sexta-feira, 21 de fevereiro de 2020

FILHAS MAIORES DE MILITARES, A PENSÃO MILITAR E O PLANO DE SAÚDE.

Por Francisco  Alves dos Santos Júnior


Legislação militar permitia que as suas filhas, mesmo maiores, desde que não fossem casadas e não ocupassem  cargo público, tinham direito de receber pensão, quando da morte do Pai Militar e da viúva Pensionista. A partir do momento que essas filhas se tornaram Pensionistas passaram a ter remuneração. Então,  perderam o  direito de continuar gozando de plano de saúde pago pela UNIÃO. A sentença que segue discute essa matéria. 
Boa leitura. 

PROCESSO Nº: 0808149-72.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL AUTOR: D C P M DA S e outro 
ADVOGADO: F A G De L R Dos S e outros 
RÉ: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO. 
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)



SENTENÇA



EMENTA: - DIREITO ADMINISTRATIVO E PREVIDENCIÁRIO. MILITAR. AERONÁUTICA. ASSISTÊNCIA MÉDICA. FILHAS PENSIONISTAS. IMPOSSIBILIDADE. DANO MORAL. IMPROCEDÊNCIA.
-As filhas solteiras e sem remuneração fazem jus à assistência médica da Aeronáutica apenas enquanto dependente do Pai Militar e, quando este falece, da Mãe-viúva e Pensionista.
-Após a morte dos Pais, como passam a receber pensão pública, logo passa a ter remuneração, perdem o direito de continuar gozado de assistência médico-hospitalar. 
- Não há Lei autorizando o custeio de assistência médico-hospitalar para filhas solteiras de Militares que passam a receber a respectiva pensão militar.
-O Administrador Público, sob pena de sofrer pesadas penalidades administrativo-penais, não pode realizar despesa sem prévia autorização legal. 
-Não comprovado o alegado dano moral.
- Improcedência.



Vistos, etc.
1. Breve Relatório
Trata-se de Ação de Obrigação de Fazer c/c pedido de indenização de Danos Morais e de Antecipação de Tutela, ajuizada por D C P M DA S e M R P M DA S em face da UNIÃO, pretendendo o restabelecimento da assistência médico-hospitalar que era patrocinada pela Aeronáutica, bem como o pagamento de indenização por danos morais. Inicialmente, requereram a concessão dos benefícios da justiça gratuita. Alegaram, em síntese, que: a) seriam filhas e pensionistas, desde o óbito do seu genitor, Sub Oficial A M da S, militar aposentado da Aeronáutica, usufruindo de pensão por morte deixada pelo seu genitor e da assistência médico-hospitalar prestada pela Aeronáutica; b) teriam utilizado a assistência médico hospitalar da Aeronáutica por toda sua vida; c) partir de janeiro/2018 as Autoras não mais tiveram descontado do contracheque o valor de R$17,28 que se destinava ao financiamento do Fundo de Saúde da Aeronáutica (FUNSA), sob a rubrica FAMHS, e teriam sido excluídas do Sistema de Saúde da Aeronáutica (SISAU); d) a atitude da Ré teria lhes causado abalo emocional e psíquico, o que teria lhe causado danos morais. Juntaram procuração e documentos e requereram a concessão da tutela de urgência para serem reintegradas aos quadros de beneficiários da assistência médico-hospitalar da Aeronáutica e, ao final, a anulação do ato que excluiu as Autoras da assistência médico-hospitalar da Aeronáutica e a condenação da UNIÃO a lhes pagar indenização por danos morais, no valor de R$ 10.000,00(dez mil reais).
Despacho de identificador 4058300.5565952, no qual foi deferida a gratuidade de justiça e determinada citação da Ré, na forma e para os fins legais, e a sua intimação para se manifestar sobre o pedido liminar.
A União, em contestação, alegou que "a permanência da pensionista na condição de beneficiária do sistema de assistência médico-hospitalar não encontra guarida, conforme o estabelecido no art. 50, § 2º, III, da Lei n.º 6.880/80 - Estatuto dos Militares - c/c com os itens 5.1, letra "i", 5.2, 5.2.1 e 5.5 da NSCA 160-5 (Normas para Prestação da Assistência Médico-Hospitalar no SISAU), aprovada pela Portaria COMGEP n.º 643/2SC, de 12 de abril de 2017", porque as Autoras receberiam pensão por morte do seu genitor, recebendo, portanto, remuneração. Defendeu a inexistência dos danos morais alegados. Em manifestação sobre o pedido liminar, limitou-se a questionar e a considerar a pretensão da Autora, via decisão liminar, como manifesto efeito satisfativo de eventual decisão concessiva liminar da antecipação de tutela e arguir, genericamente, que não foram preenchidos os requisitos autorizadores da concessão de tal tutela, por ausência de probabilidade do direito e do periculum in mora (Id. 4058300.5650042).
A decisão de identificador 4058300.5693429 deferiu o pedido de tutela provisória de urgência e intimou a Parte Autora para Réplica.
Contra a r. decisão, a União interpôs agravo de instrumento (processo nº 0810456-67.2018.4.05.0000 - Id. 4058300.5733373), ao qual foi negado provimento (Id. 4050000.14243761).
A Parte Autora não apresentou Réplica à Contestação (Id. 4058300.5921051).
Intimadas para se manifestarem sobre a produção de provas, as Autoras (Id. 4058300.6257426) e a União (Id. 4058300.6259527) manifestaram seu desinteresse.
Vieram os autos conclusos.
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.

2. Fundamentação

Na hipótese dos autos, pretendem as Autoras sua reinclusão no Sistema de Saúde da Aeronáutica, garantindo-lhes acesso à assistência médico hospitalar da Força, bem como o pagamento de indenização por danos morais.
Pois bem.

2.1. Do Restabelecimento da Assistência Médico-Hospitalar
Da leitura do Estatuto dos Militares (Lei nº 6.880/80), conclui-se que enquanto o militar estiver vivo, a relação de dependência da filha solteira e sem remuneração está enquadrada no art. 50, §2º, III, da Lei nº 6.880/80, verbis:

"Art. 50. São direitos dos militares:
§ 2° São considerados dependentes do militar:
III - a filha solteira, desde que não receba remuneração;".

Após o falecimento do militar, que tenha deixado viúva, a filha solteira do caso, independentemente da idade, continua no quadro de dependente, desta vez da Mãe-viúva e Pensionista, verbis:  

"Art. 50. São direitos dos militares:
§ 2° São considerados dependentes do militar:
VII - a viúva do militar, enquanto permanecer neste estado, e os demais dependentes mencionados nos itens II, III, IV, V e VI deste parágrafo, desde que vivam sob a responsabilidade da viúva;".

Assim, a permanência da "filha solteira e sem remuneração" nos quadros de beneficiários da assistência médico-hospitalar da Aeronáutica não é ad aeternum, dependendo, por óbvio, da manutenção da condição de "solteira e sem remuneração", e que sua Genitora, a viúva do militar, esteja viva.
A partir do momento do falecimento da Mãe-viúva e Pensionista, a própria filha passa a ser Pensionista, quando então passa a ter uma remuneração, exatamente o valor da pensão, momento em que perde o direito de continuar gozando da assistência médico-hospitalar, pois, para gozo dessa assistência exige-se que não tenha remuneração.
Ademais, não há Lei com regra expressa autorizando a UNIÃO a realizar despesa com plano de saúde a favor das filhas solteiras de falecidos Militares, maiores de 21(vinte e um) anos, que recebam pensão por força do inciso III do § 2º do art. 50 da 6.880/80.
Ora, sabe-se que o Administrador Público só pode realizar qualquer despesa pública com prévia autorização legal, conforme § 5º do art. 165 e 167, inciso I, todos da vigente Constituição da República.
No mesmo sentido, o art. 15 da Lei Complementar nº 101, de 2000, a famosa Lei de Responsabilidade Fiscal, verbis:

"Art. 15. Serão consideradas não autorizadas, irregulares e lesivas ao patrimônio público a geração de despesa ou assunção de obrigação que não atendam o disposto nos arts. 16 e 17."

O Administrador Público que realiza despesa sem prévia autorização legal submete-se a pesadas penalidades políticas e penais, conforme reza o art. 73 dessa Lei Complementar, que tem a seguinte redação:


"Art. 73. As infrações dos dispositivos desta Lei Complementar serão punidas segundo o Decreto-Lei no 2.848, de 7 de dezembro de 1940 (Código Penal); a Lei no 1.079, de 10 de abril de 1950; o Decreto-Lei no 201, de 27 de fevereiro de 1967; a Lei no 8.429, de 2 de junho de 1992; e demais normas da legislação pertinente.".

Filhas solteiras de Militares, que atingiram a maioridade, como a ora Autora, já são altamente privilegiadas com a percepção dessa pensão pública legal, de forma que seria um acinte à grande maioria dos brasileiros, que vivem sem emprego ou com emprego de baixa remuneração, com ausência quase total dos instrumentos básicos no campo educacional e de saúde pública, obrigar a UNIÃO a patrociná-las com mais uma benesse: um plano de saúde de alto custo.
E, como dito, se não há Lei específica autorizando essa despesa, não pode o Judiciário obrigar a UNIÃO a arcar com esse tipo de despesa, pois seria uma intromissão constitucional indevida do Judiciário nas atividades do Poder Legislativo e do Poder Executivo.
Então, não há como se acolher o pleito das Autoras.

2.2. Do Dano Moral
As Autoras pleiteiam, também, a indenização de R$ 10.000,00 (dez mil reais) por alegados danos morais, que lhes teriam sido causados por sua exclusão da assistência médico-hospitalar da Aeronáutica.
Não há qualquer comprovação de que as Autoras tenham sofrido algum tratamento desrespeitoso ou degradante por parte da Autoridade Militar, não tendo as Requerentes feito prova de tais fatos.
Por outro lado, como demonstrado acima, não houve o cometimento de nenhum ato ilícito por parte do Administrador Público Militar, vinculado à UNIÃO, ao excluir as ora Autoras do mencionado benefício, posto que agiu dentro dos limites das normas constitucionais e legais. 

3. Dispositivo
Posto isso:
3.1. Revogo a liminar anteriormente deferida e julgo improcedentes os pedidos autorais, dando o processo por extinto, com resolução do mérito (art. 487, I, do CPC);
3.2. Condeno as Autoras ao pagamento das custas e dos honorários advocatícios, os quais, em face da simplicidade da causa, serão arbitrados no percentual mínimo, previsto no §2º e 3º do art. 85 do CPC, sobre o valor atualizado da causa, submetida a respectiva cobrança à condição suspensiva do § 3º do art. 98 do CPC, pelo prazo de cinco anos ali fixado, por estarem as Autoras em gozo da gratuidade de justiça.
Registre-se. Intimem-se.

Recife, 21.02.2020.



Francisco Alves dos Santos Júnior                            

Juiz Federal da 2ª Vara (PE)


segunda-feira, 10 de fevereiro de 2020

AUXÍLIO-RECLUSÃO: BENEFICIÁRIOS E EFEITOS DA FUGA DO SEGURADO INSTITUIDOR.




Por Francisco Alves dos Santos Júnior

A sentença que segue trata do polêmico benefício denominado de auxílio-reclusão, que benefícia dependentes de Presos do Sistema Presidiário do Brasil, os quais, quando foram presos, ostentavam a condição de Segurado da Previdência Social. Inclusive, debate-se na sentença os efeitos da fuga quanto a essa qualidade. 
Boa leitura. 

Obs.: sentença pesquisada e minutada pela assessora de gabinete Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques. 


PROCESSO Nº: 0816024-93.2018.4.05.8300 - TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE
REQUERENTE: L V DE S L
ADVOGADO: F C M
REPRESENTANTE(PAIS): M C DE L
ADVOGADO: F C M
REQUERIDO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



Sentença tipo A

EMENTA:- PREVIDENCIÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. FILHO MENOR DE 21 (VINTE E UM) ANOS. COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS ATÉ A EVASÃO DO INSTITUIDOR/RECLUSO. PAGAMENTO DAS PARCELAS DO BENEFÍCIO DEVIDAS NO PERÍODO ENTRE O NASCIMENTO DO AUTOR E A FUGA DO INSTITUIDOR.
PARCIAL PROCEDÊNCIA.
 
Vistos, etc.
1-Relatório
L V DE S L, menor impúbere, representado por sua genitora M C DE L, ajuizou esta ação em 05/11/2018 em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, na qual pretende, a título de tutela provisória de urgência antecipada, a concessão do benefício previdenciário de Auxílio-Reclusão.
Requereu, inicialmente, o benefício da assistência judiciária gratuita e alegou, em síntese, que: teria requerido ao INSS a concessão do benefício Auxílio Reclusão em 03/07/2018 (NB 14.18.16.7776), em razão do aprisionamento de seu genitor A A DE S que se encontraria recluso desde 21/01/2009; no período de 18/06/2012 a 09/08/2013, o qual teria "fugado" e passado 01 ano e 03 meses fora do sistema prisional; o requerimento teria sido indeferido pelo INSS sob o argumento de perda da qualidade de Segurado; que o indeferimento do INSS estaria baseado em um trabalhador regido pela CLT, o que não seria o caso, pois o mencionado Recluso seria trabalhador rural; que mesmo estando o Trabalhador "em fuga", teria permanecido contribuindo ao INSS em razão das atividades rurais desenvolvidas por sua família; portanto, faria jus ao benefício. Teceu outros comentários e requereu, ao final: a concessão do benefício da Justiça Gratuita; a concessão da tutela de urgência a fim de lhe ser concedido o benefício de Auxílio-Reclusão; a citação do INSS; a procedência do pedido com a condenação do INSS a lhe conceder o benefício de Auxílio-Reclusão a partir da data da reclusão do Reeducando; renunciou ao valor excedente a sessenta salários mínimos; requereu também a condenação do Réu ao pagamento de honorários advocatícios. Protestou o de estilo. Atribuiu valor à causa e juntou instrumento de procuração e documentos.
Decisão na qual foi deferido o benefício da assistência judiciária gratuita e indeferida a tutela provisória de urgência antecipada.
Regularmente citado, o INSS apresentou Contestação na qual alegou, em síntese, que: à época da entrada do requerimento administrativo em 17/04/2018, o segurado recluso já teria perdido a qualidade de segurado; o Autor teria deixado de contribuir para a Previdência desde os idos de 01/2009, que seria o último vínculo registrado no sistema do INSS quando do seu vínculo com o Sítio Varzinha; portanto, estaria patente a perda da qualidade de segurado; não haveria ilegalidade no ato administrativo que indeferiu o requerimento da Parte Autora. Requereu, ao final: "a) sejam julgados IMPROCEDENTES os pedidos formulados pela parte autora, ante a não comprovação de que os requisitos necessários à concessão do benefício ora reclamado restaram atendidos no caso vertente;" Protestou o de estilo e juntou documentos.
A parte Autora apresentou Réplica.
Devidamente intimado, o Autor regularizou a representação processual mediante a juntada de instrumento de procuração na qual a Parte Autora aparece representada por sua Genitora.
Ato Ordinatório no qual as Partes foram intimadas para especificar provas; certificado o decurso do prazo sem manifestação das Partes.
O Ministério Público Federal ofertou r. Parecer no qual opinou pela improcedência dos pedidos formulados na Inicial.
É o relatório, no essencial.
Fundamento e decido.
2- Fundamentação
O Autor, menor impúbere, representado por sua genitora, requer a concessão do benefício de Auxílio-Reclusão, cujo instituidor seria o seu Pai, A A DE S. E, ainda, o pagamento das verbas vencidas desde a data da reclusão do seu Pai, ocorrida em 21/01/2009.
Quanto ao benefício pretendido, estabelece o art. 80 da Lei nº 8.213/91, que os requisitos para a sua concessão são semelhantes aos estabelecidos para a concessão da Pensão por morte, regendo-se pela Lei vigente à época do recolhimento do segurado à prisão, verbis:
"Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.
Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário."
No caso concreto, tendo o recolhimento à prisão de A A DE S ocorrido em 21/01/2009, diante do princípio tempus regis actum, são aplicáveis as disposições da Lei nº 8.213/91, na redação dada pelas Leis nº 9.032/95, Lei nº 9.528/97 (precedida da Medida Provisória n. 1.596-14, de 10-11-1997) e Lei nº 9.876/99, que estatui:
"Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:
I - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;
II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;
III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.
Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:
I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família e auxílio-acidente;".
Além disso, de acordo com o art. 201, inciso IV, da Constituição da República de 1988, e art. 13 da Emenda Constitucional nº 20/98, o Auxílio-Reclusão será devido aos dependentes dos segurados de baixa renda da seguinte forma:
"Art. 13. Até que a lei discipline o acesso ao salário-família e auxílio-reclusão para os servidores, segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.".
Acrescente-se que o Supremo Tribunal Federal - STF, em sede de repercussão geral, firmou o entendimento no sentido de que, nos termos do art. 201, IV, da mencionada Carta Magna, a renda do segurado preso é a que deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes, a saber:
"EMENTA: PREVIDENCIÁRIO. CONSTITUCIONAL. RECURSO EXTRAORDINÁRIO. AUXÍLIO-RECLUSÃO. ART. 201, IV, DA CONSTITUIÇÃO DA REPÚBLICA. LIMITAÇÃO DO UNIVERSO DOS CONTEMPLADOS PELO AUXÍLIO-RECLUSÃO. BENEFÍCIO RESTRITO AOS SEGURADOS PRESOS DE BAIXA RENDA. RESTRIÇÃO INTRODUZIDA PELA EC 20/1998. SELETIVIDADE FUNDADA NA RENDA DO SEGURADO PRESO. RECURSO EXTRAORDINÁRIO PROVIDO.
I - Segundo decorre do art. 201, IV, da Constituição, a renda do segurado preso é que a deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes.
II - Tal compreensão se extrai da redação dada ao referido dispositivo pela EC 20/1998, que restringiu o universo daqueles alcançados pelo auxílio-reclusão, a qual adotou o critério da seletividade para apurar a efetiva necessidade dos beneficiários.
III - Diante disso, o art. 116 do Decreto 3.048/1999 não padece do vício da inconstitucionalidade.
IV - Recurso extraordinário conhecido e provido. (RE 587365, Relator(a):  Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Tribunal Pleno, julgado em 25/03/2009, REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO. DJe-084 DIVULG 07-05-2009 PUBLIC 08-05-2009 EMENT VOL-02359-08 PP-01536[1]).
Assim, para a concessão do auxílio-reclusão devem ser preenchidos os seguintes requisitos: a) efetivo recolhimento à prisão; b) demonstração da qualidade de segurado do recluso à prisão; c) condição de dependente de quem objetiva o benefício; d) prova de que o segurado não está recebendo remuneração de empresa ou de que está em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou abono de permanência em serviço; e) comprovação de baixa renda, para benefícios concedidos a partir da Emenda Constitucional nº 20/98.
A falta de algum dos requisitos legais impede a concessão do benefício.
Ademais, com relação ao pensionista menor (caso dos autos), incapaz ou ausente, eis a redação original do art. 79 da Lei nº 8.213/91, ora revogado:
"Art. 79. Não se aplica o disposto no art. 103 desta Lei ao pensionista menor, incapaz ou ausente, na forma da lei.
2.1 - Caso concreto
Inicialmente, cumpre registrar que, na data do nascimento do Autor e na data do requerimento administrativo, estava vigente o art. 79 da Lei nº 8.213/91, que previa, de modo expresso, que os prazos de prescrição não correm contra os incapazes.
Mencionada regra legal é aplicada ao caso dos autos pois o Autor tem apenas 7 (sete) anos de idade.
2.1.1 - Pagamento das parcelas a contar do recolhimento do genitor do Autor ao cárcere.
Alega o(a) d. Representante do Parquet, em seu r. Parecer sob Id. 4058300.11854287não prosperar o pleito do Autor de pagamento do Auxílio-Reclusão desde a data do recolhimento ao cárcere do Sr. A A de S, em 21/01/2009, tendo em vista que, a essa época, o Autor não era, sequer, nascido.
Nesse particular, o MPF tem razão em parte, pois o fato de o ora Autor ter nascido depois da prisão do seu Pai não afasta o seu direito ao auxílio reclusão, mas impede que ele retroaja à data da prisão, porque nasceu dois anos e alguns meses depois.
Data de nascimento do Autor: 29/11/2011 (Id. 4058300.7463188).
Data do primeiro recolhimento ao cárcere do Sr. Adenilson: 21/01/2009 (Id. 4058300.7463165).
Portanto, levando-se isso em consideração, tem-se que o Menor Autor somente poderá fazer jus ao benefício de Auxílio-Reclusão a partir do seu nascimento, ocorrido em 29/11/2011.
2.1.2 - Da implantação do Auxílio-Reclusão e pagamento das parcelas vencidas.
Os requisitos do Auxílio Reclusão devem ser avaliados conjuntamente; é o que se passa a fazer neste momento à luz dos dispositivos legais acima transcritos.
Requisitos:
I)  recolhimento à prisão do instituidor; II) ser o recluso Segurado da Previdência; III) não estar o Recluso recebendo algum outro tipo de benefício ou renda;  e II) ser o Requerente, menor,  dependente do Recluso.
Caso concreto: O Recluso, instituidor do Auxílio-Reclusão,  foi recolhido à prisão em 21/01/2009, evadiu-se em 18/06/2012 e foi recapturado em 09/08/2013.
Ademais, consta no "Atestado de Recolhimento", anexado aos autos e expedido pela Penitenciária Juiz Plácido de Souza, em 29/08/2018 (Id. 4058300.7463165), que o Sr. A. permanece recolhido no sistema prisional em regime fechado.
Encontra-se preenchido o primeiro requisito legal.
Quanto ao segundo requisito, está comprovado o estado de filiação da criança, como demonstra a certidão de nascimento sob Id. 4058300.7463188.
Além disso, considerando que, na data do requerimento administrativo do pedido em 03/07/2018, o Autor tinha apenas sete anos de idade, pois nascido em 29/11/2011, era e ainda é dependente do instituidor (Lei nº 8.213/91, art. 16, I, §4º[1]).
O segundo requisito legal também está satisfeito.
III) instituidor não estar recebendo remuneração como empregado, ou ser beneficiário de auxílio-doença, aposentadoria, ou de abono de permanência em serviço; IV) instituidor enquadrar-se como "segurado de baixa renda".
Da análise do extrato CNIS juntado aos autos verifica-se que o instituidor não recebia remuneração como empregado no período, nem era titular de qualquer benefício previdenciário.
Portanto, estão presentes os requisitos legais.
V) Qualidade de segurado do instituidor na época do recolhimento ao cárcere - ponto controverso da lide.
Nos presentes autos, o que motivou o indeferimento do requerimento administrativo foi a alegada ausência da qualidade de segurado do instituidor, o que foi reiterado pelo INSS ao contestar o feito; portanto, É ESTE O PONTO CONTROVERTIDO DA LIDE.
O INSS, ao contestar o feito, sustenta que o Autor deixara de contribuir para a Previdência desde os idos de 01/2009, data em que está registrado o seu último vínculo com o Sítio Varzinha, no sistema da Previdência; nessa circunstância, concluiu o INSS, que, na data do requerimento administrativo do Autor,  em 17/04/2018, o segurado recluso, pretenso instituidor do benefício, já teria perdido a qualidade de segurado e, assim, o Autor não faria jus ao Auxílio-Reclusão.
O MPF, por seu turno, observa que não está comprovado o trabalho rural pelo instituidor e opinou pela improcedência do pedido.
Os argumentos lançados pelo INSS, data maxima venia, não merecem prosperar, pois os documentos apresentados com a Contestação revelam que a Autarquia, na seara administrativa, reconheceu que, no período de 04/01/2007 a 15/03/2010, o instituidor possuía a qualidade de segurado, e que sua última contribuição se deu em 01/2009.
Constam no processo administrativo trazido aos autos pelo INSS o "Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição", o CNIS e a Comunicação de Decisão do requerimento administrativo.
No "Resumo de Documentos para Cálculo de Tempo de Contribuição" está registrado o "período de qualidade de segurado" de 04/01/2007 a 15/03/2010.
O mesmo período está registrado no CNIS.
E, na "Comunicação de Decisão" está consignado que a última contribuição do instituidor se deu em 01/2009, e que a qualidade de segurado foi mantida até 15/03/2010.
O Pai do Requerente foi recolhido à prisão em em 21/01/2009, portanto quando ainda era Segurado.
Ora, de acordo com o informado pelo INSS e documentos juntados ao processo administrativo, a última contribuição para a Previdência Social recolhida em nome do instituidor, antes do seu encarceramento, refere-se à competência janeiro de 2009; portanto, repito, na data do recolhimento à prisão o Sr. A era segurado da Previdência Social (fato incontroverso), situação que permaneceu durante todo o período de encarceramento, e não até 15/03/2010 como defendido pelo INSS.
O INSS computou o "período de graça" do Sr. A enquanto ele cumpria a pena privativa de liberdade, o que não se coaduna com o disposto no inciso IV do art. 15 da Lei nº 8.213/91, verbis:
"Art. 15. Mantém a qualidade de segurado, independentemente de contribuições:
Omissis.
IV - até 12 (doze) meses após o livramento, o segurado retido ou recluso;"
No presente caso, o Autor nasceu em 29/11/2011, o que sucedeu após o recolhimento à prisão do instituidor ocorrida em 21/01/2009, mas antes da evasão do encarcerado, ocorrida em 18/06/2012.
Portanto, entre a data do nascimento do Autor e a data da evasão do instituidor, é devido o Auxílio reclusão, pois o instituidor/recluso possuía a qualidade de segurado à época.
Melhor esclarecendo, o benefício é devido ao filho do segurado no período do recolhimento à prisão, no compreendido entre 29/11/2011 (data do nascimento do Autor) e 17/06/2012 (um dia antes da fuga do instituidor/recluso). Explica-se.
O segurado que foge da prisão mantém a qualidade de segurado se recapturado em menos de 12 meses, na forma do inciso IV do art. 15 da Lei nº 8.213/91.
O instituidor se evadiu da prisão em 18/06/2012 e foi recapturado em 09/08/2013, logo, quando retornou ao regime carcerário, já havia transcorrido o período de graça de 12 (doze) meses entre a evasão e o novo recolhimento a prisão, a que se refere o inciso IV do art. 15 da Lei nº 8.213/91, ou seja, tinha perdido a qualidade de Segurado da Previdência Social.
Portanto, quando do novo recolhimento ao cárcere o genitor do Autor já não mais possuía a qualidade de segurado e, assim, o pleito de implantação do Auxílio-Reclusão não pode ser atendido; é a inteligência que se extrai do art. 117, §2º do Decreto nº 3.048/99, verbis:
"Art. 117. O auxílio-reclusão será mantido enquanto o segurado permanecer detento ou recluso.
Omissis
§ 2º No caso de fuga, o benefício será suspenso e, se houver recaptura do segurado, será restabelecido a contar da data em que esta ocorrer, desde que esteja ainda mantida a qualidade de segurado."
Nessa situação, é de ser julgado parcialmente procedente o pedido
2.2. Da condenação em honorários advocatícios
A sucumbência do INSS foi mínima, pois, dos pleitos apresentados pelo Autor, a Autarquia apenas terá que pagar uma parcela mínima do que foi requerido, logo, incide a regra do Parágrafo Único do art. 86 do CPC, verbis:
"Art. 86. Se cada litigante for, em parte, vencedor e vencido, serão proporcionalmente distribuídas entre eles as despesas.
Parágrafo único. Se um litigante sucumbir em parte mínima do pedido, o outro responderá, por inteiro, pelas despesas e pelos honorários."
Portanto, configurada a sucumbência mínima do INSS, incube unicamente ao Autor arcar com a verba honorária, permanecendo a exigibilidade suspensa desta verba por ser a Parte Autora beneficiária da justiça gratuita (CPC, art. 98, §3º).
3- Dispositivo
Posto ISSO, julgo parcialmente procedente o pedido e condeno o INSS a pagar o benefício de Auxílio-Reclusão ao Autor, relativo ao período compreendido entre 29/11/2011 (data do nascimento do Autor) a 17/06/2012(data em que o seu Pai fugiu da prisão), corrigidas monetariamente nos termos do Manual de Cálculos da Justiça Federal, e juros de mora desde a citação, e dou o processo por extinto, com resolução do mérito (art. 487, I, CPC).
Outrossim, tendo em vista que a Parte Autora está em gozo da gratuidade da justiça, a condeno ao pagamento da verba honorária, que arbitro em 10% (dez por cento) do valor da causa, atualizada a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação na forma da Lei nº 11.960/2009, ficando, todavia, a cobrança da verba sucumbencial submetida à condição suspensiva e temporária do §3º do art. 98 do CPC.
P.R.I.
Recife, 10.02.2020
 Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara Federal/PE
  (rmc)




[1]  Lei nº 8.213, de 1991:

"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:
I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental ou deficiência grave;               (Redação dada pela Lei nº 13.146, de 2015)          (Vigência)
§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada".

sábado, 1 de fevereiro de 2020

DISPOSITIVO LEGAL QUE, SEM BASE EM REGRA DA CONSTITUIÇÃO, AUTORIZA O CHEFE DO PODER EXECUTIVO FEDERAL A REDUZIR E A RESTABELECER ALÍQUOTAS DAS COPIS-PASEP E COFINS, É INCONSTITUCIONAL.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior

A vigente Constituição da República autoriza o Legislador Ordinário permitir em apenas duas situações, especificadas na  fundamentação da sentença abaixo,  que o Chefe do Poder Executivo Federal possa, por Decreto, reduzir ou restabelece alíquotas de tributos. Há também uma hipótese que isso pode ocorrer com as alíquotas do ICMS mediante autorização a ser dada ao Chefe do Poder Executivo de cada Estado por Convênio ICMS.
Em qualquer outra situação, que não as mencionadas, na  qual o Chefe do Poder Executivo reduza ou restabeleça alíquotas de tributos por Decreto, ainda  que autorizado por Lei Ordinária, tanto esta Lei como os Decretos dela decorrentes serão inconstitucionais. 
Na sentença que segue, essas matérias são debatidas detalhadamente. 
Boa  leitura.  


PROCESSO Nº: 0816579-76.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: C I T DE P - CITEPE
ADVOGADO: S L M R
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM RECIFE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

Sentença tipo A




EMENTA:- CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. PROCESSUAL CIVIL.
-Pedido sem respaldo de fundamentação na causa petendi da petição inicial torna esta peça,  quanto a tal pedido, inepta.
-É inconstitucional dispositivo de Lei que autoriza o Chefe do Poder Executivo a reduzir e a restabelecer alíquotas das contribuições COPIS-PASEP[1] e COFINS, quando,  com relação a tais contribuições, não há dispositivo na Constituição da República permitindo que o Legislador ordinário dê tal autorização por Lei Ordinária.
-O Decreto que,  com base nesse tipo de dispositivo legal, restabeleceu as alíquotas das COPIS-PASEP e COFINS a patamares médios das alíquotas fixadas em Lei, é inconstitucional, como também são inconstitucionais os Decretos anteriores  que reduziram as  mesmas  alíquotas a 0%(zero por cento), tendo que prevalecer a alíquota de 1,6% da COPIS-PASEP e de 7,6% da COFINS, como fixadas nas Leis que tratam dessas contribuições. 
-Concessão parcial da segurança.


Vistos, etc

1. Breve Relatório

C I T DE P - CITEPE, qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança com pedido de liminar inaudita altera parte contra ato praticado pelo Ilmo. Sr. Dr. Delegado da Receita Federal em Recife, vinculado à União Federal (PGFN). Aduziu, em síntese, que:  seria pessoa jurídica de direito privado, tendo como atividade econômica principal a produção, distribuição e comercialização de polímeros e filamentos de poliéster e de resina para embalagens PET, figurando como uma das maiores fornecedoras destes produtos no mercado nacional, sendo que estaria sujeita ao recolhimento do PIS e da COFINS, incidente sobre suas receitas, pela sistemática não cumulativa, nos termos das Leis nº 10.637/02, nº 10.865/04 e nº 10.833/03;  no desenvolvimento de suas atividades, a Impetrante auferiria receitas financeiras, bem como apuraria despesas financeiras, fatos que seriam evidenciados por sua Escrituração Fiscal Digital ("EFD - Contribuições"); até o ano de 2015, as receitas financeiras estariam submetidas à alíquota zero de PIS e COFINS, nos termos dos Decretos nº 5.164/041 e nº 5.442/052; no entanto, em julho de 2015, teria entrado em vigor o Decreto nº 8.426/15, que teria revogado as disposições do Decreto nº 5.442/055 e majorado as referidas alíquotas para os percentuais de 0,65% (PIS) e 4% (COFINS), sem que fosse autorizado  o direito ao crédito das contribuições recolhidas; diante disso, todas as receitas financeiras (com exceção das decorrentes de variação cambial e hedge operacional) teriam passado a ser tributadas pelo PIS e COFINS, razão pela qual viria a Impetrante realizando o recolhimento destas contribuições com a inclusão das aludidas receitas em sua base de cálculo; a referida majoração de alíquotas seria ilegal e inconstitucional, pois esta não poderia ser realizada através de Decreto do Poder Executivo, em decorrência do Princípio Constitucional da Legalidade.  Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. Pugnou, ao final,
"i) Conceder medida liminar inaudita altera pars, nos termos do artigo 7º, inciso III, da Lei nº 12.016/2009, a fim de que seja suspensa a inconstitucional e ilegal inclusão do PIS e da COFINS em suas respectivas bases de cálculo, ainda que com as alterações introduzidas pela Lei nº 12.973/2014, conforme a regra disposta no artigo 151, inciso IV, do CTN, no que diz respeito aos fatos geradores ocorridos a partir da data em que impetrado o presente mandamus, obstando a negativa da certidão de regularidade fiscal pela d. Autoridade coatora, nos termos do artigo 206 do CTN, desde que não haja outros débitos impeditivos à sua emissão, o que faz manejado conjuntamente com base na tutela de evidência do artigo 311, inciso II, do NCPC, uma vez que os fundamentos que sustentam evidenciam a ilegalidade e inconstitucionalidade da majoração de alíquotas do PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras, pelo Decreto nº 8.426/2015;
ii) determinar a notificação da d. Autoridade coatora para, no prazo legal, prestar as informações devidas, nos termos da Lei nº 12.016/2009;
iii) cientificar o órgão de representação judicial para que, querendo, ingresse no feito, bem como o representante do d. Ministério Público para que apresente seu parecer;
iv) ao final, seja confirmada a medida liminar e concedida em definitivo a segurança pleiteada, para assegurar o direito líquido e certo da Impetrante de não ser compelida à inconstitucional e ilegal majoração de alíquotas do PIS e da COFINS incidentes sobre as receitas financeiras, garantindo-lhe o direito à restituição/compensação dos valores recolhidos indevidamente a esse título, no período de 01/07/2015 até a data em que cessar as referidas exigências, com quaisquer outros tributos administrados pela Receita Federal do Brasil, com a devida atualização pela Taxa SELIC, sem a indevida e ilegal restrição imposta pela alínea "b", do inciso I, do § 1º, do artigo 26-A, da Lei nº 11.457, de 16/03/2007."
Foi determinada a notificação da DD. Autoridade apontada como coatora (Id. 4058300.11673843).
A União (Fazenda Nacional) manifestou interesse no feito (Id. 4058300.11821498).
A DD Autoridade apontada coatora apresentou Informações. Aduziu, em síntese, que: a própria Lei teria conferido ao poder executivo a prerrogativa de reduzir ou restabelecer as alíquotas a incidir sobre as receitas financeiras (gênero),  dentro dos limites ali fixados (art. 2º do art. 27 da Lei n. 10.865/2004); a Lei n. 10.685/2004, que teria instituído as contribuições em análise, teria previsto alíquotas bem mais altas que as previstas no Decreto n. 8426/2015;  o art. 26 da Lei n. 10.685/2004 teria delegado ao Poder Executivo a possibilidade de instituição de uma série de reduções tributárias, em meio à respectiva política fiscal escolhida, dentre elas a redução, como aconteceu por meio do Decreto n. 5,442/2005; que como já dito o Decreto 8.426, de 2015, apenas restabelecera às alíquotas a um patamar inferior ao máximo permitido na Lei, que seria de 1,65% para COPIS-PASEP e de 7,6% para a COFINS. E que mencionados Decretos teriam por base o incisoIV do art. 84 da Constituição. Se os Decretos anteriores que reduziram a alíquota dessas contribuições para  0%(zero por cento) não eram inconstitucionais, então o Decreto que restabeleceu as alíquotas para um patamar médio, também não pode ser.   Transcreveu jurisprudência. Pugnou, ao final, pela denegação da segurança.
O Ministério Público Federal não se manifestou sobre o mérito da questão (Id. 4058300.13180172).
É o relatório, no essencial.
Passo a fundamentar e a decidir.

2. Fundamentação

2.1 - Matéria Preliminar

Detecto um erro material na petição inicial, que deveria ter sido detectado quando do despacho inicial, para permitir à Impetrante a devida emenda. Mas, infelizmente isso não ocorreu e, como  a instrução processual já findou, essa providência não se faz mais possível, de forma que o assunto deve ser resolvido dentro do sistema processual civil vigente.

Noto que na letra "i" dos pedidos da petição inicial,  pede-se inicialmente que se considere inconstitucional regra legal que obriga a Impetrante a integrar na base de cálculos das COPIS-PASEP[1] e COFINS os seus próprios valores.

Todavia, em toda a causa petendi dessa peça vestibular não há um único argumento a respeito desse pedido, de forma que nesse particular referida petição inicial é inepta, conforme regra do inciso III do § 1º do art 330 do vigente Código de Processo Civil, cabendo, nesse particular,  o seu indeferimento de plano, com as consequências processuais daí advindas.
No entanto, quanto à alegada inconstitucionalidade da regra do § 2º do art. 27 da Lei  10.865, de 2004,    e do Decreto nº  8,426, de 2015, que com base nela foi editado, constante da causa petendi da petição inicial, amolda-se à perfeição ao final do pedido da mencionada alínea "i" e aos outros pedidos das demais alíneas dos pedidos de tal petição, situação essa que permite a apreciação desses pleitos.
2.2 - Matéria de Mérito
No presente mandado de segurança, objetiva a Impetrante impedir que haja ato constritivo para cobrança da COPIS-PASEP e da COFINS, respectivamente, sob alíquotas de 0,65% e 4,0%, restabelecidas pelo Decreto 8.426/15, de 1º de abril de 2015, e incidentes sobre as receitas financeiras auferidas pela Impetrante, que se encontra submetida ao regime não cumulativo de apuração das mencionadas contribuições. E também que se afaste das respectivas bases de cálculo os valores de tais contribuições.

Como se extrai da petição inicial e das informações da DD Autoridade Impetrada, os Tribunais Regionais Federais vêm adotando entendimentos diversos sobre o assunto: há precedentes de Turmas do TRF5R, conforme a petição inicial, concluindo pela inconstitucionalidade do § 2º do art. 27 da Lei 10.865, de 2004, porque não haveria  respaldo constitucional para  permitir que o Chefe do Poder Executivo, por Decreto, pudesse reduzir a zero as alíquotas das COPIS-PASEP e COFINS e, também por Decreto, restabelecer tais alíquotas até às alíquotas máximas fixadas nas Leis que delas tratam; mas, segundo as informações da DD Autoridade apontada como coatora,  há precedentes dos TRFs das  3ª e 4ª Regiões, concluindo que o Decreto nº 8.426, de 2015, não seria inconstitucional, porque calcado no referido dispositivo legal e este contaria com respaldo no inciso I do art 150 da vigente Constituição da República, o qual vedaria apenas a majoração de tributo por ato infralegal, mas que referido Decreto não teria majorado, mas apenas restabelecido percentuais de alíquotas entre o  mínimo e o máximo fixado nas Leis que tratam de tais contribuições. 

Pois bem.

A DD Autoridade apontada como coatora chega a invocar precedentes do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça, no quais se  considerou constitucional o enquadramento de Contribuintes em alíquota superior, relativamente às contribuições  SAT/RAT,  por mero Decreto do Chefe do Executivo Federal, sem conceder-se ao Contribuinte o direito ao devido processo legal, como observância dos  princípios constitucionais do contraditório e da ampla defesa, para pelo menos tentar demonstrar que não houvera aumento de riscos, nem aumento de desastres nas suas atividades que justificassem o seu enquadramento em alíquota maior, relativamente a tais contribuições.
Registro também que o Plenário da Suprema Corte admitiu a fixação de alíquotas, por Decreto, da Contribuição denominada de "salário educação", instituída pela Lei nº 9.424, 1996, hoje modificada  pela Lei nº 9.766, de 18.12.1998, sem que aquela Lei tivesse fixado nenhum percentual.

Tenho que essa abertura dada pelo Supremo Tribunal Federal ao Chefe do Poder Executivo da UNIÃO para, por Decreto, data maxima venia, sem observar a literalidade do princípio da legalidade tributária, fixada  no inciso I ao art. 150 da vigente Constituição da República, contrariando, assim, frontalmente a Carta Magna, quanto à fixação de alíquotas tributárias, como foi no caso da contribuição denominada de salário educação, bem como do enquadramento ou reenquadramento dos Contribuintes em percentuais mais altos das contribuições SAT/RAT, neste caso sem o devido processo legal (inciso LIV do art. 5º da referida Carta) e também sem a ampla defesa e sem o contraditório (inciso LV do art 5º da mesma Carta),  representa um grande perigo para os Contribuintes e fator de insegurança jurídica  no campo tributário, sobretudo quando se sabe que o tributo corresponde a uma diminuição do poder político-econômico e financeiro dos Contribuintes, pelo que as regras constitucionais devem ser aplicadas da forma mais literal possível.
Por outro lado, é de todos conhecida a sede arrecadatória das Fazendas Públicas, de forma que se a Suprema Corte não obrigar os Chefes do Poder Executivo das Unidades da Federação a observarem rigidamente as regras tributárias consignadas na  Constituição da República, quer seja para favorecer, quer seja para desfavorecer os Contribuintes, cairemos  numa insegurança jurídico-econômica e financeira sem  precedentes. 

Ora, ainda que o debatido dispositivo legal não autorize o Chefe do Poder Executivo a majorar as alíquotas das mencionadas contribuições,  mas apenas reduzi-las a 0%(zero por cento) e a restabelecê-las até as alíquotas máximas fixadas nas respectivas Leis  instituidoras, em decorrência de variações econômicas do mercado, ainda assim é temeroso, porque, como bem alegado na petição inicial, o Legislador Constituinte só permitiu que a Lei assim regrasse com referência a alguns Impostos relacionados no § 1º do art. 153 da vigente Constituição da República, bem como com referência à Contribuição de Intervenção no Domínio Econômico - CIDE, na  hipótese indicada na alínea "b" do inciso I do § 4º do art. 177 da referida Carta Magna.
Acrescento também que há autorização parecida, concedida pelo Legislador Constituinte Derivado, na  Emenda Constitucional nº 33, de 2001, com  relação a alíquotas do ICMS, um imposto estadual, incidentes  sobre alguns combustíveis, conforme consta da alínea "c" do inciso IV do § 4º do art. 155 da mencionada Carta Magna, com redação dada por mencionada Emenda Constitucional.

Mas permitir essa flexibilização por Lei, à margem da Carta Magna, como o fez a Suprema  Corte nos casos acima referidos, data maxima venia, pelas razões já expostas, parece-me altamente perigoso.

Alenta-nos a notícia dada na petição inicial que o Plenário do Supremo Tribunal Federal, com relação à discussão sobre a constitucionalidade do mencionado § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865, de 2004, e do referido  Decreto nº 8.426, de 2015, submeteu o Recurso Extraordinário nº 986.296/PR (posteriormente substituído pelo RE n. 1.043.313/RS), à repercussão geral, sob a relatoria do Ministro Dias Toffolia. 
Registro que,  no dia de hoje, visitei o site da Suprema Corte e constatei que mencionado  Recurso Extraordinário encontra-se concluso a esse Ministro Relator desde 05.09.2018.[2]
Oxalá, seja essa importante questão tributária resolvida o mais rápido possível por nossa Suprema Corte, para segurança e tranquilidade dos Contribuintes e da própria UNIÃO - FAZENDA NACIONAL.
 Diante do quadro acima desenhado, tenho que o referido dispositivo legal, o ora debatido § 2º do art. 27 da Lei nº 10.865, de 2004, bem como todos os Decretos dele decorrentes, são inconstitucionais.
Então, com  relação ao caso em debate, é inconstitucional não apenas o Decreto  nº 8.426, de 2015,  que restabeleceu às alíquotas das contribuições  em questão para um patamar médio, como também os Decretos que lhe antecederam, quais sejam, os Decretos nº 5.164/04 e nº 5.442/05, e que reduziram tais alíquotas a 0%(zero por cento).
Ou seja, pelas razões acima aduzidas, devem prevalecer, para todos os períodos,  as alíquotas de 1,65% para a COPIS-PASEP e 7,6% para a COFINS, como estabelecem as Leis que delas tratam, indicadas nas  informações  da DD Autoridade apontada como coatora. 

Então, prosperam em parte os pedidos da Impetrante, relativamente às questões analisadas neste subópico 2.1 desta fundamentação, em face da inconstitucionalidade do referido dispositivo de Lei e dos mencionados Decretos, reconhecendo-se o direito de a ora  Impetrante não adotar as alíquotas restabelecidas pelo Decreto nº 8.426, de 2015, mas  negando-lhe o retorno à alíquota zero dos Decretos nº 5.164/04 e nº 5.442/05, porque igualmente inconstitucionais, devendo,  pois, a Impetrante voltar a pagar as mencionadas Contribuições pelas  alíquotas acima indicadas, 1,65% COPIS-PASEP e 7,6% COFINS, que são as alíquotas legais realmente  devidas.
Obviamente, quanto aos pagamentos feitos de tais contribuições sob as alíquotas restabelecidas pelo Decreto nº 8.426, de 2015, a ora  Impetrante não fará jus à pretendida compensação ou restituição, porque, à luz do entendimento supra, findou por pagar tais contribuições  com alíquotas menores que as realmente devidas.
Poderá sim compensá-las no pagamento do valor correto dessas contribuições, a partir da vigência desse Decreto e dos Decretos que os antecederam, recolhendo as diferenças entre as mencionadas alíquotas legais(1,65% COPIS-PASEP e 7,6% COFINS) e as alíquotas inconstitucionais fixadas por tais Decretos.
Claro que a UNIÃO poderá, pelo meio legal próprio, exigir as parcelas ainda não decaídas e/ou prescritas de tais contribuições, relativas aos períodos em que prevaleceram os inconstitucionais Decretos,  acima referidos, que reduziram as alíquotas a 0%(zero por cento), e a diferença entre o que a Impetrante pagou com base nas alíquotas do Decreto nº 8.426, de 2015, e as alíquotas legais que deveriam ter sido aplicadas.


3. Dispositivo
Posto isso:
3.1 - não conheço do pedido de afastamento dos valores das próprias COPIS-PASEP e COFINS das suas bases de cálculo, em face da inépcia da petição inicial com relação a esse pedido, conforme consignado no subitem 2.1 da fundamentação supra, pelo que, quanto a esse pleito, indefiro a petição inicial e dou este processo por extinto, sem resolução do mérito(art. 330, I, § 1º-III, c/c art. 485, I, todos do vigente Código de Processo Civil);
3.2 - com base no consignado no subitem 2.2 da fundamentação supra, concedo parcialmente a segurança, apenas afastando a obrigatoriedade de a Impetrante continuar recolhendo as COPIS-PASEP e COFINS pelas alíquotas do Decreto 8.426, de 2015, e determinando que a DD Autoridade apontada como coatora abstenha-se de puni-la por essa prática, sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2020, ficando, todavia,  a Impetrante desautorizada a continuar aplicando, quanto a tais contribuições, a alíquota 0%(zero por cento), devendo voltar a recolhê-las com as alíquotas de 1,6% COPIS-PASEP e 7,6% COFINS, como estabelecem as Leis que delas tratam e as regras constitucionais acima indicadas, sem prejuízo de a UNIÃO - FAZENDA  NACIONAL exigir as respectivas diferenças ainda não decaídas ou prescritas, conforme o descrito na fundamentação supra.
Como o feito foi procedente em torno de 1/6(um sexto) dos pedidos, condeno a Parte Impetrante ao pagamento de custas processuais nessa  proporção.
Sem verba honorária(art 25 da Lei nº 12.016, de 2009, e Súmula 512 do  STF).
Submeto esta sentença ao duplo grau de jurisdição(art. 14 da Lei nº 12.016, de 2009).


Registre-se. Intimem-se.

Recife, 01.02.2020

Francisco Alves dos Santos Júnior
  Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE

(lsc)
___________________________________
[1] - A partir da Lei Complementar nº 26, de 1975, os Fundos PIS e PASEP foram unificados, assim como as respectivas contribuições, de forma que passou a ser apenas contribuição PIS-PASEP, sigla apropriada COPIS-PASEP.
Acesso em 01.02.2020.