quinta-feira, 25 de julho de 2019

INDENIZAÇÃO. O RESPECTIVO VALOR E RESPECTIVOS ACESSÓRIOS(JUROS DE MORA E CORREÇÃO MONETÁRIA)NÃO SOFREM INCIDÊNCIA DO IRPJ, NEM DA CSLL.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Importantes matérias tributárias são debatidas na decisão que segue, envolvendo inclusive recente julgado do Superior Tribunal de Justiça, editado com efeito repetitivo.  
Boa leitura.


Obs.: Pesquisa feita pela Assessora Luciana Simões Correa de Albuquerque



PROCESSO Nº: 0814011-87.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: U C O D'A S/A
ADVOGADO: L E C T De M M e outros
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
D E C I S Ã O
  1. Breve Relatório



U C O D'Á S.A., qualificada na Inicial, impetrou este MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO COM PEDIDO DE LIMINAR contra ato do Sr. DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE, representada em juízo pela Procuradoria Regional da Fazenda Nacional - PGFN da 5ª Região. Aduziu, em síntese, que: a Impetrante desenvolveria atividade agroindustrial no setor sucroalcooleiro, comercializando produtos derivados da cana-de-açúcar (etanol e açúcar); em 30/09/1999, a impetrante teria ajuizado a Ação Ordinária de Indenização contra a União (Proc. nº NPU 0012745-02.1999.4.05.8300 - Doc. 03) -, postulando que fosse a Ré condenada a pagar indenização por danos emergentes "em virtude da suspensão do pagamento do subsídio de equalização da cana-de-açúcar, após o advento da Lei n. 8.383/91, causando sérios prejuízos à suplicante, como, de resto, às outras Usina localizadas no Norte/Nordeste dos País, no período entre janeiro de 1992 e outubro de 1998, em função da adoção, quanto aos derivados de cana, de preços unificados em todo o Brasil, sem observar as disparidades regionais, no que tange aos custos da matéria-prima.; após regular tramitação, teria sido proferida sentença julgando procedente o pedido formulado, nos termos ali transcritos; referida sentença teria sido mantida integralmente nas demais instâncias, consoante se extrai do Acórdão do TRF5, que teria negado provimento à Apelação da União e à Remessa Oficial (fls. 538/539 da ação ordinária); do Acórdão do STJ - que não conhecera do Recurso Especial (fls. 630/631); do Acórdão do STJ - que teria rejeitado os Embargos de Declaração da União (fls. 647/648) e, finalmente; da Decisão Monocrática da Ministra Relatora do STF que teria negado seguimento ao Recurso Extraordinário (fls. 679/681) (Doc. 05); o feito teria transitado em julgado em 27/02/2009 (Doc. 06), tendo a Autora ingressado com Execução de sentença, na forma do art. 475-B do CPC/1973, então vigente, no valor de R$ 60.710.216,69 (sessenta milhões, setecentos e dez mil, duzentos e dezesseis reais e sessenta e nove centavos), atualizado até a data da propositura da execução em 18/04/2011 (Doc. 07); a União teria  oposto Embargos à Execução (proc. nº 0007723-40.2011.4.05.8300) - Doc. 08, no bojo do qual teria sido determinada a realização de laudo pericial (Doc. 09), tendo o MM. Juízo de 1º grau, ao final, julgado improcedentes os da referida  ação de Embargos à Execução e determinado o prosseguimento da execução "com os valores apresentados pelo Perito Contábil, no importe de R$ 89.708.116,03 (oitenta e nove milhões, setecentos e oito mil, cento e dezesseis reais e três centavos), atualizado até 12/2012" (Doc. 10); a União teria interposto Recurso de Apelação ao qual fora dado provimento parcial  pelo E. TRF da 5ª Região apenas para determinar que a Execução de Sentença prosseguisse, não pelo valor calculado pelo Senhor Perito, por ser superior ao valor executado, e sim pelo valor calculado e executado pela Autora (Doc. 11); contra referido Acórdão, a União teria interposto  Recurso Especial e Recurso Extraordinário insurgindo-se tão somente quanto ao índice de correção monetária do valor da indenização, pedindo a aplicação do artigo 1º-F, da Lei 9.494/1997, com a redação dada pela Lei nº 11.960, de 29/06/2009, que teria determinado a utilização da correção pela TR (poupança partir 30/06/2009 (doc. 12); diante desse resultado, restando incontroverso o valor do principal da indenização, a impetrante teria peticionado nos autos da ação ordinária Proc. nº NPU 0012745-02.1999.4.05.8300, requerendo a expedição do precatório da parcela incontroversa da condenação, com fulcro no §4º do art. 535 do CPC/2015 (doc. 13); intimada a União, teria finalmente concordado com a inscrição em precatório do valor incontroverso de R$ 39.984.067,79 (trinta e nove milhões, novecentos e oitenta e quatro mil, sessenta e sete reais e setenta e nove centavos) corrigidos pela SELIC até a data base de 20/12/2018, conforme defendido e calculado pela União Federal em sua manifestação (Doc. 14); fixado o valor incontroverso, foi determinada sua inscrição em precatório, consoante decisão anexa (Doc. 15), tendo, em consequência, sido emitido o precatório n. 2019.83.00.007.000298, na data de 28/06/2019 (Doc. 16); autuado no TRF5 e individualizado em 28/06/2019, referido requisitório teria sido inscrito em precatório sob o n. PCR 179324-PE, NPU n. 0342140-33.2019.4.05.0000 e atualizado em 04 de julho de 2019 para o montante de R$ 40.320.752,94 (quarenta milhões, trezentos e vinte mil, setecentos e cinquenta e dois reais e noventa e quatro centavos); uma única controvérsia persistiria no aludido processo e  seria atinente ao índice de correção monetária a ser aplicado sobre o valor indenizatório, este já incontroverso e já inscrito em precatório; não haveria controvérsia quanto ao valor do prejuízo auferido pela Impetrante nem tampouco quanto à natureza dessa condenação (indenização por dano emergente); em relação ao tratamento tributário a ser conferido aos valores recebidos a título de indenização em decorrência de decisão judicial, todavia, a Receita Federal, em pronunciamentos recentes, a exemplo das Soluções de Consulta nº 455/2017 e nº 76/2019 (doc. 17), ambas editadas por sua Coordenação-Geral de Tributação - COSIT, cujas conclusões teriam efeito vinculante para a Administração Fiscal Federal, estariam impondo uma série de restrições à regra da não incidência de Imposto de Renda e CSLL sobre os valores recebidos a título de indenização por danos patrimoniais; a sobredita Solução de Consulta COSIT nº 455-2017 determinaria que algumas "parcelas" do valor recebido a título de indenização por danos patrimoniais deveriam ser consideradas como acréscimo patrimonial e, consequentemente, deveriam compor a base de cálculo dos tributos acima referidos; por esdrúxulo que pudesse parecer tal entendimento, para a Receita Federal, vinculados ao valor da indenização, haveria (i) parcelas deduzidas como despesas, bem como valores relativos a (ii) correção monetária e (iii) juros legais contados a partir da citação do processo judicial os quais constituiriam acréscimo patrimonial, não se caracterizando como indenização; a integralidade dos valores recebidos a título de indenização por danos emergentes, neles incluídos correção monetária e juros, representaria mera recomposição de patrimônio, o que não autorizaria sua adição à receita e ao resultado tributáveis como "acréscimo patrimonial"; como poderia ser conferido na sentença proferida no processo NPU 0012745-02.1999.4.05.8300, a indenização da qual teria resultado o precatório PCR 179324-PE seria qualificada  como indenização destinada a recompor prejuízo suportado pela impetrante, sendo incabível sua consideração como acréscimo patrimonial para fins de adição à receita e ao resultado tributáveis; os valores atinentes à correção monetária e juros de mora não deveriam sofrer tributação, na medida em que representariam genuína recomposição do patrimônio do credor pela impontualidade do devedor na realização do pagamento; a Impetrante estaria apurando o resultado tributável pelo IRPJ e pela CSLL por meio da sistemática do lucro real anual (vide DCTFs - Doc. 18); estaria obrigada a efetuar recolhimentos mensais a título de estimativa do IRPJ devido ao término do período sobre os acréscimos patrimoniais, consoante previsão do art. 2º da Lei n. 9.430/96, art. 32 da Lei n. 8.981/95 e art. 17 da IN 390/04; no presente caso, os Embargos à Execução opostos pela União Federal ainda não teriam transitado em julgado; considerando que a Receita Federal possui entendimento de que os valores a serem recebidos passam a ser receita tributável pelo IRPJ e pela CSLL já a partir da data da expedição do precatório (vide ADI SRF 25/2003 - Doc. 19), a Impetrante deveria, no entender da Receita Federal, incluir referidos valores como receita tributável já a partir de 30 de julho do corrente ano, sob pena de se sujeitar a autuação; teria a impetrante justo receito de que lhes seriam exigidos  valores indevidos a título de  Imposto de Renda e CSLL sobre os valores creditados a título de indenização, não lhe restando outra alternativa senão o ajuizamento do presente writ, para lhe assegurar o direito líquido e certo de não ser compelida ao pagamento dos referidos tributos sobre o valor da indenização, bem como dos juros moratórios e correção monetária decorrentes da demora da União na reparação aos danos sofridos. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final, pela concessão de medida liminar para determinar à autoridade impetrada que se abstenha de exigir o IRRF e a CSLL sobre a indenização concedida nos autos do processo n. 0012745-02.1999.4.05.8300, cujo montante foi definido nos autos do  processo n. 0007723-40.2011.4.05.8300, incluindo também os juros moratórios e a correção monetária sobre ela incidentes, assegurando-se a suspensão da sua exigibilidade até o final julgamento do feito, nos termos do artigo 151, IV, do CTN. Inicial instruída com procuração e documentos.



É o relatório, no essencial.



Passo a decidir.


2. Fundamentação


Para a concessão da liminar, exige-se a presença simultânea dos dois pressupostos estabelecidos no inciso III do artigo 7º da Lei nº 12.016/2009, quais sejam, demonstração da relevância do fundamento (fumus boni iuris) e perigo da demora (periculum in mora).





Pugna a Impetrante por provimento jurisdicional liminar no sentido de determinar que  a autoridade impetrada se abstenha de exigir o IRRF e a CSLL sobre a indenização concedida nos autos do processo n. 0012745-02.1999.4.05.8300, cujo montante foi definido nos autos do  processo n. 0007723-40.2011.4.05.8300, incluindo também os juros moratórios e a correção monetária sobre ela incidentes, assegurando-se a suspensão da sua exigibilidade até o final julgamento do feito, nos termos do artigo 151, IV, do CTN. Inicial instruída com procuração e documentos.


Da análise dos autos e diante do historiado na petição inicial, vê-se que a Impetrante detém provimento jurisdicional favorável, nos seguintes termos:



Isto posto, julgo procedente a pretensão deduzida na petição inicial, determinando o pagamento da indenização alusiva à adoção do sobre-preço  na aquisição da cana-de-açúcar de seus fornecedores, no período entre janeiro de 1992 e outubro de 1998, no período entre janeito de 1992 e outubro de 1998, nos quantitativos constantes no seu Livro LPD, concernente à diferença dos preços da cana de açúcar praticados para o Estado de São Paulo e a região Nordeste, em função da supressão do subsídio de equalização anteriormente pago a tal título. (GN)






Prima facie, extrai-se do conteúdo dessa decisão  que mencionado crédito judicial,  obtido pela ora Impetrante na noticiada ação judicial,  tem natureza indenizatória.



Ora, créditos com natureza indenizatória não se caracterizam como renda (inciso I do art. 43 do Código Tributário Nacional, Lei 5.172, de 1966) e, embora enquadráveis como proventos de qualquer natureza, não sofrem incidência do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza, porque não implicam acréscimo patrimonial, como exigido pelo inciso II desse mesmo dispositivo legal, uma vez que apenas repõe uma perda.
Registre-se que os mencionados atos administrativos, que estão a respaldar a exigência tributária em debate, não podem sobrepor-se à mencionada Lei Complementar, em face de regras do inciso III do art. 146 da vigente Constituição da República, que tem a seguinte redação:
Art. 146. Cabe à lei complementar:
I - (...);
II - regular as limitações constitucionais ao poder de tributar;
III - (...);
    a) definição de tributos e de suas espécies, bem como, em relação aos impostos discriminados nesta Constituição, a dos respectivos fatos geradores, ases de cálculo e contribuintes;
b) obrigação, lançamento, crédito, prescrição e decadência tributários; 
c) adequado tratamento tributário ao ato cooperativo praticado pelas sociedades cooperativas.".



E, como consequência da não incidência do mencionado Imposto sobre Renda, também não incidirá a  Contribuição Social sobre Lucro Líquido-CSLL, primeiro porque a Constituição estabelece que essa Contribuição incide apenas sobre o lucro(art. 195, I, "c") e, se a verba é indenizatória, não há que se falar em lucro e, segundo, porque a Lei que a instituiu(Lei nº 7.689, de 15.12.1988), já com inúmeras alterações, estabelece que a sua base de cálculo será "valor do resultado do exercício, antes da provisão para o imposto de renda",  quando, não sendo tal crédito considerado renda, não será considerada nessa valor do resultado do exercício para tal finalidade tributária.



Tem-se, então, prima facie, que,  relativamente aos mencionados tributos, o recebimento do mencionado crédito indenizatório não caracteriza os respectivos fatos geradores, sendo, pois, caso de não incidência.

Quanto aos juros moratórios e correção monetária incidentes sobre o valor da indenização recebido,  tenho que, conforme defendido na petição inicial, sendo apenas acessórios do principal, a este incorporam-se com a mesma natureza indenizatória. 

Nesse contexto, não desconheço julgado Superior Tribunal de Justiça, relativo ao REsp 1138695/SP, em regime de recursos repetitivos, no qual se firmou a tese de que os juros incidentes na repetição do indébito tributário, inobstante a constatação de se tratarem de juros moratórios, encontram-se dentro da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, dada a sua natureza de lucros cessantes, compondo o lucro operacional da empresa. (tema 505).
Mas esse julgado, com relação ao qual, data maxima venia, quanto aos juros de  mora, guardo reservas[1], não se aplica ao presente caso, no qual o principal tem clara natureza indenizatória, natureza essa que incorpora-se aos respectivos juros de mora, porque dela mero acessória.
E a correção monetária, sendo mera reposição do poder aquisitivo da moeda, nunca implica em acréscimo do patrimônio, mas mera manutenção deste.

3. Dispositivo



Posto isso, concedo a pleiteada medida liminar, suspendendo a exigibilidade do IRPJ e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido-CSLL sobre a totalidade do valor indenizatório acima descrito, recebido pela ora Impetrante da própria UNIÃO, inclusive sobre as respectivas parcelas de juros de mora e de correção monetária.



Notifique-se a DD Autoridade apontada como coatora, para cumprir a decisão supra, sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009, bem como para apresentar as informações(art. 7º, I, dessa Lei) e também que se dê ciência deste mandado de segurança ao Órgão de Representação(Procuradoria Geral da Fazenda Nacional em Recife-PE) da UNIÃO, na forma e para os fins do inciso II desse art. 7º dessa Lei.

No momento oportuno, encaminhem-se os autos ao Ministério Público Federal para que oferte r. Parecer.

Sucessivamente, voltem-me os autos conclusos para julgamento.

Intimem-se. Cumpra-se.
Recife, 25.07.2019
Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz  Federal, 2a Vara Federal/PE.

______________________________________________________
[1] Como os  juros de mora sempre têm natureza indenizatória, pois representam a paga pelo uso  indevido, por parte do Devedor, do dinheiro do Credor, ainda que o principal não tenha natureza indenizatória,  mencionados tributos não poderiam incidir sobre os valores de tais juros, porque, tendo natureza indenizatória,  estes não implicam em  acréscimo patrimonial, pelo que o respectivo recebimento não constitui fato gerador dos mencionados tributos(IRPJ e CSLL), conforme as regras acima indicadas do Código Tributário Nacional.


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