Segue decisão, lançada nos autos de uma ação civil pública, proposta pelo Ministério Público Federal de Pernambuco contra a determinada Entidade privada de Ensino Superior, buscando proibir esta de cobrar dos seus alunos determinadas taxas não previstas em Lei e cujos respectivos serviços já têm seus custos cobertos pelas mensalidades ou semestralidades pagas pelos alunos.
Na decisão, indica-se também o que pode ser cobrado à parte, além das mensalidades ou semestralidades.
Boa leitura!
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRO GRAU 5ª REGIÃO
SEÇÃO JUDICIÁRIA DO ESTADO DE PERNAMBUCO
2ª VARA
Processo nº 0005792-31.2013.4.05.8300
Classe: 1 AÇÃO CIVIL PÚBLICA
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉU: A V I DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA
C O N C L U S Ã O
Nesta data, faço conclusos os presentes autos a(o)
M.M.(a) Juiz(a) da 2a. VARA FEDERAL Sr.(a) Dr.(a) FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JUNIOR
Recife, 13/06/2013
Encarregado(a) do Setor
D E C I S Ã O
1-
Relatório
O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
ingressou com esta “AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE LIMINAR” em face da
A V DO IDE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (FACULDADE J
L F DE CIÊNCIAS APLICADAS). Alegou, em síntese, que em 13.03.2013,
teria sido instaurado na Procuradoria da República em Pernambuco o Procedimento
Administrativo nº 1.26.000.000766/2013-55, com a finalidade de apurar possíveis
irregularidades cometidas pela Instituição de Ensino Superior Faculdade J
L F de Ciências Aplicadas, no que diz respeito à cobrança de taxas
para expedição de documentos escolares, assim como para a realização de outras
medidas inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada;
que a Faculdade José Lacerda Filho de Ciências Aplicadas teria confirmado que,
de fato, cobraria as taxas internas de seus alunos, contudo, teria ressaltado
que a cobrança estaria prevista no Contrato de Prestação de Serviços
Educacionais. Sustentou a legitimidade ativa ad causam do Ministério Público Federal e o cabimento da presente
ação civil pública, assim como a competência da Justiça Federal para apreciar e
julgar o presente feito, e aduziu que a natureza de ente privado, por si só,
não seria hábil para excluir a demandada da incidência das normas
constitucionais e legais, tampouco o fundamento de que a livre iniciativa lhe
permitiria escapar dos regramentos impostos pelas normas legais da educação
nacional, cujo cumprimento seria condição para que o serviço educacional fosse
prestado no âmbito da iniciativa privada; que a cobrança de taxas para a
emissão de documentos acadêmicos, assim como para a realização de outros
serviços também inerentes à prestação dos serviços vinculados à educação ministrada,
é pratica que não se coadunaria com a legislação vigente; que os serviços
prestados por uma Instituição de Ensino Superior – IES, via de regra, seriam
remunerados pelas anuidades, semestralidades ou mensalidades, e deveriam estar
obrigatoriamente inclusos na referida contraprestação todos os serviços
inerentes ao objetivo da prestação escolar; que a Lei nº 9.870/99 teria
revogado a Lei nº 8.170/91, que preveria a existência e o modo de fixação dos
encargos educacionais nos estabelecimentos particulares de ensino de nível
pré-escolar, fundamental, médio e superior, e estipulava a forma de reajuste, e
autorizava a intervenção da Delegacia Regional do MEC; que, se a nova lei
revogou a anterior e passou a prever, como forma de remuneração das IESs apenas
as anuidades e a semestralidades, seria evidente o propósito do legislador de
extinguir os encargos educacionais antes existentes; que, no mesmo sentido
estariam inclinadas as Resoluções nºs 01/83 e 03/89, editadas pelo extinto
Conselho Federal de Educação, que, ao tratar dos encargos pagos aos alunos às
IESs, preconizariam que a anuidade/mensalidade escolar constituiria a
contraprestação pecuniária correspondente à educação ministrada e à prestação
de serviço a ela diretamente vinculados, enquanto a taxa escolar remuneraria, a
preço de custo, apenas os serviços extraordinários efetivamente prestados pelo
corpo discente; que apesar de tais resoluções terem sido revogadas pelo
Conselho Nacional de Educação, permaneceriam íntegros os balizamentos postos à
disciplina das taxas cobradas pelas IESs; que seria inconstitucional a cobrança
de taxa para emissão de certidões que visam esclarecer situações de interesse
pessoal; que também seria inadequada a cobrança de taxa para prestação de
outros serviços inerentes à prestação educacional, como a realização de segunda
chamada, quando motivada pro fatores excepcionais (saúde, por exemplo), que
impediram o aluno de se submeter ao exame regular; que o mesmo raciocínio seria
aplicável à revisão de prova, que constituiria um direito do aluno e seria
inerente à prestação do serviço de ensino; que a cobrança de taxa pela
transferência do aluno da IES seria expressamente vedada pela Portaria nº
230/2007 do MEC; que os preços cobrados seriam desproporcionais ao serviço
prestado. Invocou o Código de Defesa do Consumidor e acrescentou que a previsão
contratual de cobrança das taxas referidas seria nula de pleno direito.
Transcreveu ementas de decisões judiciais. Teceu outros comentários, e requereu
a concessão da medida liminar para que seja determinado à Ré que: suspenda
imediatamente a cobrança de qualquer tipo de prestação pecuniária, como
condição para emissão de documentos escolares, como ementa de disciplina,
declaração de vínculo, histórico escolar, certidão de notas, declaração de
conclusão de curso, declaração de regime de aprovação, declaração de
frequência, declaração de aprovação no vestibular, declaração de horário de
prova, declaração de quitação de mensalidades, dentre outros documentos que
constituem decorrência lógica da prestação educacional, assim como para a
realização de outros serviços também inerentes à prestação dos serviços
vinculados à educação ministrada, tais como realização de segunda chamada,
revisão de prova, dentre outros. A petição inicial veio acompanhada de duas
pastas: uma pasta da cor amarela contendo o Inquérito Civil nº 018/2011 (Peças
de Informação) e a outra pasta da cor branca contendo o IC nº 018/2011.
2-
Fundamentação
2.1) O Ministério Público
Federal pretende compelir a A V I DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E
CULTURA (FACULDADE J L F DE CIÊNCIAS APLICADAS), a cumprir
obrigação de não fazer, consistente na abstenção de cobrança de taxas de seus
discentes, a exemplo dos valores exigidos para a expedição de declaração de conclusão
de curso, histórico escolar, revisão de prova, e outros que constituam
decorrência lógica da prestação educacional.
2.2) A Resolução nº 01/83 e
também a Resolução nº 03/89, ambas do ora extinto Conselho Federal de Educação
(atual Conselho Nacional de Educação), evocadas na Petição Inicial desta ACP,
definem os encargos educacionais do corpo discente das Instituições de Ensino
Superior, nos seguintes termos:
Resolução
nº 01, de 1983:
Art. 2º. Constituem
encargos educacionais de responsabilidade do corpo discente:
I – a anuidade;
(...) § 1º. A anuidade
escolar, desdobrada em 2 (duas) semestralidades, constitui a contraprestação
pecuniária correspondente à educação ministrada e à prestação de serviços a ela
diretamente vinculados, como a matrícula, estágios obrigatórios, utilização de
laboratórios e biblioteca, material de ensino e uso coletivo, material
destinado a provas e exames, 1ª via de
documentos para fins de transferência, certificados ou diplomas (modelo
oficial) de conclusão de curso, de identidade estudantil, de boletins de
notas, de cronogramas, de horários escolares, de currículos e de programas.
Resolução nº 03, de 1989:
Art. 4º. Constituem
encargos educacionais de responsabilidade do corpo discente:
I – a mensalidade
II- a taxa
III- a contribuição.
(...) § 1º. A mensalidade escolar constitui a
contraprestação pecuniária, correspondente à educação ministrada e à prestação
de serviços a ela diretamente vinculados como matrícula, estágios obrigatórios,
utilização de laboratórios e biblioteca, material de ensino de uso coletivo,
material destinado a provas e exames, de certificados de conclusão de cursos, de identidade estudantil, de
boletins de notas, cronogramas, de horários escolares, de currículos e de
programas.
Tratou também do assunto,
mais recentemente, a Portaria Normativa nº 40[1],
de 12 de dezembro de 2007, expedida pelo Ministro de Estado da Educação, no §4º
do seu art. 32, proíbe que as IES exijam pagamento pela expedição e registro de
diplomas e de certificados de conclusão de cursos, por considerar tais serviços
incluídos nos serviços educacionais prestados pelas Instituições de Ensino, verbis:
§ 4º A expedição do diploma e histórico escolar
final considera-se incluída nos serviços educacionais prestados pela
instituição, não ensejando a cobrança de qualquer valor, ressalvada a hipótese
de apresentação decorativa, com a utilização de papel ou tratamento gráfico
especiais, por opção do aluno.
Também recentemente, a
Portaria nº 230[2], de 9 de março de 2007,
expedida pelo Ministro de Estado da
Educação, no seu art. 2º, veda a cobrança de taxa de matrícula como condição
para apreciação e pedidos de emissão de documentos de transferência para outras
instituições.
Portanto, à luz das
Resoluções nºs 01/83 e 03/89, ambas do ora extinto Conselho Federal de
Educação, e, ainda, da Portaria Normativa nº 40 e da Portaria nº 230, estas
duas últimas do Ministro de Estado da Educação, não podem ser cobrados do corpo
discente da ASSOCIAÇÃO VALE IPOJUCA DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA (Faculdade
José Lacerda Filho de Ciências Aplicadas): o pagamento pela expedição de
diploma, expedição de histórico escolar, utilização de laboratórios e biblioteca,
material de ensino de uso coletivo, material destinado a provas e exames, 1ª via de documentos para fins de
transferência de certificados ou diplomas (modelo oficial) de conclusão de
curso, de identidade estudantil, de boletins de notas, de cronogramas,
de horários escolares, de currículos e de programas, bem como a taxa de
matrícula como condição para apreciação e pedidos de emissão de documentos de
transferência para outras instituições.
Também não pode ser cobrada dos alunos taxa para realização de exames finais, porque esses exames fazem parte
da regular atividade de qualquer estabelecimento de ensino, sendo, por isso,
coberto pela mensalidade ou anuidade paga pelo Aluno.
2.3.) As taxas e encargos que podem ser cobrados à
margem da mensalidade ou anuidade encontram-se arrolados no § 2º do art. 4º da
Resolução nº 03, de 1989, verbis:
§2º A taxa escolar remunera, a preços de
custos, os serviços extraordinários efetivamente prestados ao corpo discente
como a segunda chamada de provas e
exames, declarações, e de outros documentos não incluídos no §1º deste artigo,
atividades extracurriculares optativas, bem como os estudos de recuperação,
adaptação e dependência prestados em horários especiais com remuneração
específica para os professores. (G.N.)
Acresce o rol desse
dispositivo também: os diplomas ou certificados expedidos em modelos não oficiais,
decorrentes de escolha do aluno(tais como, em papeis decorativos, em coro de
carneiro etc.) e as segundas vias dos documentos relacionados nos dispositivos
transcritos no item 2.2 supra.
2.4) Como visto, a
mensalidade ou anuidade remunera os chamados serviços ordinários, mencionados
no subitem 2.2 supra e a taxa escolar, os serviços extraordinários, referidos no subitem 2.3 supra.
2.5) O E. Tribunal Regional
Federal da 5ª Região e, mais recentemente, o E. Tribunal Regional Federal da 1ª
Região, ao apreciar pleitos semelhantes ao veiculado na Petição Inicial, com
esteio nas Resoluções acima transcritas, reconheceram a ilegitimidade da
cobrança da taxa de emissão de histórico escolar e do certificado de conclusão
de curso pelas IES, sob o argumento principal de que tais documentos constituem
serviços ordinários e vinculados à atividade educativa, já remunerados pelas
mensalidades pagas pelos discentes, verbis:
ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. ENSINO
SUPERIOR. EXIGÊNCIA DE PAGAMENTO DE TAXA PARA EMISSÃO DE HISTÓRICO ESCOLAR E
ATESTADO DE CONCLUSÃO DE CURSO. ILEGITIMIDADE. 1. Revela-se ilegítima a
cobrança por universidade de taxa para a expedição de histórico escolar e
atestado de conclusão de curso. Inteligência das Resoluções 01/83 e 03/89,
ambas do Conselho Federal de Educação. Precedentes desta Corte. 2. Remessa
oficial desprovida. (REOMS 200738110048768, DESEMBARGADOR FEDERAL FAGUNDES DE
DEUS, TRF1 - QUINTA TURMA, 09/07/2010)
ADMINISTRATIVO. ENSINO SUPERIOR. UNIVERSIDADE
PRIVADA. HISTÓRICO ESCOLAR. TAXA. ISENÇÃO. PROCEDÊNCIA.- A despesa realizada
pelo aluno com o histórico escolar está definida no parágrafo 1º do art. 4º da
Resolução nº 3, de 3.10.1989 do Conselho Federal de Educação, como despesa
ordinária, e como tal, incluída já no valor das mensalidades escolares cobradas
pela Universidade.- Remessa oficial improvida. (REO 200283000105384,
Desembargador Federal Ubaldo Ataíde Cavalcante, TRF5 - Primeira Turma,
15/10/2004)
Conclusão
Posto isso:
a) defiro,
parcialmente, o pedido de antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, e
determino que a ASSOCIAÇÃO VALE DO IPOJUCA DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E CULTURA
(FACULDADE JOSÉ LACERDA FILHO DE CIÊNCIAS APLICADAS), ora Ré, cobre dos seus Alunos apenas a anuidade ou as
semestralidades, e que suspenda a cobrança de qualquer outro valor ou encargo,
tais como valor para expedição de diploma no impresso e no modelo oficial,
certidões em geral, inclusive a de conclusão de curso, revisão de prova ou
exame, grade curricular, isenção de disciplina, conteúdo programático, guia de
transferência, segunda chamada, provas finais e de quaisquer outros documentos
ou serviços próprios de Estabelecimentos de Ensino Superior, podendo ser cobrado, todavia, à parte,
encargo ou valor, correspondente ao custo(entendendo-se como tal o total dos
gastos que a Entidade de Ensino teve para adquiri-lo e para fornecê-lo), de
diploma em impresso e/ou em modelo diverso do oficial(como em pele de carneiro,
cartolina dourada, etc.), a repetição de
quaisquer documentos(segunda via) ou serviços, tanto dos dados como exemplo ou a duplicidade de outros
documentos ou serviços que não tenham sido arrolados entre os exemplos
indicados e que sejam próprios dos fornecidos ou prestados por esse tipo de
Estabelecimento de ensino, sob pena de exigência de multa, no valor
correspondente a 100%(cem por cento)do valor indevidamente cobrado, que será
majorada em 10%(dez por cento) sempre que houver reincidência, conforme
preconizado no ar. 57 do Código de Proteção e Defesa
do Consumidor, aprovado pela Lei nº 8.078, de 11.09.1990, multa essa que será destinada
ao Fundo Federal, previsto no art. 13 da Lei nº 7.347, de 1985, sem prejuízo da
responsabilização criminal dos Dirigentes da Associação ora Ré e de esta poder
vir a sofrer as sanções administrativas do art. 56 daquele Código e também sem
prejuízo do direito de o aluno ou pessoa por ele responsável, que tenha pago o
valor indevido, reclamar e receber a restituição em dobro desse valor, na forma
preconizada no Parágrafo Único do art. 42 do referido Código.
b) Cite-se e Intimem-se, na
forma e para os fins legais.
P.I.
Recife, 17 de junho de 2013
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara/PE
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