  4058300.11896603 e 4058300.11896614).
Por outro lado, tendo o Autor recebido a vultosa quantia, pois só de imposto de renda retido na fonte pagou mais de  trezentos mil reais, encontra-se apto a arcar com as custas judiciais e, caso vencido, com as respectivas verbas de sucumbência.
Assim, há se ser revogado o benefício da justiça gratuita, concedido provisoriamente na decisão inicial.
2.2 - Matéria de Mérito
Pugna a parte autora por provimento jurisdicional que lhe assegure o reconhecimento do direito à isenção do imposto de renda, relativamente à verba de R$ 374.390,08, diferenças de proventos de aposentadoria que recebeu e que se encontram descritas na petição inicial, com a consequente condenação da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL a lhe devolver o valor de imposto de renda retido na fonte sobre mencionada verba. 
Aduziu o Autor, em síntese, que teria realizado Acordo Judicial em ação de nº 0024365-30.2001, na qual buscou receber seus proventos de complementação de aposentadoria. Mencionou, ainda, que de tal valor, R$ 374.390,08 (trezentos e setenta e quatro mil trezentos e noventa reais e oito centavos), fora retida parcela a titulo de imposto de renda, parcela tal que reputaria indevida, uma vez que seria portador de Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica, conforme documentos anexos.
Pois bem.
Como bem alegado na contestação da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, o cerne da questão está na interpretação do inciso XIV do artigo 6º da Lei nº 7.713/1988, o qual tem a seguinte redação:
"Art. 6º - Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas:
(...)
XIV - os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltiplaneoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget(osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma; (Redação dada pela Lei nº 11.052, de 2004). [destaquei]"
A doença indicada pelo Autor, "Doença Pulmonar Obstrutiva Crônica", não se encontra expressamente prevista nesse dispositivo legal.
Importante sublinhar a existência do Projeto de Lei n. 1.613/2015,  em tramitação no Congresso Nacional, cuja ementa tem a seguinte redação:
"Altera o inciso XIV do art. 6º da Lei nº 7.713, de 22 de dezembro de 1988, com a redação dada pela Lei nº 11.052, de 29 de dezembro de 2004, para incluir entre os rendimentos isentos do imposto de renda os percebidos pelos portadores de doença pulmonar obstrutiva crônica - DPOC."[1]
Entretanto, em consulta à tramitação do aludido projeto [1], vê-se que a proposição ainda se encontra sujeita à apreciação do Plenário, circunstância esta desfavorável ao pleito autoral.
Finalmente, impende registrar, como também bem alegado na contestação da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL,  que a esse respeito o Superior Tribunal de Justiça afirmou, categoricamente, que a relação de doenças descritas no rol do inciso XIV, da Lei 7.713/88 é taxativa, não admitindo interpretação analógica ou extensiva, consoante trecho da ementa abaixo transcrito:
"TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. IMPOSTO DE RENDA. ISENÇÃO.  SERVIDOR PÚBLICO PORTADOR DE MOLÉSTIA GRAVE. ART. 6º DA LEI 7.713/88 COM ALTERAÇÕES POSTERIORES. ROL TAXATIVO. ART. 111 DO CTN. VEDAÇÃO À INTERPRETAÇÃO EXTENSIVA.
 1. A concessão de isenções reclama a edição de lei formal, no afã de verificar-se o cumprimento de todos os requisitos estabelecidos para o gozo do favor fiscal. 2. O conteúdo normativo do art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88, com as alterações promovidas pela Lei 11.052/2004, é explícito em conceder o benefício fiscal em favor dos aposentados portadores das seguintes moléstias graves: moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma. Por conseguinte, o rol contido no referido dispositivo legal é taxativo (numerus clausus), vale dizer, restringe a concessão de isenção às situações nele enumeradas. 3. Consectariamente, revela-se interditada a interpretação das normas concessivas de isenção de forma analógica ou extensiva, restando consolidado entendimento no sentido de ser incabível interpretação extensiva do aludido benefício à situação que não se enquadre no texto expresso da lei, em conformidade com o estatuído pelo art. 111, II, do CTN. (Precedente do STF: RE 233652 / DF - Relator(a): Min. MAURÍCIO CORRÊA, Segunda Turma, DJ 18-10-2002. Precedentes do STJ: EDcl no AgRg no REsp 957.455/RS, Rel. Ministro LUIZ FUX, PRIMEIRA TURMA, julgado em 18/05/2010, DJe 09/06/2010; REsp 1187832/RJ, Rel. Ministro CASTRO MEIRA, SEGUNDA TURMA, julgado em 06/05/2010, DJe 17/05/2010; REsp 1035266/PR, Rel. Ministra ELIANA CALMON, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2009, DJe 04/06/2009; AR 4.071/CE, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 22/04/2009, DJe 18/05/2009; REsp 1007031/RS, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 12/02/2008, DJe 04/03/2009; REsp 819.747/CE, Rel. Ministro JOÃO OTÁVIO DE NORONHA, SEGUNDA TURMA, julgado em 27/06/2006, DJ 04/08/2006).4. In casu, a recorrida é portadora de distonia cervical (patologia neurológica incurável, de causa desconhecida, que se carcateriza por dores e contrações musculares involuntárias - fls. 178/179), sendo certo tratar-se de moléstia não encartada no art. 6º, XIV, da Lei 7.713/88.5. Recurso especial provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução STJ 08/2008."[2].
Ademais, como ainda registrado na contestação da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, ainda que a doença apontada pelo Autor estivesse arrolada em Lei, teria o Autor que ser submetido a perícia oficial, conforme regra do art. 30 da Lei nº 9.250, de 1995, ainda em vigor, submissão essa que tenho por desnecessária, uma vez que a apontada doença não se encontra legalmente arrolada como passível de gerar a isenção do imposto de renda.
Diante de todo o exposto, a decretação de improcedência dos pedidos é medida que se impõe.
2.3 - Diante do quadro supra e da bem elaborada contestação, assinada pela d. Procuradora da Fazenda Nacional, Dra. RITA DE CASSIA RAMALHO TEMPORAL, tenho que o Autor deve ser condenado nas verbas de sucumbência, devendo a verba honorária, graças ao esforço e dedicação da referida Procurador, ser arbitrada acima do mínimo legal, observada a regra do § 2º do art. 85 do vigente Código de Processo Civil, tomando-se por base o valor do imposto de renda retido na fonte + multa, que se pretendia repetir, indicado como valor da causa. 

3. Dispositivo

Diante de todo o exposto:
3.1 - Preliminarmente:
3.1.1 - reconheço que não estamos diante de caso que envolve jurisdição voluntária, mas sim jurisdição contenciosa, tampouco que estamos diante de ação declaratória e, sim, de ação condenatória e, por isso, determino que a Secretaria tome as providências indicadas no subitem 2.1 supra, tendentes à alteração da autuação;
3.1.2 - revogo a concessão provisória do benefício da Assistência Judiciária e concedo ao Autor o prazo de 15(quinze) dias para recolher as custas judiciais, sobre o valor indicado como "valor da causa", devidamente atualizado pelos índices da tabela SELIC, por se tratar de matéria tributária, sob pena de execução forçada, por não mais caber a aplicação do art. 290 do CPC, uma vez que já se processou a instrução do feito.
3.2 - No mérito, julgo improcedentes os pedidos desta ação e dou o processo por extinto, com resolução do mérito (art. 487, I, CPC), condenando a Parte Autora nas custas judiciais e ao pagamento da verba honorária, que, em face do esforço e dedicação da mencionada Procuradora da Fazenda Nacional, Dra. RITA DE CASSIA RAMALHO TEMPORAL, arbitro em 13% (treze por cento) do valor que se pretendia fosse restituído, qual seja, o valor do imposto de renda retido na fonte, indicado como valor da causa, devidamente atualizado pelos índices da tabela SELIC, por se tratar de matéria tributária(aplicação analógica e contrario senso do § 4º do seu art. 39 da Lei nº 9.250, de 1995).
Registre-se. Intimem-se.

Recife, 09.01.2019

Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz Federal,2a Vara Federal/PE.


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[1] Disponível em https://www.camara.leg.br/proposicoesWeb/fichadetramitacao?idProposicao=1279694

Acesso em 08.01.2020

[2] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Seção. Recurso Especial - REsp nº 1.116.620-BA, Rel. Luiz Fux,  julgado em 09.08.2010, in Diário da Justiça Eletrônico - DJe de 25.08.2010.

Disponível em: https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=ISEN%C7%C3O+E+IMPOSTO+E+RENDA+E+ROL+E+TAXATIVO&repetitivos=JULGADO+E+CONFORME+E+%22RECURSOS+REPETITIVOS%22&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true.

Acesso em 08.01.2020.