segunda-feira, 29 de julho de 2019

PLANO DE SAÚDE. A QUALIDADE DE DEPENDENTE IDOSA NÃO PODE FICAR VINCULADA AOS PADRÕES DA DECLARAÇÃO DO IR, PORQUE FERE REGRAS CONSTITUCIONAIS E LEGAIS DE AMPARO AO IDOSO

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Pode uma regra administrativa de um Plano de Saúde de Servidores da Administração Pública criar critério de enquadramento de uma Mãe como Dependente do filho-Servidor, de forma contrária às regras da Constituição da República e da Lei do Estatuto do Idoso quanto à manutenção ou ampliação do amparo ao idoso? 
Na sentença que segue, esse assunto é amplamente debatido. 
Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0806384-66.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: R S C DE O e Outra ADVOGADO: E L S ADVOGADO: P S C De ORÉUS: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO. e OUTRO  2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



Sentença Tipo A, registrada eletronicamente. 




Vistos, etc.

EMENTA: - PLANO DE SAÚDE. DEPENDENTE. RENDA. EXCLUSÃO. NÃO CABIMENTO.
Se a Dependente de Segurado de Plano de Saúde, atualmente com mais de 80(oitenta) anos de idade,  não tem benefícios previdenciários com reajustes vinculados aos índices de atualização da Tabela do IRPF, tampouco o rendimento do próprio Segurado, e se a referida Tabela não é reajustada pelo índice de reajuste do benefício previdenciário da mencionada Dependente, tampouco pelo índice de reajuste dos vencimentos do seu Filho, o Segurado, não pode a sua(da Segunda Autora) qualidade de Dependente ficar vinculada a valor enquadrável no rol de dependentes do IRPF, porque fere a lógica do sistema e contraria regras da Constituição da República e da Lei do Estatuto do Idoso, as quais orientam no sentido do mais completo amparo ao idoso, com alargamento dos benefícios ao passo que a sua idade aumenta.
Procedência.


1. Relatório

R S C DE O e N C DE O, qualificados na inicial, ajuizaram a presente AÇÃO ORDINÁRIA DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA em face da UNIÃO FEDERAL e do CONSELHO GESTOR DO PROGRAMA DE SAÚDE E ASSISTÊNCIA SOCIAL DO MINISTÉRIO PÚBLICO DA UNIÃO. Requereram preliminarmente, a prioridade na tramitação do feito. Aduziram, em síntese que: a) o primeiro demandante seria técnico administrativo do Ministério Público da União e teria inserido sua mãe, segunda demandante, no Programa de Saúde e Assistência Social - Plan-Assiste, desde 26/10/2006, porque recebia apenas 02 salários mínimos de aposentadoria/pensão e seria sua dependente economicamente; b) em 2007, a segunda demandante teria sido diagnosticada com Câncer no ovário, atualmente em estágio IV, com metástase; c) no corrente ano, o primeiro demandante, ao receber da segunda demandante os comprovantes de rendimento, para fins de declaração do Imposto de Renda, constatou que os valores auferidos em 2017 teriam excedido o teto fixado pela Receita Federal para fins de inclusão de dependente, no total de R$ 22.847,86; d) o primeiro demandante teria  procurado a ajuda da ADUSEPS - Associação de Defesa dos Usuários de Seguros, Planos e Sistemas de Saúde, a qual enviou um Ofício ao Plan-Assiste, em 25 de abril de 2018, levando ao conhecimento do Plano de Saúde Réu os fatos específicos da segunda demandante, no intuito de evitar o corte no resectivo serviço de assistência à saúde; e) em 02 de maio de 2018, o Diretor de Assistência e Benefícios Sociais do Plan-Assiste/MPF, proferiu despacho negando o pleito de permanência da segunda demandante no plano. Fundamentou seu pedido citando textos de lei e da jurisprudência pátria, anexou documentos e ao final requereu o deferimento do pedido de Tutela Provisória de Urgência, no sentido de que fosse determinada a permanência da segunda demandante, Sra. N C DE O, no Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União - PLAN-ASSISTE, independentemente de comprovação de que ela seja dependente do seu filho, primeiro demandante, para fins de Imposto de Renda.
R. Decisão proferida sob identificador nº 4058300.5367567,  pela qual foi deferida a tutela provisória de urgência e determinado que a União e o Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União mantivessem a Autora, N C DE O, no Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União -PLAN-ASSISTE, como dependente do Autor, R S C DE O, independentemente da comprovação de ser ela dependente para fins de Imposto de Renda.
Devidamente citada, a União apresentou contestação sob identificador nº 4058300.5696785 requerendo a improcedência dos pedidos.
O Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União foi citado por meio de Carta Precatória anexada sob identificador nº 4058300.5955608 e deixou transcorrer o prazo sem apresentar contestação, conforme certidão de Id. 4058300.9857658.
A Parte Autora apresentou réplica à contestação requerendo a procedência dos pedidos formulados na exordial.
Pelas peças anexadas sob identificadores nªs 4058300.14791747 e 4058300.15328530 é possível constatar que a União interpôs Agravo de Instrumento, com pedido de efeito suspensivo, autuado no TRF 5ª Região sob o nº 0810227-10.2018.4.05.8300, contra decisão que deferiu o pedido de tutela de urgência. Consultando a movimentação processual comprova-se que o pedido de efeito suspensivo foi indeferido liminarmente (Id. 4050000.11666348) e na sequência, conforme acórdão proferido pela Terceira Turma, foi negado provimento ao Agravo de Instrumento (Id. 4050000.13040746).
 Vieram os autos conclusos.
É o breve relatório. 
Fundamento e decido. 


2. Fundamental

2.1 - Preliminarmente,  cabe a decretação da revelia do Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União, sem os respectivo efeitos, quer pelo fato de que a UNIÃO apresentou contestação, quer tendo em vista que se trata de pessoa jurídica de direito público, cujos bens  são indisponíveis(incisos I e II,  respectivamente, do art. 344 CPC).
2.2 - Nos presentes autos, a controvérsia consiste em saber se a Autora Necy Carvalho de Oliveira pode permanecer na qualidade de dependente no plano de saúde de titularidade de seu filho, independentemente da comprovação de sua dependência para fins de Imposto de Renda.

Por meio da decisão inicial, proferida pela d. Juíza Federal Substituta desta 2ª Vara/PE, Dra. DANIELLI FARIAS RABÊLO LEITÃO RODRIGUES, a Tutela Provisória de Urgência foi concedida com a determinação de que a União e o Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União mantivessem a Autora, N C DE O, no Programa de Saúde e Assistência Social do Ministério Público da União -PLAN-ASSISTE, como dependente do Autor, R S C DE O, independentemente da comprovação de ser ela enquadrável como dependente para fins de Imposto de Renda.

Apresentada contestação por parte da União e com o silêncio do Conselho Gestor do Programa de Saúde e Assistência Social do MPU, nada de novo foi apresentado no sentido de desconstituir os argumentos expostos na fundamentação daquela r. Decisão.

E, consta, também, nos autos que em sede de agravo de instrumento, interposto pela União, a Egrégia Terceira Turma do TRF 5ª Região negou provimento ao recurso e manteve a decisão agravada.

Sendo assim, adentrando no mérito, tenho que merece ser ratificada a mencionada r. Decisão, proferida pela MM. Juíza Federal Substituta da 2ª Vara/PE, Dra. DANIELLI FARIAS RABELO LEITÃO RODRIGUES, da qual transcrevo alguns trechos da sua d. fundamentação: verbis:
"2. Fundamentação 
2.1 (...).

2.2. Da tutela provisória de urgência

 (...).
Nos presentes autos, pretende-se a título tutela de urgência seja determinado aos Réus a permanência da Autora N C de O, como dependente no plano de saúde de titularidade de seu filho, independentemente da comprovação de sua dependência para fins de Imposto de Renda.

Pelo que se depreende da documentação anexada aos autos, a segunda Autora, N C de O é uma pessoa idosa, com 81 anos, e com grave problema de saúde (câncer no ovário, atualmente com metástase) e desde o ano de 2006 é dependente do seu filho, o primeiro Autor, R S de C de O, no Plan-Assiste.
De acordo com o Regulamento Geral do Plan-Assiste, à época de sua inclusão (Id. 4058300.5360409):

  "II - dependentes econômicos:
   (....)
  (...)
 c) os pais, inclusive adotantes, o padrasto ou a madrasta com renda familiar de até três salários mínimos que constem como dependentes na Declaração de Imposto de Renda do titular.".

E foi em face desse regulamento que a segunda Autora foi inscrita, aprovada e vinculada como dependente no PLAN-ASSISTE, tendo em vista ser mãe com renda familiar de até três salários mínimos e constar na declaração de imposto de renda do seu filho como dependente.


O rendimento auferido pela segunda Autora ao longo de 2017, incluído o 13º salário, atingiu a cifra de R$ 24.205,00, quando o teto fixado pela Receita Federal, para fins de inclusão de dependentes no Imposto de Renda, naquele ano, era de R$ 22.847,86, desde 2015. Com isso, a segunda Autora não pôde ser incluída como dependente do seu filho na declaração do IR 2017/2018.


Atualmente, a Norma Complementar nº 13/2017, estabelece em seu art. 1º, inciso II, alínea "c":


    "Art. 1º São beneficiários do PLAN-ASSISTE, na condição de:
    (...)
    II - dependentes:
    (c) o pai ou o padrasto e a mãe ou a madrasta que constem como dependentes ou pensionistas na declaração de imposto de renda do titular.;
    (...)"

Numa interpretação restritiva da regra acima, considerou-se que a segunda Autora deixara de cumprir um dos requisitos para a sua configuração como dependente econômica do titular do plano (figurar como dependente na declaração do Imposto de Renda), o que levou à sua exclusão do plano de assistência à saúde.


Em face da questão posta, vislumbro o preenchimento dos requisitos para a concessão da tutela de urgência, invocada pelos Autores.


Primeiramente, cumpre consignar o que está disposto na Constituição da República sobre o direito dos idosos:

"Art. 1o É instituído o Estatuto do Idoso, destinado a regular os direitos assegurados às pessoas com idade igual ou superior a 60 (sessenta) anos.

Art. 2o O idoso goza de todos os direitos fundamentais inerentes à pessoa humana, sem prejuízo da proteção integral de que trata esta Lei, assegurando-se-lhe, por lei ou por outros meios, todas as oportunidades e facilidades, para preservação de sua saúde física e mental e seu aperfeiçoamento moral, intelectual, espiritual e social, em condições de liberdade e dignidade.
Art. 3o É obrigação da família, da comunidade, da sociedade e do Poder Público assegurar ao idoso, com absoluta prioridade, a efetivação do direito à vida, à saúde, à alimentação, à educação, à cultura, ao esporte, ao lazer, ao trabalho, à cidadania, à liberdade, à dignidade, ao respeito e à convivência familiar e comunitária.". 
No caso dos autos, a Autora é uma pessoa idosa, com mais de 80 anos e com graves problemas de saúde, sendo obrigação da sociedade assegurar-lhe o direito à vida e à saúde, conforme disposição constitucional. Tal direito não pode ser restringido por norma infra legal.


Com efeito, a segunda Autora continua recebendo mensalmente parcos rendimentos, tendo ultrapassado por muito pouco o limite para inclusão como dependente no Imposto de Renda do seu filho."
E isso só ocorreu porque a UNIÃO não cumpriu com o seu dever social e moral de atualizar a tabela do IRPF, a qual, inexplicavelmente, encontra-se  congelada desde 2015, quando o benefício previdenciário da autora gozou de atualização, embora meramente monetária e abaixo do reajuste do salário mínimo, findou por ultrapassar o mínimo para ser considerada dependente perante o IRPF, por conta da referida imoralidade: falta de atualização dos valores da tabela do IRPF.
O equilíbrio econômico-financeira das obrigações das duas Partes exigiria que a referida Tabela fosse atualizada, pelo menos pelo mesmo índice de reajuste do beneficio da referida Dependente, a ora Segunda Autora, ou pelo mesmo índice de reajuste de vencimentos do seu Filho, o Segurado e ora Primeiro Autor. 
Note-se que não existe mais o requisito cumulativo de que o ascendente aufira menos de 3 (três) salários mínimos para sua inclusão como dependente no plano de saúde, assim como acontecia quando da inserção da segunda Autora no Plan-Assiste, há 12 anos.
Então, as regras não poderiam ser mudadas unilateralmente, porque os Autores têm direito adquirido a esse requisito, especialmente a Dependente, a Segunda Autora, por conta da proteção constitucional e legal a que faz jus, conforme já demonstrado e ao que retornaremos abaixo.

Por outro lado, o valor do benefício da Autora, sempre reajustado por índice inferior ao de um salário mínimo, nunca ultrapassou o patamar de três salários mínimos e só ultrapassa o mínimo da referida Tabela do IRPF, na declaração do IR do seu Filho, o Primeiro Autor, pelas razões já expostas: a falta de atualização da famigerada Tabela do IRPF, no mínimo pelos índices de reajuste do benefício da Segunda Autora. 

Ora, se o poder aquisitivo da Segunda Autora, frente ao valor do salário mínimo,  cai, ano a ano, porque o valor do seu benefício é reajustado por índice inferior ao do reajuste do salário mínimo, não pode ser punida com a exclusão do rol de dependentes do seu Filho perante a Entidade de Plano de Saúde do  Emprego Público deste, em face da culpa única e exclusiva da UNIÃO, na qual encontra-se no rol de Órgãos o Ministério Público Federal, onde trabalha o seu Filho, o Primeiro Autor.

Princípios de Justiça orientam de que, nessa situação, deve-se manter os parâmetros de quando a Sra. Mãe do Primeiro Autor, a Segunda Autora, foi admitida no referido Plano de Saúde, uma vez que o descompasso, meramente financeiro, decorre de, repito, culpa única e exclusiva da UNIÃO, a qual, de forma imoral, não atualiza a referida Tabela do IRPF. 

Por outro lado, a mencionada regra do referido Plano de Saúde, de vincular a renda do Dependente a valor fixado para cada Dependente na declaração do IRPF do Servidor Segurado, não se mostra razoável, pois o que tem a ver mencionado Plano com o IR dos Beneficiários?

Os  Parâmetros que gozariam de um equilíbrio justo mínimo seriam os que já adiantei: 1) atualização da Tabela do IRPF pelo mesmo índice de atualização do valor do benefício da Segunda Autora e dos vencimentos do Primeiro Autor; ou,  2) aquele da renda da data da inclusão da Dependente, ora Segunda Autora, isto é, vinculação da sua renda, naquela data, à luz do total de salários mínimos que ganhava quando da sua inclusão: tome-se o valor total da renda da ora Segunda Autora, na data em que foi incluída como dependente, e divida pela valor de um
salário mínimo, e chegue ao total de salários mínimos que a Segunda Autora ganhava naquela época, sem dúvida alguma, constatar-se-á que ganha, hoje,  um número de salários mínimos bem menor do que ganhava naquela época. E isso decorre do fato, já dito: aqueles que se aposentaram ganhando mais de um salário mínimo, perdem ano a ano frente ao valor do salário mínimo, porque o total de tais benefícios é reajustado por índice inferior ao do reajuste do salário mínimo.

O mencionado arcabouço jurídico constitucional e legal não admite que norma infra legal elimine o mencionado direito de uma idosa, que já conta com mais de 80(oitenta) primaveras, sem descurar que o Primeiro Autor vem pagando, religiosamente, o valor do mencionado Plano de Saúde há mais de 12(doze)anos.
Não pode, exatamente agora quando a sua Mãe já com mais de 80(oitenta)anos de idade e mais necessita de utilizar-se dos recursos do Plano de Saúde, vê-la dele excluída, porque há uma singela e ilógica norma administrativa, que fere todo o mencionado conjunto de regras constitucionais e legais, asseguradoras dos direitos dos idosos e que, ao invés de ser reduzidos,  devem é ser ampliados com o passar do tempo.

Não, isso não é aceitável, não pode acontecer.

Nessa situação, sem maiores delongas, a decretação da procedência dos pedidos é medida que se impõe.


3. Dispositivo

POSTO ISSO, ratifico a mencionada r. Decisão Inicial, na  qual se deferiu o pedido de tutela provisória de urgência de antecipação, julgo procedentes os pedidos, tornando definitiva a determinação constante na  mencionada r. Decisão, para todos  os fins de direito, e dou este processo por extinto, com resolução do mérito(art. 487, I, CPC).

Outrossim, condeno às Rés, pro rata, ao ressarcimento do valor atualizado das custas desembolsadas pelos Autores, com atualização pelos índices da tabela SELIC, por ser um tributo, a partir do mês seguinte ao do efetivo desembolso,  e a pagar ao(à,s) Patrono(a,s) dos Autores verba honorária advocatícia, a qual, à luz dos §§ 2º e 8º do art. 85 do vigente Código de Processo Civil,  arbitro em R$ 3.000,00 (três mil reais), que serão atualizados(correção monetária e juros de mora) pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal, vigentes na data da execução, sendo que os juros de mora incidirão sobre o valor já monetariamente corrigido, mas somente a partir do trânsito em julgado desta sentença ou de acórdão que venha a substituí-la(§ 19 do art. 85, CPC).

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição (art. 496, I do CPC).

Registre-se. Intimem-se.


Recife, 20.07.2019

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE.




sexta-feira, 26 de julho de 2019

CRÉDITO TRIBUTÁRIO E SUA PRESCRIÇÃO. UM CASO IMPROCEDENTE.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Na sentença que segue, são debatidos importantes tópicos relativos à prescrição do crédito tributário.

Boa leitura.



PROCESSO Nº: ...... - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: J. A. L DE F C - ME
ADVOGADO: R P B G V
RÉU: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



Sentença tipo A, registrada eletronicamente

Vistos, etc.

Ementa: DIREITO TRIBUTÁRIO. PRESCRIÇÃO. LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. 
-O pedido de parcelamento interrompe a fluência do prazo de prescrição:
-A inscrição em dívida ativa suspende a fluência do  prazo de prescrição.
-O protesto extrajudicial não gera nenhum efeito na fluência do prazo de  prescrição.
-Improcedência.

1. Relatório

J. A. L DE F CO - ME, qualificada na  petição inicial, propôs esta ação pelo procedimento comum, em 27.12.2018, contra a FAZENDA NACIONAL - UNIÃO, alegando que estaria sendo cobrada de crédito tributário já fulminado pela prescrição, pois objeto da Certidão de Dívida Ativa de nº 40 4 16 006247-99, com data de inscrição em 29/07/2016 e valor consolidado em R$ 64.926,81 (sessenta e quatro mil, novecentos e vinte e seis reais e oitenta e um centavos), relativa ao SIMPLES NACIONAL, tributo esse que seria submetido ao lançamento por declaração; que, quando o tributo, submetido a esse tipo de lançamento, o lançamento torna-se definitivo na data do vencimento para o pagamento que não ocorreu; que "O débito mais recente condito na CDA anexa aos autos tem sua competência em 05/2012, portanto, devendo haver um ato que promovesse a interrupção da prescrição até 05/2017, o que não ocorreu."; que "o primeiro ato praticado que tem o condão de realizar a interrupção retro mencionada, apenas o foi realizado em 19/10/2017, com o protesto da Certidão da Dívida Ativa.", data em que a prescrição já  teria  ocorrido e nesse sentido invoca precedente da 2ª Turma do STJ, REsp: 1235676 SC 2011/0017826-4, relativo a lançamento de ofício; finalmente, pugnou pela antecipação da tutela, liminarmente, suspendendo-se a exigibilidade do mencionado crédito tributário, com  determinação para fornecimento de CDN à Autora e final procedência, reconhecendo-se a prescrição e consequente extinção do referido crédito e condenação da Requerida nas verbas de sucumbência. 
A petição inicial veio instruída com procuração, comprovante do recolhimento das custas e outros documentos.
Despacho, id 4058300.5087834, determinando que a Secretaria diligenciasse e certificasse se já haveria ação executiva fiscal da CDA indicada na petição inicial.
Certidão, id 4058300.5253966, segundo a qual ainda não teria sido ajuizada ação de execução fiscal da referida CDA.
Despacho, id 4058300.5087834, firmando a competência deste Juízo, deixando para apreciar o pedido de antecipação da tutela após manifestação da Parte Requerida no prazo de cinco dias e que esta fosse citada, para os fins legais, e intimada para tal manifestação.
A FAZENDA NACIONAL - UNIÃO, na petição sob id 4058300.5495421, instruída com documentos,  manifestou-se, alegando que houvera pedido de parcelamento em 11/01/2012, encerrado em 15/02/2015, quando então teria  havido a interrupção da prescrição, conforme regra do inciso IV do art. 174 do Código Tributário Nacional, pelo que não se poderia falar em prescrição e pugnou pelo indeferimento do pedido de antecipação da tutela.
A Requerida, em seguida, apresentou contestação, id 4058300.5581528, instruída com um documento, repetindo os argumentos da manifestação referida no parágrafo anterior, e pugnando pela improcedência e condenação da Autora nas verbas de sucumbência.
 Despacho, id 4058300.6240175, abrindo prazo para réplica e deixando para apreciar o pedido de antecipação da tutela  na sentença.
Réplica, id 4058300.6445005, com ratificação dos argumentos da  petição inicial e pugnando pela procedência.
É o relatório
Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Inicialmente, registro que o tributo SIMPLES  NACIONAL não se submete ao lançamento por declaração, como sustentado na petição inicial, mas sim ao lançamento por homologação, que se distingue daquele pelo fato de que o Contribuinte apura o valor, declara e paga antes de qualquer notificação. Naquele, o Contribuinte só fica obrigado a pagar após receber a notificação do lançamento.
Então, o prazo de prescrição do SIMPLES NACIONAL submete-se ao prazo fixado  no § 4º do art 150 do Código Tributário Nacional, cinco anos, a contar do dia seguinte à data do fato gerador.
Mas, se o Contribuinte não recolhe o tributo no prazo da Lei, a fluência do prazo de prescrição passa a ser contada na forma preconizada para os  Lançamentos de Ofício e Por Declaração, qual seja, o prazo do inciso I do art. 173 do mesmo diploma  legal: do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, se Lançamento por Homologação[1], na data em que poderia  ter sido homologado, no caso, final de 2010, para os créditos tributários vencidos em 2009, e no final de 2011, para os créditos tributários vencidos em 2010.

2.2 - No presente caso, conforme consta na documentação juntada pela Requerida, com a sua manifestação acima referida, a Parte Autora pediu “PARCELAMENTO DATA DO PEDIDO: 11/01/2012", com "DATA DA FINALIZAÇÃO: 15/02/2015", relativamente aos créditos  tributários  de 2009 e de 2010.  
Mencionada documentação goza de fé pública e a sua desconstituição,  não ocorrida, caberia à Parte Autora(Parágrafo Único do art. 3º da Lei nº 6.830, de 1980, c/c  Parágrafo Único do art. 204 do Código Tributário Nacional).
O parcelamento interrompeu a fluência da prescrição, quer tendo em vista a regra do inciso IV do art. 174 do Código Tributário Nacional, quer porque suspende a exigibilidade do crédito tributário (art. 151, VI), quando então não flui o prazo de prescrição, porque fica a Fazenda Pública impedida de exigir o seu crédito, a não ser na forma preconizada no parcelamento.
O prazo de prescrição só ocorreria em 16.02.2020, pois só voltara a fluir em 16.02.2015, dia seguinte ao vencimento do parcelamento, previsto para 15.02.2015. 
Como a ora Autora não honrou o parcelamento, houve a inscrição em dívida em 26.07.2016, conforme último dos documento acostados sob id 4058300.549542, quando já havia fluído 5(cinco) meses e 10 (dez)dias do prazo prescricional, iniciado  em 26.02.2015.
A inscrição em dívida ativa suspendeu a fluência do prazo de prescrição "por 180 dias, ou até a distribuição da execução fiscal, se esta ocorrer antes de findo aquele prazo."( § 3º do art. 2º da Lei nº .6.830, de 1980, Lei da Execução Fiscal). 

Então o prazo final da prescrição, que seria 16.02.2020, foi acrescido de mais  180(cento e oitenta) dias, ficando estendido para 16.08.2020.
O noticiado protesto, por ser extrajudicial, não gerou nenhum efeito na fluência do prazo de prescrição, porque apenas  o  protesto judicial poderia voltar a interromper a sua fluência(inciso II do art. 174 do CTN).
Logo, não houve a noticiada prescrição, pois só ocorrerá em 16.08.2020.

3. Dispositivo

POSTO ISSO, julgo improcede os pedidos desta ação, rejeitando a exceção de prescrição levantada na  petição inicial.
Outrossim, condeno a Autora nas custas processuais e em verba honorária advocatícia, a qual, tendo em visa a simplicidade do caso, arbitro no mínimo legal(§2º do art. 85 do CPC) qual seja, em 10%(dez por cento) do valor atualizado dos créditos tributários  em debate (R$ 64.926,81), com atualização pelos índices da tabela SELIC até a data do efetivo pagamento.
Finalmente, dou este processo por extinto,  com resolução do mérito(art. 487, I, CPC).
Registrada, intimem-se.

Recife, 26.07.2019

Francisco Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE.

_________________________________________________________
[1] Os procedimentos praticados pelo Contribuintes, tendentes ao Lançamento, não o perfazem, porque o Lançamento é ato privativo da Autoridade Administrativa, daí a necessidade da homologação, expressa ou tácita, daqueles procedimentos do Contribuinte por essa Autoridade (art. 142 do Código Tributário Nacional). No caso, quando a Empresa Contribuinte fez a apuração, declarou e não pagou, ocorreu a homologação tácita e o prazo de prescrição começou a fluir na forma indicada na fundamentação supra.

Processo: 0802424-05.2018.4.05.8300
Assinado eletronicamente por:
Francisco Alves dos Santos Júnior - Magistrado
Data e hora da assinatura: 26/07/2019 09:40:41
Identificador: 4058300.11029931

quinta-feira, 25 de julho de 2019

INDENIZAÇÃO. O RESPECTIVO VALOR E RESPECTIVOS ACESSÓRIOS(JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA)NÃO SOFREM INCIDÊNCIA DO IRPJ, NEM DA CSLL.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Importantes matérias tributárias são debatidas na decisão que segue, envolvendo inclusive recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, editado com efeito repetitivo.  
Boa leitura.


Obs.: Pesquisa feita pela Assessora Luciana Simões Correa de Albuquerque



PROCESSO Nº: 0814011-87.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: U C O D'A S/A
ADVOGADO: L E C T De M M e outros
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
D E C I S Ã O
  1. Breve Relatório



U C O D'Á S.A., qualificada na Inicial, impetrou este MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO COM PEDIDO DE LIMINAR contra ato do Sr. DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE, representada em juízo pela Procuradoria Regional da Fazenda Nacional - PGFN da 5ª Região. Aduziu, em síntese, que: a Impetrante desenvolveria atividade agroindustrial no setor sucroalcooleiro, comercializando produtos derivados da cana-de-açúcar (etanol e açúcar); em 30/09/1999, a impetrante teria ajuizado a Ação Ordinária de Indenização contra a União (Proc. nº NPU 0012745-02.1999.4.05.8300 - Doc. 03) -, postulando que fosse a Ré condenada a pagar indenização por danos emergentes "em virtude da suspensão do pagamento do subsídio de equalização da cana-de-açúcar, após o advento da Lei n. 8.383/91, causando sérios prejuízos à suplicante, como, de resto, às outras Usina localizadas no Norte/Nordeste dos País, no período entre janeiro de 1992 e outubro de 1998, em função da adoção, quanto aos derivados de cana, de preços unificados em todo o Brasil, sem observar as disparidades regionais, no que tange aos custos da matéria-prima.; após regular tramitação, teria sido proferida sentença julgando procedente o pedido formulado, nos termos ali transcritos; referida sentença teria sido mantida integralmente nas demais instâncias, consoante se extrai do Acórdão do TRF5, que teria negado provimento à Apelação da União e à Remessa Oficial (fls. 538/539 da ação ordinária); do Acórdão do STJ - que não conhecera do Recurso Especial (fls. 630/631); do Acórdão do STJ - que teria rejeitado os Embargos de Declaração da União (fls. 647/648) e, finalmente; da Decisão Monocrática da Ministra Relatora do STF que teria negado seguimento ao Recurso Extraordinário (fls. 679/681) (Doc. 05); o feito teria transitado em julgado em 27/02/2009 (Doc. 06), tendo a Autora ingressado com Execução de sentença, na forma do art. 475-B do CPC/1973, então vigente, no valor de R$ 60.710.216,69 (sessenta milhões, setecentos e dez mil, duzentos e dezesseis reais e sessenta e nove centavos), atualizado até a data da propositura da execução em 18/04/2011 (Doc. 07); a União teria  oposto Embargos à Execução (proc. nº 0007723-40.2011.4.05.8300) - Doc. 08, no bojo do qual teria sido determinada a realização de laudo pericial (Doc. 09), tendo o MM. Juízo de 1º grau, ao final, julgado improcedentes os da referida  ação de Embargos à Execução e determinado o prosseguimento da execução "com os valores apresentados pelo Perito Contábil, no importe de R$ 89.708.116,03 (oitenta e nove milhões, setecentos e oito mil, cento e dezesseis reais e três centavos), atualizado até 12/2012" (Doc. 10); a União teria interposto Recurso de Apelação ao qual fora dado provimento parcial  pelo E. TRF da 5ª Região apenas para determinar que a Execução de Sentença prosseguisse, não pelo valor calculado pelo Senhor Perito, por ser superior ao valor executado, e sim pelo valor calculado e executado pela Autora (Doc. 11); contra referido Acórdão, a União teria interposto  Recurso Especial e Recurso Extraordinário insurgindo-se tão somente quanto ao índice de correção monetária do valor da indenização, pedindo a aplicação do artigo 1º-F, da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960, de 29/06/2009, que teria determinado a utilização da correção pela TR (poupança partir 30/06/2009 (doc. 12); diante desse resultado, restando incontroverso o valor do principal da indenização, a impetrante teria peticionado nos autos da ação ordinária Proc. nº NPU 0012745-02.1999.4.05.8300, requerendo a expedição do precatório da parcela incontroversa da condenação, com fulcro no §4º do art. 535 do CPC/2015 (doc. 13); intimada a União, teria finalmente concordado com a inscrição em precatório do valor incontroverso de R$ 39.984.067,79 (trinta e nove milhões, novecentos e oitenta e quatro mil, sessenta e sete reais e setenta e nove centavos) corrigidos pela SELIC até a data base de 20/12/2018, conforme defendido e calculado pela União Federal em sua manifestação (Doc. 14); fixado o valor incontroverso, foi determinada sua inscrição em precatório, consoante decisão anexa (Doc. 15), tendo, em consequência, sido emitido o precatório n. 2019.83.00.007.000298, na data de 28/06/2019 (Doc. 16); autuado no TRF5 e individualizado em 28/06/2019, referido requisitório teria sido inscrito em precatório sob o n. PCR 179324-PE, NPU n. 0342140-33.2019.4.05.0000 e atualizado em 04 de julho de 2019 para o montante de R$ 40.320.752,94 (quarenta milhões, trezentos e vinte mil, setecentos e cinquenta e dois reais e noventa e quatro centavos); uma única controvérsia persistiria no aludido processo e  seria atinente ao índice de correção monetária a ser aplicado sobre o valor indenizatório, este já incontroverso e já inscrito em precatório; não haveria controvérsia quanto ao valor do prejuízo auferido pela Impetrante nem tampouco quanto à natureza dessa condenação (indenização por dano emergente); em relação ao tratamento tributário a ser conferido aos valores recebidos a título de indenização em decorrência de decisão judicial, todavia, a Receita Federal, em pronunciamentos recentes, a exemplo das Soluções de Consulta nº 455/2017 e nº 76/2019 (doc. 17), ambas editadas por sua Coordenação-Geral de Tributação - COSIT, cujas conclusões teriam efeito vinculante para a Administração Fiscal Federal, estariam impondo uma série de restrições à regra da não incidência de Imposto de Renda e CSLL sobre os valores recebidos a título de indenização por danos patrimoniais; a sobredita Solução de Consulta COSIT nº 455-2017 determinaria que algumas "parcelas" do valor recebido a título de indenização por danos patrimoniais deveriam ser consideradas como acréscimo patrimonial e, consequentemente, deveriam compor a base de cálculo dos tributos acima referidos; por esdrúxulo que pudesse parecer tal entendimento, para a Receita Federal, vinculados ao valor da indenização, haveria (i) parcelas deduzidas como despesas, bem como valores relativos a (ii) correção monetária e (iii) juros legais contados a partir da citação do processo judicial os quais constituiriam acréscimo patrimonial, não se caracterizando como indenização; a integralidade dos valores recebidos a título de indenização por danos emergentes, neles incluídos correção monetária e juros, representaria mera recomposição de patrimônio, o que não autorizaria sua adição à receita e ao resultado tributáveis como "acréscimo patrimonial"; como poderia ser conferido na sentença proferida no processo NPU 0012745-02.1999.4.05.8300, a indenização da qual teria resultado o precatório PCR 179324-PE seria qualificada  como indenização destinada a recompor prejuízo suportado pela impetrante, sendo incabível sua consideração como acréscimo patrimonial para fins de adição à receita e ao resultado tributáveis; os valores atinentes à correção monetária e juros de mora não deveriam sofrer tributação, na medida em que representariam genuína recomposição do patrimônio do credor pela impontualidade do devedor na realização do pagamento; a Impetrante estaria apurando o resultado tributável pelo IRPJ e pela CSLL por meio da sistemática do lucro real anual (vide DCTFs - Doc. 18); estaria obrigada a efetuar recolhimentos mensais a título de estimativa do IRPJ devido ao término do período sobre os acréscimos patrimoniais, consoante previsão do art. 2º da Lei n. 9.430/96, art. 32 da Lei n. 8.981/95 e art. 17 da IN 390/04; no presente caso, os Embargos à Execução opostos pela União Federal ainda não teriam transitado em julgado; considerando que a Receita Federal possui entendimento de que os valores a serem recebidos passam a ser receita tributável pelo IRPJ e pela CSLL já a partir da data da expedição do precatório (vide ADI SRF 25/2003 - Doc. 19), a Impetrante deveria, no entender da Receita Federal, incluir referidos valores como receita tributável já a partir de 30 de julho do corrente ano, sob pena de se sujeitar a autuação; teria a impetrante justo receito de que lhes seriam exigidos  valores indevidos a título de  Imposto de Renda e CSLL sobre os valores creditados a título de indenização, não lhe restando outra alternativa senão o ajuizamento do presente writ, para lhe assegurar o direito líquido e certo de não ser compelida ao pagamento dos referidos tributos sobre o valor da indenização, bem como dos juros moratórios e correção monetária decorrentes da demora da União na reparação aos danos sofridos. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, pela concessão de medida liminar para determinar à autoridade impetrada que se abstenha de exigir o IRRF e a CSLL sobre a indenização concedida nos autos do processo n. 0012745-02.1999.4.05.8300, cujo montante foi definido nos autos do  processo n. 0007723-40.2011.4.05.8300, incluindo também os juros moratórios e a correção monetária sobre ela incidentes, assegurando-se a suspensão da sua exigibilidade até o final julgamento do feito, nos termos do artigo 151, IV, do CTN. Inicial instruída com procuração e documentos.



É o relatório, no essencial.



Passo a decidir.


2. Fundamentação


Para a concessão da liminar, exige-se a presença simultânea dos dois pressupostos estabelecidos no inciso III do artigo 7º da Lei nº 12.016/2009, quais sejam, demonstração da relevância do fundamento (fumus boni iuris) e perigo da demora (periculum in mora).





Pugna a Impetrante por provimento jurisdicional liminar no sentido de determinar que  a autoridade impetrada se abstenha de exigir o IRRF e a CSLL sobre a indenização concedida nos autos do processo n. 0012745-02.1999.4.05.8300, cujo montante foi definido nos autos do  processo n. 0007723-40.2011.4.05.8300, incluindo também os juros moratórios e a correção monetária sobre ela incidentes, assegurando-se a suspensão da sua exigibilidade até o final julgamento do feito, nos termos do artigo 151, IV, do CTN. Inicial instruída com procuração e documentos.


Da análise dos autos e diante do historiado na petição inicial, vê-se que a Impetrante detém provimento jurisdicional favorável, nos seguintes termos:



Isto posto, julgo procedente a pretensão deduzida na petição inicial, determinando o pagamento da indenização alusiva à adoção do sobre-preço  na aquisição da cana-de-açúcar de seus fornecedores, no período entre janeiro de 1992 e outubro de 1998, no período entre janeito de 1992 e outubro de 1998, nos quantitativos constantes no seu Livro LPD, concernente à diferença dos preços da cana de açúcar praticados para o Estado de São Paulo e a região Nordeste, em função da supressão do subsídio de equalização anteriormente pago a tal título. (GN)






Prima facie, extrai-se do conteúdo dessa decisão  que mencionado crédito judicial,  obtido pela ora Impetrante na noticiada ação judicial,  tem natureza indenizatória.



Ora, créditos com natureza indenizatória não se caracterizam como renda (inciso I do art. 43 do Código Tributário Nacional, Lei 5.172, de 1966) e, embora enquadráveis como proventos de qualquer natureza, não sofrem incidência do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza, porque não implicam acréscimo patrimonial, como exigido pelo inciso II desse mesmo dispositivo legal, uma vez que apenas repõe uma perda.
Registre-se que os mencionados atos administrativos, que estão a respaldar a exigência tributária em debate, não podem sobrepor-se à mencionada Lei Complementar, em face de regras do inciso III do art. 146 da vigente Constituição da República, que tem a seguinte redação:
Art. 146. Cabe à lei complementar:
I - (...);
II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
III - (...);
    a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, ases de cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; 
c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.".



E, como consequência da não incidência do mencionado Imposto sobre Renda, também não incidirá a  Contribuição Social sobre Lucro Líquido-CSLL, primeiro porque a Constituição estabelece que essa Contribuição incide apenas sobre o lucro(art. 195, I, "c") e, se a verba é indenizatória, não há que se falar em lucro e, segundo, porque a Lei que a instituiu(Lei nº 7.689, de 15.12.1988), já com inúmeras alterações, estabelece que a sua base de cálculo será "valor do resultado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda",  quando, não sendo tal crédito considerado renda, não será considerada nessa valor do resultado do exercício para tal finalidade tributária.



Tem-se, então, prima facie, que,  relativamente aos mencionados tributos, o recebimento do mencionado crédito indenizatório não caracteriza os respectivos fatos geradores, sendo, pois, caso de não incidência.

Quanto aos juros moratórios e correção monetária incidentes sobre o valor da indenização recebido,  tenho que, conforme defendido na petição inicial, sendo apenas acessórios do principal, a este incorporam-se com a mesma natureza indenizatória. 

Nesse contexto, não desconheço julgado Superior Tribunal de Justiça, relativo ao REsp 1138695/SP, em regime de recursos repetitivos, no qual se firmou a tese de que os juros incidentes na repetição do indébito tributário, inobstante a constatação de se tratarem de juros moratórios, encontram-se dentro da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, dada a sua natureza de lucros cessantes, compondo o lucro operacional da empresa. (tema 505).
Mas esse julgado, com relação ao qual, data maxima venia, quanto aos juros de  mora, guardo reservas[1], não se aplica ao presente caso, no qual o principal tem clara natureza indenizatória, natureza essa que incorpora-se aos respectivos juros de mora, porque dela mero acessória.
E a correção monetária, sendo mera reposição do poder aquisitivo da moeda, nunca implica em acréscimo do patrimônio, mas mera manutenção deste.

3. Dispositivo



Posto isso, concedo a pleiteada medida liminar, suspendendo a exigibilidade do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido-CSLL sobre a totalidade do valor indenizatório acima descrito, recebido pela ora Impetrante da própria UNIÃO, inclusive sobre as respectivas parcelas de juros de mora e de correção monetária.



Notifique-se a DD Autoridade apontada como coatora, para cumprir a decisão supra, sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009, bem como para apresentar as informações(art. 7º, I, dessa Lei) e também que se dê ciência deste mandado de segurança ao Órgão de Representação(Procuradoria Geral da Fazenda Nacional em Recife-PE) da UNIÃO, na forma e para os fins do inciso II desse art. 7º dessa Lei.

No momento oportuno, encaminhem-se os autos ao Ministério Público Federal para que oferte r. Parecer.

Sucessivamente, voltem-me os autos conclusos para julgamento.

Intimem-se. Cumpra-se.
Recife, 25.07.2019
Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz  Federal, 2a Vara Federal/PE.

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[1] Como os  juros de mora sempre têm natureza indenizatória, pois representam a paga pelo uso  indevido, por parte do Devedor, do dinheiro do Credor, ainda que o principal não tenha natureza indenizatória,  mencionados tributos não poderiam incidir sobre os valores de tais juros, porque, tendo natureza indenizatória,  estes não implicam em  acréscimo patrimonial, pelo que o respectivo recebimento não constitui fato gerador dos mencionados tributos(IRPJ e CSLL), conforme as regras acima indicadas do Código Tributário Nacional.