sexta-feira, 11 de dezembro de 2020

ESCREVENTE DE CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL: APOSENTADORIA PELO INSS, POR IDADE.

Por Francisco Alves dos  Santos  Júnior

A aposentadoria do Escrevente de Cartório Extrajudicial dá-se pelo Estado onde trabalha, na  qualidade de servidor público, ou pelo INSS, na qualidade de Empregado vinculado ao Regime Geral da Previdência Social?

Na sentença que segue, esse assunto é tratado com muitos detalhes. 


Obs.: sentença pesquisada e minutada pela Assessora Rossana Marques 


 PROCESSO Nº: 0825002-25.2019.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

AUTOR: E G DE L 
ADVOGADO: L A M L De A 
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)

Sentença tipo A


EMENTA:- PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR IDADE. ESCREVENTE DE CARTÓRIO EXTRAJUDICIAL. VINCULAÇÃO AO REGIME GERAL DE PREVIDÊNCIA SOCIAL. PROVA ROBUSTA DE FILIAÇÃO DO AUTOR AO RGPS.

-Procedência.


Vistos etc.

1-Relatório

E G DE L, qualificado na Petição Inicial, ajuizou esta ação em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS, na qual requer, a título de tutela de urgência antecipada, a concessão do benefício previdenciário de Aposentadoria por Idade.

Requereu, inicialmente, o benefício da assistência judiciária gratuita e alegou, em síntese, que: seria segurado do INSS na condição de empregado desde 01/08/1972; possuiria os seguintes vínculos laborais que deveriam ser reconhecidos para fins de cálculo de tempo de contribuição como empregado: a) 01/08/1972 a 19/09/1972; b) 19/10/1972 a 06/06/1973; c) 02/06/1973 a 28/06/1976; d) 01/10/1976 a 30/08/2014; portanto, em 30/08/2014 (data do último vínculo laboral), o Autor possuiria 41 anos, 9 meses e 4 dias de tempo de contribuição; ademais, na data da DER (04/10/2019), já teria atingido a idade de 72 anos, o que permitiria a concessão da Aposentadoria por Idade; contudo, o seu requerimento de Aposentadoria por Idade e Tempo de Contribuição ainda não teria sido analisado até a presente data; o C. STF já teria definido o prazo de 45 dias para o INSS apresentar uma resposta administrativa; portanto, seria notório o seu interesse em propor a presente ação de concessão de aposentadoria; a  Constituição de Pernambuco/1989 teria estabelecido que os serviços notariais e de registros públicos seriam de caráter privado, exceto os já oficializados, exercido por delegação do Poder Público; a Lei Estadual nº 10.648/91 permitiria que os escrevente e os demais detentores de cargos em cartórios extraoficiais pudessem se manter vinculados ao Regime Próprio de Previdência Social; com a edição da Lei Federal nº 8.935/94, o regime jurídico previdenciário dos oficiais, notários e escreventes teria passado a ser o Regime Geral, na condição de Empregado ou Contribuinte Individual, conforme o caso, mas permitiu que aqueles que já eram detentores dos cargos em referência pudessem optar pela permanência no Regime Próprio de Previdência Social; contudo, com a edição da EC nº 20/98, teria sido afastado o direito à opção estabelecida pela Lei nº 8.934/94, que teria estabelecido o direito à opção estabelecida pela Lei nº 8.934/94, e restringiu a vinculação ao RPPS aos detentores de cargos públicos propriamente ditos, ou seja, aos servidores públicos estatutários, de pessoas jurídicas de direito privado; com isso, teria sido firmado o entendimento de que os escreventes de cartórios não oficiais nunca teriam ocupado cargo público, mas emprego público e, portanto, estariam vinculados ao RGPS, salvo  aqueles que adquiriram o direito a algum benefício previdenciário antes de 15/12/1998; alguns notários, em razão dessa discussão jurídica, teriam negligenciado, por alguns períodos, a sua obrigação legal/tributária de realizar o pagamento das contribuições sociais ao INSS dos seus escreventes, que eram seus empregados; a obrigação tributária quanto ao pagamento das contribuições previdenciárias fugiria à responsabilidade do segurado empregado, e seria ônus do empregador; o Decreto nº 3.048/99 e a IN 77/2015 do INSS estabeleceriam que os escreventes seriam segurados obrigatórios na modalidade de empregados. Teceu outros comentários, e requereu: "a) Determinar a citação do Instituto Nacional do Seguro social - INSS, através da sua Procuradoria, para que querendo apresente contestação, no prazo legal, sob pena de revelia; b) Determinar que o INSS apresente, na primeira oportunidade em que se pronuncie nos autos, o Processo de Concessão de Benefício Previdenciário, sob pena de cominação de multa diária, nos termos dos arts. 497 do CPC - a ser por esse Juízo; c) Deferir os efeitos da tutela urgência perseguida, por se tratar de verba de caráter alimentar, para que seja o INSS determinado a conceder o beneficio de aposentadoria por idade à parte Autora, com data de início a contar do requerimento administrativo, sob pena de pagamento de multa diária, à luz do disposto nos arts. 294 e seguintes CPC; d) Que seja a presente ação julgada totalmente procedente para: d.1) concessão da aposentadoria perquirida pelo Autor, sob a rubrica da aposentadoria por Idade (41), com o coeficiente de 100%, e fator previdenciário de 1,8116, ante o reconhecimento dos 41 anos, 09 meses e 14 dias de trabalho, pelo reconhecimento dos tempos de contribuição constantes da RAIS e da Declaração Patronal e demais documentos apresentados nos presentes autos; d.2) determinar, consequentemente, o cálculo da RMI (Renda Mensal Inicial) da aposentadoria do Autor, estabelecendo a DIB como sendo a data do pedido administrativo, levando-se em consideração o requerido no item anterior; d.3) determinar que o cálculo do Salário de Benefício e da RMI (Renda Mensal Inicial) seja realizado com base nas remunerações da demandante, devidamente comprovadas na presente ação, incluindo no PBC todos os salários-de-contribuição demonstrados na presente ação a partir de julho de 1994. d.4) restituir ao Autor os valores não percebidos a título de proventos de aposentadoria ao longo do tempo, desde a data do pedido administrativo, com os devidos acréscimos de juros e correção monetária, a serem quantificados pela Contadoria deste Juízo; d.5) confirmar os efeitos da tutela antecipada perseguida e eventualmente deferida, por se tratar de verba de caráter alimentar, para que seja o INSS determinado a conceder o beneficio de aposentadoria por idade à parte Autora, com data de início a contar do requerimento administrativo, sob pena de pagamento de multa diária, à luz do disposto nos arts. 294 do CPC; e) A condenação do INSS ao pagamento de eventuais honorários advocatícios na base de 20% sobre o valor da condenação, conforme dispõe o art. 85, §2º do CPC. f) O deferimento da justiça gratuita requerida, por ser a demandante pobre na forma da Lei;". Protestou pela produção de provas, "(...) especialmente a juntada de novos documentos, sobremaneira a oitiva de testemunhas (que confirmarão o labor continuo do autor no 2º Ofício de Registro de Imóveis) e outras mais, se, para tanto, necessárias forem à demonstração da  verdade.; Requer-se que ao final da presente demanda, caso sejam encontradas diferenças em favor do Autor, quando da expedição da RPV ou do precatório, que os valores referentes aos honorários advocatícios contratuais (cujo contrato segue anexo aos presentes autos), sejam expedidos em nome da sociedade de advogados signatários e contratados pelo Autor no percentual constante do mesmo, assim como eventuais honorários de sucumbência." Atribuiu valor à  causa e juntou instrumento de procuração e documentos.

Em atenção a Decisão deste Juízo, retificou o valor da causa; recolheu as custas processuais iniciais e juntou a guia respectiva, apresentou documentos novos, emendou a Petição Inicial e alegou que: além dos vínculos empregatícios já arrolados na Exordial, teria servido ao Exército, razão pela qual teria direito à contabilização do tempo de serviço, conforme estabelece art. 55, inciso I, da Lei 8.213/91. Requereu, ao final, a emenda da Petição Inicial para: "a) Modificar o tempo de contribuição a ser reconhecido em favor do autor, que implicará na fixação de fator previdenciário positivo, consoante explicitado acima, b) Modificar o valor da causa para que conste o montante de R$ 87.591,75; c) Juntar a guia de pagamento das custas processuais; d) Juntar os documentos complementares à comprovação do tempo de contribuição do autor."

Decisão em que se determinou a citação do INSS e a sua intimação para informar a fase do requerimento administrativo do Autor de concessão de aposentadoria; e, decorrido o prazo, que os autos retornassem para análise do pedido de tutela de urgência.

O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS apresentou Contestação na qual arguiu preliminar de ilegitimidade passiva ad causam, pois, segundo sustentou, o Autor não seria vinculado ao RGPS, mas sim ao Regime Próprio de Previdência Social dos Servidores do Estado de Pernambuco; e carência da ação por ausência de interesse processual, pois o Autor nunca teria formulado pedido de Aposentadoria por Idade, mas, sim Aposentadoria por Tempo de Contribuição. Requereu, pois, o acolhimento da preliminar e a extinção do processo sem resolução do mérito. No mérito, alegou, em síntese, que o vínculo da Parte Autora com o 2º Ofício de Registro de Imóveis da Capital teve início em 01/08/1972, quando foi admitido no citado Cartório; o Autor estaria enquadrado na categoria de servidor em sentido amplo, porque teria sido sob a égide da Constituição anterior e, no Estado de Pernambuco, teria sido submetido ao regime jurídico estatutário; a Constituição da República de 1988 teria assegurado, expressamente, em seu ADCT (art. 32), o respeito aos direitos dos servidores anteriores; a Lei nº 10.648/91 (Estado de Pernambuco) teria estabelecido que os Tabeliães de Notas, Oficiais de Registros e seus escreventes, seriam contribuintes obrigatórios do Instituto de Previdência dos Servidores do Estado de Pernambuco (IPSEP); e a Lei nº 8.935/94 teria assegurado aos escreventes a opção de transformar o seu regime jurídico em celetista, e apenas passariam ao RGPS se firmassem opção expressa pela transformação do regime jurídico; do contrário, continuariam regidos pelas normas aplicáveis aos servidores públicos estaduais; a Parte Autora não teria comprovado a opção pela mudança para o regime jurídico trabalhista; portanto, o pedido deveria ser julgado improcedente; na hipótese de ser considerada a Parte Autora vinculada ao RGPS, seria necessário a apresentação de Certidão de Tempo de Contribuição para fins de contagem recíproca. Teceu outros comentários e, ao final, requereu a improcedência dos pedidos; a condenação da Parte Autora nas custas e honorários advocatícios; na hipótese de condenação do INSS, que os juros de mora e a correção monetária sejam fixadas de acordo com a Lei nº 9.494/97, com a nova redação dada pela Lei nº 11.960/2009, e que o termo final da condenação seja fixado em 01/11/2017; e que os honorários advocatícios sejam fixados de acordo com o art. 85 do CPC, e Súmula nº 111/STJ.

O Autor apresentou Réplica e juntou o comunicado da decisão que indeferiu o seu requerimento de aposentadoria.

Certificado o pagamento satisfatório das custas processuais.

Decisão na qual foi determinada a intimação do Autor facultando-o apresentar a comprovação do recolhimento das contribuições previdenciárias do período de fevereiro de 2004 a outubro de 2008, ocasião em que ocupou o cargo de Oficial interino do 2º Ofício de Registro de Imóveis de Recife.

Em cumprimento à Decisão acima aludida, o Autor desistiu da averbação do período de fev/2004 a outubro/2008, tendo me vista ser período de contribuinte individual; o reconhecimento dos demais tempos de contribuição como empregado, consoante cálculos que anexou; a concessão da aposentadoria com o reconhecimento do fator previdenciário positivo e considerando as remunerações/salários percebidos pelo Autor ao longo dos anos; a procedência dos pedidos. Em seguida, juntou cálculo da RMI.

Despacho no qual foi determinada a intimação do INSS para se manifestar sobre a desistência parcial da ação veiculada pelo Autor; e, na sequência, que os autos retornassem para análise do pedido de tutela de urgência formulado na Inicial.

Certificado o decurso do prazo sem manifestação do INSS acerca da intimação supra.

É o relatório, no essencial.

Fundamento e decido.

2- Fundamentação

2.1 - Julgamento Antecipado

Considerando que os documentos anexados aos autos são suficientes para o deslinde da questão, decido julgar antecipadamente a lide(art. 355, I, CPC).

2.2- Matérias Preliminares

2.2.1 - Preliminar de ilegitimidade passiva ad causam

Referida preliminar confunde-se com o mérito da ação, o que foi reconhecido pelo próprio Réu ao levantá-la.

Portanto, resta prejudicada, porque a respectiva  matéria será analisada com o  mérito.

2.2.2 - Preliminar de ausência de interesse processual de e agir

O INSS contestou o mérito da demanda e pugnou pela improcedência dos pedidos formulados na inicial.

Assim, com a defesa apresentada, restou materializada a resistência do INSS à pretensão deduzida na Petição Inicial, configurando-se a lide e o interesse processual de agir do Autor.

Há de ser rejeitada a preliminar em tela.

2.3- Matéria de Merito

2.3.1 - Aspectos Gerais

O Autor pugna pela concessão do benefício de Aposentadoria por Idade, na condição de segurado empregado (Escrevente de Cartório Extrajudicial).

Os requisitos para a concessão do benefício previdenciário de Aposentadoria por Idade, previsto no art. 48 da Lei nº 8.213/91, são: implemento da carência exigida;  e  65 anos de idade, se homem, ou 60, se mulher.

A carência foi fixada pela Lei nº 8.213/1991 em 180 meses de contribuição (art. 25, II, da Lei Nº 8.213/91).

2.3.2- Exame do tempo urbano no caso concreto

A análise dos documentos anexados com a Petição Inicial leva à conclusão que o Autor preencheu o requisito etário (65 anos) em 2011, porquanto nascido em 06/08/1946 (id. 4058300.13009020).

Resta comprovada a sua filiação à Previdência Social, na condição de segurado empregado, em 01/08/1972 (id. 13009079) e que permaneceu nessa situação até ser demitido em 30/08/2014 (id. 13009062), perfazendo, portanto, a carência exigida.

Destarte, devem ser computados como tempo de contribuição e carência os seguintes interregnos laborais: de 15/01/1965 a 30/11/1965; de 01/08/1972 a 19/09/1972; de 19/10/1972 a 06/06/1973; de 02/07/1973 a 28/07/1976; de 01/10/1976 a 31/01/2004; e de 01/11/2008 a 30/08/2014.

No que diz respeito ao período que se estende de 15/01/1965 a 30/11/1965, durante o qual o Autor prestou serviço militar obrigatório, tenho que, nos termos do inciso I do art. 55 da Lei n° 8.213/91, também deve ser contado como tempo de contribuição, ante a Certidão expedida pelo Ministério do Exército anexada sob o id. 4058300.13471191, que atesta a incorporação do Autor em 15/01/1965 e o licenciamento em 30/11/1965.

As anotações na Carteira de Trabalho do Autor comprovam mencionados vínculos laborais.

Também comprovam os vínculos laborais a Certidão expedida pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco (id. 4058300.13009069), a Declaração de Vínculo Empregatício, Funcional e de Salarial expedida pelo Oficial do 2º Ofício de Registro de Imóveis de Recife (id. 4058300.13009062) e uma outra Certidão expedida pelo Tribunal de Justiça (id. 4058300.13471192).

Nesse ponto, importante frisar que a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições previdenciárias é do Empregador (Lei nº 8.212/91, arts. 30, I), não cabendo ao Autor/empregado fiscalizar tal atividade, razão pela qual não se lhe pode imputar qualquer efeito da ausência ou irregularidade no recolhimento das referidas contribuições, por seu empregador.

2.3.3 - Desistência Parcial

Note-se que o interstício laboral do período compreendido entre fevereiro de 2004 a outubro de 2008 não será considerado para efeito da aposentadoria pretendida, porque, nesse período, o Autor ocupou o cargo de Oficial interino do 2º Ofício de Registro de Imóveis de Recife e, nessa condição, era de sua responsabilidade o recolhimento das respectivas Contribuições Previdenciárias, o que não está comprovado nos autos. Na realidade, o Autor, regularmente intimado para comprovar o recolhimento das mencionas contribuições, desistiu de incluir o referido lapso temporal no cômputo do pretendido benefício previdenciário.

2.3.4 - Demais Períodos - Não Impugnação do INSS

Quanto aos demais períodos, de tudo o que se apurou nos autos, verifico que o INSS não apresentou qualquer impugnação,  relativamente à existência e duração dos respectivos vínculos laborais em tela, razão pela qual os tenho como incontroversos.

2.3.5 - Natureza Jurídica da Relações de Trabalho do Autor com os Referidos Empregadores

Fixada essa premissa inicial, observo que as Partes controvertem quanto ao Regime Previdenciário ao qual a Parte Autora esteve vinculada, quando trabalhou como Escrevente do 2º Ofício de Registro de Imóveis de Recife.

O Autor sustenta a tese de vinculação ao Regime Geral de Previdência Social - RGPS/INSS, na condição de empregado; em contrapartida, o INSS defende que o Autor integrava o Regime Previdenciário Próprio dos Servidores Públicos do Estado de Pernambuco - RPPS/IPSEP, na condição de servidor público.  

Pois bem, os documentos oficiais anexados aos autos comprovam que o Autor, durante o período trabalhado no 2º Ofício de Registro de Imóveis de Recife, de fato, era segurado obrigatório do Regime Geral de Previdência Social - RGPS, na condição de empregado regido pela CLT.

A "DECLARAÇÃO DE VÍNCULO EMPREGATÍCIO, FUNCIONAL E DE SALÁRIO", emitida pelo Oficial do 2º Ofício de Registro de Imóveis de Recife, comprova que o Autor era funcionário da referida Serventia desde 01/10/1976, tendo sido admitido no regime Celetista, na função/cargo de Escrevente, e exerceu a referida função até a data de sua demissão em 30/08/2014 (id. 4058300.13009062).

A certidão emitida pelo Tribunal de Justiça de Pernambuco, em 20/01/2006,  atesta que o Autor foi nomeado para o cargo de Escrevente do 2º Ofício de Registro Geral de Imóveis da Capital em 07/04/1978 e que é "remunerado pelo Titular do Cartório, não percebendo, portanto, pelos Cofres Públicos" (id. 4058300.13009069).

Certidão mais recente, emitida em 02/05/2019, pelo mesmo Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco - TJPE, atesta que o serventuário, o ora Autor,  não recebe pelos Cofres Públicos (id. 4058300.13471192).

Ademais, a Carta de Indeferimento do benefício emitida pelo INSS, reconhecendo que foram trabalhados 22anos, 3meses e 0dia, entre 01/10/1976 a 31/12/1998, é praticamente um reconhecimento tácito da Autarquia de que o Autor integrava o RGPS, antes da Constituição da República/88 e da Lei nº 8.935/94 (id. 4058300.14755663).

Portanto, diante da consistente prova documental carreada aos autos, é possível concluir que o Autor, durante todo o período em que trabalhou no 2º Ofício de Registro de Imóveis de Recife, estava vinculado ao regime celetista, não recebia dos cofres públicos e estava vinculado ao RGPS, caindo por terra a argumentação do INSS de que o Autor estava vinculado ao RPPS.

Destarte, considerando que, em 04/10/2019, o Autor já havia implementado ambos os requisitos necessários à concessão do benefício, uma vez que já contava com mais de 65 anos de idade e atendeu à carência exigida, conforme anteriormente explicitado, é de se reconhecer que fazia e faz jus ao benefício de Aposentadoria por Idade.

Com efeito, considerando que o Autor, durante todo o exercício de sua atividade laboral esteve filiado ao RGPS, desnecessária a juntada da Certidão de Tempo de Contribuição em regime próprio, pois não haverá transferência de tempo de contribuição de um regime para o outro, perdendo todo o sentido a preocupação do INSS de que o tempo não seja utilizado em outro regime.

No sentido do exposto, já decidiu o E. TRF-5ª Região, in verbis:

"PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA POR TEMPO DE CONTRIBUIÇÃO. ESCREVENTE. CNIS E CARTA DE INDEFERIMENTO DEMONSTRANDO A CONDIÇÃO DE FILIADA AO RGPS. SUPRIMENTO DE OMISSÃO QUANTO À FIXAÇÃO DO SALÁRIO-DE-CONTRIBUIÇÃO. APELAÇÃO DO INSS IMPROVIDA.

1. Trata-se de apelação interposta pelo INSS contra sentença que deferiu o benefício de aposentadoria por tempo de contribuição à particular, pela comprovação de mais de 38 anos de trabalho, com base nas Relações Anuais de Informações Sociais - RAIS, "as quais remontam a 1979 e comprovam a continuidade do vínculo empregatício com o 1º Ofício de Registro de Imóveis do Recife (ids. 4736917, 4736927, 4736928, 4736946 e 4736940)."

 2. O cerne da presente controvérsia consiste em perquirir se a apelada integra o RGPS a fim de se vislumbrar seu direito à aposentadoria por tempo de contribuição, dado o desempenho da função de escrevente em cartório.

3. Primeiramente, denota-se que o INSS não impugna a duração do vínculo ora analisado, que resta incontroverso.

 4. A particular exerceu a ocupação de escrevente entre 02/04/1979 e 17/04/2017, tendo o seu vínculo precedido a CF/1988 e a Lei nº 8.935/1994. No período que antecede o referido diploma normativo, os escreventes eram vinculados, em regra, a regime próprio de previdência.

5. No entanto, no presente caso, verifica-se que a particular consta como filiada ao INSS como empregada no referido vínculo, consignada a data de início em 02/04/1979, o que indica sua vinculação ao RGPS mesmo enquanto escrevente cartorária. Ademais, na carta de indeferimento do benefício emitida pelo INSS, a autarquia reconhece que foram trabalhados 17 anos, 11 meses e 17 dias até 16/12/1998. Significa dizer que o INSS admitiu o tempo trabalhado anteriormente à CF/1988 e à Lei nº 8.935/1994, o que corrobora a alegação de que a particular já era filiada ao RGPS àquela altura.

6. Destarte, admitindo, com base no conjunto probatório acima, que a apelada esteve vinculada ao RGPS desde o início do labor, em 02/04/1979, despicienda a juntada da Certidão de Tempo de Contribuição em regime próprio, uma vez que se verificou que sempre foi filiada ao RGPS.

7. Destarte, irretocável a sentença, impende analisar a fixação dos consectários legais relativamente às parcelas vencidas. Não assiste razão ao INSS, correta a sentença, pois cabível a aplicação do Manual de Cálculos da Justiça Federal, que reproduz as orientações constantes do REsp no julgamento do REsp 1.492.221 - PR, submetido à sistemática dos recursos repetitivos, na linha do que definiu o STF, no julgamento do RE870947/SE-RG, quanto à aplicabilidade do art. 1º-F. Por ocasião do referido julgamento, o STF afastou o uso da TR como índice de correção monetária dos débitos judiciais da Fazenda Pública, mesmo no período da dívida anterior à expedição do precatório. Inclusive, já foram julgados os embargos de declaração da decisão que dizia respeito à modulação dos efeitos, em 03/10/2019, entendendo o STF pela sua imediata aplicabilidade.

8. Quanto ao pedido veiculado em contrarrazões para a fixação do salário-de-contribuição, verifica-se que se tratava de pleito aduzido na inicial, tendo restado omissa a sentença a seu respeito. Sendo assim, na forma do artigo 1.013, § 3º, III, do CPC, cabe conhecer do pedido e suprir a referida omissão.

9. Para a fixação do salário-de-contribuição, cabe o recurso ao CNIS, que não foi juntado em sua integralidade aos autos, mas que constitui registro à disposição do INSS das remunerações obtidas pelo segurado e, em sua deficiência, cabe o recurso ao RAIS para suprir eventual omissão.

10. Diante do exposto, apelação do INSS improvida, mantido o deferimento da aposentadoria por tempo de contribuição. 11. Ante a dupla sucumbência do INSS, majoram-se os honorários que haviam sido fixados no mínimo das faixas do art. 85, § 3º, do CPC, em um ponto percentual, nos termos do § 11 do mesmo dispositivo.".[1]).

Ante o exposto, é de ser julgado procedente o pedido formulado na Petição Inicial.

2.3.2- Do coeficiente de cálculo da Aposentadoria por Idade

A renda mensal da Aposentadoria por Idade corresponde a uma parcela básica de 70% (setenta por cento) do salário de benefício, mais 1% (um por cento) por grupo de doze contribuições, até o máximo de 100% (cem por cento) (art. 50, Lei nº 8.213/91).

Portanto, considerando que o Autor implementou mais de 30(trinta) grupos de 12 competências (tendo em vista que a responsabilidade pelo recolhimento das contribuições era do empregador), faz jus à utilização do coeficiente de 100% (70% + 30%).

O cálculo da RMI - Renda Mensal Inicial há de ser realizado com base nas remunerações do Autor comprovadas nos autos com os seguintes documentos: declaração de vínculo empregatício, RAIS - Relação Anual de Informações Sociais (Id´s 4058300.13009046 e 4058300.13009049), e CTPS.

Ademais, embora não tenha sido juntado aos autos, mas constitui documento à disposição do INSS, caberá a utilização do CNIS, para a fixação do salário de contribuição e, por conseguinte, do salário de benefício e, assim, apurar-se o valor da RMI.  

2.3.3 - Da tutela de urgência

Ante os fundamentos acima expostos, tenho por satisfeita a probabilidade do direito.

Quanto ao perigo de dano, consubstancia-se na natureza alimentar do benefício previdenciário em tela.

Presentes os requisitos legais (CPC, art. 300), cumpre deferir a tutela de urgência antecipada.

3-Dispositivo

3.1- Matérias Preliminares:

3.1.1 - não conheço da preliminar de ilegitimidade passsiva ad causam da defesa do INSS;

3.1.2 - rejeito a preliminar de falta de interesse processual de agir da Parte Autora, levantada na defesa do INSS.

3.2- Concedo a tutela provisória de urgência e determino ao INSS que implante, no prazo de 15(quinze) dias, o benefício de Aposentadoria por Idade em favor do Autor, EDUARDO GOMES DE LIMA, considerando como tempo de contribuição os períodos trabalhados entre 15/01/1965 a 30/11/1965, 01/08/1972 a 19/09/1972, 19/10/1972 a 06/06/1973, 02/07/1973 a 28/07/1976, 01/10/1976 a 31/01/2004; 01/11/2008 a 30/08/2014, no valor correspondente a 100% do salário de benefício, e fator previdenciário, caso benéfico ao Autor, sob pena de pagamento de  mula mensal no valor máximo do benefício previdenciário, sem prejuízo da responsabilização civil, criminal e administrativa do Servidor e/ou respectiva Chefia der causa ao pagamento dessa multa;  

3.3- Julgo procedentes os pedidos, nos termos da tutela concedida, e condeno o INSS a conceder o benefício de Aposentadoria por Idade ao Autor em caráter definitivo, considerando como tempo de contribuição os períodos trabalhados entre 15/01/1965 a 30/11/1965, 01/08/1972 a 19/09/1972, 19/10/1972 a 06/06/1973, 02/07/1973 a 28/07/1976, 01/10/1976 a 31/01/2004; 01/11/2008 a 30/08/2014, no valor correspondente a 100% do salário de benefício, e fator previdenciário, caso benéfico ao Autor, bem como a pagar as diferenças vencidas, a contar da data do requerimento administrativo em 04/10/2019, com juros de mora a contar da citação e correção monetária, observados os índices e a forma  consignados no Manual de Cálculos da Justiça Federal que estiver em vigor no momento do cumprimento da sentença.

3.4 - condeno ainda a parte Ré no pagamento de honorários advocatícios que, como já se trata de matéria por demais conhecida, que não deve ter exigido muito esforço do(a) I. Patrono(a) da Parte Autora, arbitro no mínimo legal, observados os índices da gradação do § 3º do art. 85 do vigente Código de Processo Civil sobre o total das parcelas vencidas e das 12(doze)primeiras parcelas vincendas decorrentes desta sentença(§ 9º do art. 85 do NCPC).

De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição, porque se trata de condenação ainda ilíquida (CPC, art. 496, § 3°).

R.I.

Recife, 11.12.2020.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal da 2ª Vara da JFPE

(rmc)



[1] BRASIL. Tribunal Regional Federal da 5ª Região.3ª Turma. Processo nº 08018464220184058300, Apelação Civil, Relator Desembargador Federal Fernando Damasceno,  Julgamento em 23/04/2020, Consulta feita em 11.12.2020.

terça-feira, 8 de dezembro de 2020

IMPUGNAÇÃO DE ASSINANATURA

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O vigente Código de Processo Civil de 2015 modificou a terminologia para impugnação de assinatura, mas a regra do Código de Processo Civil de 1973, segundo a qual cabe a quem alega comprovar que a assinatura é falsa,  continua a mesma.   

PROCESSO Nº: 0801121-92.2014.4.05.8300 - MONITÓRIA

AUTOR: CAIXA ECONOMICA FEDERAL
ADVOGADO: RL G e outro
RÉU: J N B DA  
ADVOGADO: M R Da S
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

 

 

DECISÃO

1. Relatório e Fundamentação

O pedido formulado pela CAIXA não poderá ser deferido (ID. 4058300.12171456).

Na decisão acostada sob ID. 4058300.4310900, consta, na sua fundamentação, o seguinte trecho:

"(...) como foi o Embargante que arguiu a mencionada falsidade e quem a argui passa a ter o ônus da prova (inciso I do art. 429 do mencionado diploma processual), e como requereu a realização dessa prova, caber-lhe-á adiantar a verba honorária pericial que venha a ser arbitrada(art. 95 do mesmo diploma processual)."

Constato haver engano deste Magistrado, quanto ao ônus da prova, na mencionada decisão.

Explico:

A respeito do assunto, rezava o Código de Processo Civil de 1973:

"Art. 389 - Incube o ônus da prova quando:

I - se tratar de falsidade de documento, à parte que a arguir;

II - se tratar de contestação de assinatura, à parte que produziu o documento".

O vigente Código de Processo Civil de 2015, trata da mesma matéria da seguinte forma:

"Art. 429. Incumbe o ônus da prova quando:

I - se tratar de falsidade de documento ou de preenchimento abusivo, à parte que a arguir;

II - se tratar de impugnação da autenticidade, à parte que produziu o documento.".

Note-se que a "contestação de assinatura" do Diploma Processual de 1973 agora encontra-se, de forma mais técnica, na "impugnação da autenticidade" do vigente Diploma Processual de 2015, no inciso II do art.429 acima  transcrito.

Então, como há regra específica para a situação, não se aplica a regra geral do art. 95 do atual Código de Processo Civil, de forma que cabe à CAIXA, que apresentou o documento cuja autenticidade não é reconhecida pelo ora Embargante, fazer a prova da sua autenticidade.

Logo, aquela decisão sob ID. 4058300.4310900, merece, nesse particular, ser modificada, para se estabelecer que o ônus da prova da autenticidade da assinatura do Embargante cabe à CAIXA.

2. Dispositivo

Posto isso, indefiro o pedido de julgamento antecipado formulado pela CAIXA e, modifico a decisão sob ID. 4058300.4310900 e estabeleço que o ônus da prova, quanto à autenticidade da assinatura aposta no documento em questão, cabe à CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CAIXA, pelo que a verba pericial não se paga à luz da ali mencionada Resolução do CJF, mas sim diretamente pela mencionada Parte autora da ação monitória e ora Embargada.

Intimem-se.

Recife, 30.03.20201061

Francisco  Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal, 2a Vara Federa/PE.


OBS.: 

1 - A 4ª Turma do Superior Tribunal de Justiça decidiu, em 15.06.2021, da mesma forma que o Juiz Federal da 2a Vara da JFPE na Decisão supra, verbis: 

"4. Incumbe ao apresentante do documento o ônus da prova da autenticidade da assinatura, quando devidamente impugnada pela parte contrária, não tendo o reconhecimento das rubricas o condão de transmudar tal obrigação, pois ainda que reputado autêntico quando o tabelião confirmar a firma do signatário, existindo impugnação da parte contra quem foi produzido tal documento cessa a presunção legal de autenticidade.".

Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 4ª Turma. REsp 1313866/MG, Recurso Especial nº 2012/0051059-2, Relator Ministro Marco Buzzi, julgamento em 15/06/2021, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 22/06/2021.

Disponível em https://scon.stj.jus.br/SCON/pesquisar.jsp

Acesso em 13.07.2021.

2 - A 2ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, em 01.07.2021, afetou a questão para efeito repetitivo, por unanimidade, verbis:  "CERTIDÃO Certifico que a egrégia SEGUNDA SEÇÃO, ao apreciar o processo em epígrafe na sessão realizada nesta data, proferiu a seguinte decisão: A Segunda Seção, por unanimidade, aprovou questão de ordem suscitada pelo Sr. Ministro Relator, para redefinição da questão a ser discutida no recurso especial afetado, restringindo-se a controvérsia da afetação apenas ao item 1.3 da proposta aprovada pela Segunda Seção do STJ (tema 1.061), a seguir: Nas hipóteses em que o consumidor/autor impugnar a autenticidade da assinatura constante do contrato juntado ao processo, cabe à instituição financeira/ré o ônus de provar essa autenticidade (CPC, art. 429 II), por intermédio de perícia grafotécnica ou mediante os meios de prova legais ou moralmente legítimos (CPC, art. 369). Os Srs. Ministros Moura Ribeiro, Nancy Andrighi, Luis Felipe Salomão, Raul Araújo, Paulo de Tarso Sanseverino, Antonio Carlos Ferreira, Ricardo Villas Bôas Cueva e Marco Buzzi acompanharam o Sr. Ministro Relator. Presidiu a Sra. Ministra Maria Isabel Gallotti.". 01.07.2021.

Disponível em https://processo.stj.jus.br/repetitivos/temas_repetitivos/pesquisa.jsp?novaConsulta=true&tipo_pesquisa=T&sg_classe=REsp&num_processo_classe=1846649 

Acesso em 13.07.2021.

sábado, 5 de dezembro de 2020

MARECHAL HUMBERTO DE ALENCAR CASTELO BRANCO PODE SER HOMENAGEADO DANDO NOME A PRÓPRIO PÚBLICO FEDERAL.

 

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Na sentença que segue, uma interessante questão é discutida, a respeito do alcance das recomendações da denominada Comissão da Verdade, envolvendo o nome do primeiro Presidente do regime Militar de 1964, o Marechal Humberto de Alencar Castelo Branco. 

Boa  leitura. 



PROCESSO Nº: 0812782-58.2020.4.05.8300 - AÇÃO CIVIL PÚBLICA
AUTOR: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)



Sentença tipo A

EMENTA. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. ADMINISTRATIVO. COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE. RECOMENDAÇÃO Nº 28. CARÁTER NÃO VINCULANTE. .

-As recomendações da Comissão Nacional da Verdade não têm caráter vinculante e a recomendação referida nestes autos não goza da unanimidade do que pensam todos os Historiadores, relativamente ao papel do Marechal Humberto Alencar Castelo Branco no regime militar que se implantou no Brasil em março de 1964.

-Leis Municipais e Estaduais, relativas à denominação de próprios públicos, não obrigam a UNIÃO na fixação de nomes para os seus próprios públicos.

-Improcedência.  

 

Vistos, etc. 

1-Relatório

O MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL ajuizou esta Ação Civil Pública com pedido de tutela de urgência em face da UNIÃO, por ato do Ministério da Defesa - Exército Brasileiro, na qual almeja, primordialmente: 

"(...) a alteração do nome destinado ao prédio que está sendo construído pelo Comando da 7ª Região Militar do Exército, 'Edifício Marechal Castelo Branco', no imóvel situado na Avenida Rosa e Silva, s/n, Bairro da Tamarineira, Recife/PE (em frente ao Hospital Psiquiátrico Ulisses Pernambucano), obra financiada com recursos federais."

Alegou que a Procuradoria da República no Estado de Pernambuco instaurou o Inquérito Civil em anexo (IC n.º 1.26.000.002978/2018-81) para "Apurar notícia de construção de edifício, pelo Exército Brasileiro, na Avenida Conselheiro Rosa e Silva, em frente ao Hospital Ulysses Pernambucano, no bairro da Tamarineira, Recife/PE, cuja placa de descrição da obra indica, além do financiamento com recursos federais, a denominação 'Edifício Marechal Castelo Branco', ex-presidente da República relacionado entre os autores de graves violações de direitos humanos pela Comissão Nacional da Verdade (CNV), em seu Relatório Final, Capítulo 16 ("A autoria das graves violações de direitos humanos"), a fim de se verifique eventual descumprimento da Recomendação nº 28 do referido Relatório Final da CNV."

E aduziu, em síntese, que: instado a se manifestar, considerando o teor da referida Recomendação da CNV, o Comando da 7ª Região Militar do Exército teria defendido a denominação atribuída ao edifício sob os seguintes argumentos: "i) a União é possuidora de imóveis, Próprios Nacionais Residenciais (PNR), com a finalidade de moradia para os militares na ativa; ii) todos os imóveis jurisdicionados ao Exército possuem denominações de data, fatos ou personalidades históricas; iii) o marechal Humberto de Alencar Castelo Branco, militar do Exército Brasileiro, foi um dos principais responsáveis pela campanha do Brasil, por meio da Força Expedicionária Brasileira (FEB) durante a 2ª Guerra Mundial, tendo a escolha da denominação considerado a sua carreira militar exitosa; iv) como órgão da administração pública, está adstrito "a cumprir à lei (em sentido formal), o que não se subsome ao caso em tela"; v) não houve procedimento formal prévio para a aludida escolha, tendo a administração militar se valido da discricionariedade que lhe cabe para optar pelo nome escolhido (OFÍCIO 904/2018 PE-COMANDO - PR-PE-00057914/2018)"; em seguida, os autos administrativos teriam sido arquivados pela Procuradora da República oficiante à época; todavia, apreciando o recurso interposto pelo Exma. Procuradora da República Carolina de Gusmão Furtado, na condição de noticiante e integrante do Grupo de Trabalho Direito à Memória e à Verdade, a Procuradoria Federal dos Direitos do Cidadão (PFDC) decidiu não homologar o arquivamento pelos seguintes fundamentos: "i) 'respeito ao valor jurídico do Relatório Final da Comissão Nacional da Verdade e postulados da Justiça de Transição; ii) não observância da jurisprudência da Corte Interamericana de Direitos Humanos; iii) manifestação do Grupo de Trabalho Memória e Verdade da PFDC" (DECISÃO MONOCRÁTICA 616/2019 PFDC - PGR-00456662/2019)."; e assim, retomada a instrução dos autos extrajudiciais, o Comando Militar teria sido novamente instado a prestar informações atualizadas sobre a obra, bem como para encaminhar cópia do processo de tombo e do ato de registro do imóvel; em resposta enviada em 25/11/2019, o Chefe do Estado-Maior da 7ª Região Militar teria reiterado as informações iniciais e acrescentado que "i) a denominação do aludido edifício é a mesma inicialmente prevista (Ed. Marechal Castelo Branco), denominação atribuída conforme os requisitos previstos na Portaria Ministerial nº. 039, de 12 JAN 1996; ii) a obra do Edf. Castelo Branco foi objeto de inexecução e que a retomada da construção estava prevista para o ano de 2020, com prazo de 18 (dezoito) meses para a execução dos serviços remanescentes por nova empresa contratada (OFÍCIO 903/2019 7ª RM/PE - PR-PE-00059962/2019)."; no curso do procedimento administrativo, a Assembleia Legislativa de Pernambuco  também teria sido oficiada para informar as providências adotadas com o objetivo de cumprir a Recomendação nº 28 da CNV, e teria aduzido que "i) em 20 de setembro de 2019 foi promulgada a lei estadual nº 16.629 que proíbe a administração pública estadual de fazer qualquer tipo de homenagem ou exaltação ao golpe militar de 1964 e ao período ditatorial subsequente, incluindo na vedação a atribuição de nome a prédios, rodovias, repartições públicas e bens de qualquer natureza de pessoa que conste no Relatório Final da CNV como responsável por violações de direitos humanos (art. 1º e parágrafo único); ii) como resultado da Comissão da Verdade instituída em âmbito estadual no ano de 2017, foi recomendado ao governo do Estado que promova a alteração de logradouros, vias de transporte, edifícios e instituições públicas que se referiram a agentes ou particulares que notoriamente tenham tido participação direta em atos de graves violações de direitos humanos durante o período de ditadura previsto na Lei nº 12.528, de 18 de novembro de 2018". E prosseguiu: ante o posicionamento do Comando do Exército local, que teria afrontado a Recomendação nº 28 da CNV, a promoção dos direitos humanos, assim como a preservação do patrimônio histórico e cultural imaterial brasileiro, não teria restado ao MPF outra alternativa senão a judicialização do caso com vistas a impedir que fosse perpetuada e festejada grave violação de direitos humanos promovida pelo homenageado da ora demandada. Sustentou a competência da Justiça Federal e a legitimidade ativa do Ministério Público Federal para propor a presente ação e transcreveu trecho da Petição Inicial na ACP nº 1000944-36.2018.4.01.3800, que tramita perante a Justiça Federal do Estado de Minas Gerais/MG, subscrita pelo procurador da República Edmundo Antônio Dias Netto Junior, no qual teriam sido abordadas as graves violações de direitos ocorridas no Brasil durante a ditadura. Transcreveu trechos de livros do jornalista Elio Gaspari, autor de um conjunto de obras sobre a ditadura militar brasileira, e acrescentou que: o ex-presidente Castelo Branco teria sido um dos protagonistas desse período, pois era o chefe do Estado-Maior do Exército quando eclodiu o golpe militar de 1964, que derrubou o presidente constitucional João Goulart e teria instaurado a ditadura militar no Brasil, tendo sido escolhido pelos militares para terminar o mandato do presidente deposto; assim, teria sido incluído no Capítulo 16  do Relatório Final da CNV, na qualidade de "responsável político-institucional pela definição geral da doutrina que permitiu as graves violações e das correspondentes estratégias, e pelo estabelecimento das cadeias de medidas que determinaram o cometimento desses ilícitos (Vol. I, p. 844)"; alegou que Castelo Branco, como primeiro presidente da ditadura militar instaurada pelo golpe de 1964, governou o país entre 1964 e 1967; em seu governo teriam sido gestados os elementos que teriam constituído o alicerce do autoritarismo e das ilegalidades, consistentes no completo aniquilamento de direitos e garantias fundamentais, que teriam marcado esse período de exceção da história do Brasil; os elementos históricos comprovariam e seriam suficientes para caracterizar a impertinência jurídica de lhe serem prestadas homenagens por órgãos componentes da administração pública, seja ela federal, estadual ou municipal; celebrar Castelo Branco, longe de festejar sua "carreira militar exitosa", seria promover o desprezo pelas instituições democráticas e, indiretamente, apoiar a possibilidade de rupturas constitucionais; lembrou que, à luz da Constituição Federal, sua conduta seria, nos tempos atuais, um crime inafiançável e imprescritível, nos termos do inciso XLIV do artigo 5º; tais motivos teriam levado a CNV a relacionar o marechal Castello Branco entre os autores de graves violações de direitos humanos, e não poderia ser ignorado pela administração quando da denominação de prédios públicos e promoção de homenagens. Discorreu sobre: a "democracia como valor constitucional"; a "Justiça de Transição, direito a não-repetição e reparação dos danos causados às vítimas", e acrescentou que: no dia 10/12/2014, a CNV teria apresentado seu Relatório Final, contendo 29 recomendações de ações, medidas institucionais e iniciativas de reformulação normativa, destinadas à prevenção de graves violações de direitos humanos, bem como a assegurar sua não repetição e a promover o aprofundamento do Estado Democrático de Direito; dentre elas, a Recomendação nº 28 que dispõe: "28 - Preservação da memória das graves violações de direitos humanos; com a mesma finalidade de preservação da memória, a CNV teria proposto a revogação de medidas que, durante o período da ditadura militar, objetivaram homenagear autores das graves violações de direitos humanos; dentre outras, deveriam ser adotadas medidas visando "b) promover a alteração da denominação de logradouros, vias de transporte, edifícios e instituições públicas de qualquer natureza, sejam federais, estaduais ou municipais, que se refiram a agentes públicos ou a particulares que notoriamente tenham tido comprometimento com a prática de graves violações"; a conduta perpetrada pelo Comando do Exército afrontaria a recomendação da CNV, pois teria atribuído ao prédio, ainda em construção, em homenagem a representante do longo período de ditadura militar no pais, entre 1964 e 1985, conforme verificar-seia da placa afixada na obra em imagem extraída do google maps; o relatório da CNV possuiria valor jurídico e suas conclusões representariam a manifestação oficial do Estado sobre a violação de direitos humanos durante a ditadura militar, conforme teria destacado Procurador da República e ex-Procurador Federal dos Direitos do Cidadão Adjunto, Marlon Alberto Weichert, entre os anos de 2018 e 2020, também coordenador do Grupo de Trabalho Memória e Verdade; os órgãos civis e militares do Poder Executivo deveriam respeitar as conclusões e as recomendações da CNV; ao denominar prédio público em homenagem a "reconhecido agente envolvido na perpetração de graves violações aos direitos humanos, o Exército Brasileiro, arbitrariamente, viola os postulados constitucionais que visam o fortalecimento da democracia no país em afronta à preservação e reconstrução da memória histórica perseguida pelos ordenamentos pátrio e internacional.";  a Corte Interamericana de Diretos Humanos, em mais de uma oportunidade, teria condenado o Brasil a reconhecer sua responsabilidade - em âmbito interno e internacional - pelos abusos e violações de direitos humanos cometidos durante a ditadura militar, a reparar e amparar as famílias de desaparecidos políticos, para além de investigar e punir os autores dos crimes de desaparecimento forçado de pessoas, considerados crimes contra humanidade, conforme sentenças proferidas nos casos Herzog e outros vs Brasil e Gomes Lund vs Brasil, em relação aos quais não se aplicaria anistia, consoante teria entendido a Corte; uma das condenações visaria justamente a garantia de não repetição desses fatos. Discorreu sobre as limitações normativas para a nomeação de bens públicos que teriam sido trazidas pela Constituição da República/88 e afirmou que a Lei nº 6.454/77, na redação dada pela Lei nº 12.781/2013, proibiria que se atribuísse nome de pessoa viva a logradouros públicos, mencionaria a atividade dos homenageados e disporia que aquele que defender ou explorar mão de obra escrava não poderia ter seu nome atribuído a bens públicos; o Estado de Pernambuco teria editado a Lei nº 16.629, de 20 de Setembro de 2019 que veda à "Administração Pública Estadual fazer qualquer tipo de homenagem ou exaltação ao Golpe Militar que sofreu o Brasil em 1964 e ao período de ditadura subsequente ao golpe e proíbe de homenagens a pessoas que tenham praticado violações de direitos humanos durante o período da ditadura militar". Teceu outros comentários, e requereu a concessão da tutela provisória, tanto na modalidade do art. 300, como na prevista no art. 311 do Código de Processo Civil, a fim de ser:

"(..) determinado à União, até julgamento definitivo da ação, obrigação de não fazer consistente em abster-se de utilizar a atual denominação conferida ao edifício ainda em construção na Avenida Conselheiro Rosa e Silva, s/n, bairro da Tamarineira, Recife/PE, retirando o nome da placa colocada na frente da obra.". Requereu, ao final:

"1) o recebimento desta petição inicial, do Inquérito Civil nº 1.26.000.0002978/2018-81 que a instrui e demais documentos juntados;

2) a concessão da tutela de urgência, para determinar à União Federal, por intermédio do EXÉRCITO BRASILEIRO, que suspenda imediatamente a utilização do nome "Edifício marechal Castelo Branco" nas placas indicativas da obra em execução de imóvel destinado à residência militar situado na Avenida Conselheiro Rosa e Silva, s/n, bairro da Tamarineira, Recife/PE;

3) a citação da demandada para contestar a ação, com as advertências de praxe, inclusive quanto à confissão da matéria de fato, em caso de revelia;

4) a condenação da União, por intermédio do Ministério da Defesa-EXÉRCITO BRASILEIRO, à obrigação de fazer consistente em implementar a Recomendação de nº 28, emitida pela Comissão Nacional da Verdade em seu Relatório Final, se abstendo de atribuir ao prédio em construção na Av. Conselheiro Rosa e Silva, s/n (em frente ao Hospital Psiquiátrico Ulisses Pernambucano), Tamarineira, Recife/PE, a denominação de Marechal Castelo Branco ou qualquer outro personagem que tenha tido comprometimento com a prática de graves violações aos direitos humanos;

6) julgado procedente o pedido, sejam renovados na sentença os efeitos da tutela liminar concedida, para que sejam mantidos seus efeitos até o trânsito em julgado da presente ação. Requer-se, ainda, o julgamento antecipado da lide, conforme art. 335, inc. I do NCPC, por se tratar de matéria exclusivamente de direito e, caso Vossa Excelência entenda necessária dilação probatória, pugna pela produção de todas as provas em direito admitidas."

Juntou o Inquérito Civil - IC 1.26.000.002978/2018-81.

Decisão na qual este Juízo indeferiu o pedido de tutela de urgência.

Regularmente citada, a UNIÃO apresentou Contestação na qual levantou preliminar de ausência de interesse processual do Ministério Público Federal, pois, segundo afirmou, a via utilizada não seria a adequada. No mérito, alegou, em síntese, que: o pleito do MPF atentaria contra os artigos 2º, 5º e 142 da Constituição da República/88, pois invadiria a seara de ato interno das Forças Armadas, que teria sido praticado sem qualquer ilegalidade;  imóvel cujo nome estaria sendo questionado na presente demanda se trataria de um imóvel Próprio Nacional Residencial (PNR), jurisdicionado ao Exército, com a finalidade de moradia para os militares na ativa, que seriam frequentemente transferidos de cidades, dentro do Brasil; no âmbito específico do Comando Exercito, todos os imóveis sob sua jurisdição possuiriam denominações de data, fatos ou personalidades históricas, conforme preceituaria a Portaria Ministerial nº 39/1996. Transcreveu esclarecimento do Comando da 7ª Região Militar, por meio do Ofício nº 455-Asse Ap As Jurd/Ch EM/7ª RM, sobre o nome do imóvel objeto da irresignação do MPF, e aduziu que: a atuação da Administração Pública, ao escolher o nome do imóvel, teria seguido os ditames legais e  regulamentares, razão pela qual não haveria motivo jurídico para a insurgência do MPF, haja vista que a escolha do nome estaria inserida na seara discricionária do Exército. Acrescentou que o fundamento da Exordial estaria escorado na Recomendação n. 28 da Comissão Nacional da Verdade, todavia, as Recomendações da Comissão Nacional da Verdade, como o próprio nome sugeriria, não vinculariam a atuação do Poder Público, e apenas teriam caráter sinalizador, consoante se extrairia da Lei nº 12.528/11, que criou a Comissão Nacional da Verdade; aduziu que, em caso similar ao presente, em demanda ajuizada pelo MPF em Minas Gerais, o pedido teria sido julgado improcedente; a medida proposta pelo MPF estaria inserida na órbita da discricionariedade administrativa, e representaria ofensa à separação dos poderes; o nome dado ao imóvel sob jurisdição do Exército não ofenderia mandamento legal e/ou constitucional, de forma que o ato não poderia ser tido por ilegal; pugnou pela improcedência dos pedidos formulados na Petição Inicial, e requereu, ao final: "a) seja acolhida a preliminar de ausência de interesse processual, na modalidade "adequação", a ensejar a extinção do processo sem julgamento do mérito, nos termos do art. 485, VI do CPC; b) caso assim  não entenda, seja reconhecida a total improcedência do pedido formulado, na forma do art. 487, inciso I, do Diploma Processual em referência." Protestou o de estilo e juntou documentos.

O MPF comunicou a interposição do recurso de Agravo de Instrumento em face da Decisão que indeferiu a tutela de urgência. Em seguida, pugnou pela reconsideração da decisão impugnada.

Decisão do Desembargador Federal Fernando Damasceno, nos autos do agravo de instrumento nº 0810758-28.2020, negou efeito suspensivo à decisão deste Juízo de primeiro grau.

Despacho no qual se indeferiu o pedido de reconsideração formulado pelo Parquet, decidindo-se pela manutenção da decisão agravada por seus próprios fundamentos; outrossim, determinou-se que o MPF fosse intimado para se manifestar acerca da Contestação apresentada pela União.

A União manifestou ciência acerca do despacho supra.

O MPF apresentou Réplica na qual rebateu a preliminar arguida pela União ao contestar o feito.

É o relatório, no essencial.

Fundamento e decido.

2- Fundamentação

2.1- Do julgamento antecipado da lide

A hipótese é de julgamento antecipado do mérito, porque o acervo documental constante dos autos é suficiente ao deslinde da matéria em apreciação (CPC, art. 355, I).

Destaque-se que a decisão inicial deste Juízo, negando a  pretendida tutela provisória de urgência antecipatória, foi mantida pelo Desembargador Relator do Agravo de Instrumento, interposto pelo MPF, conforme acima relatado.

Feitas essas considerações iniciais, passa-se ao exame do feito.

2.2- Da preliminar de ausência de interesse processual por inadequação da via eleita.

A União alega ser necessário, para a propositura da Ação Civil Pública, que haja o descumprimento de um dever legal que inexistiria no presente caso, já que não haveria obrigação legal preestabelecida, e o MPF teria baseado seu pleito em Recomendação da Comissão Nacional da Verdade, o que inviabilizaria o conhecimento da presente demanda.

As razões aduzidas pela União para fundamentar a preliminar em tela, na realidade, dizem respeito ao mérito desta ACP, a seguir apreciado. Tanto assim que o MPF, em sede de Réplica à Contestação, rebateu a preliminar com razões ligadas ao mérito da ação.

Ante o exposto, resta prejudicada a análise da preliminar arguida pela União.

2.3 - Do Mérito

O Ministério Público Federal - MPF pretende, com a presente Ação Civil Pública, obter a:

"(...) condenação da União, por intermédio do Ministério da Defesa-EXÉRCITO BRASILEIRO, à obrigação de fazer consistente em implementar a Recomendação de nº 28, emitida pela Comissão Nacional da Verdade em seu Relatório Final, se abstendo de atribuir ao prédio em construção na Av. Conselheiro Rosa e Silva, s/n (em frente ao Hospital Psiquiátrico Ulisses Pernambucano), Tamarineira, Recife/PE, a denominação de Marechal Castelo Branco ou qualquer outro personagem que tenha tido comprometimento com a prática de graves violações aos direitos humanos;"

Verifico que não há nos autos elemento novo de convicção trazido pelas Partes que justifique a mudança de orientação adotada por ocasião do exame da tutela provisória de urgência antecipada, razão pela qual reitero as razões aduzidas na Decisão sob id. 4058300.15478349, a título de fundamentação desta Sentença, in verbis:

"(...)

Do que consta dos autos, observa-se que o Inquérito Civil - IC que subsidia a presente Ação Civil Pública foi instaurado em 24/08/2018, para apurar a notícia da construção de edifício, pelo Exército Brasileiro, na Av. Conselheiro Rosa e Silva, no bairro da Tamarineira, Recife/PE, cuja placa de descrição indica, além do financiamento com recursos federais, a denominação "Edifício Marechal Castelo Branco"; com a finalidade de verificar eventual descumprimento da Recomendação nº 28 do referido Relatório Final da CNV, sob o fundamento de que o ex-presidente da República estaria relacionado entre os autores de graves violações de direitos humanos pela Comissão Nacional da Verdade - CNV, em seu Relatório Final, Capítulo 16 ("A autoria a graves violações de direitos humanos").

O IC teve regular andamento e, em 18/01/2019, Órgão do Ministério Público Federal oficiante à época, em substituição,  promoveu o seu arquivamento, mediante apresentação da respectiva Promoção de Arquivamento.

Na fase de revisão do ato de arquivamento do IVC, pelo colegiado do MPF, deliberou-se, por unanimidade, pela homologação do arquivamento, nos termos do voto do (a) relator (a), o que aconteceu em 27/02/2019. Em seu r. Voto, o Relator referendou os motivos e fundamentos declinados pelo órgão ministerial que apresentou a Promoção de Arquivamento.

No entanto, no dia 19/03/2019, Órgão do MPF que figurou como noticiante dos fatos ["construção de um edifício, pelo Exército Brasileiro, na Avenida Conselheiro Rosa e Silva, em frente ao Hospital Ulysses Pernambucano, (...), cuja placa de descrição da obra indica, além do financiamento com recursos federais, a denominação 'Edifício Marechal Castelo Branco', ex-presidente da República relacionado entre os autores de graves violações de direitos humanos pela Comissão Nacional da Verdade - CNV(...)]", por discordar da decisão administrativa de arquivamento, e considerando que findou o período de substituição da signatária no 9º Ofício, apresentou Recurso da decisão de arquivamento, que findou, em 02.09.2019,  por ser acolhido, para que se desse continuidade à tramitação do referido IC, que embasa a presente ACP.

Analisa-se, prima facie, se a Parte Requerida está obrigada a cumprir a Recomendação nº 28 do Relatório Final da CNV, que assim dispõe:

"28 - Preservação da memória das graves violações de direitos humanos;

48. Devem ser adotadas medidas para preservação da memória das graves violações de direitos humanos no período investigado pela CNV e, principalmente, da memória de todas as pessoas que foram vítimas dessas violações. Essas medidas devem ter por objetivo, entre outros:

(...)

49. Com a mesma finalidade de preservação da memória, a CNV propõe a revogação de medidas que, durante o período da ditadura militar, objetivaram homenagear autores das graves violações de direitos humanos. Entre outras, devem ser adotadas medidas visando:

a) (...)

b) promover a alteração da denominação de logradouros, vias de transporte, edifícios e instituições públicas de qualquer natureza, sejam federais ou municipais, que se refiram a agentes públicos ou a particulares que notoriamente tenham tido comprometimento com a prática de graves violações." (G.N.)

Inicialmente, oportuno registrar que este magistrado reconhece a importância da Comissão Nacional da Verdade - CNV, criada pela Lei nº 12.528, de 18 de novembro de 2011, com a finalidade de examinar e esclarecer as graves violações de direitos humanos praticadas no período fixado no art. 8º do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, a fim de efetivar o direito à memória e à verdade histórica e promover a reconciliação nacional.  (art. 1º).

Reconciliação nacional, destaco.

Uma imagem (print) colada na Petição Inicial comprova que está afixada uma placa indicativa de uma obra de alvenaria em execução situada na Av. Conselheiro Rosa e Silva, s/n, nesta cidade do Recife/PE, com a denominação: "EDIFÍCIO MARECHAL CASTELO BRANCO".

O prédio está sendo construído pelo Ministério da Defesa/Exército Brasileiro, segundo anotado na placa, destinado à residência militar; trata-se, portanto, de próprio público federal.

A pessoa do "Marechal Humberto de Alencar Castello Branco", Marechal de Exército Brasileiro (1897-1967) e Presidente da República (de 15/04/1964 a 15/03/1967), aparece no Relatório Final da CNV como agente público responsável por graves violações de direitos humanos,  descritas na Lei nº 12.528/2011, na categoria "responsabilidade político-institucional", porque, no período em que foi Presidente da República, foi criado, em  junho de 1964, o Serviço Nacional de Informação - SNI, para coordenar a ação repressiva do Estado brasileiro. (Id. 4058300.15403882).

No entanto, como já dito, embora reconheça a relevância das Recomendações expedidas pela Comissão Nacional da Verdade, com destaque para a Recomendação nº 28, objeto destes autos, o mencionado instrumento - Recomendação - não tem  caráter vinculante para a Administração Pública, logo, não obriga os órgãos públicos ao seu cumprimento.  

O fato de o mencionado Militar-Marechal, quando Presidente da  República, ter assinado os atos legais que deram origem ao Serviço Nacional de Informação - SNI, exatamente para obter dados informativos tendentes à defesa dos interesses do País, não o acumpliciam a eventuais desvios que tenham sido praticados por alguns membros desse Órgão de Informação  contra os adversários político-administrativos daquele regime.

Por outro lado, além de a finalidade da Comissão da Verdade ter sido de buscar a RECONCILIAÇÃO NACIONAL, a Suprema Corte brasileira já  decidiu que a Lei da Anistia teve a força de perdoar e apagar eventuais males(excessos) da época do regime militar, tanto os praticados  pelos que estavam no poder,  como os praticados pelos opositores daquele  regime.

Nesse ponto, conforme muito bem exposto na Promoção de Arquivamento do MPF (o arquivamento não prevaleceu, consoante narrado), as Recomendações da Comissão Nacional da Verdade - CNV são:

"(...) mera orientação aos órgãos públicos e entidades sociais para o balizamento de suas ações, não tendo o condão de vincular a Administração Pública em suas decisões. In casu, cabe ao Exército, no âmbito de sua discricionariedade, a denominação dos seus prédios (...)" (Id. 4058300.15403709).

Registro que o Estado de Pernambuco, pela Lei nº 16.629, passou a vedar, a partir de 20 de setembro de 2019, a atribuição de nome de pessoa que conste no Relatório Final da CNV, como responsável por violações de direitos humanos, a prédios, rodovias, repartições publicasse e bens de qualquer natureza pertencente ou sob gestão da Administração Pública Estadual direta e indireta. (Id. 4058300.15403732).

Lei recente do Estado do Ceará (Lei nº 16.832, de 14 de janeiro de 2019) e, pelo que se tem notícia, Lei do Estado do Piauí, também passaram a estabelecer a vedação, mas ainda não veio a lume lei federal estabelecendo tal vedação.

Note-se que esses Estados, quando do advento de tais Leis, eram e são administrados por Partidos Políticos cuja orientação era contrária ao referido regime militar.

Todavia, também cabe registrar, o próprio em questão, por meio do qual se homenageia o referido Personagem da história do Brasil, não é Estadual, mas sim Federal, logo a ele não se aplicam as reprimendas das referidas Leis Estaduais."

Aliás, o Marechal Humberto de  Alencar Castelo Branco, cearense de Fortaleza-CE,  sempre foi considerado, por vários historiadores, como um militar moderado que até pensava em realizar eleições antes do final do seu mandato como primeiro Presidente da República do regime militar, instalado em 1964, e aventa-se até que, por isso, o acidente de avião no qual faleceu pode não ter sido um mero acidente.

Então, mencionada Recomendação da denominada Comissão Nacional da Verdade, além de não ter caráter vinculante, nesse particular, parece não gozar da unanimidade dos Historiadores.

3- Dispositivo

3.1- rejeito a preliminar arguida pela União;

3.2 - julgo improcedentes os pedidos desta ação e extingo o processo,  com resolução do mérito (CPC, art. 487, I).

Sem condenação em custas processuais ou honorários advocatícios (Lei nº 7.347/85, art. 18).

Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório (Lei nº 4.717/65, art. 19).

Remeta-se, com urgência,  cópia desta Sentença para os autos do recurso de Agravo de Instrumento noticiado nos autos, para os fins legais.

R.I.

Recife, 01.12.2020.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal da 2ª Vara Federal/PE

(rmc)


A Sentença supra foi mantida no TRF5R e o respectivo acórdão já transitou em julgado. 

Eis o voto condutor e o acórdão

"VOTO 

 

De início, observa-se que a União sustentou, preliminarmente, a ausência de interesse processual do Ministério Público Federal, diante da inadequação da via eleita, pois para propositura da Ação Civil Pública é necessário o descumprimento de um dever legal, inexistente no presente caso, já que ausente obrigação legal preestabelecida, tendo o MPF baseado seu pleito em Recomendação da Comissão Nacional da Verdade, o que inviabiliza o conhecimento da demanda. A meu ver, tal questão confunde-se com o mérito da demanda, que se passa a analisar.

Na presente ação, o MPF defende, em apertada síntese, que a conduta perpetrada pelo Comando do Exército de atribuir denominação ao prédio, ainda em construção, em homenagem ao ex-presidente da República Marechal Castello Branco, representante do longo período de ditadura militar no país entre 1964 e 1985, afronta cabalmente a recomendação nº 28 do Relatório Final da CNV - Comissão Nacional da Verdade, que, buscando a preservação da memória das graves violações de direitos humanos, propôs que fossem adotadas medidas visando promover a alteração da denominação de logradouros, vias de transporte, edifícios e instituições públicas de qualquer natureza, sejam federais, estaduais ou municipais, que se refiram a agentes públicos ou a particulares que notoriamente tenham tido comprometimento com a prática de graves violações.

Conforme pontuado na sentença, observa-se que o Inquérito Civil - IC que subsidia a presente Ação Civil Pública foi instaurado em 24/08/2018, para apurar a notícia da construção de edifício, pelo Exército Brasileiro, na Av. Conselheiro Rosa e Silva, no bairro da Tamarineira, Recife/PE, cuja placa de descrição indica, além do financiamento com recursos federais, a denominação "Edifício Marechal Castelo Branco"; com a finalidade de verificar eventual descumprimento da Recomendação nº 28 do referido Relatório Final da CNV, sob o fundamento de o ex-presidente da República estar relacionado entre os autores de graves violações de direitos humanos pela Comissão Nacional da Verdade - CNV, em seu Relatório Final, Capítulo 16 ("A autoria a graves violações de direitos humanos").

O IC teve regular andamento e, em 18/01/2019, Órgão do Ministério Público Federal oficiante à época, em substituição,  promoveu o seu arquivamento, mediante apresentação da respectiva Promoção de Arquivamento.

Na fase de revisão do ato de arquivamento do IVC, pelo colegiado do MPF, deliberou-se, por unanimidade, pela homologação do arquivamento, nos termos do voto do (a) relator (a), o que aconteceu em 27/02/2019. Em seu r. Voto, o Relator referendou os motivos e fundamentos declinados pelo órgão ministerial que apresentou a Promoção de Arquivamento.

No entanto, no dia 19/03/2019, Órgão do MPF que figurou como noticiante dos fatos ["construção de um edifício, pelo Exército Brasileiro, na Avenida Conselheiro Rosa e Silva, em frente ao Hospital Ulysses Pernambucano, (...), cuja placa de descrição da obra indica, além do financiamento com recursos federais, a denominação 'Edifício Marechal Castelo Branco', ex-presidente da República relacionado entre os autores de graves violações de direitos humanos pela Comissão Nacional da Verdade - CNV(...)]", por discordar da decisão administrativa de arquivamento, e considerando que findou o período de substituição da signatária no 9º Ofício, apresentou Recurso da decisão de arquivamento, que findou, em 02.09.2019,  por ser acolhido, para que se desse continuidade à tramitação do referido IC, que embasa a presente ACP.

Em relação à questão devolvida ao Tribunal, comunga-se do entendimento do juízo sentenciante no sentido de que: i) A pessoa do "Marechal Humberto de Alencar Castello Branco", Marechal de Exército Brasileiro (de 1897 a 1967) e Presidente da República (de 15/04/1964 a 15/03/1967), aparece no Relatório Final da CNV como agente público responsável por graves violações de direitos humanos,  descritas na Lei nº 12.528/2011, na categoria "responsabilidade político-institucional", porque, no período em que foi Presidente da República, foi criado, em  junho de 1964, o Serviço Nacional de Informação - SNI, para coordenar a ação repressiva do Estado brasileiro; ii) Embora se reconheça a relevância das Recomendações expedidas pela Comissão Nacional da Verdade, com destaque para a Recomendação nº 28, objeto destes autos, o mencionado instrumento - Recomendação - não tem  caráter vinculante para a Administração Pública, logo, não obriga os órgãos públicos ao seu cumprimento. Conforme exposto na Promoção de Arquivamento do MPF (o arquivamento não prevaleceu, consoante narrado), as Recomendações da Comissão Nacional da Verdade - CNV são: "(...) mera orientação aos órgãos públicos e entidades sociais para o balizamento de suas ações, não tendo o condão de vincular a Administração Pública em suas decisões. In casu, cabe ao Exército, no âmbito de sua discricionariedade, a denominação dos seus prédios (...)"; iii) Registre-se que o Estado de Pernambuco, pela Lei nº 16.629, passou a vedar, a partir de 20 de setembro de 2019, a atribuição de nome de pessoa que conste no Relatório Final da CNV, como responsável por violações de direitos humanos, a prédios, rodovias, repartições publicasse e bens de qualquer natureza pertencente ou sob gestão da Administração Pública Estadual direta e indireta.  O prédio público em questão, por meio do qual se homenageia o referido Personagem, da história do Brasil, não é Estadual, mas sim Federal, logo a ele não se aplicam a lei estadual.

Diante desse contexto, tratando-se de mera recomendação, conclui-se que o nome dado ao imóvel sob jurisdição do Exército não ofende mandamento legal e/ou constitucional, não se vislumbrando ilegalidade.

Ante o exposto, NEGO PROVIMENTO à apelação.

É como voto.

 

PROCESSO Nº: 0812782-58.2020.4.05.8300 - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
APELADO: UNIÃO FEDERAL
RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Fernando Braga Damasceno - 3ª Turma
JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal Francisco Alves Dos Santos Júnior

 

 

EMENTA: ADMINISTRATIVO E CONSTITUCIONAL. ALTERAÇÃO DE NOME DE PRÉDIO PÚBLICO EM CONSTRUÇÃO. RECOMENDAÇÃO DA COMISSÃO NACIONAL DA VERDADE. CARÁTER NÃO VINCULANTE.

1. Trata-se de apelação interposta contra sentença que julgou improcedente o pedido formulado pelo Ministério Público Federal, em sede de ação civil pública, na qual se pretende "a condenação da União, por intermédio do Ministério da Defesa-EXÉRCITO BRASILEIRO, à obrigação de fazer consistente em implementar a Recomendação de nº 28, emitida pela Comissão Nacional da Verdade em seu Relatório Final, se abstendo de atribuir ao prédio em construção na Av. Conselheiro Rosa e Silva, s/n (em frente ao Hospital Psiquiátrico Ulisses Pernambucano), Tamarineira, Recife/PE, a denominação de Marechal Castelo Branco ou qualquer outro personagem que tenha tido comprometimento com a prática de graves violações aos direitos humanos".

2. De início, observa-se que a União sustentou, preliminarmente, a ausência de interesse processual do Ministério Público Federal, diante da inadequação da via eleita, pois para propositura da Ação Civil Pública é necessário o descumprimento de um dever legal, inexistente no presente caso, já que ausente obrigação legal preestabelecida, tendo o MPF baseado seu pleito em Recomendação da Comissão Nacional da Verdade, o que inviabiliza o conhecimento da demanda. A meu ver, tal questão confunde-se com o mérito da demanda, que se passa a analisar.

3. Na presente ação, o MPF defende, em apertada síntese, que a conduta perpetrada pelo Comando do Exército de atribuir denominação ao prédio, ainda em construção, em homenagem ao ex-presidente da República Marechal Castello Branco, representante do longo período de ditadura militar no país entre 1964 e 1985, afronta cabalmente a recomendação nº 28 do Relatório Final da CNV - Comissão Nacional da Verdade, que, buscando a preservação da memória das graves violações de direitos humanos, propôs que fossem adotadas medidas visando promover a alteração da denominação de logradouros, vias de transporte, edifícios e instituições públicas de qualquer natureza, sejam federais, estaduais ou municipais, que se refiram a agentes públicos ou a particulares que notoriamente tenham tido comprometimento com a prática de graves violações.

4. Conforme pontuado na sentença, observa-se que o Inquérito Civil - IC que subsidia a presente Ação Civil Pública foi instaurado em 24/08/2018, para apurar a notícia da construção de edifício, pelo Exército Brasileiro, na Av. Conselheiro Rosa e Silva, no bairro da Tamarineira, Recife/PE, cuja placa de descrição indica, além do financiamento com recursos federais, a denominação "Edifício Marechal Castelo Branco"; com a finalidade de verificar eventual descumprimento da Recomendação nº 28 do referido Relatório Final da CNV, sob o fundamento de o ex-presidente da República estar relacionado entre os autores de graves violações de direitos humanos pela Comissão Nacional da Verdade - CNV, em seu Relatório Final, Capítulo 16 ("A autoria a graves violações de direitos humanos").

5. O IC teve regular andamento e, em 18/01/2019, Órgão do Ministério Público Federal oficiante à época, em substituição,  promoveu o seu arquivamento, mediante apresentação da respectiva Promoção de Arquivamento.

6. Na fase de revisão do ato de arquivamento do IVC, pelo colegiado do MPF, deliberou-se, por unanimidade, pela homologação do arquivamento, nos termos do voto do (a) relator (a), o que aconteceu em 27/02/2019. Em seu r. Voto, o Relator referendou os motivos e fundamentos declinados pelo órgão ministerial que apresentou a Promoção de Arquivamento.

7. No entanto, no dia 19/03/2019, Órgão do MPF que figurou como noticiante dos fatos ["construção de um edifício, pelo Exército Brasileiro, na Avenida Conselheiro Rosa e Silva, em frente ao Hospital Ulysses Pernambucano, (...), cuja placa de descrição da obra indica, além do financiamento com recursos federais, a denominação 'Edifício Marechal Castelo Branco', ex-presidente da República relacionado entre os autores de graves violações de direitos humanos pela Comissão Nacional da Verdade - CNV(...)]", por discordar da decisão administrativa de arquivamento, e considerando que findou o período de substituição da signatária no 9º Ofício, apresentou Recurso da decisão de arquivamento, que findou, em 02.09.2019,  por ser acolhido, para que se desse continuidade à tramitação do referido IC, que embasa a presente ACP.

8. Em relação à questão devolvida ao Tribunal, comunga-se do entendimento do juízo sentenciante no sentido de que: i) A pessoa do "Marechal Humberto de Alencar Castello Branco", Marechal de Exército Brasileiro (de 1897 a 1967) e Presidente da República (de 15/04/1964 a 15/03/1967), aparece no Relatório Final da CNV como agente público responsável por graves violações de direitos humanos,  descritas na Lei nº 12.528/2011, na categoria "responsabilidade político-institucional", porque, no período em que foi Presidente da República, foi criado, em  junho de 1964, o Serviço Nacional de Informação - SNI, para coordenar a ação repressiva do Estado brasileiro; ii) Embora se reconheça a relevância das Recomendações expedidas pela Comissão Nacional da Verdade, com destaque para a Recomendação nº 28, objeto destes autos, o mencionado instrumento - Recomendação - não tem  caráter vinculante para a Administração Pública, logo, não obriga os órgãos públicos ao seu cumprimento. Conforme exposto na Promoção de Arquivamento do MPF (o arquivamento não prevaleceu, consoante narrado), as Recomendações da Comissão Nacional da Verdade - CNV são: "(...) mera orientação aos órgãos públicos e entidades sociais para o balizamento de suas ações, não tendo o condão de vincular a Administração Pública em suas decisões. In casu, cabe ao Exército, no âmbito de sua discricionariedade, a denominação dos seus prédios (...)"; iii) Registre-se que o Estado de Pernambuco, pela Lei nº 16.629, passou a vedar, a partir de 20 de setembro de 2019, a atribuição de nome de pessoa que conste no Relatório Final da CNV, como responsável por violações de direitos humanos, a prédios, rodovias, repartições publicasse e bens de qualquer natureza pertencente ou sob gestão da Administração Pública Estadual direta e indireta.  O prédio público em questão, por meio do qual se homenageia o referido Personagem, da história do Brasil, não é Estadual, mas sim Federal, logo a ele não se aplicam a lei estadual.

9. Diante desse contexto, tratando-se de mera recomendação, conclui-se que o nome dado ao imóvel sob jurisdição do Exército não ofende mandamento legal e/ou constitucional, não se vislumbrando ilegalidade.

10. Apelação improvida.

 

PROCESSO Nº: 0812782-58.2020.4.05.8300 - APELAÇÃO / REMESSA NECESSÁRIA
APELANTE: MINISTÉRIO PÚBLICO FEDERAL
APELADO: UNIÃO FEDERAL
RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Fernando Braga Damasceno - 3ª Turma
JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal Francisco Alves Dos Santos Júnior

 

 

ACÓRDÃO

Decide a Terceira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por unanimidade, negar provimento à apelação, nos termos do voto do Relator, na forma do relatório e notas taquigráficas que passam a integrar o presente julgado.





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Processo: 0812782-58.2020.4.05.8300
Assinado eletronicamente por:
FERNANDO BRAGA DAMASCENO - Magistrado
Data e hora da assinatura: 23/11/2021 10:45:38
Identificador: 4050000.29004808

Para conferência da autenticidade do documento:
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