sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

TERRENO DE MARINHA OU ACRESCIDO DE MARINHA SOB REGIME DE OCUPAÇÃO NÃO ADMITE USUCAPIÃO, POR NÃO GERAR DOMÍNIO ÚTIL.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Terreno de marinha ou acrescido de marinha pertence, por regra constitucional, à UNIÃO, logo não pode ser objeto de usucapião, mas a jurisprudência firmou-se que, quando sob regime de aforamento, o respectivo domínio útil comporta a usucapião, mas se sob regime de ocupação, que não gera, sequer, domínio útil, não pode ser objeto de ação de usucapião. 

Na sentença que segue, esse assunto é dissecado. 

Boa leitura. 


Obs.: sentença pesquisada e minutada pela Assessora Patrícia Luna



PROCESSO Nº: 0801381-38.2015.4.05.8300 - USUCAPIÃO
AUTOR: J B DE O
ADVOGADO: N E R
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
CHAMADO AO PROCESSO: E J P e outros
ADVOGADO: G P P S e outro
TERCEIRO INTERESSADO: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL e outro
REPRESENTANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

Sentença tipo A, registrada eletronicamente



Ementa:- USUCAPIÃO. TERRENO ACRESCIDO DE  MARINHA. REGIME DE OCUPAÇÃO.A jurisprudência firmou-se no sentido de que não se pode usucapir posse direta em regime de ocupação de terreno acrescido de marinha, em face da precariedade dessa posse.Improcedência.




Vistos etc.

1. Relatório

J B DE O, qualificado na petição inicial (id. nº 4058300.913551), propôs, inicialmente perante a Justiça Estadual, sendo distribuída para esta Justiça Federal em 09/02/2015 (processo físico) e 09/03/2015 (PJe), a presente "Ação de Usucapião Extraordinário" em face dos herdeiros de A C N M. Alegou, em síntese, que exerceria a posse mansa e pacífica do imóvel onde está localizada a casa de nº 222, da Rua Passo da Pátria, bairro de São José, Recife/PE, há mais de 20 anos, com animus domini, de modo ininterrupto, pacífico e sem oposição. Descreveu dimensões, limites e confrontações do imóvel. Requereu, ao final: "Citação pessoal dos herdeiros de Antônia Nunes Machado, a Sra. Maria da Glória Nunes Machado com endereço à Rua dos Navegantes nº 23 Edificio São João no Bairro de Boa Viagem. Citação pessoal dos confinantes: Flanco Direito: Lêda da Costa Vasconcelos, brasileira, solteira, agente de sáude, residente à Rua Passo da Pátria nº 228. Flanco Esquerdo: Erivaldo José Peixoto, brasileiro, solteiro, residente e domiciliado no nº 228/B da Rua Passo da Pátria. Fundos: Banco Bradesco sito à Av.Dantas Barreto nº 1024, Bairro de São José. Citação por edital dos interessados incertos, não sabidos e ausentes; Citação do Ministério Público e dos Representantes das Fazendas Públicas Municipal, Estadual e Federal. Protestou o de estilo. Deu valor à causa. Instruiu a Inicial com procuração e documentos.

Originariamente, a demanda foi proposta perante Justiça Estadual de Pernambuco (1ª Vara da Assistência Judiciária), sendo deferida a gratuidade da justiça ao Autor. Em seguida, foi declinada a competência para uma das Varas de Sucessões e Registros Públicos da Capital, e, depois, para a 9ª Vara Cível da Capital (id. nº 4058300.913565).

No Juízo Estadual, foi determinada a citação daquele em cujo nome estiver registrado o imóvel usucapiendo; dos confinantes; citação editalícia dos réus incertos e não sabidos, e eventuais e ou possíveis interessados; assim como a intimação via postal dos Representantes das Fazendas Públicas da União, Estado e Município, para dizerem sobre o pedido e sobre a área usucapienda, e vista ao Ministério Público (id. nº 4058300.913574).

Naquele Juízo, foi expedido Edital de Citação para os réus incertos e não sabidos e possíveis interessados; expedidos mandados de citação para a parte ré (herdeira de Antônia Cotias Nunes Machado, a Sra. MARIA DA GLÓRIA NUNES MACHADO, e para os confinantes (BANCO BRADESCO S/A, LÊDA DA COSTA VASCONCELOS e ERIVALDO JOSÉ PEIXOTO); expedidas cartas de intimação para os Representantes das Fazendas Públicas da União, Estado e Município (id. nº 4058300.913 574).

A UNIÃO ingressou com petição no Juízo Estadual, e que pugna pela juntada do Ofício nº 1569/2013 - SPU/PE/MP, informando que o imóvel cujo domínio a parte autora postula ver reconhecido constitui-se "terreno conceituado como acrescido de marinha em regime de ocupação". Em face do interesse jurídico, a União suscitou a incompetência do Juízo Estadual e que os autos fossem remetidos para a Justiça Federal (id. nº 4058300.913576).

Ainda naquele Juízo, o MUNICÍPIO DO RECIFE peticionou, informando que o imóvel objeto da presente ação não obedeceria ao alinhamento previsto para o local, avançando cerca de um metro sobre logradouro público (calçada) (id. nº 4058300.913617); tendo a Parte Autora apresentado manifestação a respeito da petição do ente municipal (id. nº 4058300.913617).

Ante o interesse jurídico da União, o MM. Juiz Estadual declinou a competência para esta Justiça Federal, com a respectiva remessa dos autos (id. nº 4058300.913624).

Distribuído o feito para esta 2ª Vara Federal (PE), foi proferido despacho, no qual foi determinada a intimação da Parte Autora para providenciar a digitalização e propositura de ação idêntica pelo Sistema PJe, com distribuição por dependência ao processo físico nº 0001839-88.2015.4.05.8300 (id. nº 4058300.913624).

A Parte Autora ingressou com petição (id. nº 4058300.913354). Alegou, em síntese, que exerceria a posse mansa e pacífica do imóvel onde está localizada  a casa de nº 222, da Rua Passo da Pátria, bairro de São José, Recife/PE, há mais de 20 anos, com animus domini, de modo ininterrupto, pacífico e sem oposição. Descreveu a área total do terreno, seus limites e confrontações. Pugnou, a final: "Requer ainda que sejam aceitas como válidas as citações pessoais e editalícia feitas no processo originado no TJPE: v Citação da  herdeira de Antônia Nunes Machado, a Sra. Maria da Glória Nunes Machado com endereço à Rua dos Navegantes nº 23, Ed. São João, no Bairro de Boa Viagem,  Recife/PE. v Citação dos confinantes: Flanco Direito: Lêda da Costa Vasconcelos, brasileira, solteira, agente de sáude, residente à Rua Passo da Pátria nº 228, Bairro de São José, Recife/PE.Flanco esquerdo: Erivaldo José Peixoto, brasileiro, solteiro, residente e domiciliado na Rua Passo Pátria, nº220, Bairro de São José, Recife/PE. Fundos: Banco Bradesco, sito à Av. Dantas Barreto nº 1024, Bairro de São José, Recife/PE. v Citação dos representantes das Fazendas Públicas Municipal, Estadual e Federal. v Citação por edital dos interessados incertos, não sabidos e ausentes. Requer que o feito prossiga pela assistência judiciária, como foi deferido no processo originário, por ser o suplicado  pobre na forma da Lei, conforme declaração de pobreza anexa. Requer ainda a citação do Mistério Público Federal para acompanhar o feito".

Em seguida, a Parte Autora peticionou, requerendo a distribuição por dependência ao processo físico nº 0001839-88.2015.4.05.8300 (id. nº 4058300.921658).

R. despacho exarado em 16/04/2015 (id. nº 4058300.985340), no qual foi determinada a redistribuição do feito para esta 2ª Vara.

Despacho proferido em 26/04/2015 (id. nº 4058300.1000824), no qual se determinou a citação da herdeira de Antônia Nunes Machado, a Sra. Maria da Glória Nunes Machado; dos confinantes; da União Federal; citação editalícia de interessados incertos, não sabidos e ausentes; assim como a intimação dos representantes das Fazendas Públicas Municipal, Estadual e Federal para que manifestem interesse na causa; e vista ao Ministério Público.

A União Federal (FAZENDA NACIONAL) informou que, em consulta aos sistemas SIDA e PLENUS, não detectou débitos de responsabilidade do autor inscritos em Dívida Ativa da União; e requereu, ao final, a intimação da UNIÃO FEDERAL, através da ADVOCACIA GERAL DA UNIÃO - AGU, para a devida manifestação no presente feito (id. nº 4058300.1075358).

Expedido Edital de Citação de interessados incertos, não sabidos e ausentes (id. nº 4058300.1074372).

Juntada certidão negativa de citação da herdeira de Antônia Cotias Nunes Machado, a Sra. MARIA DA GLÓRIA NUNES MACHADO (id. nº 4058300.1096151).

Juntada certidão negativa de citação do confinante de ERIVALDO JOSÉ PEIXOTO (id. nº 4058300.1118626).

Juntada certidão de citação do confinante BANCO BRADESCO S/A (id. nº 4058300.1118650).

Juntada certidão de citação da confinante LÊDA DA COSTA VASCONCELOS (id. nº 4058300.1163789).

 O ESTADO DE PERNAMBUCO apresentou manifestação (id. nº 4058300.1170579), informando não ter interesse no feito.

Certidão negativa de citação do confinante ERIVALDO JOSÉ PEIXOTO (id. nº 4058300.1176279).

O BANCO BRADESCO S/A apresentou contestação (id. nº 4058300.1181578), informando, em síntese, que não se oporia à pretensão posta em Juízo, ante ausência de qualquer interesse no objeto da lide. Pugnou, ao final, por sua exclusão da lide, bem como resta isentado de qualquer ônus sucumbencial, seja processual ou de honorários.

A UNIÃO apresentou contestação (id. nº 4058300.1187937). Suscitou, preliminarmente, a impossibilidade jurídica do pedido, visto que o imóvel seria conceituado como de marinha, não existindo contrato de aforamento para esta área, nos termos do art. 20, inciso VII, da Constituição Federal de 1988, em razão da sua natureza de terreno de marinha em regime de ocupação, como provaria o Ofício nº 1817/2015-DICAP/SPU/PE, de 10.06.2015, oriundo da SUPERINTENDÊNCIA REGIONAL DO PATRIMÔNIO DA UNIÃO EM PERNAMBUCO. No mérito, aduz que o imóvel objeto da presente demanda seria bem de propriedade da União, nos termos do art. 20, inciso VII, da Constituição Federal de 1988, em razão da sua natureza de terreno de marinha, em regime de ocupação. Teceu outros comentários. Transcreveu dispositivos constitucionais e legais, e ementas de decisões judiciais. Pugnou, ao final, sem prejuízo das preliminares suscitadas, sejam julgados improcedentes os pedidos constantes na petição inicial.

Ato ordinatório emitido em 15/09/2015 (id. nº 4058300.1341787), no qual foi a parte Autora intimada para se manifestar acerca do edital de citação, certidões negativas da oficiala de justiça, das contestações do BRADESCO e da UNIÃO, bem como impulsionar o feito.

Certificado o decurso de prazo sem manifestação da Parte Autora (id. nº 4058300.1681042).

O Ministério Público Federal ofertou o seu r. parecer esclarecendo o motivo pelo qual estaria devolvendo os autos sem manifestação sobre o mérito da demanda, para o seu regular prosseguimento (id. nº 4058300.1685165).

A Parte Autora ingressou com petição, pugnando pela continuidade do feito (id. nº 4058300.2193778).

O BANCO BRADESCO S/A requereu habilitação de novos advogados (id. nº 4058300.2195699).

Decisão proferida em 10/02/2017 (id. nº 4058300.2862680), na qual se convalidou os atos praticados pela Justiça Estadual; foi concedido prazo à UNIÃO para trazer aos autos a documentação comprobatória de que o imóvel em questão realmente se situa em terreno de marinha ou acrescido de marinha; anotação dos nomes dos novos advogados do Bradesco S/A.

A UNIÃO, em cumprimento à decisão supra, requereu a juntada de documento que comprovaria ser o imóvel terreno de marinha com acrescido (id. nº 4058300.3033820).

Despacho exarado em 07/04/2017 (id. nº 4058300.3114175), no qual se determinou intimação da Parte Autora para manifestação acerca do documento juntado pela União.

Despacho exarado em 04/09/2017 (id. nº 4058300.3891226), no qual se determinou o integral cumprimento do despacho ID. 4058300.3114175.

Certificado nos autos a remessa ao setor de expedientes (id. nº 4058300.3907032).

Juntada certidão negativa de intimação da Sra. MARIA DA GLÓRIA NUNES MACHADO (id. nº 4058300.4351727).

Ato ordinatório emitido em 04/12/2017 (id. nº 4058300.4426937), no qual foi a parte Autora intimada para se manifestar sobre a certidão negativa da oficiala de justiça.

Juntadas certidões negativas de intimação dos confinantes LÊDA DA COSTA VASCONCELOS (id. nº 4058300.4462631) e ERIVALDO JOSÉ PEIXOTO (id. nº 4058300.4462683).

Ato ordinatório emitido em 21/02/2018 (id. nº 4058300.4783472), no qual foi a parte Autora intimada para impulsionar o feito.

A Parte Autora ingressou com petição, informando novo endereço do confinante ERIVALDO JOSÉ PEIXOTO (id. nº 4058300.5225676).

R. despacho exarado em 15/05/2018 (id. nº 4058300.5348196), no qual se determinou a citação do sr. ERIVALDO JOSÉ PEIXOTO; bem como intimação acerca do carreado aos autos pela União sob identificador nº 4058300.3033821.

Juntada certidão de citação/intimação do confinante ERIVALDO JOSÉ PEIXOTO (id. nº 4058300.6181662).

Ato ordinatório emitido em 06/11/2018 (id. nº 4058300.7554843), no qual foi a parte Autora intimada para se manifestar sobre a certidão da oficiala de justiça.

Certificado o decurso de prazo sem manifestação da Parte Autora (id. nº 4058300.9570451).

Ato ordinatório emitido em 14/12/2018 (id. nº 4058300.9570520), no qual foram as partes intimadas para se manifestarem sobre o documento carreado aos autos pela União (id. nº 4058300.3033821).

A Parte Autora apresentou manifestação, informando não ter "nada a falar à respeito do documento acostado aos autos pela União (Identificador nº 4058300.3033821)" (id. nº 4058300.9584503).

Vieram os autos conclusos.

É o relatório. Passo a decidir.

2 - Fundamentação

2.1 O feito comporta julgamento antecipado, nos termos do art. 355, inciso I, do Código de Processo Civil, uma vez que não há necessidade de produção outras provas além das que já constam dos autos.

2.2 Da impossibilidade jurídica do pedido

No que concerne à preliminar de impossibilidade jurídica do pedido, embora não mais prevista no novo Código de Processo Civil como uma das condições da ação, conforme se extrai do § 1º do art. 330 (correspondente ao Parágrafo Único do art. 295 do revogado CPC), há de ser apreciada nos termos do art. 14 do novo CPC.

Sustenta a UNIÃO que seria juridicamente impossível o pedido da Parte Autora porque não poderia ser objeto de usucapião o terreno acrescido de marinha, em regime de ocupação, por se tratar de bem público, de propriedade da União.

Resta prejudicada, no entanto, a preliminar suscitada pela UNIÃO, haja vista que tal ponto se confunde com a análise do mérito da questão, que será devidamente analisado adiante.

2.3 Do mérito

Pretende a Parte Autora usucapir o domínio do imóvel (casa), localizado na Rua Passo da Pátria, nº 222, bairro de São José, Recife/PE.

Argumenta que há mais de 20 (vinte) anos da data do ajuizamento da presente ação exerce a posse mansa e pacífica do imóvel usucapiendo, com animus domini, de modo ininterrupto, pacífico e sem oposição.

A UNIÃO, por sua vez, sustenta que o imóvel objeto da presente demanda seria bem de sua propriedade, nos termos do art. 20, inciso VII, da Constituição Federal de 1988, em razão da sua natureza de terreno de marinha, em regime de ocupação. Para tanto juntou ofício emitido pela Superintendência do Patrimônio da União em Pernambuco - SPU, no qual constam a informação de que o imóvel em tela é conceituado como terreno de marinha com acrescido e encontra-se cadastrado no Sistema Integrado de Administração Patrimonial (SIAPA), em regime de ocupação, sob o RIP nº 2531.0017303-23, sendo anexado no referido ofício o cadastro SIAPA e a Certidão de Inteiro Teor do imóvel usucapiendo (id. nº 4058300.3033821).

Pois bem.

O art. 20 da Constituição Federal de 1988 estabelece, expressamente, que os terrenos de marinha e seus acrescidos são bens da União:

"Art. 20. São bens da União:

(...)

VII - os terrenos de marinha e seus acrescidos;"

A matéria, inclusive, é sumulada pelo Supremo Tribunal Federal (Súmula 340 do STF):

"Desde a vigência do Código Civil os bens dominicais, como os demais bens públicos, não podem ser adquiridos por usucapião."

Da mesma forma, dispõe o art. 200 do Decreto-Lei n º 9.760/46:

"Art. 200. Os bens imóveis da União, seja qual fôr a sua natureza, não são sujeitos a usucapião."

Ambos os institutos (aforamento e ocupação) são disciplinados pelo Decreto-Lei nº 9.760/46, sendo que o aforamento(enfiteuse de imóvel público) (arts. 99-124) tem caráter de perpetuidade, enquanto a ocupação (arts. 127-133) tem natureza precária/temporária.

Sobre a possibilidade de aquisição do domínio útil de bens públicos, via ação de usucapião, a jurisprudência pátria firmou-se no sentido de ser possível tal aquisição, desde que se trate do domínio útil de terreno de marinha e acrescido de marinha submetido a regime de aforamento, que equivale à antiga enfiteuse do Código Civil de 1916, hoje revogado.

Nesse sentido, o Tribunal Regional Federal da 5ª Região já se manifestou, inclusive, com a edição da Súmula 17, in verbis:

"É possível a aquisição do domínio útil de bens públicos em regime de aforamento, via usucapião, desde que a ação seja movida contra particular, até então enfiteuta, contra quem operar-se-á a prescrição aquisitiva, sem atingir o domínio direto da União."

Situação diversa, no entanto, é a dos terrenos de marinha ou acrescidos de marinha, de propriedade da UNIÃO, quando esses terrenos se encontram  submetidos a regime de ocupação, diante da natureza precária deste instituto, e que corresponde ao imóvel objeto desta ação.

No aforamento(enfiteuse), o Beneficiário(aforador ou enfiteuta) tem uma parcela do domínio, que é o domínio útil.

Já no regime de ocupação, o Beneficiário, mero ocupante, não tem domínio útil, mas apenas a posse precária, de sorte que a União se mantém com o domínio pleno do terreno de marinha, inviabilizando o pleito de usucapião.

Sobre o tema, transcrevo os seguintes julgados do E. TRF da 5ª Região:


"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. USUCAPIÃO. NULIDADE DA SENTENÇA. NECESSIDADE DE DILIGÊNCIAS. NÃO ACOLHIMENTO. IMPOSSIBILIDADE. TERRENO ACRESCIDO DE MARINHA. IMÓVEL SUJEITO APENAS AO REGIME DE OCUPAÇÃO. NÃO COMPROVAÇÃO DE AFORAMENTO. APELO NÃO PROVIDO.

1. Apelação interposta pelo particular em face da sentença proferida que, nos autos da presente ação ordinária, julgou improcedente o pedido de aquisição do domínio útil por usucapião de imóvel, sob o fundamento de que se trata de imóvel fora do regime de aforamento, tratando-se de terreno acrescido de marinha, não podendo ser objeto de usucapião.

2. A prova documental acostada aos autos se mostrou suficiente a evidenciar que se trata de terreno acrescido de marinha, não havendo dúvida acerca dessa condição, sendo desnecessária que seja declarada a nulidade para realização de diligências de fato já demonstrado.

3. Da simples análise das informações colacionadas nos autos, especialmente as prestadas pela Secretaria do Patrimônio da União, verifica-se que o imóvel em testilha está apenas submetido a regime de ocupação, restando evidenciada a vedação à declaração de usucapião de domínio útil, nos termos do Decreto-Lei n.º 9.760/46.

4. Não há dúvida quanto à natureza de regime que recai sobre à área do imóvel, não tendo o demandante demonstrado a constituição da enfiteuse, tampouco comprovado o regime de aforamento sobre a área em litígio, necessária para a viabilizar a aquisição da titularidade do domínio útil do bem via usucapião. Não aplicação da Súmula 17 - TRF5ª REGIÃO. Precedente da Turma.

5. Apelo improvido."

(PROCESSO: 08054787420164058000, AC - Apelação Civel - , DESEMBARGADOR FEDERAL RUBENS DE MENDONÇA CANUTO, 4ª Turma, JULGAMENTO: 30/01/2019, PUBLICAÇÃO: )[1]



"CONSTITUCIONAL. CIVIL. ADMINISTRATIVO. USUCAPIÃO DE DOMÍNIO ÚTIL. TERRENO DE MARINHA. REGIME DE OCUPAÇÃO. IMPOSSIBILIDADE. APELAÇÃO IMPROVIDA.

1. Estando o imóvel sob regime de ocupação, não é possível a aquisição de domínio útil por usucapião, em virtude do caráter precário que rege o instituto, sendo necessário o anterior aforamento para tal modalidade aquisitiva.

2. Deste modo, ainda que presentes o animus de possuir e o fato concreto da ocupação pelo apelante há décadas, não pode proceder a pretensão de conversão em propriedade, pois a posse é exercida sobre bem público, insuscetível de aquisição mediante usucapião, conforme o disposto no art. 183, parágrafo 3º da CF.

3. Vale salientar que, no caso em exame, a cópia da escritura pública da aquisição do domínio útil do imóvel em questão, acostada pela parte demandante, não tem o condão de caracterizar, por si só o regime de aforamento, sobretudo, quando confrontada pelo extenso acervo probatório enquadrando o referido imóvel em regime de ocupação.

4. Apelação improvida.

(PROCESSO: 08042402720154058300, AC/PE, DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL ERHARDT, 1º Turma, JULGAMENTO: 19/03/2017, PUBLICAÇÃO:  )[2]"(G.N.)

No caso dos autos, os documentos acostados pela União, principalmente o ofício emitido pela Secretaria do Patrimônio da União - SPU (Ofício nº 15257/2017-MP), demonstram que o imóvel em discussão é conceituado como acrescido de marinha e encontra-se cadastrado no Sistema Integrado de Administração Patrimonial (SIAPA) em regime de ocupação, sob o RIP nº 2531.0017303-23 (id. nº 4058300.3033821).

Em que pese a alegação da Parte Autora de existência de posse ininterrupta, por mais de 20 anos, com animus domini, o fato é que não se pode reconhecer, via usucapião, o domínio útil do imóvel em apreço, uma vez que inexiste domínio útil a ser adquirido por prescrição aquisitiva.

Desse modo, como visto, o imóvel usucapiendo é conceituado como terreno acrescido de marinha, sob o regime de ocupação, e não de aforamento(enfiteuse pública), o que impossibilita a aquisição de domínio útil mediante ação de usucapião, em virtude do caráter precário da posse gerada por esse regime, uma vez que a União mantém o domínio pleno sobre o imóvel.

3. Dispositivo

Posto isso:

3.1 Resta prejudicada a preliminar de impossibilidade jurídica do pedido.

3.2 Julgo improcedentes os pedidos desta ação e extingo o processo com resolução do mérito nos termos do art. 487, I, do Código de Processo Civil.

3.3 Condeno a Parte Autora ao pagamento de verba honorária em favor da Parte Ré, no percentual de 10% (dez por cento) do valor atualizado da causa (art. 85, § 4º, III c/c § 3º, I, do CPC), mas submeto a respectiva cobrança às condições suspensivas e temporárias do § 3º do art. 98 do CPC.

Custas ex lege.

Registre-se. Intimem-se.
Recife, 31.01.2020
Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE


(mppl)


[1] https://www4.trf5.jus.br/Jurisprudencia/JurisServlet?op=pdf&tipo=1&coddoc=465100
[2] https://www4.trf5.jus.br/Jurisprudencia/JurisServlet?op=pdf&tipo=1&coddoc=421464
Acesso em 31/01/2020
  

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