domingo, 29 de março de 2020

EXPRESSÕES HOMOFÓBICAS NO FACEBOOK. EXCLUSÃO POR ORDEM JUDICIAL.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O direito constitucional brasileiro não admite o uso de expressões homofóbicas na rede social e nem em qualquer outro meio  de comunicação. 
A decisão abaixo trata desse assunto.
Boa leitura.


PROCESSO Nº: 0806597-04.2020.4.05.8300 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA CÍVEL
AUTOR: ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL SECCÃO DE OLINDA-PERNAMBUCO
ADVOGADO: Paulo Joviniano Álvares Dos Prazeres
RÉU: FACEBOOK S O DO B LTDA. e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

DECISÃO

1-Relatório

A ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, Subsecção Olinda-PE, representada por seu presidente Paulo Joviniano Alvares dos Prazeres, ajuizou esta AÇÃO CIVIL PUBLICA COM PEDIDO LIMINAR, em face de FACEBOOK S O DO B LTDA., e de G C DE A C, na qual objetiva, em sede de tutela de urgência antecipada, que os Réus sejam compelidos a remover ou suspender a URL discriminada no corpo da Petição inicial, dentro do prazo de ate 24 (vinte e quatro) horas da intimação, sob pena de multa.


Alegou, em síntese, que: o Réu G C DE A C, entre os dias 20 e 24 do corrente mês, teria se utilizado da rede de comunicação Facebook, que seria de responsabilidade da primeira demandada, e realizado postagens públicas e de teor preconceituoso e homofóbico, o que causaria instabilidade e comoção em razão da repulsa do conteúdo de sua postagem. Transcreveu as mensagens e destacou que ser Gay não perfaria xingamento, tampouco ofensa, e não corresponderia a nenhum tipo de desvio de caráter ou ofensa; as referidas mensagens ultrapassariam o mero preconceito e não perfariam o enquadramento de exposição de opinião, pois proliferariam ódio e incitariam cultura de homofobia, o que não se admitiria de nenhum cidadão, muito menos de um advogado, de quem se poderia supor conhecimento das leis e guardião da cidadania; a manutenção de tais assertivas teriam o condão de perpetrar a discriminação, e deveriam ser retiradas do ar; além disso, seria patente a agressividade empregada na transmissão da mensagem, marcada pela utilização de temos injuriosos como "viado", "parte militonta", "xingando de Gay", "Seja feliz e não torça por bandidos, ou vai dizer que viadagem também desvia caráter", entre outros, em referência aos homossexuais; as escolhas lexicais reforçariam o intuito de discriminar, ofender, e estimular a violência contra este grupo; além disso, seria notório o potencial da internet como instrumento difusor de informações, propagando conteúdo instantaneamente e em ampla dimensão; a utilização da rede mundial de computadores conferiria à prática e aos danos gerados um carácter transnacional. Teceu outros comentários, e requereu: "a) O deferimento da tutela de evidencia para determinar que os Réus sejam compelidos a remover ou suspender a URL discriminada no corpo da exordial, dentro do prazo de ate 24 (vinte e quatro) horas da intimação, tudo sob pena do pagamento de uma multa diária a ser estabelecida por V. Exª, em valor adequado para realização da devida reprimenda; b) a citação dos Réus para, querendo, contestar a presente ação, sob pena de revelia; c) A inclusão do Ministério Publico para que figure como litisconsorte ativo nos termos do art 5 da lei 7.347/85, ou caso entenda a entidade ministerial, na condição de custos legis. d) a isenção do pagamento de custas, emolumentos, honorários periciais e quaisquer outras despesas, nos termos do que dispõe a Lei nº 7.347/85; e) Condenação dos réus a retirar a postagem e o correspondente conteúdo descritas no item I da presente demanda; f) a condenação do Réu, ao final, ao pagamento de R$ 20.000,00 (vinte mil reais) a título de indenização por danos morais coletivos, devendo o montante ser destinado ao Fundo Federal de Defesa dos Direitos Difusos (art. 13 da Lei nº 7.347/85), estando sujeito o valor à atualização monetária e juros; g) a condenação do segundo Réu a publicar, no serviço mundial FACEBOOK de retratação pelo comentário que originou a presente demanda, especificando tratar-se de condenação judicial imposta nos autos desta ACP, devendo a referida postagem permanecer no ar por, pelo menos, 1 (um) ano. h) a condenação do réu ao pagamento dos honorários advocatícios e demais despesas e custas processuais, recolhendo os valores ao Fundo de que trata a Lei nº 7.347/85." Protestou o de estilo e juntou documento.


2- Fundamentação

2.1- Da prevenção

Os fatos historiados na Petição Inicial aconteceram em data recente (entre 20/03/2020 e 24/03/2020), e as ações indicadas pelo sistema de prevenção do PJE foram ajuizadas nos anos de 2017 e 2018, razão pela qual não existe a apontada prevenção.

2.2 - Inicialmente, importante consignar que o I. Advogado, Dr. Paulo Joviniano Alvares dos Prazeres, de fato, é o atual Presidente da ORDEM DOS ADVOGADOS DO BRASIL, Subsecção Olinda-PE, razão pela qual reconheço a sua legitimidade para representar a Parte Autora nestes autos.

2.3 - A Lei nº 7.347/85 prevê a possiblidade de concessão de medida liminar, de natureza cautelar ou de antecipação da tutela (art. 12), e estabelece os requisitos que devem estar presentes para a concessão da medida: relevância da fundamentação e receio de ineficácia do provimento final.

O art. 300 do CPC/2015 exige a presença concomitante dos requisitos probabilidade do direito e perigo de dano ou risco ao resultado útil do processo, para a concessão liminar da tutela provisória de urgência antecipada.

No presente caso, tenho que estão presentes os requisitos legais para a concessão liminar da tutela provisória de urgência antecipada.

Consta do preâmbulo da vigente Constituição da República que o Estado Democrático de Direito Brasileiro está estruturado em valores supremos, tais como exercício de direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurança, o bem estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justiça, os quais buscam a formação de uma SOCIEDADE FRATERNA, PLURALISTA E SEM PRECONCEITOS, fundada na harmonia social e comprometida, na ordem interna e internacional, com a solução pacíficas das controvérsias.

Nesse norte, a liberdade de expressão do pensamento, assegurada no  inciso  IV do art. 5º da mencionada Carta Republicana,  não é absoluta e nessa própria Carta, além das orientações do seu preâmbulo, veicula várias regras que figuram como verdadeiros limites ao exercício dessa liberdade, dentre as quais destaco duas que são bem próprias para o caso em foco,  saber: o inciso IV do seu art. 3º veda manifestações preconceituosas de qualquer natureza;  o inciso III do seu art. 1º, no qual se proíbe comportamentos violadores da dignidade da pessoa humana.
Eis o que postou no FACEBOO o Sr. G C DE A C:
"Pq tem viado que não gosta de Bolsonaro? Tu acha que teus pais queriam que você fosse gay, caso pudessem escolher? Seja feliz e não torça por bandidos, ou vai dizer que viadagem também desvia caráter?"
"Estou sendo severamente atacado por que falei que nenhum pai escolheria ter um filho gay, se pudesse. E verdade!!! Ninguém quer, mas isso não quer dizer que não se deve amar e respeitar
"A comunidade Gay esta com raiva de mim, e do que eles xingam? DE VIADO!!!!! Como assim???? Piada pronta. E pra ficar pior e so o povinho de esquerda nojento. Querem impor uma ditadura Gay."
"A parte militonta doente da comunidade gay esta me xingando de Gay!!! Acho que vou chorar. Rsrsrs.".
Amoldam-se àquelas orientações preambulares e regras estruturadoras da nossa Carta Magna tais mensagens postas no FACEBOO pelo Sr. G Ce de A C, entre os dias 20 e 24 do corrente mês deste ano, indicadas na petição inicial e comprovadas em documento que a instrui?

Respondo tranquilamente, óbvio que não!

Essas manifestações, além de denotar péssimo mau gosto, são chulas,  bestiais, e findam por ser claramente hostis e preconceituosas contra, não apenas às pessoas homossexuais, mas também contra todo o pensamento médio da comunidade brasileira, especialmente daquela que frequenta o FACEBOOK. 

Tais mensagens também são ofensivas à dignidade da pessoa humana, como um todo, e por isso não encontram amparo na liberdade de expressão, que foi uma  grande conquista da Sociedade Brasileira nos movimentos políticos que geraram, sob muita luta e dor,  a mencionada Carta Magna de 1988. 
O FACEBOOK, tão importante na geração de troca de ideias,  na veiculação de manifestações poéticas, políticas, humanas, não pode se deixar manchar com formas de expressão tão baixas e asquerosas como as cima referidas, porque, aqui no Brasil, como vimos, ferem o preâmbulo da nossa Constituição e vários dos seus comandos, pelo que, para restabelecer o respeito a tudo isso, é de ser concedida a tutela provisória de urgência antecipada para determinar que os Réus as removam ou as suspendam imediatamente. 


3- Conclusão

3.1- concedo a isenção de custas requerida pela Parte Autora na forma do art. 18 da Lei nº 7.347/85;

3.2- presentes os requisitos legais, concedo a tutela provisória de urgência e determino que os Réus FACEBOOK S O DO B LTDA. e G C DE A C suspendam, imediatamente, as mensagens transcritas na Petição Inicial, nos endereços informados no corpo da Petição Inicial, sob pena de, solidariamente, pagarem multa diária no valor de R$ 5.000,00(cinco mil reais), que será destinado a Fundo próprio. 

3.3- Por mandado e com URGÊNCIA, citem-se os Réus, na forma e  para os fins legais, e os intimem, para cumprir a presente decisão, incontinenti, sob a pena pecuniária acima indicada, sem prejuízo da responsabilização na forma do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009, aqui aplicado integrativamente. 

3.4-  abra-se vista ao Ministério Público Federal,  para os fins legais (Lei nº 7.347/85, art. 5º, §1º).

Providencie a Secretaria do Juízo a exclusão do feito da anotação da Prevenção.
CUMPRA-SE COM URGÊNCIA.

Recife, 25.03.2020

Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara/PE



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