Por Francisco Alves dos Santos Jr.
A ANATEL também é obrigada a observar os princípios constitucionais da celeridade, efetividade e duração razoável do processo, concretizados na Lei Geral do Processo Administrativo, sob pena de pagar multa a favor da Empresa de Comunicação prejudicada.
É esse o assunto que segue.
Boa leitura.
PROCESSO Nº: 0805961-48.2014.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTORA: T DO A LTDA - ME
ADVOGADO: H V DE A
RÉ: AGENCIA NACIONAL DE TELECOMUNICACOES - ANATEL 2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL
AUTORA: T DO A LTDA - ME
ADVOGADO: H V DE A
RÉ: AGENCIA NACIONAL DE TELECOMUNICACOES - ANATEL 2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL
Sentença tipo A
Ementa: - DIREITO ADMINISTRATIVO. COMUNICAÇÕES. LICENÇA DA ANATEL. DEMORA. NÃO CABIMENTO. PRAZO LEGAIS.-A ANATEL não pode alongar o tempo que lhe aprouver para tomar decisões sobre licença de funcionamento e mudança de funcionamento de Empresas de Comunicação, porque tem que seguir as regras de tempo da Lei Geral de Processos Administrativos, caso não haja prazo em Lei Específica, regras legais essas que têm respaldo nos princípios constitucionais da celeridade, eficiência e duração razoável do processo.
-Ratificação da antecipação da tutela, tornada definitiva.
-Procedência.Vistos, etc.
1. Breve Relatório
T DO A LTDA - ME, pessoa jurídica qualificada na Inicial, ajuizou a
presente AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE FAZER C/C PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DOS
EFEITOS DA TUTELA, pelo rito ordinário, contra a AGENCIA NACIONAL DE TELECOMUNICACOES - ANATEL.
Aduziu, em síntese, que: seria detentora da permissão para exploração
do serviço de radiodifusão sonora em frequência modulada na localidade
de Igarassu/PE; no dia 22 de novembro de 2013 a autora teria protocolado
junto a ANATEL - ER 06, um pedido para mudança de localização da
estação transmissora (protocolo 53532.003279/2013); os engenheiros do
escritório regional em Pernambuco da ré analisaram o pleito rapidamente,
tendo emitido o Ofício n. 2898/2013-GR06R/GR06-Anatel em 23/12/2013,
informando que o requerimento fora vinculado ao Processo
53000.005955/2012; ao mesmo tempo requereram que a entidade pleiteasse a
alteração no Plano Básico de Canais FM, com inclusão de coordenadas
pré-fixadas na localidade desejada (Olinda/PE); no mesmo comunicado, a
ANATEL teria informado que após a apresentação desses documentos o
processo seria encaminhado à Gerência de Espectro, Órbita e Radiodifusão
(ORER) para análise; dessa maneira, o requerimento fora recebido pela
ORER em Brasília/DF no dia 10/03/2014, conforme extrato do processo
anexado; contudo, até os dias de hoje, o processo não fora movimentado. Teceu comentários sobre
o Princípio Constitucional da Celeridade Processual e Lei n. 9.784/99,
reforçando que, após a remessa do processo para a ORER, não teria havido
nenhuma movimentação, passados mais de de 7 (sete) meses. Transcreveu
jurisprudência. Pugnou, ao final, pela antecipação dos efeitos da
tutela, no sentido de determinar que a ANATEL conclua o Processo
53532.003279/2013, vinculado ao Processo 53500.005955/2012, no prazo
máximo de 15 (quinze) dias, sob pena de multa diária arbitrada por este
Juízo. Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e
documentos.
Em 20/10/14, decisão deferindo o pleito liminar.
Em
18/02/15, a ANATEL apresentou Contestação. Suscitou, preliminarmente,
carência de ação/falta de interesse de agir, ante a falta de objeto. No
mérito, defendeu inexistir a alegada mora administrativa. Teceu outros
comentários. Pugnou, ao final, pela improcedência dos pedidos
Réplica apresentada em 03/03/2015.
É o relatório, no essencial.
Passo a fundamentar e a decidir.
2. Fundamentação
2.1. Da alegação de perda de objeto
Preliminarmente,
defendeu a ANATEL que restaria configurada a falta de interesse de agir
por perda superveniente do objeto, ante a conclusão dos processos
administrativos noticiados nos autos.
De
fato, a satisfação da pretensão da Autora, após o ajuizamento desta
ação, não há que se falar em perda de objeto/falta de interesse de agir
superveniente, primeiro porque a Ré só cumpriu o seu dever legal em face
da decisão deste juízo que, liminarmente, determinou que assim
procedesse e segundo, porque o feito ainda depende de um pronunciamento
judicial exauriente, via sentença de mérito, único ato judicial que tem a
faculdade de tornar a liminar definitiva.
Realmente,
o cumprimento da medida liminar deferida e a conseqüente satisfação da
pretensão perseguida não afastam o direito de agir existente, uma vez
que o adimplemento ocorreu através da coerção judicial, fazendo-se
necessária a confirmação da liminar por sentença.
2.3. Do mérito propriamente dito.
Inexistindo
qualquer modificação substancial no quadro jurídico desde o instante do
deferimento da liminar, mantenho a decisão que a concedeu, cujo trecho
passo a transcrever:
"Numa
análise perfunctória, verifica-se, à luz da documentação acostada aos
autos, que, no dia 22 de novembro de 2013, a autora protocolou junto à
ANATEL-ER06 pedido para mudança de localização da estação transmissora
n. 53532.003279/2013.
De
fato, como alegado na Inicial, os engenheiros do escritório regional em
Pernambuco da ré analisaram o pleito da Autora, tendo emitido o ofício
2898/2013-GR06R/GR06-Anatel em 23/12/2013, no qual requereram que a
entidade pleiteasse a alteração no Plano Básico de Canais FM, com
inclusão de coordenadas pré-fixadas na localidade desejada (Olinda/PE).
No
mesmo comunicado da ANATEL, ela informou que após a apresentação desses
documentos o processo seria encaminhado à Gerência de Espectro, Órbita e
Radiodifusão (ORER) para análise.
De acordo com a documentação constante dos autos, vê-se que tal requerimento foi recebido pela ORER em Brasília/DF no dia 10/03/2014 e que não foi concluído desde então (Id. 4058300.660972).
Com
efeito, rezam os arts. 48 e 49 da Lei nº 9.784, de 29.01.1999, que
traça normas gerais sobre processo administrativo, no âmbito da
Administração Pública Federal:
"Art.
48. A Administração tem o dever de explicitamente emitir decisão nos
processos administrativos e sobre solicitações ou reclamações, em
matéria de sua competência.
Art.
49. Concluída a instrução de processo administrativo, a Administração
tem o prazo de até trinta dias para decidir, salvo prorrogação por igual
período expressamente motivada.".
Esses
dispositivos legais buscam dar concretização ao princípio da
eficiência, que foi constitucionalizado pela Emenda Constitucional nº
19, de 1998, que deu ao art. 37 da Constituição da República a seguinte
redação, verbis:
"Art.
37. A administração pública direta e indireta de qualquer dos Poderes
da União, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios obedecerá
aos princípios de legalidade, impessoalidade, moralidade, publicidade e
eficiência e, também, ao seguinte: (Redação dada pela Emenda
Constitucional nº 19, de 1998)"
Mencionados
temas, o tempo de duração razoável do processo e a celeridade, findaram
por passar a ser direitos individuais dos brasileiros, com a Emenda 45,
de 2004, que acrescentou inciso ao rol dos direitos e garantias
individuais dos brasileiros, assentados no art. 5º da Constituição da
República, com a seguinte redação:
"LXXVIII.
A todos, no âmbito judicial e administrativo, são assegurados a
razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua
tramitação.".
Extrai-se
do descrito na petição inicial que o Órgão Administrativo está
desrespeitando os regramentos constitucional e legal pertinentes, a não
ser que a ora Autora esteja omitindo o não cumprimento de alguma
pendência.
Corroborando tal entendimento, seguem os arestos abaixo colacionados que, mutatis mutandis, aplicam-se ao presente caso:
CONSTITUCIONAL.
ADMINISTRATIVO. RÁDIO COMUNITÁRIA. TRANSFERÊNCIA DIRETA DE OUTORGA.
NECESSIDADE DE AUTORIZAÇÃO GOVERNAMENTAL. DEMORA NO EXAME DO PEDIDO
ADMINISTRATIVO. FIXAÇÃO DE PRAZO PARA APRECIAÇÃO DO PEDIDO. IMPOSIÇÃO DE
MULTA. POSSIBILIDADE. ADOÇÃO DA TÉCNICA DA FUNDAMENTAÇÃO PER
RELATIONEM.
1.
Hipótese em que a demandante solicitou a transferência da sua outorga
para a Rádio FM Miramar de Salgueiro Ltda., em 18/06/2010, não tendo
obtido resposta do Ministério das Comunicações até a presente data, o
que violaria o princípio da razoável duração do processo.
2.
Reputa-se prejudicado o agravo retido, quando a questão nele argüida
confunde-se com o próprio mérito da lide, onde será analisada.
3.
Adoção da chamada fundamentação per relationem, após a devida análise
dos autos, tendo em vista que a compreensão deste Relator sobre a
questão litigiosa guarda perfeita sintonia com o entendimento esposado
pelo Juízo de Primeiro Grau, motivo pelo qual se transcreve, como razão
de decidir, nesta esfera recursal, a fundamentação da sentença (itens 4
a 7 desta ementa).
4.
"Com efeito, a Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça, quando do
julgamento do REsp 1123343, Rel. Ministro Castro Meira, DJe 15/10/2010,
consolidou o entendimento no sentido de que o Poder Judiciário não pode
se imiscuir no âmbito da discricionariedade da Administração Pública
para deferir pedido de funcionamento de rádio comunitária. Ao Judiciário
cabe, tão-somente, verificando que houve atraso da Administração na
análise do pedido administrativo de autorização para funcionamento,
compeli-la a sanar a mora em prazo razoável".
5.
"Em que pese o caso em exame versar sobre uma transferência de outorga
entre duas rádios, e não propriamente sobre deferimento de pedido de
funcionamento, verifico que se trata, igualmente, de situação na qual a
mora do Poder Público representa prejuízo ao funcionamento de uma rádio,
qual seja, a Rádio FM Miramar de Salgueiro Ltda., que aguarda receber a
outorga atualmente pertencente à Executiva FM Ltda".
6.
"In casu, resta evidenciada a caracterização da mora administrativa,
porquanto a apresentação do pedido administrativo de transferência de
outorga se deu em 18/06/2010, através do Processo Administrativo n°
53000.031259/2010-49, não tendo a demandante obtido qualquer resposta da
Administração até a presente data, consoante observo da documentação
acostada aos autos".
7.
"Frise-se que a excessiva demora da Administração Pública à
manifestação no Processo Administrativo n° 53000.031259/2010-49, afronta
os princípios constitucionais da razoável duração do processo e da
eficiência administrativa, bem como viola os interesses da comunidade em
ser beneficiada pelo serviço de radiodifusão".
8.
Nos termos do art. 461, parágrafo 4º, do CPC, é cabível a imposição de
multa diária ao réu por descumprimento de obrigação de fazer ou não
fazer, fixando-lhe prazo razoável para o cumprimento do preceito. A
multa diária, ou astreinte, objetiva compelir o devedor a satisfazer uma
obrigação que deveria ser cumprida de maneira espontânea. É uma medida
legítima de coação, sem natureza de punição.
9.
O STJ já uniformizou o entendimento no sentido da possibilidade de
cominação de astreinte contra a Fazenda Pública em caso de
descumprimento de decisão judicial que prescreva obrigação de fazer ou
não fazer. Precedentes: Resp 987280/SP, DJ de 20/05/09; AgRg no Ag
1040411/RS, DJ de 19/12/2008; REsp 1067211/RS, DJ de 23/10/2008; REsp
1063902/SC, DJ de 01/09/2008 e AgRg no Ag 1021240/RJ, DJ de 23/06/2008.
10.
Na hipótese, afigura-se razoável a quantia fixada de R$ 100,00 (cem
reais), por dia de atraso no cumprimento da obrigação de fazer
(apreciação do pedido administrativo). Reduzir tal valor, ou até mesmo,
declará-lo inexistente, quando fixado dentro de critérios proporcionais,
seria um meio de estimular o descumprimento de decisões judiciais,
premiando aqueles que relutam em cumprir com suas obrigações.
11. Agravo retido prejudicado. Remessa oficial e apelação improvidas.
(PJE:
08000477120124058300, APELREEX/PE, RELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL
FRANCISCO CAVALCANTI, Primeira Turma, JULGAMENTO: 13/02/2014)
MANDADO
DE SEGURANÇA. ANISTIA. INTERPOSIÇÃO DE RECURSO ADMINISTRATIVO. DEMORA
NA RESPOSTA. PRAZO RAZOÁVEL PARA APRECIAÇÃO. INCIDÊNCIA DO PRINCÍPIO
CONSTITUCIONAL DA EFICIÊNCIA E DA GARANTIA À DURAÇÃO RAZOÁVEL DO
PROCESSO. OMISSÃO CONFIGURADA. APLICAÇÃO SUBSIDIÁRIA DO ART. 49 DA LEI
N. 9.784/99. 1. Concedida a anistia política, encontra-se pendente de
solução, por mais de quatro anos, recurso administrativo que busca a
indenização com proventos de Capitão-de-mar-e Guerra. 2. Em que pesem o
grande número de pedidos feitos ao Ministro da Justiça e o fato dos
membros da Comissão de Anistia, seu órgão de assessoramento, atuarem pro
bono, aqueles que se consideram atingidos no período de 18 de setembro
de 1946 a 5 de outubro de 1988, por motivação exclusivamente política,
não podem ficar aguardando, indefinidamente, a apreciação do seu pedido,
sem expectativa de solução em prazo razoável. 3. Não é lícito à
Administração Pública prorrogar indefinidamente a duração de seus
processos, pois é direito do administrado ter seus requerimentos
apreciados em tempo razoável, ex vi dos arts. 5º,LXXIII, da Constituição
Federal e 2º da Lei n. 9.784/99. 4. O prazo a ser fixado para o
julgamento do pedido de anistia pela autoridade coatora, na linha da
orientação firmada por esta Terceira Seção, deve ser de 30 (trinta)
dias, prorrogáveis por igual período, desde que expressamente motivado,
conforme estabelecido no art. 49 da Lei 9.784/99, dispositivo aqui
aplicado de forma subsidiária. 5. Segurança concedida.(MS 200801110404,
JORGE MUSSI, STJ - TERCEIRA SEÇÃO, 26/06/2009)
Sendo assim, reputo presente a verssimilhança das alegações.
O periculum in mora
está igualmente configurado, eis que a afronta os princípios
constitucionais acima descritos está violando os interesses da
comunidade em ser beneficiada pelo serviço de radiodifusão.
3. Conclusão
Posto isso:
a)
caso não haja nenhuma pendência a ser cumprida pela ora Autora perante o
órgão próprio, que tem o poder-dever de decidir quanto ao pleito
submetido à sua apreciação, defiro o pedido de antecipação da tutela e
determino que a Ré, tome providências urgentes para que, no prazo máximo
de 15 (quinze) dias, decida quanto ao mencionado pleito da ora autora,
sob pena de pagamento de multa mensal, a favor da ora Autora, no valor
de R$ 1.000,00 (mil reais), sem prejuízo da responsabilização civil,
administrativa e criminal do dirigente/servidor que der azo ao pagamento
dessa multa;
b)
cite-se a Ré, na forma e para os fins legais, e a intime da decisão
supra, para dar-lhe efetivo cumprimento, sob as penas acima consignadas.
P. I.".
Diante de tal contexto, a decretação de procedência dos pedidos é medida que se impõe.
Constato
que o I. Patrono da Autora desenvolveu o seu trabalho com muito esforço
e dedicação, por isso merece ser remunerado condignamente, com
honorários arbitrados à lua dos dispositivos legais indicados na
conclusão infra.
3. Conclusão
Posto isso, rejeito a preliminar suscitada, ratifico a decisão antecipatória da tutela, acima transcrita, julgo procedentes os pedidos formulados e torno definitiva mencionada decisão para todos os fins e direito.
Condeno
a Ré ao pagamento de honorários advocatícios que, considerando o
esforço e dedicação do I.Patrono da Parte Autora e à luz dos §§ 3º e 4º
do art. 20 do vigente Código de Processo Civil, arbitro em R$
5.000,00(cinco mil reais), atualizados(correção monetária)a partir do
mês seguinte ao da publicação desta sentença, pelos índices do manual de
cálculos do Conselho da Justiça Federal - CJF, e acrescidos de juros de
mora, à razão de 0,5%(meio por cento)ao mês, incidentes sobre o valor
já monetariamente corrigido, mas incidentes somente a partir da data em
que a ANATEL venha a ser citada para os fins do art. 730 do vigente
Código de Processo Civil ou regra semelhante que venha a substituir
mencionado artigo, vigente na data do início da execução.
Publique-se. Registre-se. Intimem-se.
Recife, 07 de dezembro de 2015.
Francisco Alves dos Santos Jr.
Juiz Federal, 2a Vara-PE.
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