sábado, 28 de setembro de 2019

PROCESSO DE REMOÇÃO. PROFESSORA AFASTADA DAS ATIVIDADES PORQUE FREQUENTANDO CURSO DE DOUTORAMENTO. DIREITO LÍQUIDO E CERTO À PARTICIPAÇÃO.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Poderia uma Professora, que se encontra afastada das suas funções, porque frequentando curso de doutoramento, ser proibida de participar de processo de remoção de um Órgão(Campus) para  outro Órgão(Campus) da Instituição de Ensino Superior Público, à qual se encontra vinculada?
Na sentença que segue, chega-se à conclusão que não, embora um Desembargador Federal do TRF5R tenha chegado à conclusão exatamente contrária.
O que você, eventual caro Leitor,  pensa disso?
Boa leitura.  

OBS.: Sentença pesquisada pelo Assessor ANTONIO RICARDO FERREIRA.



PROCESSO Nº: 0815510-43.2018.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: C M M
ADVOGADO: I Da R T De L e outro
IMPETRADO: INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE PERNAMBUCO - IFPE
AUTORIDADE COATORA: REITORA DO INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE PERNAMBUCO - IFPE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



Sentença Tipo A, registrada eletronicamente

                                                         
Vistos, etc.
Ementa: - MANDADO DE SEGURANÇA. PROCESSO DE REMOÇÃO.
-O(a) Professor(a) que estiver afastado(aa) das suas atividades, porque frequentando curso(especialização, mestrado, doutorado, etc) tem direito de participar de processo de remoção para outro Órgão da Entidade Autárquica à qual se encontra vinculado(a).
-Concessão da segurança. 

1 - Relatório

C M M, qualificada na petição inicial, impetrou o presente MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO com pedido de medida liminar contra suposto ato praticado pela Reitora A K R R, autoridade vinculada ao INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE PERNAMBUCO -IFPE. Alegou, em síntese, que: a) é servidora pública, no cargo de professora do IFPE, lotada no campus de Garanhuns/PE; b) em 05.07.2018, teria sido  afastada no interesse da administração para realizar pós-graduação stricto sensu (doutorado) na Universidade Federal de Pernambuco, em Recife/PE; c) em 17.08.2018, a Impetrada lançou edital de remoção, edital nº 63, para Processo de Classificação para Remoção de Servidores Técnico-Administrativos e Docentes do Instituto Federal de Pernambuco; d) consta no Edital (item 2.1), que um dos pré-requisitos para a inscrição seria a de que o servidor não estivesse em gozo de qualquer tipo de afastamento ou licença, previstos na Lei nº 8.112, exceto as licenças para tratamento da própria saúde; de pessoa da família; gestante; paternidade; adotante; por acidente em serviço ou doença profissional; participação em programa de treinamento regularmente instituído, júri e das concessões, nos termos dos artigos 202, 83, 207, 208, 210, 211, 102 - inciso IV, 97, respectivamente da Lei nº 8.112/90, conforme registro eletrônico a ser realizado pela CGPE do Campus; [...]; e) uma das exceções especificadas seria a do art. 102, inciso IV da Lei 8.112/90 que trata do afastamento para estudo em pós-graduação stricto sensu no País; f) teria recebido por e-mail um informativo encaminhado pela Reitoria do IFPE constando, sobre o Edital de Remoção, que um dos critérios para o servidor participar do processo de remoção, seria o de não estar em gozo de qualquer tipo de afastamento ou licença, exceto por motivo de saúde; g) com essa inovação ao edital estaria automaticamente impedida de participar do edital de remoção; h) uma vez que o prazo para inscrição já estaria em curso e em face à ameaça de não aceitação de sua inscrição, impetra o presente mandamus em caráter preventivo. Teceu outros comentários e ao final requereu a concessão de medida liminar para permitir sua inscrição no processo seletivo de remoção, caso lhe seja negada e no mérito, em confirmação à tutela liminar, seja concedida a segurança garantindo a sua participação definitiva no processo seletivo. Deu valor à causa. Instruiu a inicial com Instrumento de Procuração e documentos.

Decisão de identificador nº 4058300.6484263, por meio da qual se determinou a notificação da Autoridade apontada como coatora para prestar informações, para, só após, apreciar o pedido liminar. Determinou-se ainda, fosse dado ciência ao órgão de representação judicial à qual essa Autoridade se encontra vinculada, na forma e para os fins legais, na forma prevista no inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016/2009.

Em petição de identificador nº 4058300.7003363, o Instituto Federal de Educação, Ciência e Tecnologia de Pernambuco - IFPE manifesta o desejo de figurar no feito e ser intimado de todas as decisões judiciais.

A Autoridade apontada como coatora, em petição anexada sob identificador nº 4058300.10173003, presta as informações solicitadas. Alegou, em síntese, que não merece prosperar os termos da impetração "...seja porque não há qualquer ato administrativo iminente a ser praticado pela Administração em relação à remoção de docentes de matemática para o Campus Recife, seja porque não há qualquer inovação interpretativa promovida pelo Informativo em relação às regras estabelecidas no item 2.1, alínea "c", do Edital, que veda a participação da Impetrante em concurso de remoção enquanto perdurar o seu afastamento para participar de programa de doutoramento..."

Em decisão proferida sob identificador nº 4058300.10182737, foi concedida a medida liminar e se determinou à autoridade apontada como coatora que tomasse as providências necessárias para permitir que a Impetrante se inscrevesse e participasse do processo seletivo de remoção, estabelecido pelo Edital nº 63, de 17 de agosto de 2018, sob as penas estabelecidas no art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009.

O Ministério Público Federal, em petição de Id. 4058300.10523928, deixou de se manifestar sobre o mérito da causa, por entender desnecessário.

O Impetrado noticia a interposição de Agravo de Instrumento em face da decisão liminar proferida (Id.4058300.10648344).

A 4ª Turma do TRF 5ª Região encaminha a decisão liminar proferida nos autos do Agravo de Instrumento nº 0805942-37.2019.4.05.0000, interposto pelo IFPE, anexada sob identificador nº 4058300.15719791, suspendendo a decisão deste Juízo, no qual se concedeu a medida  liminar.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório.

Passo a fundamentar e a decidir.

 2 - Fundamentação
2.1 - O d. Relator do TRF5R da r. decisão lançada no noticiado agravo de instrumento, assim se expressão, quando suspendeu a decisão deste Juízo, na qual se concedeu a medida liminar:
"Com efeito, a Lei nº 8.112/90, no seu art. 96-A, § 4º[i], exige que o servidor afastado para capacitação continue vinculado ao órgão no qual exerce suas funções e, após o seu retorno, permaneça pelo mesmo tempo que esteve afastado.
Por sua vez, o art. 36, "c", do mesmo diploma, delegou ao órgão de lotação do servidor a competência normativa para preestabelecer as regras dessa modalidade de remoção.
Transcrevo:
"Art. 36. Remoção é o deslocamento do servidor, a pedido ou de ofício, no âmbito do mesmo quadro, com ou sem mudança de sede.III - a pedido, para outra localidade, independentemente do interesse da Administração:"..
Inicialmente,  o § 4º do art. 96-A da Lei nº 8.112, de 1990, invocado na  r. decisão do d. Desembargador Federal Relator do noticiado agravo de instrumento e transcrita em nota de rodapé, não estabelece, data maxima venia, que os Servidores afastados para a realização de cursos tenham que continuar vinculados ao "Órgão de origem", como dito na mencionada r. decisão. Conforme se vê no referido dispositivo(v. nota de rodapé [i] infra), ali consta que "...terão que permanecer no exercício de suas funções após o seu retorno por um período igual ao do afastamento concedido.".
Note-se que o Legislador não utilizou a palavra "Órgão", como o fez o d. Relator.
Data maxima venia, a mens legis desse dispositivo foi no sentido de que o Servidor beneficiário de realização de cursos, com afastamento das funções, terá que permanecer vinculados ao Ente, no caso, o IFPE, não importa em que Órgão deste, pelo mesmo período que gozou de afastamento para frequentar o curso, o que é perfeitamente  legítimo e, por motivos óbvios,  para evitar locupletamento ilícito do Servidor.
Caso desvincule-se do Ente(e não do Órgão), terá que ressarci-lo dos valores que recebeu durante o afastamento e/ou do valor de eventual bolsa com a qual tenha sido contemplado.
Mas impedir que esse Servidor possa participar de processo de remoção,  para outro Órgão do Ente Autárquico, data maxima venia, não consta da Lei, tampouco do Edital em questão(v. subitem seguinte desta fundamentação) e, se constasse, seria  inconstitucional, pois daria aos Servidores que não estivessem em tal situação tratamento diferenciado, e, pior, funcionaria como uma PUNIÇÃO para os Servidores  que estão em constante aprimoramento para  melhor servir ao público e ao próprio Ente Autárquico.
No subtópico seguinte, procurarei demonstrar que o Edital em debate não tem tal vedação e, pela legislação, a Impetrante tem o direito líquido e certo de participar do referido processo de remoção.
2.2 -Não obstante a r. decisão do Relator do noticiado agravo de instrumento do TRF5R, tenho que referida r. decisão não afastou o poder-dever deste Juiz de primeiro grau exercer a sua jurisdição, pelo que, data maxima venia, passo a apreciar o mérito da causa.
A pretensão da Autora, professora do INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE PERNAMBUCO, é de participar em concurso de remoção levado a efeito pela IFPE, através do Edital nº 63, de 17 de agosto de 2018, para o campus Recife.

Nas informações prestadas, a autoridade administrativa, apontada como coatora, alegou inicialmente que "desde o lançamento do Edital nº 63/2018, para regramento de remoções internas em fluxo contínuo, até o presente momento, não surgiu qualquer vaga na área de matemática para o Campus Recife, tendo, no período, surgido duas vagas para o Campus Pesqueira, para os quais não houve qualquer docente interessado em preenchê-las."

Aduziu, ainda, que teria construído as regras do Edital, por entender que "os servidores afastados para participação em programas de mestrado e doutorado, nos termos do art. 96-A, da Lei n. 8.112/90 estão momentaneamente impossibilitados de concorrer a eventuais vagas surgidas para remoção, pelo simples fato de que, havendo a necessidade administrativa de preenchimento de tal vaga para atendimento imediato às demandas letivas do campus de destino, o interesse público não estaria atendido se tal unidade de ensino necessitasse aguardar de dois a quatro anos para que o servidor removido restabelecesse o seu exercício propriamente dito."

Em resumo, por estas duas razões, considera não merecer prosperar os termos da impetração.

Analisando pelo consta nos autos, a Impetrante teria recebido por e-mail um informativo, encaminhado pela Reitoria do IFPE, alegando constar no Edital de Remoção que um dos critérios para o servidor participar do processo seria o de não estar em gozo de qualquer tipo de afastamento ou licença, exceto por motivo de saúde.

Compulsando os documentos anexados (Id. 4058300.6474839 e 4058300.6474842), foi esse o teor da comunicação encaminhada pela reitoria do IFPE, para o e-mail da Impetrante.

Ocorre que, conferindo o que consta no Edital nº 63, de 17.08.2018, anexado sob identificador nº 4058300.6474838, não consta mencionada vedação.

Com efeito, no item 02, do mencionado Edital, que trata dos Pré-Requisitos para a inscrição, consta:

2.1. Poderá se inscrever no Processo de Classificação para Remoção, o (a) servidor(a) que:
(....)
(...)
c) não esteja em gozo de qualquer tipo de afastamento ou licença, previstos na Lei nº 8.112, exceto as licenças para tratamento da própria saúde; de pessoa da família; gestante; paternidade; adotante; por acidente em serviço ou doença professional; participação em programa de treinamento regularmente instituído; júri e das concessões, nos termos dos artigos 202, 83, 207, 208, 210, 211, 102 - inciso IV, 102- inciso VI, 97, respectivamente, da Lei nº 8.112/90, conforme registro eletrônico a ser realizado pela CGPE do Campus;

Ao observarmos atentamente, é possível constatar que está previsto no Edital, como uma das exceções à regra acima mencionada, o art. 102, inciso IV da Lei nº 8.112/90, os quais têm o seguinte texto:

"Art. 102. Além das ausências ao serviço previstas no art. 97, são considerados como de efetivo exercício os afastamentos em virtude de:
(...)
IV - participação em programa de treinamento regularmente instituído ou em programa de pós-graduação stricto sensu no País, conforme dispuser o regulamento;".(negritei)

E sendo assim, diante de tal previsão, mostra-se evidente a possibilidade da inscrição da Impetrante no processo seletivo de remoção, aberto com base no Edital nº 63, de 17.08.2018, pelo IFPE.

É possível considerar como razoável a alegação da Autoridade Impetrada, de que as regras do Edital teriam sido construídas por entender que "os servidores afastados para participação em programas de mestrado e doutorado, nos termos do art. 96-A, da Lei n. 8.112/90 estão momentaneamente impossibilitados de concorrer a eventuais vagas surgidas para remoção".

Ocorre que tal entendimento não poderia ser aplicado à Impetrante, uma vez que permaneceu no Edital a previsão acima apontada, do art. 102, inciso IV da Lei n.º 8.112/90.
Quanto ao fato de não existirem vagas para o campus de Recife na área de atuação da Impetrante, não seria fundamento para impedir ou até de excluir a participação da Impetrante no concurso de remoção interna, porque um dia  surgirão, é tanto que foi levado à publicação o referido Edital.

Diante de tais considerações e em face de todo corpo probatório anexado aos autos, data maxima venia do d. Relator do noticiado agravo de instrumento, a pretensão da Impetrante merece ser acolhida, porque é líquido e certo o seu direito à participação no referido processo de remoção.

3. Dispositivo


Posto isso, julgo procedentes os pedidos desta ação mandamental e concedo à Impetrante a segurança pleiteada, assegurando-lhe o direito de participar do processo seletivo de remoção, estabelecido pelo Edital nº 63, de 17 de agosto de 2018, e determino que mencionada DD Autoridade seja notificada a cumprir esta sentença, nos seus exatos termos, sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009.

Outrossim, condeno o IFPE a ressarcir as custas processuais despendidas pela Impetrante, atualizadas a partir do mês seguinte ao do respectivo desembolso, atualizadas pelos índices da tabela SELIC, por se tratar de um tributo federal.
Sem verba honorária(art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009, e Súmula 512 do Supremo Tribunal Federal - STF).
COM URGÊNCIA, remeta-se cópia desta sentença para os autos do noticiado agravo de instrumento,  aos cuidados do respectivo d. Desembargador Federal Relator, para os fins legais.
Recife, 29.09.2019
Francisco Alves dos Santos  Júnior
 Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE.

Sem honorários (art. 25, Lei nº 12.016/09).

Sentença sujeita ao reexame necessário (art. 14, §1º, da Lei 12.016/2009).

Oficie-se ao Exmo. Desembargador Relator do Agravo de Instrumento nº 0805942-37.2019.4.05.0000, em trâmite no TRF 5ª Região, encaminhando cópia desta sentença.

Registre-se. Intimem-se.


  (ARF)

__________________________________________________________________________
[i] § 4o Os servidores beneficiados pelos afastamentos previstos nos §§ 1o, 2o e 3o deste artigo terão que
permanecer no exercício de suas funções após o seu retorno por um período igual ao do afastamento
concedido.








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