Por Francisco Alves dos Santos Júnior
Se o Contribuinte se aposenta porque acometido de uma das moléstias graves arroladas no inciso XIV do art. 6º da Lei nº 7.713, de 1988, gozará da isenção do IR, previsto nesse dispositivo legal, no saque de cota-parte do Fundo de Previdência Privada do qual era Contribuinte e pelo qual, por força dessa doença, estará se aposentando?
Na sentença que segue, essa questão é detalhadamente debatida, inclusive fazendo-se referência a dois r. julgados do Tribunal Regional Federal da 4ª Região, favoráveis à tese da petição inicial.
Boa leitura.
Obs.: pesquisa de jurisprudência feita pela Assessora Luciana Simoes Correa de Albuquerque.
PROCESSO Nº: 0805833-23.2017.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: L S L
ADVOGADA: R G G De S S
RÉU: BRASILPREV SEGUROS E PREVIDENCIA S/A e outros
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
AUTOR: L S L
ADVOGADA: R G G De S S
RÉU: BRASILPREV SEGUROS E PREVIDENCIA S/A e outros
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
SENTENÇA TIPO A
EMENTA: -DIREITO TRIBUTÁRIO. ISENÇÃO DO IR. LEI 7.713, DE 1988, E LEI 9.250, DE 1995.
A
isenção das pessoas acometidas pelas moléstias arroladas no inciso XIV
do art. 6º da Lei nº 7.713, de 1988, abrange apenas proventos e não
valor de cota-parte resgatado de Fundo de Aposentadoria Privada, ainda
que mencionado resgate decorra de aposentadoria motivada por uma
daquelas moléstias.
Cobrança
das verbas de sucumbência submetida à condição suspensiva, pelo prazo
de um ano, por se encontrar a Autora em gozo da Assistência Judiciária.
Improcedência.
Vistos,etc.
- Breve Relatório
L S L ajuizou esta Ação Ordinária em face do
BRASILPREV SEGUROS E PREVIDÊNCIA S/A - (EAPC), BANCO DO BRASIL S/A e
UNIÃO FEDERAL . Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça
Gratuita, bem como tramitação prioritária do feito, por ser portadora de
moléstia grave. Aduziu, em síntese, que: estaria vinculada ao
BRASILPREV SEGUROS E PREVIDÊNCIA S/A - (EAPC) pelo PGBL de matrícula
8.534.429-X desde 06/09/2011; por ser portadora de moléstia grave,
conforme laudo médico oficial acostado aos autos de fl. 34, doença esta
devidamente inserida no rol legal, causa autorizadora da isenção do
Imposto de Renda, devidamente preconizada no Art 6º XIV Lei 7.713/1988
art 6º XIV, teria pleiteado o resgate do seu PGBL com a referida
isenção do IR; a moléstia grave que acomete a Requerente desde 2008
teria CID M45, Espondilite Ancilosante, conforme atesta de forma
inconteste laudos médicos oficiais de fls 34 a 37 e também particulares
que seriam acostados nesta oportunidade; seria direito inconteste à
isenção do imposto de renda; seria de suma importância ressaltar que em
virtude de ser portadora da moléstia acima citada, a Requerente já se
encontraria oficialmente aposentada por invalidez (fls. 38 e 39);
segundo o Manual de Perícia Oficial em Saúde do Servidor Público Federal
em seu capítulo VII, a Espondiloartrose anquilosante, corresponderia a
Moléstia Espondilite anquilosante, sendo esta definida como:"A
espondilite anquilosante, inadequadamente denominada de espondiloartrose
anquilosante nos textos legais, é uma doença inflamatória de etiologia
desconhecida, que afeta principalmente as articulações sacroilíacas,
interapofisárias e costovertebrais, os discos intervertebrais e o tecido
conjuntivo frouxo que circunda os corpos vertebrais, entre estes e os
ligamentos da coluna"; a Requerente seria sim detentora inconteste do
beneficio da isenção do imposto de renda conforme previsão legal, por
ser portadora de CID M45, Espondilite Ancilosante, devendo tal isenção
também ser concedida quando do resgate de seu plano de previdência
privada; no próprio contrato do PLANO DE PREVIDÊNCIA PRIVADA pactuado
com a Requerida, haveria a previsão da ISENÇÃO DO IR para os casos
previstos pela Lei, justamente a situação em que se encontra a
Requerida; conforme a Seção IV, no Art. 38, e 40 de fl. 61, do
Regulamento do Plano Individual da Requerida ao qual a Requerente teria
aderido, seria possível constatar a garantia do resgate do PGBL em
questão com isenção do IR, conforme transcrito na Inicial; os
Requeridos ao negarem a Requerente o resgate do seu plano de previdência
privada com isenção do IR, estariam cometendo grande equívoco. Teceu
outros comentários. Pugnou, ao final, pelo prosseguimento do feito pello
formato PJE do processo físico que segue digitalizado de nº
0015027-17-2016.4.05.8300 Advindo da Justiça Civil - Processo nº
0041509-35.2015.8.17.0001- 2º vara civil da capital.
Cópia
da decisão exarada pelo MM. Juiz de Direito Wagner Ramalho Procópio
determinando a citação do demandado (Id. 4058300.3202414).
Cópia
digitalizada da Contestação apresentada pela BRASILPREC SEGUROS DE
PREVIDÊNCIA S/A, aduzindo, em síntese, que: o Plano Gerador de
Benefício Livre (PGBL) seria um plano que teria por objetivo a concessão
de uma renda mensal vitalícia ao participante que atingisse a idade
mínima na proposta de inscrição para a aposentação; o resgate seria
destinado para a hipótese em que o participante, durante o período de
rentabilização do plano, decidiria pela retirada dos valores aportados
durante o período de diferimento do contrato, respeitadas as normas
contratuais e legais; já o benefício seria o pagamento que seria
realizado em decorrência do evento gerador , qual seja, o atingimento da
data de aposentação atingida pelo Participante; as definições de
pagamento e resgate seriam distintos; haveria incidência do imposto de
renda no momento de solicitação do resgate; a legislação de que dispõe
sobre a isenção tributária deveria ser interpretada de forma literal.
Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela decretação de
improcedência dos pedidos (Id. 4058300.3202423).
Cópia
da decisão exarada pelo MM. Juiz de Direito Júlio Cezar dos Santos da
Silva determinando a remessa dos autos à Justiça Federal (Id.
4058300.3202461).
Concedido
os benefícios da Justiça Gratuita e da prioridade na tramitação do
feito, ratificados os atos praticados na Justiça Estadual e determinada a
citação da União/Fazenda Nacional. (Id. 4058300.3263726).
A
União (Fazenda Nacional) apresentou Contestação, aduzindo, em apertada
síntese, que: no que se refere ao preceitos contidos nos incisos XIV e
XXI do art. 6°, da Lei n° 7.713/88, o foco seriam os proventos de
aposentadoria ou pensão daqueles portadores de moléstia grave que são
isentos do imposto de renda. No caso dos autos, não se buscaria
reconhecimento de isenção em relação a proventos de aposentadoria ou
pensão, mas em relação ao resgate dos recursos mantidos em entidade de
previdência privada, situação totalmente diversa da prevista na norma
isentiva. Teceu outros comentários. Pugnou,ao final, pela decretação de
improcedência dos pedidos (Id. 4058300.3333489).
A parte autora apresentou réplica, rebatendo os argumentos da defesa e reiterando os termos da Inicial (Id. 4058300.3633005).
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.
2. Fundamentação
2.1
- Inicialmente, cabe destacar que a UNIÃO não contesta que a ora Autora
esteja com a doença acima indicada, mas apenas que a isenção em questão
não abrangeria a verba apontada, resgate de cota-parte do Plano Gerador de Benefício Livre (PGBL), ou seja, resgate de cota-parte de um Fundo de Previdenciário privado, para o qual pagou contribuição de aposentadoria privada.
2.2 - No que interesse à solução da lide, o artigo 6º, XIV, da Lei nº 7.713/1988 dispõe:Art. 6º - Ficam isentos do imposto de renda os seguintes rendimentos percebidos por pessoas físicas:
(...)
XIV - os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doençade parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, hepatopatia grave, estados avançados da doença de Pagetde Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da imunodeficiência adquirida, com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma; (Redação dada pela Lei nº 11.052, de 2004). [destaquei]
O Decreto nº 3.000/1999, em seu art. 39, também assegura a isenção do imposto de renda dos proventos percebidos pelos portadores de espondiloartrose anquilosante. Vejamos:
Art. 39. Não entrarão no cômputo do rendimento bruto:
(...)
XXXIII - os proventos de aposentadoria ou reforma, desde que motivadas por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa, alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase, paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson, espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estados avançados de doença de Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome de imunodeficiência adquirida, e fibrose cística (mucoviscidose), com base em conclusão da medicina especializada, mesmo que a doença tenha sido contraída depois da aposentadoria ou reforma (Lei nº 7.713, de 1988, art. 6º, inciso XIV, Lei nº 8.541, de 1992, art. 47, e Lei nº 9.250, de 1995, art. 30, § 2º).
O
objetivo da norma isentiva é o de não onerar demasiadamente os
proventos da aposentadoria do contribuinte portador de moléstia grave,
que possui dispendiosos gastos com o tratamento da enfermidade, dando
maior efetividade ao princípio constitucional da dignidade da pessoa
humana e ao direito fundamental à saúde.
Todavia,
o resgate de cota-parte do Fundo Previdenciário privado, no ato da
aposentadoria, em decorrência da noticiada doença, enquadrar-se-ia na
mencionada isenção legal?
A
minha Assessoria encontrou dois r. julgados do Tribunal Regional
Federal da 4ª Região dando resposta positiva a essa indagação.
Eis as respectivas ementas:
"TRIBUTÁRIO. IMPOSTO DE RENDA. ISENÇÃO . LEI 7713/88. LEI 9250/95. CARDIOPATIA GRAVE. COMPROVAÇÃO. APOSENTADORIA DE ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA PRIVADA . ABRANGÊNCIA.
1. A Lei n 7.713/88 instituiu a isenção do imposto de renda retido na fonte sobre as parcelas recebidas a título de aposentadoria em decorrência de cardiopatia grave. A moléstia encontra-se documentalmente comprovada por meio de laudo médico.2. No conceito de aposentadoria protegido pela isenção inclui-se aquela oriunda de previdência complementar (privada). Interpretação teleológica, sistêmica e constitucional da norma."(APELAÇÃO CÍVEL Nº 2004.72.00.007019-1/SC, D.J.U. de 06/07/05).Nota 1 - Disponível em https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/citacao.php?doc=TRF400109421
Acesso em 30/01/2018
"TRIBUTÁRIO.IMPOSTO DE RENDA. ISENÇÃO. . LEI 7713/88. LEI 9250/95. NEOPLASIA MALÍGNA (CÂNCER DE MAMA). COMPROVAÇÃO. APOSENTADORIA DE ENTIDADE DE PREVIDÊNCIA PRIVADA. RESGATE PURO. INTERPRETAÇÃO ABRANGENTE. PROVA DA MOLÉTIA. DESNECESSIDADE DE EXAME FEITO POR SERVIÇO MÉDICO OFICIAL.
1. A Lei n. 7.713/88 instituiu a isenção do imposto de renda retido na fonte sobre as parcelas recebidas a título de aposentadoria em decorrência de neoplasia maligna.2. No conceito de aposentadoria protegido pela isenção inclui-se a de previdência complementar privada. Interpretação da norma.3. O participante do fundo de previdência privada que não aperfeiçoa os requisitos à aposentadoria (porque é demitido ou pede demissão, desvinculando-se do plano de previdência) tem direito ao resgate puro. O que difere o benefício de aposentadoria do resgate puro é o tempo e o status do participante (vinculado ou não). Resgata-se o que poderia ser percebido como benefício de aposentadoria. Assim, é possível a isenção do imposto de renda também para os casos de resgate puro de valores vertidos aos planos de previdência privada, quando o participante desliga-se por força de doença arrolada na lei, no caso, a neoplasia maligna.4. Não é imprescindível laudo emitido por serviço médico oficial para prova da moléstia. Ela restou comprovada por meio de outros documentos. (GN)".(TRF4, REO 2004.71.00.005383-0, SEGUNDA TURMA, Relator DIRCEU DE ALMEIDA SOARES, DJ 16/11/2005)
Disponível em https://jurisprudencia.trf4.jus.br/pesquisa/citacao.php?doc=TRF400116808
Acesso em 30/01/2018
Data maxima venia, penso diferente.
Noto
que o dispositivo legal acima transcrito e o dispositivo do respectivo
Regulamento são claros no sentido de que só gozam da mencionada isenção
do IRPF "os proventos de aposentadoria ou reforma motivada por acidente em serviço e os percebidos pelos portadores de moléstia... ".
Ora,
não vejo como enquadrar como proventos de aposentadoria valor relativo a
resgate de cota-parte de um Fundo de Aposentadoria Privada.
Como
se trata de matéria que diz respeito à receita/despesa pública, depende
de Lei de iniciativa exclusiva do Chefe do Poder Executivo(arts. 165 e
167 da Constituição da República).
E
o § 6º do art 150 da Constituição da República, nela introduzida pela
EC 3, de 1993, deixa bem claro que qualquer isenção ou subsídio no campo
tributário só pode ser concedido por Lei específica.
Data maxima venia dos
d. Desembargadores do TRF4R, signatários dos julgados acima
transcritos, dar à Lei interpretação excessivamente ampla, enquadrando
na regra legal de isenção fato que não foi, claramente, por ela
abrangido, fere fundamente mencionadas regras constitucionais e,
respectivamente, invade competência exclusiva do Chefe do Poder
Executivo e contraria o princípio da legalidade, também aplicável às
isenções.
Como
são enormes as responsabilidades orçamentárias do Poder Executivo, o
Legislador Constituinte o cercou de tais garantias que, data maxima venia, não podem ser rompidas pelo Poder Judiciário, a título de interpretação de Leis, ainda que de cunho social.
2.3
- A Autora está em gozo do benefício da Justiça Gratuita. Deu à causa o
valor de R$ 4.800,00, na petição inicial originária, acostada sob
identificador nº 4058300.3202407.
Não obstante a sua mencionada situação processual, haverá de ser
condenada nas verbas de sucumbência, ficando a respectiva cobrança
submetida à condição suspensiva do § 3º do art. 98 do vigente Código de
Processo Civil. E, à luz do § 2º do art. 85 desse mesmo diploma
processual, considerando que se trata de matéria que não exigiu muito
esforço dos Patronos da UNIÃO, tenho que a verba honorária deva ser
fixada no mínimo legal.
3. Dispositivo
Posto
isso, julgo improcedentes os pedidos desta ação e condeno a Autora nas
custas processuais e em verba honorária que, à luz do § 2º do art. 85 do
vigente Código de Processo Civil, arbitro em 10% do valor da causa,
indicado no valor de R$ 4.800,00, valor esse que será
atualizado(correção monetária e juros de mora)pelos índices e na forma
do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal quando da efetiva
cobrança, ficando a cobrança dessas verbas de sucumbência submetida à
condição suspensiva do § 3º do art. 98 do mencionado diploma processual,
pelo prazo de cinco anos nele fixado, porque a Autora está em gozo da
Assistência Judiciária.
Outrossim, dou o processo por extinto, com resolução do mérito(art. 487, I, CPC).
Registre-se. Intimem-se.
Recife, 30 de janeiro de 2018
Francisco Alves dos Santos Jr.
Juiz Federal, 2a Vara-PE
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