segunda-feira, 17 de junho de 2013

ENSINO SUPERIOR PRIVADO. TAXAS QUE NÃO PODEM SER COBRADAS DOS ALUNOS.


 
Por Francisco Alves dos Santos Jr

   Segue decisão, lançada nos autos de uma ação civil pública, proposta pelo Ministério Público Federal de Pernambuco contra a determinada Entidade privada de Ensino Superior, buscando proibir esta de cobrar dos seus alunos determinadas taxas não previstas em Lei e cujos respectivos serviços já têm seus custos cobertos pelas mensalidades ou semestralidades pagas pelos alunos.
   Na decisão, indica-se também o que pode ser cobrado à parte, além das mensalidades ou semestralidades.
    Boa leitura!



PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª  REGIÃO

SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO

2ª VARA

 

Processo nº 0005792-31.2013.4.05.8300

Classe:    1 AÇÃO CIVIL PÚBLICA

AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL

RÉU: A V I DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA

 

C O N C L U S Ã O

 

Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o) M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR

 

Recife, 13/06/2013

 

Encarregado(a) do Setor

 

 

D E C I S Ã O

 

1-                   Relatório

 

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ingressou com esta “AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR” em face da A V DO IDE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE J L F DE CIÊNCIAS APLICADAS). Alegou, em síntese, que em 13.03.2013, teria sido instaurado na Procuradoria da República em Pernambuco o Procedimento Administrativo nº 1.26.000.000766/2013-55, com a finalidade de apurar possíveis irregularidades cometidas pela Instituição de Ensino Superior Faculdade J L F de Ciências Aplicadas, no que diz respeito à cobrança de taxas para expedição de documentos escolares, assim como para a realização de outras medidas inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada; que a Faculdade José Lacerda Filho de Ciências Aplicadas teria confirmado que, de fato, cobraria as taxas internas de seus alunos, contudo, teria ressaltado que a cobrança estaria prevista no Contrato de Prestação de Serviços Educacionais. Sustentou a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público Federal e o cabimento da presente ação civil pública, assim como a competência da Justiça Federal para apreciar e julgar o presente feito, e aduziu que a natureza de ente privado, por si só, não seria hábil para excluir a demandada da incidência das normas constitucionais e legais, tampouco o fundamento de que a livre iniciativa lhe permitiria escapar dos regramentos impostos pelas normas legais da educação nacional, cujo cumprimento seria condição para que o serviço educacional fosse prestado no âmbito da iniciativa privada; que a cobrança de taxas para a emissão de documentos acadêmicos, assim como para a realização de outros serviços também inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada, é pratica que não se coadunaria com a legislação vigente; que os serviços prestados por uma Instituição de Ensino Superior – IES, via de regra, seriam remunerados pelas anuidades, semestralidades ou mensalidades, e deveriam estar obrigatoriamente inclusos na referida contraprestação todos os serviços inerentes ao objetivo da prestação escolar; que a Lei nº 9.870/99 teria revogado a Lei nº 8.170/91, que preveria a existência e o modo de fixação dos encargos educacionais nos estabelecimentos particulares de ensino de nível pré-escolar, fundamental, médio e superior, e estipulava a forma de reajuste, e autorizava a intervenção da Delegacia Regional do MEC; que, se a nova lei revogou a anterior e passou a prever, como forma de remuneração das IESs apenas as anuidades e a semestralidades, seria evidente o propósito do legislador de extinguir os encargos educacionais antes existentes; que, no mesmo sentido estariam inclinadas as Resoluções nºs 01/83 e 03/89, editadas pelo extinto Conselho Federal de Educação, que, ao tratar dos encargos pagos aos alunos às IESs, preconizariam que a anuidade/mensalidade escolar constituiria a contraprestação pecuniária correspondente à educação ministrada e à prestação de serviço a ela diretamente vinculados, enquanto a taxa escolar remuneraria, a preço de custo, apenas os serviços extraordinários efetivamente prestados pelo corpo discente; que apesar de tais resoluções terem sido revogadas pelo Conselho Nacional de Educação, permaneceriam íntegros os balizamentos postos à disciplina das taxas cobradas pelas IESs; que seria inconstitucional a cobrança de taxa para emissão de certidões que visam esclarecer situações de interesse pessoal; que também seria inadequada a cobrança de taxa para prestação de outros serviços inerentes à prestação educacional, como a realização de segunda chamada, quando motivada pro fatores excepcionais (saúde, por exemplo), que impediram o aluno de se submeter ao exame regular; que o mesmo raciocínio seria aplicável à revisão de prova, que constituiria um direito do aluno e seria inerente à prestação do serviço de ensino; que a cobrança de taxa pela transferência do aluno da IES seria expressamente vedada pela Portaria nº 230/2007 do MEC; que os preços cobrados seriam desproporcionais ao serviço prestado. Invocou o Código de Defesa do Consumidor e acrescentou que a previsão contratual de cobrança das taxas referidas seria nula de pleno direito. Transcreveu ementas de decisões judiciais. Teceu outros comentários, e requereu a concessão da medida liminar para que seja determinado à Ré que: suspenda imediatamente a cobrança de qualquer tipo de prestação pecuniária, como condição para emissão de documentos escolares, como ementa de disciplina, declaração de vínculo, histórico escolar, certidão de notas, declaração de conclusão de curso, declaração de regime de aprovação, declaração de frequência, declaração de aprovação no vestibular, declaração de horário de prova, declaração de quitação de mensalidades, dentre outros documentos que constituem decorrência lógica da prestação educacional, assim como para a realização de outros serviços também inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada, tais como realização de segunda chamada, revisão de prova, dentre outros. A petição inicial veio acompanhada de duas pastas: uma pasta da cor amarela contendo o Inquérito Civil nº 018/2011 (Peças de Informação) e a outra pasta da cor branca contendo o IC nº 018/2011.

 

2-                   Fundamentação

 

2.1) O Ministério Público Federal pretende compelir a A V I DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE J L F DE CIÊNCIAS APLICADAS), a cumprir obrigação de não fazer, consistente na abstenção de cobrança de taxas de seus discentes, a exemplo dos valores exigidos para a expedição de declaração de conclusão de curso, histórico escolar, revisão de prova, e outros que constituam decorrência lógica da prestação educacional.

 

2.2) A Resolução nº 01/83 e também a Resolução nº 03/89, ambas do ora extinto Conselho Federal de Educação (atual Conselho Nacional de Educação), evocadas na Petição Inicial desta ACP, definem os encargos educacionais do corpo discente das Instituições de Ensino Superior, nos seguintes termos:

 

Resolução nº 01, de 1983:

 

Art. 2º. Constituem encargos educacionais de responsabilidade do corpo discente:

I – a anuidade;

(...) § 1º. A anuidade escolar, desdobrada em 2 (duas) semestralidades, constitui a contraprestação pecuniária correspondente à educação ministrada e à prestação de serviços a ela diretamente vinculados, como a matrícula, estágios obrigatórios, utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino e uso coletivo, material destinado a provas e exames, 1ª via de documentos para fins de transferência, certificados ou diplomas (modelo oficial) de conclusão de curso, de identidade estudantil, de boletins de notas, de cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas.

 

     Resolução nº 03, de 1989:

 

Art. 4º. Constituem encargos educacionais de responsabilidade do corpo discente:

I – a mensalidade

II- a taxa

III- a contribuição.

 

 (...) § 1º. A mensalidade escolar constitui a contraprestação pecuniária, correspondente à educação ministrada e à prestação de serviços a ela diretamente vinculados como matrícula, estágios obrigatórios, utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino de uso coletivo, material destinado a provas e exames, de certificados de conclusão de cursos, de identidade estudantil, de boletins de notas, cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas.

 

Tratou também do assunto, mais recentemente, a Portaria Normativa nº 40[1], de 12 de dezembro de 2007, expedida pelo Ministro de Estado da Educação, no §4º do seu art. 32, proíbe que as IES exijam pagamento pela expedição e registro de diplomas e de certificados de conclusão de cursos, por considerar tais serviços incluídos nos serviços educacionais prestados pelas Instituições de Ensino, verbis:

 

§ 4º A expedição do diploma e histórico escolar final considera-se incluída nos serviços educacionais prestados pela  instituição, não ensejando a cobrança de qualquer valor, ressalvada a hipótese de apresentação decorativa, com a utilização de papel ou tratamento gráfico especiais, por opção do aluno.

 

Também recentemente, a Portaria nº 230[2], de 9 de março de 2007, expedida pelo  Ministro de Estado da Educação, no seu art. 2º, veda a cobrança de taxa de matrícula como condição para apreciação e pedidos de emissão de documentos de transferência para outras instituições.

 

Portanto, à luz das Resoluções nºs 01/83 e 03/89, ambas do ora extinto Conselho Federal de Educação, e, ainda, da Portaria Normativa nº 40 e da Portaria nº 230, estas duas últimas do Ministro de Estado da Educação, não podem ser cobrados do corpo discente da ASSOCIAÇÃO VALE IPOJUCA DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (Faculdade José Lacerda Filho de Ciências Aplicadas): o pagamento pela expedição de diploma, expedição de histórico escolar, utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino de uso coletivo, material destinado a provas e exames, 1ª via de documentos para fins de transferência de certificados ou diplomas (modelo oficial) de conclusão de curso, de identidade estudantil, de boletins de notas, de cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas, bem como a taxa de matrícula como condição para apreciação e pedidos de emissão de documentos de transferência para outras instituições.

 

Também não pode ser cobrada dos alunos taxa para realização de exames finais, porque esses exames fazem parte da regular atividade de qualquer estabelecimento de ensino, sendo, por isso, coberto pela mensalidade ou anuidade paga pelo Aluno.

    

2.3.)  As taxas e encargos que podem ser cobrados à margem da mensalidade ou anuidade encontram-se arrolados no § 2º do art. 4º da Resolução nº 03, de 1989, verbis:

 

§2º A taxa escolar remunera, a preços de custos, os serviços extraordinários efetivamente prestados ao corpo discente como a segunda chamada de provas e exames, declarações, e de outros documentos não incluídos no §1º deste artigo, atividades extracurriculares optativas, bem como os estudos de recuperação, adaptação e dependência prestados em horários especiais com remuneração específica para os professores. (G.N.)

     

Acresce o rol desse dispositivo também: os diplomas ou certificados expedidos em modelos não oficiais, decorrentes de escolha do aluno(tais como, em papeis decorativos, em coro de carneiro etc.) e as segundas vias dos documentos relacionados nos dispositivos transcritos no item 2.2 supra. 

        

2.4) Como visto, a mensalidade ou anuidade remunera os chamados serviços ordinários, mencionados no subitem 2.2 supra e a taxa escolar, os serviços extraordinários,  referidos no subitem 2.3 supra.

 

2.5) O E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região e, mais recentemente, o E. Tribunal Regional Federal da 1ª Região, ao apreciar pleitos semelhantes ao veiculado na Petição Inicial, com esteio nas Resoluções acima transcritas, reconheceram a ilegitimidade da cobrança da taxa de emissão de histórico escolar e do certificado de conclusão de curso pelas IES, sob o argumento principal de que tais documentos constituem serviços ordinários e vinculados à atividade educativa, já remunerados pelas mensalidades pagas pelos discentes, verbis: 

 

ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO SUPERIOR. EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DE TAXA PARA EMISSÃO DE HISTÓRICO ESCOLAR E ATESTADO DE CONCLUSÃO DE CURSO. ILEGITIMIDADE. 1. Revela-se ilegítima a cobrança por universidade de taxa para a expedição de histórico escolar e atestado de conclusão de curso. Inteligência das Resoluções 01/83 e 03/89, ambas do Conselho Federal de Educação. Precedentes desta Corte. 2. Remessa oficial desprovida. (REOMS 200738110048768, DESEMBARGADOR FEDERAL FAGUNDES DE DEUS, TRF1 - QUINTA TURMA, 09/07/2010)

 

ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. UNIVERSIDADE PRIVADA. HISTÓRICO ESCOLAR. TAXA. ISENÇÃO. PROCEDÊNCIA.- A despesa realizada pelo aluno com o histórico escolar está definida no parágrafo 1º do art. 4º da Resolução nº 3, de 3.10.1989 do Conselho Federal de Educação, como despesa ordinária, e como tal, incluída já no valor das mensalidades escolares cobradas pela Universidade.- Remessa oficial improvida. (REO 200283000105384, Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante, TRF5 - Primeira Turma, 15/10/2004)

 

Conclusão

 

Posto isso:

 

a) defiro, parcialmente, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, e determino que a ASSOCIAÇÃO VALE DO IPOJUCA DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE JOSÉ LACERDA FILHO DE CIÊNCIAS APLICADAS), ora Ré,  cobre dos seus Alunos apenas a anuidade ou as semestralidades, e que suspenda a cobrança de qualquer outro valor ou encargo, tais como valor para expedição de diploma no impresso e no modelo oficial, certidões em geral, inclusive a de conclusão de curso, revisão de prova ou exame, grade curricular, isenção de disciplina, conteúdo programático, guia de transferência, segunda chamada, provas finais e de quaisquer outros documentos ou serviços próprios de Estabelecimentos de Ensino Superior,  podendo ser cobrado, todavia, à parte, encargo ou valor, correspondente ao custo(entendendo-se como tal o total dos gastos que a Entidade de Ensino teve para adquiri-lo e para fornecê-lo), de diploma em impresso e/ou em modelo diverso do oficial(como em pele de carneiro, cartolina dourada,  etc.), a repetição de quaisquer documentos(segunda via) ou serviços, tanto dos  dados como exemplo ou a duplicidade de outros documentos ou serviços que não tenham sido arrolados entre os exemplos indicados e que sejam próprios dos fornecidos ou prestados por esse tipo de Estabelecimento de ensino, sob pena de exigência de multa, no valor correspondente a 100%(cem por cento)do valor indevidamente cobrado, que será majorada em 10%(dez por cento) sempre que houver reincidência, conforme preconizado no ar. 57 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, aprovado pela Lei nº 8.078, de 11.09.1990, multa essa que será destinada ao Fundo Federal, previsto no art. 13 da Lei nº 7.347, de 1985, sem prejuízo da responsabilização criminal dos Dirigentes da Associação ora Ré e de esta poder vir a sofrer as sanções administrativas do art. 56 daquele Código e também sem prejuízo do direito de o aluno ou pessoa por ele responsável, que tenha pago o valor indevido, reclamar e receber a restituição em dobro desse valor, na forma preconizada no Parágrafo Único do art. 42 do referido Código.

 

b) Cite-se e Intimem-se, na forma e para os fins legais.

 

P.I.

 

Recife, 17 de junho de 2013

 

 

Francisco Alves dos Santos Júnior

     Juiz Federal, 2ª Vara/PE

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