terça-feira, 7 de abril de 2020

OS SERVIDORES DA SAÚDE E O DIREITO AO ACÚMULO DE DOIS CARGOS PÚBLICOS SEM LIMITE DE CARGA HORÁRIA SEMANAL


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Os profissionais da área de saúde, por força de regra constitucional(art. 37, XVI, c, da Constituição da República)[1]  podem acumular dois cargos públicos, ou seja, ter dois empregos públicos, com uma  única exigência, que haja compatibilidade de horários.
Firmou-se jurisprudência no Superior Tribunal de Justiça no sentido de que, mesmo que haja compatibilidade de horários,  a soma da carga horária dos dois empregos públicos não pode ser superior  a 60(sessenta) horas semanais. Baseou-se esse Tribunal no Parecer GQ-145/98 da Advocacia Geral da União.
A matéria chegou ao Supremo Tribunal Federal e as suas duas Turmas já decidiram, por diversas vezes, que basta haver compatibilidade de horários entre os dois empregos públicos, porque não há, na  vigente Constituição da República, nem existia na anterior, regra estabelecendo o limite máximo de carga horária de trabalho.
Seguem ementas de dois julgados da Suprema Corte,  um caso da sua 2ª Turma e um mais recente da sua 1ª Turma:
“Ementa: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO. ADMINISTRATIVO. CONSTITUCIONAL. SERVIDOR PÚBLICO. ACUMULAÇÃO DE CARGOS. EXISTÊNCIA DE NORMA INFRACONSTITUCIONAL QUE LIMITA A JORNADA SEMANAL DOS CARGOS A SEREM ACUMULADOS. PREVISÃO QUE NÃO PODE SER OPOSTA COMO IMPEDITIVA AO RECONHECIMENTO DO DIREITO À ACUMULAÇÃO. COMPATIBILIDADE DE HORÁRIOS RECONHECIDA PELA CORTE DE ORIGEM. REEXAME DO CONJUNTO FÁTICO-PROBATÓRIO. IMPOSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO.
I - A existência de norma infraconstitucional que estipula limitação de jornada semanal não constitui óbice ao reconhecimento do direito à acumulação prevista no art. 37, XVI, c, da Constituição, desde que haja compatibilidade de horários para o exercício dos cargos a serem acumulados.
II – Para se chegar à conclusão contrária à adotada pelo acórdão recorrido quanto à compatibilidade de horários entre os cargos a serem acumulados, necessário seria o reexame do conjunto fático-probatório constante dos autos, o que atrai a incidência da Súmula 279 do STF. III - Agravo regimental improvido. (RE 633298 AgR, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe-14-02-2012).”.
O mais recente julgado da Suprema Corte a respeito da matéria é da sua 1ª Turma, Relatado pelo  Ministro Alexandre Morais, verbis:


“Supremo Tribunal Federal Inteiro Teor do Acórdão - Página 1 de 20  09/04/2019 PRIMEIRA TURMA AG. REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.176.440 DISTRITO FEDERALRELATOR : MIN. ALEXANDRE DE MORAES AGTE.( S ) : UNIÃOPROC.( A / S)(ES ) : ADVOGADO -GERAL DA UNIÃO AGDO.( A / S ) : JACQUELINE BRANDAO LIMA ADV.( A / S ) : JOSÉ LUIS WAGNER Ementa: AGRAVO INTERNO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. DECISÃO AGRAVADA EM CONSONÂNCIA COM A JURISPRUDÊNCIA DO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL.1. Nestes autos, o Superior Tribunal de Justiça aplicou entendimento de sua 1ª Seção no sentido da (a) “impossibilidade de cumulação de cargos de profissionais da área de saúde quando a jornada de trabalho for superior a 60 horas semanais” e (b) validade do “limite de 60 (sessenta) horas semanais estabelecido no Parecer GQ-145/98 da AGU nas hipóteses de acumulação de cargos públicos, não havendo o esvaziamento da garantia prevista no art. 37, XVI, da Constituição Federal”.2. O SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL tem entendimento consolidado no sentido de que, havendo compatibilidade de horários, verificada no caso concreto, a existência de norma infraconstitucional limitadora de jornada semanal de trabalho não constitui óbice ao reconhecimento da cumulação de cargos.3. Precedentes desta CORTE em casos idênticos ao presente, no qual se discute a validade do Parecer GQ 145/1998/AGU: RE 1061845 AgRsegundo, Relator(a): Min. LUIZ FUX, Primeira Turma, DJe 25-02-2019; ARE 1144845, Relator(a): Min. ROSA WEBER, DJe 02/10/2018; RMS 34257 AgR, Relator(a): Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Segunda Turma, DJe 06-08-2018; RE 1023290 AgR-segundo, Relator(a): Min. CELSO DE MELLO, Segunda Turma, DJe 06-11-2017; ARE 859484 AgR, Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI, Segunda Turma, DJe 19-06-2015. 4. Agravo Interno a que se nega provimento.A C Ó R D Ã OVistos, relatados e discutidos estes autos, os Ministros do Supremo Tribunal Federal, em Primeira Turma, sob a Presidência do Senhor Ministro LUIZ FUX, em conformidade com a ata de julgamento e as notas taquigráficas, por unanimidade, acordam em negar provimento ao agravo interno, nos termos do voto do Relator. Brasília, 9 de abril de 2019. Ministro ALEXANDRE DE MORAES Relator”.
Contra esse julgado a UNIÃO opôs Agravo Regimental, tendo a 1ª Turma da Suprema Corte negado provimento, por unanimidade, sob relatoria  da Ministra Rosa Weber, cujo acórdão ficou assim ementado:
“AG.REG. NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO 1.176.440
PROCED. : DISTRITO FEDERAL

RELATOR : MIN. ALEXANDRE DE MORAES

AGTE.(S) : UNIÃO

PROC.(A/S)(ES) : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO

AGDO.(A/S) : JACQUELINE BRANDAO LIMA

ADV.(A/S) : JOSÉ LUIS WAGNER (1235-A/AP, 17183/DF, 47516/PE, 18061/PR, 125216/RJ, 18097/RS, 15111/SC)

Decisão: A Turma, por unanimidade, negou provimento ao agravo, nos termos do voto do Relator. Presidência do Ministro Luiz Fux. Primeira Turma, 9.4.2019.

Presidência do Senhor Ministro Luiz Fux. Presentes à Sessão os Senhores Ministros Marco Aurélio, Rosa Weber, Luís Roberto Barroso e Alexandre de Moraes.
Subprocurador-Geral da República, Dr. Carlos Alberto Carvalho de Vilhena Coelho.”.
Cabe registrar que nesses últimos julgados, primeiro o Ministro Alexandre Morais, depois a Ministra Rosa Weber(quando relatou o noticiado Agravo Regimental), fizeram referência a inúmeros outros julgados da Suprema  Corte a respeito da matéria, dos quais selecionei os seguinte:
1) RE 1023290 AgR-segundo, Relator Ministro Celso de Mello, Segunda Turma, DJe-06-11-2017; 2) ARE 859484 AgR, Relator Ministro Dias Toffoli, Segunda Turma, DJe-19-06-2015; 3) (RMS 34257 AgR, Relator Ministri Ricardo Lewandowski, Segunda Turma, DJe-06-08-2018; 4) ARE 812147 AgR, Rel. Min. Luiz Fux, 1ª Turma, DJe 14.8.2014; 5) RE 679027 AgR, Relatora Ministra Rosa Weber, Primeira Turma, DJe-24-09-2014; etc.
A  íntegra do acórdão do Recurso Extraordinário, acima  referido, relatado pelo Ministro Alexandre Morais, bem como do acórdão do Agravo Regimental relatado pela Ministra Rosa Weber está disponível no endereço abaixo.  [2]
Então, atualmente a jurisprudência da Suprema Corte admite com segurança que os Servidores da Saúde podem acumular dois cargos públicos, não importando o total da carga horária de trabalho semanal, mas apenas e tão somente que haja compatibilidade entre os horários dos dois empregos púbicos, enquanto que o entendimento reinante no Superior Tribunal de Justiça é que  o acúmulo de dois cargos públicos deve observar  as duas exigências, compatibilidade de horário e que o total da carga horária  não seja superior a 60(sessenta) horas semanais. 
Obviamente, pelo sistema constitucional-processual do Brasil, há de prevalecer o entendimento da Suprema Corte. 
Penso que a Suprema Corte decidiu com maior acerto, porque os Servidores médios (enfermeiros, auxiliares de enfermeiros, protéticos, etc.) não recebem boa remuneração, de forma que necessitam trabalhar em dois empregos e para tanto não estão preocupados com o tamanho da carga horária semanal que terão que cumprir, mas sim com o valor total da remuneração que receberão no final do mês para manutenção própria e das suas famílias.






[1] Constituição da República de 1988, em vigor:
“Art. 37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e eficiência e, também, ao seguinte:           (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 19, de 1998)
XVI - é vedada a acumulação remunerada de cargos públicos, exceto, quando houver compatibilidade de horários, observado em qualquer caso o disposto no inciso XI:  
c) a de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas;         (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 34, de 2001)”.
[2] Brasil. Supremo Tribunal Federal. 1ª Turma. Recurso Extraordinário nº 1.176.440 /DF, Relator Ministro Alexandre Morais, julgado em 09.04.2019 e Agravo Regimental no Recurso Extraordinário nº 1.176.440/DF, Relatora Ministra Rosa Weber,  julgado em 09.04.2019.
Acesso em 08.04.2020, às 00:24h.


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