quarta-feira, 23 de setembro de 2020

REQUISITOS PARA FAZER O CURSO DE RECICLAGEM DE VIGILANTE NO DEPARTAMENTO DE POLÍCIA FEDERAL.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


A pessoa que exerce a atividade de Segurança/Vigilante só poderá fazer o curso de reciclagem na Polícia  Federal se não tiver antecedentes  criminais e, caso tenha condenação criminal, só se tiver sido reabilitado ou, após o término do cumprimento da pena, já tiver decorrido mais de cinco anos. 

Na sentença que segue, todos os detalhes desse assunto são dissecados. 

Boa leitura. 



Obs.: Sentença minutada pela Assessora LUCIANA SIMÕES DE ALBUQUERQUE.



 PROCESSO Nº: 0806849-07.2020.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL

IMPETRANTE: J S DA S
ADVOGADO: M J J G A 
IMPETRADO: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
AUTORIDADE COATORA: SUPERINTENDENTE DPF CARLOS HENRIQUE OLIVEIRA DE SOUZA, DIRETOR REGIONAL DA POLICIA FEDERAL EM PE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)



SENTENÇA TIPO A.


EMENTA:  MANDADO DE SEGURANÇA. CERTIFICADO DE RECICLAGEM DE CURSO DE VIGILANTE. CONDENAÇÃO CRIMINAL TRANSITADA EM JULGADO. PUNIBILIDADE EXTINTA, PELO CUMPRIMENTO DA PENA. REABILITAÇÃO NÃO COMPROVADA.

DENEGAÇÃO DA SEGURANÇA.

Vistos, etc.

1. Relatório

Versam os presentes autos sobre mandado de segurança impetrado por J S DA S contra o ato imputado ao DIRETOR REGIONAL DA POLÍCIA FEDERAL EM PERNAMBUCO, consubstanciado na negativa de inscrição do impetrante no curso de reciclagem da formação de vigilante, em virtude da exigência imposta pela Portaria nº 3.233/2012- DG/DPF, da Polícia Federal. Para tanto, narra na petição inicial, em apertada síntese, que: trabalharia como segurança patrimonial em empresa privada, sendo obrigado a se submeter a cursos periódicos de reciclagem para a permanência em suas funções; para participar de cursos de reciclagem, necessária seria a apresentação de antecedentes criminais; apesar de ter apresentado certidão negativa de antecedentes, fora impedido de participar do curso de reciclagem por possuir condenação penal por porte ilegal de arma; tal conduta teria sido praticada em 2015, o Impetrante teria sido preso em flagrante por porte ilegal de arma de fogo, crime previsto no art, 14 da Lei n. 10.826/2013; teria sido processado e julgado nos autos 83-59.2015.8.17.1580 e logo após a sentença condenatória, teria cumprido sua pena, através do Processo de Execução PENAL n. 252-07.2019.8.17.1518; a sentença de extinção da punibilidade pelo cumprimento já teria sido exarada;   tal ação já estaria arquivada e a pena extinta; para fins de Direito, seria considerada idoneidade moral um conjunto de qualidades que recomendam o indivíduo à consideração pública, com atributos como honra, respeitabilidade, seriedade, dignidade e bons costumes; a idoneidade significaria a qualidade de boa reputação; a condenação penal pelo porte ilegal de arma não teria trazido  para sua reputação nenhuma consequência no sentido de denegrir a sua imagem e nem teria feito a qualquer pessoa do seu convívio social acreditar que o mesmo teria se transformado em um criminoso pelo fato e utilizar uma arma; caso não participasse do curso, correria o risco de ficar desempregado. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela:

"Concessão da segurança para afastar o ato coator no sentido de declarar a idoneidade moral do Autor como critério para realização do curso de vigilantes, bem como, que determine a concessão de tal autorização e posterior homologação do certificado pelo Departamento da Policia Federal de  Pernambuco, mediante e imediatamente, o atendimento dos requisitos estabelecidos no art. 16 da Lei7.102, de20 de junho de1983, e do art. 155 da Portaria nº 3.233 -DG -DPF de 10 de dezembro de 2012.

Inicial instruída com procuração e documentos.

Notificada, a autoridade apontada como coatora apresentou Informações sob Id. 4058300.14433101, aduzindo, em apertada síntese, que:   a lei que regula a atividade de segurança privada no país seria a de nº 7.102/1983, regulamentada pelo Decreto nº 89.056/1983; o órgão incumbido de realizar a autorização, o controle e a fiscalização da atividade de segurança privada seria a Polícia Federal, nos termos do art. 20 da Lei nº 7.102/1983 c/c o art. 32 do Decreto nº 89.056/1983;  a Polícia Federal teria Editado a Portaria nº 387/2006 - DG/DPF, já revogada pela Portaria nº 3.233/2012 - DG/DPF, que seria  a portaria atualmente em vigor; a  lei de regência, em seu art. 16, VI, estabeleceria que um dos requisitos para o exercício da profissão de vigilante seria não ter antecedentes criminais registrados; com o intuito  de regulamentar referido dispositivo legal, a portaria em vigor, com efeito, em seu art. 155, VI, teria vedado o exercício da profissão de vigilante a quem possua registro de indiciamento em inquérito policial; entretanto,  tal vedação atualmente estaria  suspensa, em função de decisão judicial proferida pelo TRF - 1ª Região, nos autos da Ação Civil Pública nº 0039226-84.2013.4.01.3300/BA, que teria determinado que a Polícia Federal assegurasse "a quaisquer interessados, em todo o território nacional, o direito de matrícula e/ou homologação do curso deformação, reciclagem ou extensão para vigilantes, independentemente de estarem respondendo a processo criminal ou inquérito policial (..); assim, a orientação atualmente em vigor da Coordenação-Geral de Controle de Serviços e Produtos, órgão central da Polícia Federal sobre controle de segurança privada, seria de não obstar a matrícula/homologação de curso de formação/reciclagem/extensão do vigilante, contanto que ele não tivesse ainda sido condenado por sentença criminal transitada em julgado; no caso de condenação criminal transitada em julgado, o exercício da profissão só seria possível se o vigilante obtivesse a reabilitação criminal, ou quando decorrer o período de tempo superior a cinco anos, contados da data de cumprimento ou extinção da pena (art. 155, §4º, II e III da Portaria nº 3.233/2012-DG/DPF); já havendo o trânsito em julgado da condenação criminal do impetrante, e não havendo nos autos notícia de implementação de nenhuma das hipóteses previstas no art. 155, §4º, I Iou III, da Portaria nº 3.233/2012-DG/DPF, haveria causa impeditiva para homologação do curso de reciclagem do impetrante.

O Ministério Público Federal se manifestou pela denegação da segurança.

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

Versam os presentes autos sobre mandado de segurança impetrado por JOANIR SEVERINO DA SILVA contra o ato imputado ao DIRETOR REGIONAL DA POLÍCIA FEDERAL EM PERNAMBUCO, consubstanciado na negativa de inscrição do impetrante no curso de reciclagem da formação de vigilante, em virtude da exigência imposta pela Portaria nº3.233/2012- DG/DPF, da Polícia Federal.

De início, há de se registrar que, por desempenharem atividade que apresenta risco potencial à coletividade, as empresas de segurança privada se submetem a critérios rígidos de controle administrativo, estabelecidos pelo legislador.

Da leitura das Informações, vê-se que a autoridade apontada como coatora reconhece que orientação atualmente em vigor da Coordenação-Geral de Controle de Serviços e Produtos, órgão central da Polícia Federal sobre controle de segurança privada, por força de decisão exarada em sede de Ação Civil Pública, Tombada sob o número 0039226-84.2013.4.01.3300/BA[1], seria de não obstar a matrícula/homologação de curso de formação/reciclagem/extensão do vigilante, contanto que ele não tivesse ainda sido condenado por sentença criminal transitada em julgado.  Sustentou, ainda, que, no caso de condenação criminal transitada em julgado, o exercício da profissão só seria possível se o vigilante obtivesse a reabilitação criminal, ou quando decorresse o período de tempo superior a cinco anos, contados da data de cumprimento ou extinção da pena (art. 155, §4º, II e III da Portaria nº 3.233/2012-DG/DPF), o que não teria ocorrido no caso em análise.

Pois bem.

O art. 155, § 4º, II e III, da Portaria nº 3.233/2012-DG/DPF, que dispõe sobre as normas relacionadas às atividades de Segurança Privada, estabelece: 

"Art. 155. Para o exercício da profissão, o vigilante deverá preencher os seguintes requisitos, comprovados documentalmente:

(...)

§ 4o Não constituem obstáculo ao registro profissional e ao exercício da profissão de vigilante:

(...)

II - a condenação criminal quando obtida a reabilitação criminal fixada em sentença;

III - a condenação criminal quando decorrido período de tempo superior a cinco anos contados da data de cumprimento ou extinção da pena; e

(...)"

Quanto à reabilitação criminal, o Código Penal, em seu art. 94, preceitua:

"Art. 94 - A reabilitação poderá ser requerida, decorridos 2 (dois) anos do dia em que for extinta, de qualquer modo, a pena ou terminar sua execução, computando-se o período de prova da suspensão e o do livramento condicional, se não sobrevier revogação, desde que o condenado:

I - tenha tido domicílio no País no prazo acima referido;

II - tenha dado, durante esse tempo, demonstração efetiva e constante de bom comportamento público e privado;

III - tenha ressarcido o dano causado pelo crime ou demonstre a absoluta impossibilidade de o fazer, até o dia do pedido, ou exiba documento que comprove a renúncia da vítima ou novação da dívida.

Parágrafo único - Negada a reabilitação, poderá ser requerida, a qualquer tempo, desde que o pedido seja instruído com novos elementos comprobatórios dos requisitos necessários.".

Relativamente à noticiada Ação Civil Pública tombada sob o n. 0039226-84.2013.4.01.3300/BA, vê-se, por sua vez, que assim restou ementado [1]:

"ADMINISTRATIVO. PARTICIPAÇÃO EM CURSO DE FORMAÇÃO/RECICLAGEM/EXTENSÃO DE VIGILANTES. INEXISTÊNCIA DE ANTECEDENTES CRIMINAIS. INQUÉRITO POLICIAL E/OU PROCESSO CRIMINAL SEM DECISÃO CONDENATÓRIA TRANSITADA EM JULGADO. ILEGITIMIDADE. PRESUNÇÃO DE INOCÊNCIA.

I - Não obstante se reconheça a legitimidade da exigência de idoneidade moral para o exercício profissional de vigilante, eventual indiciamento do investigado em Inquérito Policial ou o oferecimento de denúncia em Ação Penal ainda em curso, não tem o condão, por si só, de configurar a ausência daquele requisito, até que seja efetivamente considerado culpado, com o trânsito em julgado de eventual sentença condenatória, em observância ao princípio constitucional da presunção de inocência (art. 5º, LVII, da CF/88), restando, assim, sem nenhum efeito jurídico as disposições do art. 155, VI c/c o art. 156, § 1º, da Portaria n. 3.233/2012 -DG/DPF.".

Assim, sob a égide da legislação transcrita acima e do decidido na noticiada Ação Civil Pública n. 0039226-84.2013.4.01.3300/BA, que orientou o novo posicionamento do Departamento da Polícia Federal, conclui-se que ao impetrante não é impossível o exercício da atividade profissional de segurança privada desde que comprove, após o cumprimento da pena imposta, a necessária reabilitação da prática do delito.

Nesse contexto, conforme salientado pelo Ministério Público Federal na sua manifestação,  o impetrante foi condenado a pena privativa de liberdade de 01 (um) ano e 08 (oito) meses de reclusão,  que restou substituída por duas penas restritivas de direito - prestação de serviços à comunidade e prestação pecuniária.

A decisão condenatória, por sua vez,  transitou em julgado em 15/01/2019 e a sentença de extinção da punibilidade pelo cumprimento da pena foi proferida em 06/12/2019, conforme consta do processo criminal juntado aos autos (ids. 4058300.14013429 e 4058300.14013435).

Acerca de tal hipótese, confira-se o precedente que se segue:

"E M E N T A CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. CURSO DE RECICLAGEM PARA FORMAÇÃO DE VIGILANTE. NÃO HOMOLOGAÇÃO PELA POLÍCIA FEDERAL. ANTECEDENTES CRIMINAIS. CONDENAÇÃO PENAL TRANSITADA EM JULGADO HÁ MENOS DE CINCO ANOS.
1. A Constituição Federal expressamente possibilita a restrição do exercício profissional caso não atendidas as qualificações estabelecidas em lei.
2. A Lei 7.102/83 prevê como requisito para o exercício da profissão de vigilante não ter antecedentes criminais registrados .
3. O art. 155, § 4º, incisos II e III do art. 155 da Portaria n. 3.233/12-DG/PF estabelece que a condenação criminal não constituirá óbice ao registro profissional e ao exercício da profissão de vigilante quando obtida a reabilitação criminal fixada em sentença ou quando decorrido o período de tempo superior a cinco anos contados da data de cumprimento ou extinção da pena, hipótese em que não se enquadra o impetrante. Inocorrência de violação ao art. 5º, inc. XLVII, alínea "b", da Constituição Federal.
4. Da análise dos autos, observa-se que a sentença condenatória transitou em julgado em 20/7/2015, e a extinção da pena ocorreu apenas em 24/5/2017; portanto, ainda não houve a reabilitação, nos termos dos requisitos expressos no art. 94 do Código Penal.
5. Apelação a que se nega provimento.".[2]

Assim, à vista de tais premissas,  observa-se que o Impetrante não comprovou ser reabilitado criminalmente pelo juízo da condenação, razão pela qual a denegação da segurança é medida que se impõe.

3. Dispositivo

POSTO ISSO,  DENEGO a segurança pleiteada e extingo o processo com resolução do mérito

Sem custas, ex lege.

Sem honorários, ex vi art. 25 da Lei nº 12.016, de 07.08.2009.

Sentença não sujeita ao duplo grau de jurisdição.

Registrada, intime-se.

Recife, 23.09.2020.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE


________________________________________

[1] Disponível em https://arquivo.trf1.jus.br/PesquisaMenuArquivo.asp?p1=00392268420134013300&pA=&pN=392268420134013300. Acesso em 23.09.2020. E da consulta da  movimentação processual da noticiada Ação Civil Pública, vê-se que o Recurso Especial em face do acórdão foi inadmitido (AgInt no REsp 1702724(2016/0210567-3 de 02/08/2017)

[2] BRASIL. Tribunal Regional Federal da 3ª Região. (TRF 3ª Região, 3ª Turma,  ApCiv - APELAÇÃO CÍVEL - 5000044-52.2017.4.03.6002, Rel. Desembargador Federal MAIRAN GONCALVES MAIA JUNIOR, julgado em 07/11/2019, e - DJF3 Judicial 1 DATA: 11/11/2019)

Disponível em http://web.trf3.jus.br/base-textual/Home/ListaColecao/9?np=5.

Acesso em 22.09.2020.

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