Por Francisco Alves dos Santos Jr

Autor: J A F F E OUTRO
Adv.: L de S L – OAB/PE ...
2. A mensuração do valor da
indenização é sempre um calcanhar de
Aquiles para o Magistrado, pois não há como se mensurar o susto de uma
operação policial, o constrangimento de ser confundido com pessoa criminosa ou
ligada a criminosos, e etc.
A UNIÃO recorreu contra a
sentença supra, que foi mantida pela Quarta Turma do Tribunal Regional Federal
da 5ª Região, em acórdão de 28.02.2012, tendo por Relatadora a então
Desembargadora Federal Margarida Cantarelli, tendo apenas reduzido a verba
honorária sucumbencial de 20% para 10%, tendo o respectivo acórdão sido
disponibilizado no Diário da Justiça Eletrônica - DJE TRF5 nº 44.0/2012, em
01.03.2012 e publicado no dia 02.03.2012.
A simples troca do número de um apartamento implicou num lamentável(embora escusável)erro da polícia federal, numa operação policial, erro esse que causou danos morais a um casal de idosos, os quais, na busca de uma indenização, processaram judicialmente a UNIÃO e foram vencedores em todas as instâncias do Judiciário Federal.
Boa Leitura.

PODER
JUDICIÁRIO
JUSTIÇA
FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção
Judiciária de Pernambuco
2ª VARA
Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 0010254-36.2010.4.05.8300 - Classe 29 – Ação Ordinária
Autor: J A F F E OUTRO
Adv.: L de S L – OAB/PE ...
Réu: UNIÃO FEDERAL
Advogado(a) da União
Registro nº ...........................................
Certifico que registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ........./.........../2011
Sentença tipo A
EMENTA:-
DANOS MORAIS. INDENIZAÇÃO. ERRO POLICIAL. BUSCA E APREENSÃO. IDOSOS.
Busca e
apreensão criminal, feita no apartamento dos Autores, por erro do setor de
investigação da Polícia Federal, causando grande susto e constrangimento aos
Autores, pessoas idosas, caracteriza-se como dano moral, indenizável
financeiramente.
Procedência.
VISTOS, ETC.
J A F F e E E F propuseram, em
30.07.2010, a presente “Ação de Indenização por Danos Morais”, contra a União,
requerendo preliminarmente os benefícios da justiça gratuita. Aduziram, em
síntese, que, no dia 24.11.2009, por volta das 6 horas da manhã, teriam sido
surpreendidos com uma “batida” policial, realizada por policiais da Polícia
Federal, com vistas a verificar a ligação dos Autores com o Capitão Marco
Vinícius Barros dos Santos, da Polícia Militar de Pernambuco; que seu
apartamento teria sido invadido por seis homens fortemente armados com
metralhadoras e escopetas, os quais teriam vasculhado toda a casa; que referidos
policiais estariam munidos de um mandado de busca e apreensão; que, ao final da
ação policial, o Delegado, que acompanhava os trabalhos policiais, concluíra
que teria sido um engano, retirando-se com sua equipe sem maiores explicações;
que, após forte crise nervosa e hipertensiva, a 2ª Demandante teria sido
removida para a emergência no Hospital Unicordis; que o 1º Demandante também
sofrido forte impacto emocional; que a notícia da dita ação policial teria se
disseminado por todo o condomínio, pois muitos vizinhos teriam visto a
abordagem policial. Discorreram sobre a responsabilidade objetiva do Estado
pelos danos causados por seus agentes no exercício da função pública. Alegaram
que teriam sofrido dano moral, o qual deveria ser indenizado. Teceram outros
comentários. Transcreveram algumas decisões judiciais. Ao final, requereram: a
citação da União; a requisição de cópia do procedimento inquisitório que
culminara na expedição do aludido mandado de busca e apreensão dirigido aos
Autores e à sua residência; a procedência dos pedidos, condenando a União ao
pagamento de indenização por danos morais; a condenação da União ao pagamento
de honorários advocatícios. Fizeram protestos de estilo. Deram valor à causa.
Pediram deferimento. Instruíram a Inicial com instrumento de procuração,
documentos e cd/dvd (fls. 16/41).
Concedidos os benefícios da justiça gratuita (fl. 42).
Citada, a União apresentou Contestação, às fls. 43/66, argumentando
que o mandado de busca e apreensão questionado pelos Autores teria sido obtido
nos autos do inquérito policial instaurado para a apuração do suposto seqüestro
do Capital da PM, Marcos Vinícius Barros dos Santos, sua esposa e filha,
resultando a subtração e entrega, a terceiros, pela suposta vítima, de 62 armas
de grosso calibre de várias unidades militares da Polícia Militar de
Pernambuco; que, em 24.11.2009, teria sido deflagrada uma operação, resultando na prisão de seis
pessoas; que todos os endereços dos investigados constantes da representação e
dos vários mandados teriam sido obtidos e repassados às autoridades policiais
pela Unidade de Inteligência Policial e pelo núcleo de análise das
interceptações telefônicas autorizadas judicialmente; que, após tomar
conhecimento da presente demanda, foi determinado à Unidade de Inteligência e
ao Núcleo de Análises que efetuassem novas leituras de todas as informações e escuta de todas as
gravações existentes, para confirmar o endereço do investigado Marcos Vinícius
Barros dos Santos; que, após nova análise das gravações telefônicas, teria sido
verificado que tal investigado se utilizaria de um apartamento no edifício Baía
de Córdoba; que, todavia, o apartamento seria 1701 e não 701; que não estariam
presentes os pressupostos para caracterização da responsabilidade civil do
Estado; que o princípio da responsabilidade objetiva não se revestiria de
caráter absoluta; que, abstraindo-se o equívoco do mandado judicial, o simples
fato de alguém sofrer investigação policial não caracterizaria ato suscetível
de gerar o dever de indenizar; que não teria havido desrespeito ou humilhação
por parte dos agentes da Polícia Federal; que não teria havido exposição
constrangedora dos Autores, porquanto a Polícia teria agido com discrição; que
a residência dos Autores não teria sido remexida além do necessário; que não
teria havido limitação de direitos individuais dos Autores; que não teria sido
comprovada a ocorrência de danos materiais e morais. Citou algumas decisões
judiciais. Ao final, requereu fosse o pedido formulado na Inicial julgado
improcedente. Protestou o de costume. Pediu deferimento. Juntou cópia de
documentos (fls. 67/89).
Os Autores apresentaram Réplica, às fls. 94/100, rebatendo os
argumentos da Defesa e reiterando os termos da Inicial.
Designada a realização de audiência de instrução
e julgamento na decisão de fl. 101.
Audiência de conciliação realizada (128/130-vº).
Vieram os autos conclusos para julgamento.
É o Relatório.
Decido.
1. No presente caso, não há muito a se
teorizar: a polícia federal de
Pernambuco fez um excelente trabalho, resolvendo, em pouquíssimo tempo, o crime
conhecido como ‘o roubo das armas’, praticados por um Capitão da própria
polícia militar de Pernambuco, o Sr. Marcos Vinícius Barros dos Santos.
E praticou todas as diligências mediante observação
do princípio do devido processo legal.
No entanto, essa gloriosa polícia federal cometeu
um pequeno engano, no decorrer das investigações, trocou o número do apartamento de uma
determinada busca e apreensão, que seria o apartamento nº 1.701, pelo nº 701, ambos na Av. Santos Dumont,
1.083, no Edifício Baía de Córdoba, Aflitos, Recife-PE, bairro de classe acima
da classe média e abaixo da classe alta da capital pernambucana, realizada nas
primeiras horas do dia 24 de novembro de 2009.
E o magistrado federal só deu a autorização, para
busca e apreensão, no apartamento dos ora Autores, porque a polícia federal
repassou-lhe o número do apartamento errado, pois referida busca deveria ter
sido efetuada no apartamento nº 1.701 e não no apartamento nº 701, onde
residiam e residem os Autores.
Houve, portanto, um ilícito, pois a Lei não
autoriza a busca e apreensão na residência de pessoas que não têm nenhuma
ligação com o ato criminoso.
Tratou-se, obviamente, de um erro humano, mas que
concretizou um ilícito e gerou um dano moral aos Autores, pois, de pessoas
idôneas, passaram a ser, indevidamente, vistas como pessoas inidôneas, sendo
acordadas, nas primeiras horas do dia em que os fatos ocorreram, por um grupo
de policiais federais, portanto armas pesadas(pelo menos duas metralhadoras,
conforme depoimento de um dos policiais, v. 129vº), como se bandidos fossem, ou, no mínino, guardadores de
instrumentos de criminosos, com ordem
judicial para vistoria e busca e apreensão no seu imóvel residencial, com todos
os transtornos daí advindos, além do grande susto, pois se sabe que, nessas
horas, as batidas na porta são fortes e são sempre seguidas da ameaça de que,
caso a porta não seja imediatamente aberta, será arrombada.
E o Sr. Escrivão de Polícia Federal, que participou
da operação policial, atesta que assim de fato ocorreu:
“...; que alguém de dentro do apartamento disse que não iria abrir a
porta; (....); que depois dessa negativa houve a ameaça, por parte do Delegado,
de arrombamento da porta do apartamento; que então abriram a porta e os
policiais constataram que se tratava de um casal de idosos”.(Fl. 129vº).
E
o engano, quanto ao número do apartamento, foi atestado pela própria Polícia
Federal, em documento que instrui a contestação, especificamente à fl. 76 dos
autos, verbis:
“..., foi determinado por esta autoridade
policial à Unidade de Inteligência e ao Núcleo de Análises que efetuassem novas
leituras de todas as informações e escutas de todas as gravações existentes que
pudessem confirmar o endereço Av. Santos Dumont, 1083, apto 701, Edf. Baía
de Córdoba, Aflitos, Recife-PE, como sendo um dos endereços do investigado
Marcos Vinícius Barros dos Santos.”.(Grifo do original).
No entanto, continua a
mesma Autoridade Policial:
“20) após analisar novamente as gravações telefônicas, confirmamos que
o investigado Marcos Vinicíus Barros dos Santos se utilizava de um apartamento
no Edf. Baía de Córdoba, porém o número do apartamento seria 1701 e não 701;”.(Negrito e
grifo do original).
Ademais, os
Autores são pessoas idosas: ele, nascido em 24.03.1935; ela, nascida em
13.06.1951, conforme documento de fl. 30.
E por conta da idade e do inusitado da situação, a
Autora, D. Eneida, ficou muito nervosa e precisou ser socorrida por uma
vizinha, que findou por figurar na diligência como testemunha e que, em
audiência judicial, declarou:
“...;
que, posteriormente, tocaram na capainha do apartamento da ora Depoente; que
era Dona Eneida, escoltada por policiais federais, que estava muito nervosa e
pediu para que a Depoente ficasse com ela; que um dos policiais se dirigiu à
ora Depoente que ela realmente ficasse como testemunha; (...); que Dona Eneida
estava muito nervosa e a ora Depoente ficou preocupada com Sr. Ferraz por ser
de idade mais avançada; (...); que como a ora Autora, a Sra. Eneida,
estava muito nervosa, a ora Depoente providenciou água para ela beber”.
(Negritei).
Os documentos médicos, juntados às fls.
25-28, também atestam alteração na saúde dos Autores.
E os Autores, no prédio em que moravam, passaram
pelo constrangimento ante os demais moradores que, por curiosidade natural,
queriam saber o motivo pelo qual a casa do “Seu Ferraz” fora submetida a uma
“batida policial”.
E essa curiosidade natural foi atestada pelo Porteiro do Edifício:
“...; que muitas pessoas do
prédio ligaram para a portaria, perguntando o que estava acontecendo, se aquilo
era uma guerra; que isso aconteceu durante e após a operação; que até pessoas
de fora do prédio também ligaram, perguntando o que tinha acontecido; que
algumas pessoas até se admiraram pelo fato de que a operação tivesse sido feita
no apartamento do ‘Seu Ferraz’”.
Lamentavelmente,
como a Polícia Federal é também feita de homens, falha como a acima narrada
acontece, quer pelo stress do dia a
dia, mormente de policiais em ação, envolvidos em crime tão sério como o que
deu origem à operação em questão, quer pelo costumeiro excesso de trabalho e
reduzido contingente de policiais, pois, como é público e notório, porque
noticiado por toda a imprensa do País, houve violentos cortes nas verbas
orçamentárias da Polícia Federal brasileira, de forma referida falha não
desmerece esse Órgão Policial, como se dá a entender na petição inicial.
São fatos que devem ser evitados, mas,
infelizmente, às vezes, acontecem, e quando acontecem, por óbvio, em face do
nosso ordenamento jurídico, sobretudo constitucional(§ 6º do art. 37 da Constituição
da República), as vítimas têm que ser indenizadas.
Mas, para casos
como o ora em debate, no qual, felizmente, não houve perda de vida, nem dano
físico-estético, mas apenas o constrangimento, o susto, o ser apontado pela
vizinhança como o casal em que a casa foi submetida a uma operação policial,
suspeito de prática de ato criminoso, há precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça para casos semelhantes, nos quais
se fixou, para cada membro da casa, a quantia indenizatória de R$18.000,00 ,
valor esse que me parece razoável para a reparação dos danos morais sofridos
pelos Autores.
O E. Superior Tribunal de Justiça tem julgado orientando como se
deve chegar ao valor desse tipo de indenização, verbis:
1. (...).
2. (...).
3. (...).
4. Na primeira etapa, deve-se estabelecer um valor
básico para a indenização, considerando o interesse jurídico lesado, com base
em grupo de precedentes jurisprudenciais que apreciaram casos semelhantes.
5. Na segunda etapa, devem ser
consideradas as circunstâncias do caso, para fixação definitiva do valor da
indenização, tendendo a determinação legal de arbitramento equitativo pelo
juiz.”. [1]
Não
encontrei precedentes idênticos ao presente caso, nem sequer semelhantes.
Mas levando em consideração as
circunstâncias descritas, o fato de os Autores serem pessoas idosas, antigos
moradores do prédio, bem conceituados, e de padrão sócio-financeiro, pelo
bairro em que residem, um pouco acima da classe média, tenho por razoável que
cada um deva receber, a título de indenização por danos morais, a quantia de R$18.000,00(dezoito
mil reais), atualizados a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação,
pelos índices de correção monetária do
Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal e acrescidos de juros
de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados estes da data
da citação(art. 730 do CPC)da execução desta Sentença, mas incidentes sobre o
valor já monetariamente corrigido.
Conclusão
POSTO ISSO, julgo procedentes
os pedidos desta ação e condeno a UNIÃO a indenizar os Autores, pelos danos morais que lhes
causou, na quantia de R$
18.000,00(dezoito mil reais), a cada um deles, atualizadas na forma acima
preconizada.
Outrossim, condeno a UNIÃO em verba honorária que, considerando o esforço e
dedicação do Patrono do Autor, Dr. Luciano de Souza Leão, arbitro em 15%(quinze
por cento)do valor total da condenação.
De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição.
P.R.I.
Recife, 07 de julho
de 2011.
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE
NOTAS IMPORTANTES
Contra esse acórdão, a UNIÃO opôs
embargos de declaração, que, por acórdão de 24.04.2012, foram providos, mas sem
alteração da conclusão condenatória do primeiro acórdão.
A UNIÃO ainda interpôs recurso
especial e recurso extraordinário, que foram contraarrazoados pela Parte
Autora.
O Presidente do TRF/5ªR, em
decisão de 16.08.2012, não admitiu o
recurso especial e, em decisão da mesma data, também não admitiu o recurso
extraordinário.
A UNIÃO interpôs dois agravos de
instrumentos contra referidas decisões, que sofreram contraminutas da Parte
Autora.
No STJ, a UNIÃO obteve uma
pequena vitória: o recurso especial foi conhecido e em parte provido, apenas
para que fica estabelecido que os juros de mora deveriam observar o
estabelecido no art. 1º-F da Lei nº 9.494, de 1997, com a redação dada pela Lei
nº 11.960, de 2009, no período posterior a 30.06.2009 e “que a correção
monetária da indenização por danos morais tenha início a partir da data do seu
arbitramento”. Decisão unitária do Ministro Relator SÉRGIO KUKINA, no Agravdo em Recurso Especial
nº 329.818-PE(2013/0110275-0), data de 18.12.2013, com certidão de nº 281451,
de código de segurança EABB.22E7.2BC.EBEB.
No STF, o Ministro TEORI ZAVASCKI
negou seguimento ao recurso extraordinário da UNIÃO, ARE 777.221/PE, decisão de
03.02.2014, documento MP nº 2.200.2/200.2/2001 de 24.08.2001.
.
.
[1] RECURSO ESPECIAL Nº 959.780 - ES
(2007/0055491-9)
RELATOR
: MINISTRO PAULO DE TARSO SANSEVERINO
RECORRENTE
: JOSÉ CASTELLO LOYOLA
ADVOGADO
: CÁSSIO DRUMOND MAGALHÃES E OUTRO(S)
RECORRIDO
: AFONSO MARCHETTI
ADVOGADO : ANTONIO BARBOSA
Brasília (DF), 26 de abril de 2011(Data do
Julgamento)
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