Por Francisco Alves dos Santos Júnior
A regra geral consiste em extinguir-se o recurso de agravo de instrumento, por perda de objeto, quando advém sentença no Juízo de primeiro grau antes do julgamento do referido recurso.
Mas em alguns casos, convém que o recurso continue tramitando e seja julgado pelo Colegiado.
Na decisão infra, estamos diante de um caso destes. Trata-se de questão processual bem interessante.
Boa leitura.
PROCESSO Nº: 0804934-49.2024.4.05.0000 - AGRAVO DE INSTRUMENTO
EMBARGOS DE DECLARAÇÃO
AGRAVANTE (EMBARGANTE): J C D A B
ADVOGADO: R W T de A e outros
AGRAVADA (EMBARGADA): UNIÃO FEDERAL
RELATOR: Desembargador Federal Francisco Alves dos Santos Júnior - 5ª Turma
PROCESSO ORIGINÁRIO Nº: 0804061-49.2022.4.05.8300 - 12ª Vara Federal/PE
JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz Federal R T da S
DECISÃO
1 - Relatório
1.1 - Trata-se de recurso de embargos de declaração (id. 4050000.45665175) oposto por J C D'Á B em face de r. decisão monocrática (id. 4050000.45336654) proferida pelo Desembargador Federal Relator Convocado Tarcísio Barros Borges, na qual deu por prejudicado o recurso de agravo de instrumento do ora Embargante, em razão da prolação de r. sentença no processo originário.
1.2 - O referido recurso de agravo de instrumento foi interposto contra r. decisão que indeferiu o pedido de concessão dos benefícios da justiça gratuita ao Embargante. Após a interposição do agravo, foi proferida r. sentença nos autos principais, o que ensejou a r. decisão monocrática recorrida, que reconheceu a perda superveniente do objeto do recurso de agravo de instrumento.
1.3 - O Embargante, nas razões do seu recurso de embargos de declaração, alega que a r. decisão embargada seria contraditória e apresentaria erro material, pois a matéria relativa à concessão do benefício da Justiça Gratuita, objeto do agravo de instrumento, não teria perdido seu objeto com o julgamento de mérito do processo principal.
Sustenta que o processo em primeira instância prosseguiu apenas porque havia determinação expressa do Tribunal para seu regular andamento, sem que isso implicasse na perda de objeto do mencionado agravo de instrumento.
Requer, assim, verbis:
"(...) que os douto Desembargador Relator, Dr. Francisco Alves dos Santos Júnior se digne a:
a) CONHECER os Embargos de Declaração, por serem tempestivos e cabíveis à espécie;
b) No mérito, dar provimento, para tornar sem efeito a Decisão acostada ao ID 4050000.45336654 e, com isso, determinar a inclusão do Agravo de Instrumento em pauta de julgamento.".
1.4 - Certificada a tempestividade do recurso de embargos de declaração no id. 4050000.46371843.
1.5 - A União Federal apresentou contrarrazões (id. 4050000.46432332) sustentando, em suma, que inexistem vícios na r. decisão embargada e que o ora embargante visa ao rejulgamento da causa, o que não seria permitido pelo ordenamento jurídico. Pugna, assim, pela rejeição dos embargos de declaração.
Relatado. Fundamento e decido.
2 - Fundamentação
2.1 - Constato o atendimento dos pressupostos intrínsecos (cabimento, legitimidade, interesse e ausência de fato extintivo e impeditivo do direito de recorrer) e extrínsecos (tempestividade e regularidade formal) de admissibilidade, pelo que admito o recurso de embargos de declaração e o recebo no efeito interruptivo (art. 1.026 do CPC).
2.2 - Inicialmente, cabe esclarecer que o recurso de embargos de declaração possui finalidade específica, conforme dispõe o art. 1.022 do CPC, qual seja, esclarecer obscuridade, eliminar contradição, suprir omissão ou corrigir erro material. Não se presta, portanto, à rediscussão do mérito da decisão ou ao simples inconformismo da parte, travestido de alegações de vícios processuais.
2.3 - No caso concreto, a análise dos pontos levantados pelo Embargante evidencia a existência dos vícios apontados, razão pela qual o recurso em apreço merece acolhimento. Explico.
2.4 - De início, é imprescindível reconhecer que a concessão ou não do benefício da Justiça Gratuita constitui matéria preliminar relevante e autônoma, que não se confunde com o mérito da causa principal, ainda que a r. sentença tenha sido prolatada.
2.5 - Sobre o tema, constato que a Parte ora Embargante, além de opor o presente recurso de embargos de declaração, também interpôs recurso de apelação contra a mencionada r. sentença. Assim, o agravo de instrumento deve permanecer em tramitação, com a manutenção dos efeitos da r. decisão inicial desta Relatoria, acostada sob id 4050000.44279155, que o recebeu neste Tribunal, até mesmo porque o recurso de apelação será recebido no efeito suspensivo, nos termos do art. 1.012, caput, do CPC.
O festejado jurista brasileiro MEDINA, José Miguel Garcia (in Curso de Direito Processual Civil Moderno, 6ª Edição, rev., atual., e ampl. - São Paulo - Thomson Reuters, Brasil, 2021, p, 1.380), depois de sustentar que o advento da sentença, antes do julgamento do agravo de instrumento, torna este sem objeto, finda por indicar o REsp 1.389.194/SP, 4a Turma e AgRG no EREsp 1.199.135/DF da Corte Especial do STJ, no sentido de que:
"A pedra angular que põe termo à questão é a averiguação da realidade fática e do momento processual em que se encontra o feito, devendo-se sempre perquirir se remanesce interesse e utilidade no julgamento do recurso, o que, em princípio, transcende o fato de ser ou não, a questão nele discutida, pressuposto lógico da decisão de mérito.".
2.6 - Desse modo, o prosseguimento do recurso de agravo de instrumento em algumas situações, como a presente, revela-se plenamente justificado, visto que subsiste interesse processual no julgamento do pedido de Justiça Gratuita, matéria de ordem pública, com reflexos tanto no processo principal quanto nos recursos subsequentes.
3 - Dispositivo
Ante o exposto, ADMITO o recurso de embargos de declaração, por ser tempestivo e cabível, e o ACOLHO INTEGRALMENTE, para tornar sem efeito a r. decisão monocrática na qual se considerou prejudicado o recurso de agravo de instrumento (id. 4050000.45336654) e, por conseguinte, determino o regular prosseguimento do referido recurso e, se a Parte Agravada já tiver apresentado contrarrazões ou tiver escoado o respectivo prazo, que seja incluído em pauta para julgamento, mantendo-se, até lá, os efeitos da r. decisão inicial desta Relatoria, acostada sob id. 4050000.44279155.
Expedientes necessários.
Recife, 19.12.2024.
Francisco Alves dos Santos Júnior
Desembargador Federal Relator
GabFA.10
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