segunda-feira, 30 de novembro de 2020

A PRESCRIÇÃO DE PARCELAS DO SALDO DEVEDOR DE IMÓVEIS FINANCIADOS PELA CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF, CEDIDOS À EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA.

Por Francisco Alves  dos  Santos Júnior


Na sentença infra, discute-se a interessante questão da prescrição aquisitiva de imóveis do SFH, bem como de parcelas  do saldo devedor dos contratos de financiamento ainda que por esse sistema, firmados com a Caixa Econômica Federal - CEF e cedidos à Empresa Gestora  de Ativos - EMBEA.

Boa leitura. 


 PROCESSO Nº: 0823538-63.2019.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

AUTOR: F DE A A 
ADVOGADO: C V C P e outros
RÉU: CAIXA ECONOMICA FEDERAL e outro
ADVOGADO: R L G 
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)


Sentença tipo B, registrada eletronicamente

EMENTA: DIREITO ECONÔMICO. DIREITO CIVIL. PRESCRIÇÃO DE PARCELAS DO SALDO DEVEDOR DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO DE IMÓVEIS. BAIXA NA  HIPOTECA.

-A fluência do prazo de prescrição, relativa a contrato sob prestação, ocorre a partir do dia seguinte ao final da data de vencimento da última prestação.

-Inércia da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF e da EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA na cobrança de parcelas do(s) saldo(s) devedor(es).

-Inaplicabilidade, ao caso, do entendimento de Turmas do E. STJ da impossibilidade de aquisição de imóvel do SFH por usucapião(prescrição aquisitiva).

-Reconhecimento da prescrição da pretensão das CAIXA e EMEA cobrarem parcelas do saldo devedor, bem  como da obrigação de ambas, solidariamente, darem baixa na(s) respectiva(s) hipoteca(s). 

-Procedência.


Vistos etc..

1. Relatório

F DE A A, qualificado na petição inicial, propôs esta ação declaratória de prescrição com cancelamento definitivo de hipoteca e tutela provisória de urgência em caráter antecedente em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA e da EMPRESA GESTORA DE ATIVOS - EMGEA, pleiteando, liminarmente, a suspensão do leilão extrajudicial dos imóveis objeto dos autos, marcado para o dia 26/11/2019. Requereu, preliminarmente, a concessão de prazo para juntar aos autos instrumento de procuração e comprovante de recolhimento de custas. Alegou, em síntese, que: a) teria adquirido os imóveis caracterizados como lojas nº 3, 4, 5 e 6 do Conjunto Comercial, localizado na Avenida Dr. Cláudio Gueiros Leite, nº 2235, bairro do Janga, Paulista/PE, aquisição esta advinda após assinatura da Escritura Pública de Mútuo com Garantia Hipotecária firmado com o vendedor e, especialmente, com a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, datada do mês de agosto de 1992, nos precisos termos das matrículas nº 25.313, 25.315, 25.185 e 25.317, respectivamente; b) o mútuo, no valor de CR$ 46.500.000,00 (cada um dos imóveis), teria suas condições de pagamento indicadas no R-2 das referidas matrículas, cujo conteúdo informa que ele deveria ser pago em 120 (cento e vinte) parcelas mensais, a primeira vencendo no dia 31/08/1992; c) considerando que o pagamento da dívida teve início no dia 31 de agosto de 1992, e considerando que o prazo total para quitação do mesmo era de 120 (cento e vinte) meses, ou seja, 10 (dez) anos seria certo afirmar que o dito financiamento terminou por ver vencer a última parcela no dia 31 de agosto de 2002; d) passados quase 17 (dezessete) anos da data indicada como do vencimento da última parcela do contrato e embora o autor não ostente termo de quitação do mesmo, não teria havido, por parte da instituição bancária credora, ou mesmo da EMGEA, qualquer ação efetiva com o objetivo de cobrar valores que estivessem em aberto, seja ela extrajudicial ou mesmo judicial, EXCETO medida cautelar de protesto distribuída no ano de 2008, quando já prescrita a obrigação; e) em 09 novembro de 2019 e novamente em 21 de novembro de 2019, teria sido surpreendido com a publicação de edital de leilão extrajudicial no Jornal Folha de Pernambuco, dando conta que o imóvel por ele adquirido seria alvo de leilão extrajudicial por dívida decorrente do contrato acima identificado. Teceu outros comentários acerca da prescrição da obrigação. Protestou o de estilo. Deu valor à causa. Instruiu a inicial com documentos.

Decisão (ID. 4058300.12766834) na qual foi determinada a intimação da parte autora para, no prazo de 15 (quinze) dias, juntar aos autos o Instrumento de Procuração e o comprovante de recolhimento das custas e, com relação aos imóveis, deferiu-se, em parte, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela, apenas, para determina a suspensão de todo e qualquer procedimento executivo tendente a sua alienação a terceira pessoa ou a sua integração no patrimônio da CAIXA ou da EMGEA, especialmente os noticiados leilões, até ulterior decisão judicial, assim como foi determinada a expedição de ofício ao Cartório de Registro de Imóveis no qual se encontram registradas as escrituras dos imóveis em questão.

Ofício expedido (ID. 4058300.12851775)

Certificada a juntada do recibo de envio do ofício (ID. 4058300.12873409).

A parte autora requereu a juntada do Instrumento de Procuração e do comprovante de recolhimento das custas (ID. 4058300.13056446 e ID. 4058300.13056449).

Ofício resposta do 1º Serviço Notarial e Registral - Paulista/PE noticiando o cumprimento da determinação deste Juízo (ID. 4058300.13194056).

Ato ordinatório (ID. 4058300.13205248) no qual a parte autora foi intimada para tomar ciência do ofício resposta do Cartório competente.

Certificado o encaminhamento para o setor de expedientes a fim de dar ciência ao leiloeiro (ID. 4058300.13205328).

A CAIXA/EMGEA apresentaram contestação (ID. 4058300.13246759). Em preliminar defenderam a inexistência de prescrição. No mérito pontuaram a legalidade das cláusulas contratuais, do pacta sunt servanda e da inaplicabilidade do Código de Defesa do Consumidor. Defenderam a existência de previsão da prorrogação do prazo contratual e da responsabilidade dos mutuários por eventual saldo residual; a legalidade da execução extrajudicial prevista no Decreto-Lei nº 70/66; da não inversão do ônus da prova. Ao final, requereram a total improcedência dos pedidos da parte autora e o deferimento dos argumentos declinados na contestação, com a condenação da parte autora ao pagamento do ônus oriundos de sua sucumbência (ID. 4058300.13246759).

Ato ordinatório (ID. 4058300.13304533) no qual a parte autora foi intimada para, querendo, apresentar réplica.

A parte autora apresentou réplica (ID. 4058300.13347487), oportunidade na qual defendeu a efetiva ocorrência da prescrição e inexistência de prorrogação do prazo para amortização; apontou a irrelevância da força obrigacional do contrato e da inaplicabilidade do CDC, por ser matéria estranha ao pedido autoral, uma vez que o mérito da questão paira apenas sobre a prescrição das obrigações; apontou a ilegalidade de procedimento sob a luz do Decreto-Lei nº 70/66 diante da inexistência e obrigação válida a ser executada; a ausência de prova da qual não se desincumbiram as demandadas; requereu, ainda, a correção do valor da causa. Teceu outros comentários. Ao final, requereu seja: avaliada a necessidade de correção do valor da causa; declarada a prescrição de todos os débitos porventura existentes em relação ao contrato de compra e venda; confirmada a medida liminar inicialmente deferida para suspender em definitivo a realização de leilão extrajudicial dos imóveis objeto do contrato supracitado; determinada a expedição de ofício ao Oficial Registrador do Cartório do 1º Serviço Notarial e Registral da Comarca de Paulista/PE, a fim de que seja procedida a baixa definitiva das hipotecas de 1º grau, constantes das matrículas de nº 25.313, 25.315, 25.185 e 25.317 das lojas nº 3, 4, 5 e 6 do Conjunto Comercial, localizado na Avenida Dr. Cláudio Gueiros Leite, nº 2235, bairro do Janga, Paulista/PE.

A CAIXA/EMGEA requereram o julgamento do feito (ID. 4058300.15941754).

A EMGEA requereu a inclusão do nome do advogado RICARDO LOPES GODOY, OAB/PE1931A (ID. 4058300.15941755). E juntou Instrumento de Procuração (ID. 4058300.15941758).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório. Decido.

2. Fundamentação

2.1. Representação Processual CAIXA/EMGEA

O pedido de cadastramento da habilitação do(a)(s) advogado(a)(s) acima indicado(a)(s) pela CAIXA e EMGEA já foi atendido, é tanto que o(s) seu(s) nome(s) está(ao) anotado(s) como Patrono(a)(s) dessa(s) Empresa(s) na distribuição deste processo.

2.2. Julgo antecipadamente este feito, de acordo com o estado do processo, por entender desnecessária qualquer outra dilação probatória, uma vez que a documentação acostada nos autos permite-me extrair a conclusão para esta demanda (art. 355, I, CPC).

2.3. Do Mérito

2.3.1. Da Prescrição

Busca a p arte autora a declaração da prescrição da pretensão das partes do polo passivo (CAIXA/EMGEA) de cobrarem valores de prestações relativas ao financiamento de quatro imóveis junto à CAIXA.

2.3.1.1 - Prescrição Aquisitiva - Usucapião - de Imóvel do SFH

Conforme já registrado na decisão sob o id. 4058300.12766834, os imóveis objeto de financiamento pela CAIXA, pelo sistema financeiro de habitação, não são passíveis de aquisição prescritiva (usucapião), conforme entendimento acolhido pela Terceira Turma do Superior Tribunal de Justiça:

"O imóvel da Caixa Econômica Federal vinculado ao Sistema Financeiro de Habitação, porque afetado à prestação de serviço público, deve ser tratado como bem público, sendo, pois, imprescritível"[1]

No mesmo sentido também decidiu a Quarta Turma do STJ[2].

2.3.1.2 -Prescrição da Pretensão de Cobrança de Valores  do Saldo Devedor

Mas, o entendimento descrito  no subitem anterior,  não se aplica à cobrança a ser feita pela CAIXA e/ou pela EMGEA de parcelas(prestações ou do saldo devedor)de contratos de financiamento de imóveis,  por qualquer  tipo de sistema, inclusive pelo Sistema Financeiro da Habitação.

Examinemos, pois, se houve ou não prescrição da pretensão de as CAIXA e EMGEA cobrarem parcelas dos saldos devedores, relativos aos três imóveis em questão, indicados na petição inicial.

Embora a Parte Autora não tenha apresentado sua via do contrato, assim como a CAIXA/EMGEA também não o fizeram, consta nos registros dos imóveis sob as matrículas de nº 25.313, 25.315, 25.185 e 25.317, todas do 1º Serviço Notarial e Registral - Paulista/PE (Id. 4058300.12763053, 4058300.12763070, 4058300.12763094 e 4058300.12763099), o registro R-2, no qual foi anotado que o financiamento da credora hipotecária (CAIXA) seria pago em 120 meses, ou 10 (dez) anos, com a primeira prestação vencendo no pretérito dia 31.08.1992.

Logo, pelas informações constantes nos autos, a última prestação do financiamento vencera no pretérito dia 31.08.2002 e, nas pesquisas nos sistemas TEBAS e PJe, os únicos processos vinculados ao autor (FRANCISCO DUCLERC MODESTO SIMEÃO - CPF 037.359.824-68) são uma medida cautelar de protesto, distribuída em 07.01.2008 e baixada (entregue) em 25.01.2008 e esta ação.

O contrato objeto dos autos foi assinado durante a vigência do Código Civil de 1916, de sorte que a contagem do prazo prescricional seria realizada levando em consideração o art. 177 do CC/1916, verbis:

"Art. 177. As ações pessoais prescrevem, ordinàriamente, em vinte anos, as reais em dez, entre presentes e entre ausentes, em quinze, contados da data em que poderiam ter sido propostas. (Redação dada pela Lei nº 2.437, de 1955).".     (Vigência)

A partir de janeiro de 2003, com a vigência do Código Civil de 2002, o prazo para cobrança desse tipo de débito passou a ser regulado pelo art. 206, §5º:

"Art. 206. Prescreve:

(...)

§ 5º Em cinco anos:

I - a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular;".

Com a alteração(redução)do prazo prescricional, o próprio Código Civil de 2002 trouxe uma regra de transição para definir qual seria o prazo aplicável às relações jurídicas. Vide o artigo 2.028:

"Art. 2.028. Serão os da lei anterior os prazos, quando reduzidos por este Código, e se, na data de sua entrada em vigor, já houver transcorrido mais da metade do tempo estabelecido na lei revogada."

No caso dos autos, como não havia transcorrido mais de 05 (cinco) anos entre o vencimento da dívida (31.08.2002) e a entrada em vigor do Código Civil de 2002 (11.01.2003), prevalecerá a contagem do prazo prescricional deste.

Logo, a prescrição da cobrança de eventual saldo devedor ocorreu em 12.01.2008, porque o marco inicial de contagem do novo prazo de prescrição é o dia 11.01.2003, ou seja, a data de entrada em vigor do Código Civil de 2002 e não a data do fato gerador.

Não houve, por parte da CAIXA, tampouco da EMGEA, qualquer comprovação de que teria promovido atos para a execução da dívida no intervalo apresentado no parágrafo anterior, sendo forçoso o reconhecimento da prescrição do fundo de direito para a cobrança(ordinária ou executiva) das parcelas pendentes.

Nesse sentido:

"CIVIL. SFH. CONTRATO DE MÚTUO. INADIMPLÊNCIA DESDE O ANO DE 2001. AUSÊNCIA DE NOTIFICAÇÃO PARA EXECUÇÃO DA DÍVIDA ANTECIPADA. PRESCRIÇÃO. OCORRÊNCIA. CONTAGEM DO PRAZO A PARTIR DA VIGÊNCIA DO NOVO CÓDIGO CIVIL. PRECEDENTES DA TURMA. PROVIMENTO DO APELO.

1. Apelação do particular em sede de ação revisional de contrato de mútuo, em que em sede de apelo discute apenas a ocorrência de prescrição do débito das parcelas vencidas e não pagas, desde o ano de 2001, diante da omissão da Caixa Econômica Federal em promover a execução extrajudicial de tais valores.

2. Havendo inadimplência do mutuário, em relação ao seu contrato de mútuo firmado com a CEF, a dívida será antecipada a partir da terceira prestação sem que tenha ocorrido sua quitação. Na hipótese, é fato incontroverso que o particular se encontra inadimplente desde o ano de 2001, com o encerramento do contrato no ano de 2010, depois de vencida e não paga a última prestação em 10/07/2010.

3. Inexiste nos autos prova de ter o agente financeiro promovido à notificação do mutuário para pagamento do débito em aberto, mas tão somente afirma em sua apelação ter tomado providências acerca da sua cobrança. Não comprovada nos autos notificação pessoal do mutuário concedendo-lhes o prazo de vinte dias para a purgação da mora, de acordo com o art. 31, §1º, do Decreto-Lei nº 70/66, ou de qualquer documento que comprove tais providências, é de se reconhecer a ausência de qualquer ato de execução extrajudicial para cobrança do débito.

4. Prevendo o Código Civil anterior o prazo de 20 anos para a cobrança da dívida, mas, na data da entrada em vigor do Novo Código Civil (12.01.2003), havendo decorrido menos de 02 anos do surgimento da pretensão da CAIXA (o que deu ensejo à execução da dívida foi o inadimplemento do mutuário ocorrido em março de 2001), o novo termo final da prescrição foi antecipado para 12/01/2008 (05 anos após o início da vigência do Novo Código Civil), sendo este prazo incontroverso.

5. Não obstante a afirmativa da CEF de que promoveu atos para execução da dívida, não demonstrou tais providências, sendo a hipótese de se reconhecer a prescrição do fundo de direito para a Caixa Econômica Federal em promover a execução em tela, diante do transcurso do lustro prescricional, na hipótese, de cinco anos, a contar da entrada em vigor do novo Código Civil, que findou em 13/01/2008, declarando-se por quitada a dívida do contrato em tela, com a respectiva liberação da hipoteca do imóvel, após o trânsito em julgado da presente ação.

6. Precedentes da Turma: (AC 200883000035475, Desembargador Federal Paulo Gadelha, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::23/09/2010 - Página::598.); (PROCESSO: 200981000006414, AC530735/CE, DESEMBARGADOR FEDERAL FRANCISCO WILDO, Segunda Turma, JULGAMENTO: 08/11/2011, PUBLICAÇÃO: DJE 17/11/2011 - Página 405); (AC 200980000000770, Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::28/01/2010 - Página::172.). 7. Apelação do particular provida."[3].

Cabe registrar, ainda, que, embora a CAIXA aponte previsão contratual para prorrogação do contrato para a liquidação do saldo devedor residual, da leitura dos documentos juntados aos autos, não é possível identificar a existência de cláusulas com a previsão de responsabilidade, por parte do mutuário, em adimplir eventual saldo devedor após o pagamento das 120 (cento e vinte) prestações previstas em contrato.

Nesse ponto, inclusive, incumbiria à referida Empresa pública indicar expressamente onde estaria registrada essa previsão em contrato, o que não ocorreu.

Logo, patente a ocorrência da prescrição da possibilidade de as Requeridas cobrarem da Parte Autora as referidas  parcelas de saldo devedor do financiamento dos três imóveis  referidos na  petição inicial.

Prescrita a possibilidade de as CAIXA e EMGEA cobrarem mencionadas  parcelas,   tem-se que houve quitação do(s) financiamento(s), pelo que são obrigadas a dar baixa na(s) respectiva(s) hipoteca, pois a Parte Autora passou a fazer jus ao domínio pleno de tais  imóveis.

2.4. Da sucumbência

As Partes do polo passivo sucumbiram integralmente, pelo que serão condenadas nas respectivas verbas e, considerando o esforço e dedicação do Patrono da Parte Autora, tenho que mencionada verba deve ser aplicada no percentual médio legal de 15%(quinze por cento), conforme regra do § 2º do art. 85 do vigente Código de Processo Civil.

3. Dispositivo

Posto isso, julgo procedentes os pedidos desta ação e:

3.1 - pronuncio a prescrição da pretensão das ora Requeridas relativamente aos saldos devedores dos imóveis em questão e, com relação aos respectivos valores, dou por quitada a dívida da Parte Autora e por extinta esta ação,  com  resolução do  mérito(art. 487, inciso  II, do Código de Processo Civil);  e

3.2 - como consequência do consignado no subitem anterior, condeno as Requeridas, solidariamente, a providenciarem, no prazo máximo de 15(quinze) dias, baixa nas hipotecas dos  referidos imóveis,  perante o Cartório do 1º Serviço Notarial e Registral da Comarca do Paulista, perante o qual fizeram mencionada hipoteca, sob pena de pagamento de multa mensal correspondente a 10%(dez por cento) do valor dos saldos devedores, cuja prescrição foi acima reconhecida, sem prejuízo da responsabilização pessoa do Servidor e/ou respectiva Chefia das mencionadas Empresas públicas, ora Rés, no campo do direito civil, administrativo e criminal, bem como de referida baixa ser determinada por este Juízo diretamente ao mencionado Cartório, sob as expensas das ora Requeridas, sem prejuízo da mencionada multa e,  com relação a este pleito, dou o processo por extinto, com resolução do mérito(art. 487, I, CPC).

 

3.3 - Finalmente, condeno as Requeridas,  pro rata, mas solidariamente, ao pagamento de honorários advocatícios, que serão pagos ao Patrono da Parte Autora, no percentual médio de 15%(quinze) por cento sobre o valor atualizado das verbas tidas acima como prescritas, atualização(correção  monetária) a ser feita desde a data da citação até a data do efetivo pagamento, pelos índices do manual de cálculos do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal.

Registrada. Intimem-se.

Recife/PE, 30.11.2020.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal da 2ª Vara da JFPE

mef




[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 3ª Turma. REsp 1448026 / PE RECURSO ESPECIAL 2014/0081994-7. Relatora Ministra Nancy Andrighi, julgado em 17.11.2016, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 21.11.2016.

Disponível em

https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=66923978&num_registro=201400819947&data=20161121&tipo=5&formato=PDF

Acesso em 30.11.2020

[2] ______________________________4ª Turma. AgInt no REsp 1513476 / AL AGRAVO INTERNO NO RECURSO ESPECIAL 2015/0002997-2. Relator Ministro Luis Felipe Salomão, julgado em 09.10.2018, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 15/10/2018.

https://processo.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=88702089&num_registro=201500029972&data=20181015&tipo=5&formato=PDF acesso em 30.11.2020

[3] Brasil. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, 2ª Turma, AC 00153206020114058300, Desembargador Federal Francisco Wildo, in DJE de 05/07/2012, p. 398.

DECADÊNCIA DO PODER-DEVER DE ÓRGÃO DA UNIÃO REVER ATO ADMINISTRATIVO QUE LHE CAUSOU DANOS FINANCEIROS.

Por Francisco Alves dos  Santos Júnior


Segue um caso de decadência do poder-dever de Órgão da União refazer ato que lhe causou prejuízo jurídico-financeiro, no campo de progressão funcional de servidor público. 

Boa leitura. 





PROCESSO Nº: 0804757-56.2020.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL 

AUTOR: T B J 
ADVOGADO: T E T V R e outros
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

 

 Sentença tio A


    EMENTA: - DIREITO ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. PROGRESSÃO.PROMOÇÃO. REVISÃO DE PROVENTOS PELA ADMINISTRAÇÃO. DECADÊNCIA.

    - A Administração Pública tem o poder-dever de rever seus próprios atos, conforme a Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal, desde que o faça no prazo legal de 5(cinco) anos(art. 54 da Lei nº 9.784, de 1999).

    - Reconhecimento da decadência  do direito de a UNIÃO exercer o seu poder-dever revisional dos proventos  do  Autor.

    - Condenação da UNIÃO a restabelecer os proventos do Autor, pagando as respectivas diferenças da noticiada redução, bem como em verba honorária.

     - Procedência.


Vistos, etc.

1. Relatório

Trata-se de procedimento comum, com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, movido por T B J, em face da UNIÃO FEDERAL. Alegou em síntese, que: a) teria tomado posse no cargo de Analista Judiciário - Oficial de Justiça Avaliador do Tribunal Regional do Trabalho da 6ª Região, em 31 de janeiro de 2005, encontrando-se lotado na 1ª Vara do Trabalho do Cabo de Santo Agostinho; b) ao longo dos anos teria progredido gradativamente nos níveis salariais previstos para o cargo de Analista Judiciário, tanto por progressões funcionais (dentro da mesma classe), quanto por promoções (passagem do último nível salarial de uma classe para o primeiro da classe seguinte); c)teria logrado a promoção para o Nível Salarial 6 em agosto de 2010, através do Ato nº 650/2010, do Presidente do TRT da 6ª Região; d) em agosto de 2019, uma comissão do TRT6 designada para identificar irregularidades em progressões funcionais relacionadas à inobservância do interstício mínimo de 1 ano, teria entendido que a promoção deferida ainda no ano de 2010 ao Demandante padeceu de vício relacionado ao não cumprimento da carga horária mínima de cursos de aperfeiçoamento; e) em 9 de setembro de 2019, o Exmo. Sr. Desembargador Presidente e a Diretora da Secretaria de Gestão de Pessoas do TRT da 6ª Região publicaram atos por meio dos quais anularam a promoção datada de 2 de agosto de 2010 e em razão dessa medida, na prática, o Demandante, que já havia atingido o Nível Salarial 13 (máximo de sua carreira) desde 31 de janeiro de 2017, sofreu significativo descenso em seu nível salarial atual, que passou a ser o NS10, com consequente perda remuneratória; f) teria sido informado, mediante contato telefônico, sobre a intenção do TRT6 de levar a efeito descontos mensais destinados a restituir aos cofres públicos as diferenças remuneratórias que o Tribunal considera indevidas, em razão da anulação da promoção em questão; g) não resta alternativa ao Demandante senão socorrer-se da prestação jurisdicional, a fim de estancar os efeitos do desfazimento da promoção que lhe fora regularmente concedida no ano de 2010, bem como para obstar a realização dos descontos mensais em seus estipêndios. Teceu comentários, citou textos de lei e da jurisprudência dos tribunais em defesa de seu pleito e ao final requereu:

    "a)      Seja deferida, em caráter antecedente e liminar, tutela provisória, com o fim específico de determinar à Demandada que devolva o Requerente ao nível salarial 13, a fim de que volte a receber a remuneração correspondente a esse nível vencimental (em voga antes da despromoção), obstando-se, ainda, a realização de qualquer desconto de valores considerados indevidos pelo TRT da 6ª Região;

    a.1) Subsidiariamente, caso se entenda pela inviabilidade da concessão da tutela provisória com a finalidade de restaurar o nível vencimental do Requerente, postula seja deferia a tutela provisória apenas para obstar a realização de quaisquer descontos dos valores considerados como pagamentos a maior pelo TRT da 6ª Região;

Ao final, requer seja decretada a invalidação dos atos que procederam à anulação do Ato TRT/GP nº 650/2010 e de todas as promoções posteriores, em efeito cascata, confirmando-se, em todos os seus termos, a tutela provisória requerida para devolver em definitivo o Requerente ao nível vencimental 13 (último da carreira a que pertence) e impedir a realização de qualquer desconto de diferenças remuneratórias, condenando-se a Demandada, ainda, ao pagamento de todas as diferenças remuneratórias decorrentes da despromoção (a partir de outubro de 2019) e daquilo que o TRT da 6ª Região venha a descontar dos estipêndios do Requerente, a título de restituição ao erário, incidindo juros de mora e correção monetária até a data do efetivo pagamento."

 Em decisão acostada sob Id. 4058300.13685480, foi deferido parcialmente o pedido de tutela provisória de urgência, apenas para determinar que a UNIÃO, por seus Órgãos próprios, inclusive  pelo mencionado TRT6R, se abstivesse de efetuar descontos no contracheque do Autor relativos aos valores que lhes  foram pagos em decorrência das progressões vencimentais concretizadas no âmbito do TRT  6ª Região.

A UNIÃO, em petição acostada sob Id. 4058300.13784085, informa que não houve qualquer desconto relativo ao reposicionamento do servidor THIAGO BRENNAND JORGE.

Citada, a UNIÃO apresentou contestação (Id.4058300.13978000). Não apresentou preliminares. Alegou em síntese, que a auditoria do Conselho Superior da Justiça do Trabalho, no exercício de sua competência, constatou a irregularidade nas progressões concedidas aos servidores do TRT6 ao longo de suas carreiras. As irregularidades verificadas foram de natureza operacional, uma vez que a contagem de tempo para a progressão funcional deveria computar apenas o tempo de efetivo exercício, não considerados, obviamente, os períodos de licenças e participação em cursos de formação e em casos de faltas injustificadas. Aduziu ainda, que a Administração Pública não incorrera em erro interpretativo, mas sim de fato (erro operacional), o que permitiria a reposição ao Erário, conforme jurisprudência pacífica dos nossos tribunais. Pugnou pela improcedência dos pedidos.

Certidão acostada sob Id. 4058300.14338101 informando que a Parte Autora interpusera Agravo de Instrumento perante o TRF 5ª Região, em face da decisão de Id. 4058300.13685480.

O Autor apresentou réplica à contestação, anexada sob Id.4058300.14438485, rechaçando os argumentos apresentados na contestação e reiterou os pedidos da petição inicial.

Vieram os autos conclusos.

 É o breve relatório.

Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação

Julgo este feito antecipadamente, de acordo com o estado do processo (art. 355, CPC), por entender desnecessária qualquer dilação probatória.

2.1. Do Mérito

Objetiva a Parte Autora provimento judicial para que seja decretada a anulação do Ato TRT/GP nº 286/2019, que procedeu com a anulação do Ato TRT/GP nº 650/2010 e de todas as promoções posteriores, em efeito cascata, confirmando-se, em todos os seus termos, a tutela provisória requerida para devolver em definitivo o Requerente ao nível vencimental 13 (último da carreira a que pertence) e impedir a realização de qualquer desconto de diferenças remuneratórias.

Pelos documentos acostados aos autos, Anexo I do Ato 286/2019, o Ato 650/2010 assegurou ao Autor a progressão funcional do Nível NS05 para o Nível NS06, com início dos efeitos financeiros a partir de 02/08/2010 (Id. 4058300.13978004).

Pelos contracheques anexados aos autos (Id. 4058300.13660491 e 13660482) é possível constatar que a partir de outubro de 2019 ocorreu a alegada redução salarial.

Ou seja, de agosto de 2010 até setembro de 2019, o Autor recebera os seus proventos de acordo com as progressões sucessivas a partir do Ato TRT GP 650/2010.

Portanto, o Autor recebeu seus proventos por 9 anos, sem que Administração tenha exercido no tempo hábil o direito de anulação, qual seja, no prazo de 5(cinco) anos, conforme regra do art. 54 da Lei nº 9.784, de 1999.

Realmente, conforme assentado na jurisprudência, a Administração Pública tem o poder-dever de rever seus próprios atos, e nesse sentido é a Súmula nº 473 do Supremo Tribunal Federal:

 "Súmula n.º 473 - A administração pode anular seus próprios atos, quando eivados de vícios que os tornam ilegais, porque deles não se originam direitos; ou revogá-los, por motivo de conveniência ou oportunidade, respeitados os direitos adquiridos, e ressalvada, em todos os casos, a apreciação judicial."

Mas, desde que a Administração o faça no prazo legal, acima indicado.

Teria ocorrido a decadência quinquenal para a revisão em tela, nos termos do art. 54 da Lei 9.784/1999, conforme alega o Autor em sua exordial?

Creio que sim.

Vejamos.

Eis o texto do art 54 da Lei nº 9.784/1999:

    "Art. 54. O direito da Administração de anular os atos administrativos de que decorram efeitos favoráveis para os destinatários decai em cinco anos, contados da data em que foram praticados, salvo comprovada má-fé.

    § 1º No caso de efeitos patrimoniais contínuos, o prazo de decadência contar-se-á da percepção do primeiro pagamento.

    § 2o Considera-se exercício do direito de anular qualquer medida de autoridade administrativa que importe impugnação à validade do ato.".

A UNIÃO, em sua contestação, não enfrentou e nem comentou a alegada decadência exposta pelo Autor na petição  inicial e limitou-se apenas a discorrer sobre a inexistência de erro jurídico de interpretação da Lei por parte da Administração, pois teria havido mero erro material.

Ademais, não se tratou de erro material, como sustentado pela UNIÃO, mas sim de erro jurídico de interpretação das regras legais e administrativas, na  implementação da progressão funcional do Autor. 

Depreende-se que o Autor vem recebendo os seus proventos, de boa-fé, com base no Ato 650/2010 do Tribunal Regional do Trabalho, há 9 anos, sem qualquer impugnação por parte da Administração Pública.

Então, quando o Tribunal Regional do Trabalho baixou o Ato TRT - GP nº 286/2019, em 09 de setembro de 2019, tornando sem efeito o Ato 650/2010 no tocante às progressões/promoções do Autor e concedeu novas progressões fixadas neste mesmo Ato, portanto, 9(nove) anos depois, já não poderia fazê-lo, porque esse seu poder-dever já se encontrava fulminado pela decadência quinquenal legal,  acima apontada.

3. Dispositivo                                               

Posto isso:

3.1. julgo procedentes os pedidos desta ação, com acolhimento da exceção de decadência quinquenal, levantada pela Parte Autora, pronuncio a decadência do direito de a UNIÃO FEDERAL, por seu Órgão  próprio,   exercer o seu poder-dever de editar Ato tornando sem efeito Atos concedidos modificando as progressões/promoções do Autor a partir de agosto de 2010, pelo que cancelo o Ato TRT - GP nº 286/2019 de 09 de setembro de 2019, pela qual mencionada modificação foi concretizada, restabeleço aquele Ato TRT GP nº 650/2010, retornando o Autor ao mesmo nível de vencimentos em que estava até outubro de 2019, quando ocorreu a modificação, e condeno a ora Requerida a restabelecer os proventos do Autor nos valores e parâmetros pagos até outubro de 2019, sem prejuízo de eventuais reajustes/aumentos concedidos em datas posteriores, bem como a pagar as diferenças vencidas, retroativamente à data que sofreu redução por conta do mencionado Ato TRT-GP nº 286/2019, de 09 de setembro de 2019, ora cancelado, com correção monetária e juros de mora  na forma indicada no Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal - CJF, no qual já se encontra incorporado o entendimento do Plenário do Supremo Tribunal Federal no acórdão relativo ao RE 870.945/SE[1], estendendo-se mencionada atualização até a data da expedição do(s) requisitório(s), conforme julgado do Plenário do Supremo Tribunal Federal [2].

 3.2. Outrossim, com base nos §§ 2º ao 5º do art. 85 do CPC, condeno a UNIÃO a pagar ao(s) Patrono(s) do Autor verba honorária, que arbitro no mínimo legal, observada a gradação do invocado § 3º do art. 85 do CPC, sobre o valor total das diferenças acima indicadas, bem como sobre as 12(doze) primeiras parcelas das diferenças em questão que voltarão a ser pagas nos proventos do Autor(§ 9º do art. 85 do CPC).

3.3 Se o mencionado agravo de instrumento, interposto pelo ora  Autor, ainda não tiver sido julgado, que se remeta cópia desta sentença para os respectivos autos, aos cuidados do d.  Desembargador Federal Relator, para os  fins  legais.

3.4. Sentença não sujeita ao duplo grau de jurisdição, porque o valor total não corresponderá ao valor de 1.000 (hum mil) salários mínimos (art. 496, §3º, inciso I do CPC).

Registre-se. Intime-se.

Recife, 30.11.2020

Francisco Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal da 2a Vara da JFPE.

___________________________________________________

[1]  Brasil Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário -  RE nº  870947/SE, Repercussão Geral. Tema 810. Relator Ministro Luiz Fux. Julgado em 20.09.2017. Ainda não publicado.

Disponível em:

http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=870947&classe=RE-RG&codigoClasse=0&origem=JUR&recurso=0&tipoJulgamento=M

[2] Brasil Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário-RE 579.431/RS. Relator Ministro Marco Aurélio, Publicado no Diário Judicial Eletrônico - Dje de 19.04.2017[Repercussão Geral, Tema 96, Mérito].

 Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2598262

 Acesso em 10.10.2017.







sábado, 28 de novembro de 2020

AS BASES DE CÁLCULO DA COPIS E DA COFINS.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Segue sentença a respeito dos valores que compõem as bases de cálculo das COPIS e COFINS, à luz de julgados recentes de várias Cortes Judiciais do Brail. 

Boa leitura. 



 PROCESSO Nº: 0807894-46.2020.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL

IMPETRANTE: A E E A E S/S - ME e outros
ADVOGADO: M De F C J e outro
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL - DRFB EM RECIFE - PE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



SENTENÇA TIPO A


EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL E TRIBUTÁRIO. COPIS E COFINS. BASE DE CÁLCULO.

-Exceto o valor do ICMS próprio, por força de r. julgado do Plenário do STF, o valor de qualqu4r outro tributo só poderá ser excluído das bases de cálculo das COPIS e COFINS, se houver Lei expressa em tal sentido, por força do § 6º do art. 150 da vigente Constituição da República. 

Negação da Segurança.


Vistos, etc.

1. Breve Relatório

M C & A  - EPP; A P E E A EL S/S - ME; M C JÚ - SOCIEDADE DE A, devidamente qualificados nos autos, impetraram, em 22.04.2020, este mandado de segurança, em virtude de ato adjetivado de coator que teria sido praticado pelo DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE - PE. Os Impetrantes pretendem que lhe seja reconhecido o direito líquido e certo de não inclusão de valores relativos às contribuições sociais (Contribuição para o Programa de Integração Social - PIS, Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL) e ao Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ, na composição da receita bruta para fins de determinar a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, apurados com base no art. 15, §1º, inciso III, alínea "a" e no art. 20, inciso I, todos da Lei nº 9.249/95

A análise do pleito de medida liminar foi postergado para o momento da elaboração desta sentença (Id. 4058300.14400143).

A União (Fazenda Nacional) pugnou pelo seu ingresso no feito (Id. 4058300.14482123).

O Ministério Público Federal não se manifestou sobre o mérito da questão (Id. 4058300.14574155).

A DD Autoridade apontada como coatora apresentou Informações (Id. 4058300.14688521), aduzindo, em apertada síntese, que: a tributação pelo regime do lucro presumido seria facultativa; os contribuintes não seriam obrigados à apuração do IRPJ e da CSLL pelo regime de tributação do lucro real; poderia haver opção, à sua conveniência, pelo regime do lucro presumido, no qual a base de cálculo imponível seria apurada de acordo com parâmetros fixados pelo legislador; nesse caso, já seriam consideradas  todas as possíveis despesas no desenvolvimento da atividade empresarial ou civil, inclusive o ISS, o PIS e a Cofins sobre as vendas/prestação de serviços; seria induvidoso que o lucro real melhor refletiria o aspecto material da hipótese de incidência dos tributos em tela; todavia, no regime de tributação pelo lucro presumido, a base de cálculo decorreria de presunção legal, que não seria imposta aos contribuintes, mas, sim, oferecida como opção; a tributação pelo lucro presumido dispensaria o contribuinte dos intrincados controles contábeis e fiscais exigidos na sistemática do lucro real, fazendo incidir o imposto sobre uma base de cálculo presumida, apurada a partir dos percentuais ali citados;  tais percentuais estabelecidos pelo legislador levariam em conta as características de cada atividade em termos de custos e despesas, projetando uma margem de lucro esperada; a pretendida exclusão do ISS, PIS e Cofins, bem como dos próprios IRPJ e CSLL, da receita bruta, antes da incidência dos percentuais legais de presunção do lucro, este sim elemento da base imponível do IRPJ e da CSLL, geraria uma verdadeira distorção nos percentuais legais estabelecidos para o cálculo do lucro presumido; não se poderia admitir a construção de um sistema híbrido, em favor do contribuinte, com a utilização apenas das benesse de cada um dos regimes, o que poderia gerar graves distorções e injustiças, beneficiando um contribuinte em detrimento dos demais, que se encontrariam em situação equivalente; eventual acatamento do pleito da Impetrante  significaria ampliar indevidamente o escopo do quanto decidido no RE 574.706/PR; seria necessária expressa previsão legal para fins de isenção ou não incidência do IRPJ e da CSLL. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou ao final, pela denegação da segurança requestada.

O Ministério Público Federal reiterou o parecer sob Id. 4058300.14574155. (vide 4058300.14815649).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Da suspensão do processo

A 1ª Seção do STJ, em sessão realizada em 12/03/2019, deliberou submeter a matéria à sistemática dos recursos repetitivos,  afetando para julgamento conjunto os REsp. 1.767.631/SC, 1.772.634/RS e 1.772.470/RS e determinando a suspensão da tramitação dos processos em todo território nacional que tratam da exclusão do ICMS da base de cálculo do IRPJ e da CSLL das empresas optantes do lucro presumido.

A questão controvertida (Tema 1008 do STJ) restou assim delimitada:

Possibilidade de inclusão de valores de ICMS nas bases de cálculo do Imposto sobre a Renda de Pessoa Jurídica - IRPJ e da Contribuição Sobre o Lucro Líquido - CSLL, quando apurados pela sistemática do lucro presumido.

No caso, por se tratar de matéria distinta ao precedente acima, passo a analisar o mérito da questão posta à desate.

2.2. Do mérito propriamente dito

A Empresa Impetrante busca, via ação mandamental, seja reconhecido o direito líquido e certo de não inclusão de valores relativos às contribuições sociais (Contribuição para o Programa de Integração Social - PIS, Contribuição para o Financiamento da Seguridade Social - COFINS e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL) e ao Imposto de Renda Pessoa Jurídica - IRPJ, na composição da receita bruta para fins de determinar a base de cálculo do IRPJ e da CSLL, apurados com base no art. 15, §1º, inciso III, alínea "a" e no art. 20, inciso I, todos da Lei nº 9.249/95

A primeira questão a ser destacada é que a sujeição do contribuinte ao regime de tributação com base no lucro presumido é uma opção deste, caso sua receita bruta total se enquadre em uma determinada faixa de valor, conforme art. 587 do atual Regulamento do IR, Decreto 9.580/2018:

 "Art. 587. A pessoa jurídica cuja receita bruta total no ano-calendário anterior tenha sido igual ou inferior a R$ 78.000.000,00 (setenta e oito milhões de reais) ou a R$ 6.500.000,00 (seis milhões e quinhentos mil reais) multiplicado pelo número de meses de atividade do ano-calendário anterior, quando inferior a doze meses, poderá optar pelo regime de tributação com base no lucro presumido (Lei nº 9.718, de 1998, art. 13, caput).".

Se o Contribuinte, atendido o requisito acima referido, e outros requisitos fixados na Lei própria, fizer a opção pelo lucro presumido, que é o caso das Empresas impetrantes, a base de cálculo do imposto de renda passa a ser um percentual da receita bruta.

Para uma melhor compreensão acerca do conceito de receita bruta, eis a sua atual definição legal, consignada no art 12 do Decreto-lei nº 1.598, de 1977, já com inúmeras alterações:

  " Art. 12.  A receita bruta compreende:      (Redação dada pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)

I - o produto da venda de bens nas operações de conta própria;         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)

II - o preço da prestação de serviços em geral;         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)

III - o resultado auferido nas operações de conta alheia; e         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)


IV - as receitas da atividade ou objeto principal da pessoa jurídica não compreendidas nos incisos I a III.         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)

§ 1o  A receita líquida será a receita bruta diminuída de:         (Redação dada pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)

I - devoluções e vendas canceladas;         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)

II - descontos concedidos incondicionalmente;         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)

III - tributos sobre ela incidentes; e         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)

IV - valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei no 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações vinculadas à receita bruta.         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)


        § 2º - O fato de a escrituração indicar saldo credor de caixa ou a manutenção, no passivo, de obrigações já pagas, autoriza presunção de omissão no registro de receita, ressalvada ao contribuinte a prova da improcedência da presunção.

        § 3º - Provada, por indícios na escrituração do contribuinte ou qualquer outro elemento de prova, a omissão de receita, a autoridade tributária poderá arbitrá-la com base no valor dos recursos de caixa fornecidos à empresa por administradores, sócios da sociedade não anônima, titular da empresa individual, ou pelo acionista controlador da companhia, se a efetividade da entrega e a origem dos recursos não forem comprovadamente demonstradas.(Redação dada pelo Decreto-lei nº 1.648, de 1978).

        § 4o  Na receita bruta não se incluem os tributos não cumulativos cobrados, destacadamente, do comprador ou contratante pelo vendedor dos bens ou pelo prestador dos serviços na condição de mero depositário.         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)

        § 5o  Na receita bruta incluem-se os tributos sobre ela incidentes e os valores decorrentes do ajuste a valor presente, de que trata o inciso VIII do caput do art. 183 da Lei nº 6.404, de 15 de dezembro de 1976, das operações previstas no caput, observado o disposto no § 4o.         (Incluído pela Lei nº 12.973, de 2014)     (Vigência)"

 Como se observa, por disposição do acima transcrito  § 5º,  "Na receita bruta incluem-se os tributo§s sobre ela incidentes".

A Lei 9.249/95, igualmente, em seu art. 15, tratando da base de cálculo em análise, determina a observância do art. 12 do Decreto-Lei 1.598/1977,

Confira-se:

 "Art. 15. A base de cálculo do imposto, em cada mês, será determinada mediante a aplicação do percentual de 8% (oito por cento) sobre a receita bruta auferida mensalmente, observado o disposto no art. 12 do Decreto-Lei no 1.598, de 26 de dezembro de 1977, deduzida das devoluções, vendas canceladas e dos descontos incondicionais concedidos, sem prejuízo do disposto nos arts. 30, 32, 34 e 35 da Lei no 8.981, de 20 de janeiro de 1995. (Redação dada pela Lei nº 12.973, de 2014)".

Assim, como a base de cálculo do IRPJ, apurada na forma do regime de tributação com base no lucro presumido, é determinada a partir da aplicação de um percentual sobre a receita bruta definida, os tributos incidentes sobre a receita bruta, entre os quais se encontram a COPIS e a COFINS, não devem ser excluídos da base de cálculo de tal Imposto.

 Essa mesma norma de apuração, cumpre registrar, é aplicada à CSLL, conforme art. 57 da Lei 8.981/95, que segue:

"Art. 57. Aplicam-se à Contribuição Social sobre o Lucro (Lei nº 7.689, de 1988) as mesmas normas de apuração e de pagamento estabelecidas para o imposto de renda das pessoas jurídicas, inclusive no que se refere ao disposto no art. 38, mantidas a base de cálculo e as alíquotas previstas na legislação em vigor, com as alterações introduzidas por esta Lei. (Redação dada pela Lei nº 9.065, de 1995);".

Logo, não há base legal que dê amparo ao pleito das Impetrantes.

Na oportunidade, é importante ressaltar acerca da impossibilidade de se aplicar, ao presente caso, de forma automática, a tese firmada pelo STF no RE 574.706, em sede de repercussão geral ("O ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da Cofins").

Primeiro porque, em matéria tributária, como não se pode utilizar a analogia para se exigir tributo(§ 1º do art. 108 do Código Tributário  Nacional), mutatis mutandis, também não se pode deixar de exigir tributo mediante utilização dessa regra de interpretação integrativa, e, por outro lado, para tanto, haveria necessidade de Lei específica, conforme regra expressa do § 6ª do art. 150 da vigente Constituição da República.

 

 Outrossim, a tese firmada pelo STF no RE 574.706 é bem restritiva e se refere a tributo bastante diverso daqueles em análise.

Acerca do assunto, há de se destacar entendimento do E. TRF da 5ª Região, ao apreciar caso semelhante:




"TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. BASE DE CÁLCULO DO IRPJ E CSLL. EXCLUSÃO DO ICMS. RE 574.706/PR, SOB REPERCUSSÃO GERAL. INAPLICABILIDADE AO IRPJ E À CSLL.

 1. É certo que o e. Supremo Tribunal Federal, sob o regime da repercussão geral, uniformizou o entendimento segundo o qual o ICMS não compõe a base de cálculo para a incidência do PIS e da COFINS(STF, RE 574.706/PR, Rel.: Min. CARMEN LÚCIA, órgão julgador: TRIBUNAL PLENO, Julgado em 15.3.2017, Publicado em 02.10.2017).

 2. Contudo, não é de ser aplicado tal entendimento relativamente à inclusão do ICMS na base de cálculo do IRPJ e da CSLL, quando apurados na sistemática de recolhimento sobre o lucro presumido, pois, nesses casos, não havendo ainda pronunciamento do STF sobre o tema, é salutar que se prestigie a presunção de constitucionalidade das normas de regência.

 3. Apelação improvida."[1]

Assim, diante da impossibilidade de aplicação, ao presente caso, da tese firmada pelo STF no RE 574.706, resta seguir a legislação, vista acima, e o entendimento dominante na jurisprudência de que, em regra, não é vedada a incidência de tributo sobre tributo, conforme consta do importante julgado, que segue, do Superior Tribunal de Justiça:

"RECURSO ESPECIAL DO PARTICULAR: TRIBUTÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. PIS/PASEP E COFINS. BASE DE CÁLCULO. RECEITA OU FATURAMENTO. INCLUSÃO DO ICMS.

 1. A Constituição Federal de 1988 somente veda expressamente a inclusão de um imposto na base de cálculo de um outro no art. 155, §2º, XI, ao tratar do ICMS, quanto estabelece que este tributo: "XI - não compreenderá, em sua base de cálculo, o montante do imposto sobre produtos industrializados, quando a operação, realizada entre contribuintes e relativa a produto destinado à industrialização ou à comercialização, configure fato gerador dos dois impostos".

 2. A contrario sensu é permitida a incidência de tributo sobre tributo nos casos diversos daquele estabelecido na exceção, já tendo sido reconhecida jurisprudencialmente, entre outros casos, a incidência:

 2.1. Do ICMS sobre o próprio ICMS: repercussão geral no RE n. 582.461 / SP, STF, Tribunal Pleno, Rel. Min. Gilmar Mendes, julgado em 18.05.2011.

 2.2. Das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS sobre as próprias contribuições ao PIS/PASEP e COFINS: recurso representativo da controvérsia REsp. n. 976.836 - RS, STJ, Primeira Seção, Rel. Min. Luiz Fux, julgado em 25.8.2010.

 2.3. Do IRPJ e da CSLL sobre a própria CSLL: recurso representativo da controvérsia REsp. n. 1.113.159 - AM, STJ, Primeira Seção, Rel.

 Min. Luiz Fux, julgado em 11.11.2009.

 2.4. Do IPI sobre o ICMS: REsp. n. 675.663 - PR, STJ, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 24.08.2010; REsp. Nº 610.908 - PR, STJ, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, julgado em 20.9.2005, AgRg no REsp.Nº 462.262 - SC, STJ, Segunda Turma, Rel.

 Min. Humberto Martins, julgado em 20.11.2007.

 2.5. Das contribuições ao PIS/PASEP e COFINS sobre o ISSQN: recurso representativo da controvérsia REsp. n. 1.330.737 - SP, Primeira Seção, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 10.06.2015.

 3. Desse modo, o ordenamento jurídico pátrio comporta, em regra, a incidência de tributos sobre o valor a ser pago a título de outros tributos ou do mesmo tributo. Ou seja, é legítima a incidência de tributo sobre tributo ou imposto sobre imposto, salvo determinação constitucional ou legal expressa em sentido contrário, não havendo aí qualquer violação, a priori, ao princípio da capacidade contributiva.

 (....)

 14. Ante o exposto, ACOMPANHO o relator para DAR PROVIMENTO ao recurso especial da FAZENDA NACIONAL. [2] 

3. Dispositivo

Diante de todo o exposto, denego a segurança e dou este processo por extinto,  com resolução do mérito(487, inciso I, do Código de Processo Civil).

Custas nos termos da lei.

Sem honorários advocatícios, nos termos do artigo 25, da Lei n. 12.016, de 2009.

Registrada, intimem-se.

Recife, 28.11.2020.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2 Vara/PE

(lsc)


__________________________________

[1]  Brasil. Tribunal Regional Federal da 5ª Região, 2a Turma. Processo nº. 08243770920194058100, APELAÇÃO CÍVEL, Relator Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira  Lima, Julgamento em 30/06/2020, sem indicação de veículo de publicação.

Disponível em https://julia-pesquisa.trf5.jus.br/julia-pesquisa/#resultado.

Acesso em 27.11.2020

[2] Brasil. Superior Tribunal de Justiça, 1ª Seção, REsp 1144469/PR, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho(vencido), Relator para o Acórdão Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES,  julgado em 10/08/2016, in  DJe 02/12/2016.

Disponível em https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?i=1&b=ACOR&livre=((%27RESP%27.clas.+e+@num=%271144469%27)+ou+(%27REsp%27+adj+%271144469%27.suce.))&thesaurus=JURIDICO&fr=veja.

Acesso em 28.11.2020