segunda-feira, 15 de junho de 2020

EXAME DE SUFICIÊNCIA PARA INSCRIÇÃO COMO TÉCNICO EM CONTABILIDADE NO CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE DE PERNAMBUCO. PRAZO DECADÊNCIA. PRECEDENTES JUDICIAIS.

Por Francisco  Alves dos Santos  Júnior

Discute-se,  na sentença que segue, interessante matéria de direito intertemporal, envolvendo uma Técnica de Contabilidade e o seu direito de inscrever-se no respectivo Conselho Regional sem submissão ao exame de suficiência, criado pela Lei  nº 12.249, de 2010. 
Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0816264-48.2019.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: M DO C C DE A
ADVOGADO: L C P T J e outro
IMPETRADO: CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE EM PERNAMBUCO
AUTORIDADE COATORA: PRESIDENTE DO CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE DE PERNAMBUCO
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)





Sentença tipo B registrada eletronicamente







EMENTA:- MANDADO DE SEGURANÇA. INSCRIÇÃO EM CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE. TÉCNICA EM CONTABILIDADE FORMADA ANTES DA VIGÊNCIA DA LEI 12.249/2010. DISPENSA DA SUBMISSÃO AO PRAZO DE DECADÊNCIA DO § 2º DO ART. 12 DO DECRETO-LEI 9.395,  DE 1946 E DO EXAME DE SUFICIÊNCIA, INCLUÍDOS NESTE DIPLOMA LEI  POR MENCIONADA LEI. REGRA DE TRANSIÇÃO.

CONCESSÃO DA SEGURANÇA.
-O prazo de decadência previsto no § 2º do art. 12 do Decreto-lei nº 9.395, de 1946, só se aplica aos Técnicos de Contabilidade formados depois da entrada em vigor  da Lei 12.249, de 2010, que acresceu mencionada regra temporal àquele diploma  legal.
-Como a ora Impetrante formou-se bem antes do advento dessa regra legal, tinha direito adquirido à referida inscrição,  sem submissão a mencionado prazo de decadência, tampouco ao  exame de Suficiência Profissional, também criado por essa Lei. 
-Ratificação da Medida  Liminar e concessão da segurança definitiva.








Vistos etc.




1. Relatório




M DO C C, qualificada na inicial, impetrou em 26/08/2019 este "MANDADO DE SEGURANÇA CUMULADO COM PEDIDO ANTECIPAÇÃO DE TUTELA" em face de ato atribuído ao Ilmo. Sr. Presidente do CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE DE PERNAMBUCO, visando obter o registro profissional na qualidade de Técnica em Contabilidade junto ao Conselho Regional de Contabilidade - CRC/PE, sem que lhe seja exigida a realização do exame de suficiência. Inicialmente, requereu o benefício da justiça gratuita. Aduziu, em síntese, que: teria concluído o curso de Técnico em Contabilidade em 05/02/1990, conforme certificado de curso reconhecido pela Secretaria de Educação DERE - Recife/PE, porém não teria registro no CRCPE - Conselho Regional de Contadores de Pernambuco, pois, ao ser contratada pela Universidade de Pernambuco - UPE, em 03/01/1985, não seria exigido o registro no CRCPE; durante 30 (trinta) anos teria exercido a profissão legalmente na qualidade de técnica em contabilidade; em 28/07/2017 teria saído a portaria nº 1564/2017, que teria designado a impetrante para exercer a função gratificada de supervisão da Faculdade de Ciências Médicas de Pernambuco - FCM; com as novas regras trazidas pela Lei nº 12.249/10, a chefe do seu setor a teria informado que deveria estar inscrita no CRCPE, sob pena de perder as gratificações que recebe; a impetrante teria procurado o CRCPE e solicitado a inclusão do seu nome no quadro de registro do referido Conselho, bem como a emissão da sua carteira profissional, o que lhe teria sido negado; o Conselho alegaria que a data limite para a regularização no CRCPE seria 1º/06/2015, nos termos do art. 12, §2º da Lei nº 12.249/10; a impetrante teria concluído o curso técnico de contabilidade em 1990, ou seja, as inovações impostas pela Lei nº 12.149/10, não seriam aplicáveis à impetrante; ao finalizar o curso técnico, preencheria todos os requisitos legais estabelecidos na lei de regência em vigor, firmando, assim, seu direito à inscrição nos quadros do conselho profissional respectivo. Teceu outros comentários. Transcreveu dispositivos legais e ementas de decisões judiciais. Pugnou, ao final, pela concessão de medida liminar, inaudita altera parte: "...com o fim de determinar ao Conselho Regional de Contabilidade de Pernambuco que emita a carteira na condição de Técnica em Contabilidade, afastando a exigência de prévia aprovação em exame de suficiência contida nos artigos 2º e 5º da Resolução n. 1.373/2011 do Conselho Federal de Contabilidade, intimando-se a Autoridade Coatora para dar pronto cumprimento com o objetivo de não perder a função gratificada, sob pena de multa diária de R$ 1.000,00 (hum mil reais) revertida à Impetrante e a responsabilização pelo crime de desobediência". No mérito, requereu: "e) Decorrido o prazo para as informações da Autoridade Impetrada e a manifestação do Ministério Público Federal, seja a presente Ação Mandamental julgada PROCEDENTE EM TODOS OS SEUS TERMOS para, confirmando a liminar deferida, defira também a segurança perseguida pela Impetrante, garantindo-lhe o direito do seu registro no CRCPE bem como a emissão da sua carteira profissional junto ao referido órgão". Deu valor à causa. Inicial instruída com procuração e documentos.



Decisão proferida em 02/09/2019 (id. 4058300.11602024), na qual foi deferido provisoriamente, o benefício da Justiça Gratuita; se determinou a intimação da Impetrante para acostar prova do ato atribuído ao Impetrado, bem como para emendar a inicial.



Em cumprimento à decisão supra, a Parte Impetrante requereu a juntada da negativa da solicitação de registro com isenção do exame de suficiência junto ao CRCPE - Conselho Regional de Contabilidade de Pernambuco, bem como emendou a Petição Inicial (id. 4058300.11904828).



Decisão de 18/10/2019 (id. 4058300.12218731), na qual foi deferida a medida liminar pleiteada, no sentido de que o Conselho Regional de Contabilidade efetuasse o registro da Impetrante, como Técnica em Contabilidade, desconsiderando o prazo legal mencionado e a submissão ao Exame de Suficiência, exceto se houvesse outro impedimento legal ao mencionado registro, não noticiado nestes autos; determinando-se a notificação da autoridade apontada como coatora para cumprir a decisão, bem como para apresentar suas informações; ciência ao órgão de representação judicial do mencionado Conselho; e vista ao MPF.



O CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE EM PERNAMBUCO - CRC/PE apresentou contestação (id. 4058300.12952102). Alegou, em resumo, que: nos termos da Lei nº 12.249/2010, que inovou o Decreto-lei nº 9.295/1946, a partir de 1º/06/2015 o exercício profissional de Contabilidade passaria a ser privativo do Bacharel em Ciências Contábeis, restando assegurado o pleno exercício especializado do Técnico em Contabilidade registrado até 1º/06/2015; o registro na categoria de Técnico em Contabilidade junto ao Conselho Regional de Contabilidade seria conferido aos profissionais técnicos em duas hipóteses: ou quando aprovados no exame de suficiência e inscritos no CRC até 1º/06/2015 (após o advento da Lei nº 12.249/2010); ou concluintes do curso de Técnico em Contabilidade (antes do advento da referida norma), que requeressem o registro profissional no período estipulado em lei; a data de 1º/06/2015 constituiria marco temporal final para a obtenção do registro profissional na categoria de Técnico em Contabilidade, e não parâmetro para o registro sem a exigência do exame de suficiência, o que denotaria natureza decadencial, refletindo período a partir do qual não mais seria possível o registro, e consequentemente, a perda do direito à inscrição profissional nesta espécie de profissional da Contabilidade; desde o advento da Lei nº 12.249/2010, teria sido instaurado o prazo decadencial para registro dos Técnicos em Contabilidade, período este que teria sido desrespeitado pelo(a) Requerente, que não teria cumprido, em tempo, os requisitos necessários à obtenção do registro; o exercício profissional na área contábil dependeria do exercício por parte do(a) Requerente em se submeter às condições previstas em lei, o que não seria diferente em ater observância ao prazo decadencial contido no art. 12 do Decreto-lei n.º 9.295/46; o ato de registro do(a) Requerente, para que fosse consumado, dependeria de prévia aprovação no Exame de Suficiência em data anterior ao fim do prazo decadencial legalmente estabelecido; não se afiguraria razoável a pretensão autoral no sentido de que, decorridos 05 (cinco) anos da edição da Lei nº 12.249/2010, a Requerente venha a pleitear tutela jurisdicional com o objetivo de suprir sua conduta omissiva em não ter buscado, a tempo e modo adequados, o registro profissional; incidiria a aplicação do instituto dadecadênci a, para, ao fim, decretar a extinção do processo com julgamento de mérito nos termos do art. 269, IV, do CPC; após a edição da Lei nº 12.249/10, somente poderiam exercer a profissão de contador os técnicos em contabilidade já registrados no CRC na data da edição da referida lei e aqueles que venham a fazer o registro até 1º/06/2015. Teceu outros comentários. Transcreveu ementas de decisões judiciais. Pugnou, ao final, pela improcedência da demanda.



O Ministério Público Federal ofertou seu r. parecer, pugnando pela concessão da segurança (id. 4058300.13450204).



É o relatório, no essencial.



Passo a decidir.



2.  Fundamentação



2.1 Da decadência do direito de registro dos Técnicos em Contabilidade 



O Conselho Impetrado sustenta que a pretensão de registro da ora Impetrante estaria revestida de decadência, haja vista o decurso do prazo estabelecido pelo advento da Lei nº 12.249/2010, para registro dos Técnicos em Contabilidade, supostamente contido no § 2º do art. 12 do Decreto-lei nº 9.295, de 27.05.1946, com  redação dada por mencionada Lei.



Tenho tal arguição por prejudicada, porque a matéria nela ventilada confunde-se com o próprio mérito, uma vez que exige exame deste para se extrair uma conclusão.



2.2 Do mérito propriamente dito



O cerne da presente questão consiste na possibilidade de a Impetrante se inscrever nos quadros do Conselho Regional de Contabilidade - CRC/PE, na condição de Técnica em Contabilidade, sem a realização do exame de suficiência, incluído no seio dessa categoria econômico-profissional pela Lei 12.249, de 2010, por ter concluído o curso de técnico em contabilidade no ano de 1990, anteriormente à data limite prevista no § 2º do art. 12 do Decreto-Lei nº 9.295, de 27/05/1946 (incluído pela Lei nº 12.249/2010).



Na oportunidade da apreciação do pedido de medida liminar, este Juízo entendeu assistir razão à Parte Impetrante quanto ao direito de não precisar se submeter nem ao prazo legal mencionado nem ao exame de suficiência para o exercício da profissão contábil, uma vez que comprovou ter concluído o Curso de Técnico em Contabilidade em 05/02/1990, consoante o respectivo Certificado acostado (id. 4058300.11590688), antes, portanto, da vigência da Lei nº 12.249/2010, que passou a exigir mencionado exame como condição ao respectivo registro.



Eis o texto da mencionada decisão de 18/10/2019 (id. 4058300.12218731), verbis:



"O presente mandado de segurança objetiva que a Autoridade apontada como coatora se abstenha de exigir exame de suficiência para a inscrição da Impetrante no quadro do Conselho Regional de Contabilidade, concedendo-lhe o registro profissional.

A concessão de medida liminar em mandado de segurança exige a concorrência dos dois pressupostos legais: a relevância do fundamento (fumus boni juris) e o perigo de um prejuízo se do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida caso, ao final, seja deferida (periculum in mora).

A exigência de aprovação em Exame de Suficiência como condição ao exercício da profissão contábil foi introduzida pela Lei nº 12.249, de 11 de junho de 2010 (art. 76), que alterou os arts. 2º, 6º e 12 do Decreto-Lei nº 9.295/1946, que passaram a ter a seguinte redação:

"Art. 2o  A fiscalização do exercício da profissão contábil, assim entendendo-se os profissionais habilitados como contadores e técnicos em contabilidade, será exercida pelo Conselho Federal de Contabilidade e pelos Conselhos Regionais de Contabilidade a que se refere o art. 1o.                      (Redação dada pela Lei nº 12.249, de 2010)"

 "Art. 6º São atribuições do Conselho Federal de Contabilidade:

        (...)

        f) regular acerca dos princípios contábeis, do Exame de Suficiência, do cadastro de qualificação técnica e dos programas de educação continuada; e editar Normas Brasileiras de Contabilidade de natureza técnica e profissional.                       (Incluído pela Lei nº 12.249, de 2010)"

"Art. 12.  Os profissionais a que se refere este Decreto-Lei somente poderão exercer a profissão após a regular conclusão do curso de Bacharelado em Ciências Contábeis, reconhecido pelo Ministério da Educação, aprovação em Exame de Suficiência e registro no Conselho Regional de Contabilidade a que estiverem sujeitos.         (Redação dada pela Lei nº 12.249, de 2010)

§ 1o O exercício da profissão, sem o registro a que alude êste artigo, será considerado como infração do presente Decreto-lei.          (Renumerado pela Lei nº 12.249, de 2010)

§ 2o  Os técnicos em contabilidade já registrados em Conselho Regional de Contabilidade e os que venham a fazê-lo até 1o de junho de 2015 têm assegurado o seu direito ao exercício da profissão.         (Incluído pela Lei nº 12.249, de 2010)"(G.N.)

Da leitura do art. 12 acima transcrito, conclui-se que a exigência de aprovação em Exame de Suficiência aplica-se tanto aos Bacharéis em Ciências Contábeis quanto aos Técnicos em Contabilidade, ambos profissionais da contabilidade.

Ocorre que, sob pena de malferir o direito adquirido, o Exame de Suficiência instituído pela Lei nº 12.249, de 11/06/2010, não pode ser exigido daqueles que haviam completado o Curso Técnico ou Superior em Contabilidade sob a égide da legislação pretérita que não fazia semelhante exigência.  

Nesse sentido, trago à colação precedentes do E. Superior Tribunal de Justiça, verbis:

"PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. REGISTRO PROFISSIONAL. CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE. EXAME DE SUFICIÊNCIA. REGRA DE TRANSIÇÃO.

1. Cuidaram os autos, na origem, de ação mandamental visando à inscrição do impetrante no CRC, mesmo sem submissão ao "exame de suficiência". A sentença concedeu a segurança pleiteada (fls. 42-44 e 103-106, e-STJ). O acórdão deu provimento à Apelação ao fundamento de que a inscrição foi requerida após o prazo de transição insculpido na Lei 12.249/2010. 2. A distinção a ser feita no presente caso está em que a lei 12.249/2010 tornou obrigatória a inscrição no Conselho Regional de Contabilidade e determinou que os técnicos em contabilidade já registrados no CRC e os que viessem a fazê-lo até 1º de junho de 2015 tivessem assegurados o direito ao exercício da profissão, como regra de transição, sem a conclusão do curso superior ou exame de suficiência.

3. O direito adquirido à obtenção do registro profissional de quem detinha o curso técnico em contabilidade foi analisado pelo Superior Tribunal de Justiça no REsp 1.424.784/RS, que entendeu ser dispensável a submissão ao exame de suficiência pelos bacharéis ou técnicos contábeis formados anteriormente à promulgação da Lei, ou no prazo decadencial por ela previsto.

4. O autor concluiu o curso Técnico em Contabilidade, em abril de 1991. Dessume-se que o acórdão recorrido diverge do atual entendimento do STJ de que "o exame de suficiência criado pela Lei nº 12.249/2010 será exigido daqueles que ainda não haviam completado o curso superior em Contabilidade sob a égide da legislação pretérita" (AgRg no REsp 1.450.715/SC, Rel. Ministro Sérgio Kukina, Primeira Turma, DJe de 13.2.2015).

5. Recurso Especial provido para restabelecer a sentença.

(REsp 1812307/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 15/08/2019, DJe 10/09/2019)"[i]

"ADMINISTRATIVO. AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO ESPECIAL. REGISTRO PROFISSIONAL. CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE. CONCLUSÃO DO CURSO APÓS A ALTERAÇÃO DO DECRETO-LEI Nº 9.295/1946 PELA LEI Nº 12.249/2010. REQUISITO PARA INSCRIÇÃO NÃO PREENCHIDO SOB A ÉGIDE DA LEI PRETÉRITA. CABÍVEL A EXIGÊNCIA DO EXAME DE SUFICIÊNCIA.

1. A tese recursal referente ao dissídio pretoriano entre o acórdão recorrido e a orientação jurisprudencial de outros Tribunais não foi oportunamente suscitada no recurso especial, restando preclusa, uma vez que não é admissível inovação na lide em sede de agravo regimental.

2. Conforme jurisprudência desta Corte, o exame de suficiência criado pela Lei nº 12.249/2010 será exigido daqueles que ainda não haviam completado curso técnico ou superior em Contabilidade sob a égide da legislação pretérita, como no caso concreto.

3. Agravo regimental a que se nega provimento.

(AgRg no REsp 1450715/SC, Rel. Ministro SÉRGIO KUKINA, PRIMEIRA TURMA, julgado em 05/02/2015, DJe 13/02/2015)"[ii]

Na esteira desse entendimento, o E. TRF da 5ª Região vem se posicionando no sentido de que o Exame de Suficiência criado pela Lei nº 12.249/2010 não pode retroagir para alcançar o direito dos que já haviam completado curso técnico ou superior em Contabilidade anteriormente à promulgação da aludida lei, ainda que o requerimento de inscrição tenha sido formulado fora do prazo ofertado no art. 12, parágrafo 2º, daquele diploma legal, consoante precedentes abaixo transcritos:

"CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. MANDADO DE SEGURANÇA. INSCRIÇÃO EM CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE. TÉCNICO HABILITADO ANTES DE 1º DE JUNHO DE 2015. DIREITO LÍQUIDO E CERTO. APELAÇÃO. PROVIMENTO.

I - A Lei nº 12.249/10, em seu art. 12, estabelece, como requisitos para o exercício da profissão de Contador e Técnico, a conclusão do curso de bacharelado em ciências contábeis reconhecido pelo MEC, assim como a aprovação em exame de suficiência: "Art. 12. Os profissionais a que se refere este Decreto-Lei somente poderão exercer a profissão após a regular conclusão do curso de Bacharelado em Ciências Contábeis, reconhecido pelo Ministério da Educação, aprovação em Exame de Suficiência e registro no Conselho Regional de Contabilidade a que estiverem sujeitos.".

II - O Superior Tribunal de Justiça possui entendimento no sentido de que a implementação dos requisitos para a Inscrição no respectivo Conselho Profissional, no momento da conclusão do curso, gera Direito Adquirido à obtenção do registro profissional. O exame de suficiência criado pela Lei nº 12.249/2010 não pode retroagir para alcançar o direito dos que já haviam completado curso técnico ou superior em Contabilidade sob a égide da legislação pretérita.

III - Provimento da Apelação.

(PROCESSO: 08079975820174058300, AC - Apelação Civel - , DESEMBARGADOR FEDERAL ALEXANDRE COSTA DE LUNA FREIRE, 1º Turma, JULGAMENTO: 30/09/2019, PUBLICAÇÃO: )"[iii]

"ADMINISTRATIVO. CRC. TÉCNICO EM CONTABILIDADE. REGISTRO PROFISSIONAL. EXAME DE SUFICIÊNCIA. DESNECESSIDADE. CONCLUSÃO DO CURSO ANTERIOR AO ADVENTO DA LEI 12.249/2010. PEDIDO DE REGISTRO POSTERIOR. DIREITO ADQUIRIDO.

1. (...)

2. (...)

3. A Lei 12.249/2010, que alterou a redação do art. 12 do Decreto-Lei 9.295/46, estabeleceu a necessidade de aprovação em "exame de suficiência" para exercício da profissão contábil, ressalvando, em seu §2º, que os técnicos em contabilidade já registrados no CRC ou que fizessem o registro até 01/06/2015 (data limite) poderiam obter o registro e exercer a profissão independentemente da realização do exame de suficiência e da conclusão do curso de Bacharelado em Ciências Contábeis.

4. In casu, tendo o demandante concluído o Curso de Técnico em Contabilidade em 1999, em que pese o pleito de inscrição ter sido formulado fora do prazo ofertado no art. 12, parágrafo 2º, da Lei 12.249/2010, qual seja, em 25/09/2017, não se apresenta razoável a recusa do referido Conselho, dado que a referida Lei não pode retroagir para atingir direito adquirido do profissional já habilitado.

5. Precedentes da Segunda Turma deste Regional: PJE 08029330920154050000, Rel. Des. Fed. Paulo Roberto de Oliveira Lima, Data do Julgamento: 14/10/2015; TRF5, 2ª Turma, PJE 0815774-60.2018.4.05.8300, Rel. Des. Fed. Leonardo Henrique de Cavalcante Carvalho, Data de Assinatura: 06/08/2019.

6. Apelação desprovida. Majoração da verba honorária, a cargo da União, em mais R$100,00 (cem reais),ex vido art. 85, parágrafo 11, do CPC/2015.

(PROCESSO: 08129351720174058100, AC - Apelação Civel - , DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIRO, 2ª Turma, JULGAMENTO: 27/08/2019, PUBLICAÇÃO: )"[iv]

"ADMINISTRATIVO. CONSELHO REGIONAL DE CONTABILIDADE. EXAME DE SUFICIÊNCIA. DESNECESSIDADE. CONCLUSÃO DO CURSO EM PERÍODO ANTERIOR À VIGÊNCIA DA LEI Nº 12.249/2010. DIREITO ADQUIRIDO.

1. Remessa Necessária em face da sentença, que julgou procedente, em parte, o pedido, para determinar que o Réu proceda à inscrição do Autor no Conselho Regional de Contabilidade da Paraíba - CRC/PB, sem a exigência do Exame de Suficiência, observados os demais requisitos legais e regulamentares.

2. O profissional do ramo da contabilidade, formado antes do início da vigência da Lei nº 12.249/2010, não está obrigado a se submeter ao Exame de Suficiência, sob pena de violação ao seu direito adquirido ao registro junto ao CRC, uma vez que já havia implementado todos os requisitos legais vigentes à época da conclusão do curso. Precedentes: STJ, REsp 201400258433, Rel. Ministro Og Fernandes, Segunda Turma, DJe: 02/05/2014; TRF5, REO 00017642620134058201, Rel. Desembargador Federal Marcelo Navarro, Terceira Turma, DJe: 13/05/2014.

3. Hipótese em que ficou comprovado que o impetrante concluiu o Curso Técnico em Contabilidade no ano de 1993, devendo ser reconhecido o seu direito à inscrição junto ao CRC/PB, sem a necessidade da apresentação do Exame de Suficiência. Remessa Necessária improvida.

(PROCESSO: 08053515520154058200, APELREEX - Apelação / Reexame Necessário - , DESEMBARGADOR FEDERAL ALCIDES SALDANHA (CONVOCADO), 3ª Turma, JULGAMENTO: 04/08/2016, PUBLICAÇÃO: )"[v]                                                           (G.N.)

Em síntese, as exigências de submissão ao exame de proficiência, fixado no art. 12 do Decreto-lei nº 9.295, de 1946,  no prazo do § 2º desse artigo, para obter o registro no Conselho Regional de Contabilidade, dispositivos esses com redação dada pela Lei n°  12.249, de 11 de junho de 2010, chocam-se com a regra do inciso XXXV ("XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;") do art. 5º da vigente Constituição da República, que assegura a prevalência do ato jurídico perfeito e do direito adquirido às Leis que lhes sejam posteriores.

Da análise dos documentos acostados à inicial, observo que a Impetrante comprovou ter concluído o Curso de Técnico em Contabilidade em 05/02/1990, consoante o respectivo Certificado acostado (id. nº 4058300.11590688), antes da vigência da Lei nº 12.249, de 11/06/2010, que passou a exigir o mencionado Exame de Suficiência como condição ao respectivo registro, logo, não pode ser atingida pelas disposições da nova lei, conforme reiterada jurisprudência do Col. STJ e do E. TRF da 5ª Região.

Nessa circunstância, faz-se presente o fumus boni iuris.

Também reputo presente o periculum in mora, porque a concessão da segurança apenas quando do julgamento do mérito deste MS causaria sérios transtornos à Impetrante, que ficaria impedida de exercer sua profissão, em prejuízo ao sustento próprio e de seus familiares.

3. Dispositivo

Posto isso:

3.1 - Defiro o pedido de concessão de medida liminar e determino que o Conselho Regional de Contabilidade efetue o registro da Impetrante, como Técnica em Contabilidade, no referido Conselho, desconsiderando o prazo legal acima menciodo e a submissão ao noticiado Exame de Suficiência, exceto se houver outro impedimento legal ao mencionado registro, não noticiado nestes autos.

3.2 - Notifique-se a Autoridade apontada como coatora, na forma e para os fins do  inciso I do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009, e para cumprir esta decisão no prazo de 30(trinta) dias.

3.3 - Outrossim, determino que o órgão de representação judicial do mencionado Conselho seja cientificado desta decisão, para os fins do inciso II do art. 7º da mencionada Lei.

3.4 - No momento oportuno, ao Ministério Público Federal - MPF para, querendo, apresentar o r. parecer legal.

Intime(m)-se.".




Extrai-se dos julgados transcritos na Decisão acima transcrita que só ficaram submetidos ao  prazo decadencial do § 2º do art. 12 do Decreto-lei nº 9.395, de 1946, a ele acrescido pela Lei 12.249,  de 11.07.2010, os Técnicos em  Contabilidade que tenham se formado depois do advento dessa Lei, não abrangendo, mencionado prazo,  os formados antes do advento dessa Lei, como é o caso da ora  Impetrante.
E assim tem que ser,  em face do princípio da irretroatividade das Leis, agasalhado no art. 5º, inciso XXXVI, verbis:
"XXXVI - a lei não prejudicará o direito adquirido, o ato jurídico perfeito e a coisa julgada;".
Registro ainda que o Ministério Público Federal opinou pela concessão da segurança (id. 4058300.13450204).



Diante de todo o exposto, a concessão da segurança definitiva é medida que se impõe.



Assim sendo, há de ser ratificada a decisão inicial, na qual se concedeu a medida liminar, acostada sob identificador nº 4058300.12218731, com as alterações lançadas na fundamentação supra.




3. Dispositivo




Posto isso:



3.1 - Tenho por prejudicada a exceção de decadência,  levantada pela Parte Impetrada, porque o seu exame foi feito  juntamente com o mérito da questão.



3.2 - Julgo procedentes os pedidos desta ação mandamental, ratifico e torno  definitiva a medida liminar concedida na decisão transcrita na  fundamentação supra, e determino que a DD Autoridade apontada como coatora efetue, em caráger definitivo, o registro da Impetrante como Técnica em Contabilidade perante o Conselho Regional de Contababilidade que Dirige, desconsiderando o prazo legal acima mencionado e a sua submissão ao noticiado Exame de Suficiência, exceto se houver outro impedimento legal ao mencionado registro, não noticiado neste mandamus, e determino que a DD Autoridade, apontada como coatora, cumpra esta sentença, sob as penas da Lei do Mandado de Segurança.



3.3 - Sem verba honorária, ex lege (Súmula 512 do STF, 110 do STJ e art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009).



3.4 - Procedam-se às intimações necessárias, observando-se as disposições legais (LMS, art. 13).



3.5 - Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição.



Registrada. Intimem-se.

Recife, 15.06.2020
Francisco Alves dos Santos Júnior
 Juiz Federal da 2a Vara da JFPE.





 (mppl)

quarta-feira, 10 de junho de 2020

"TAXA" PAGA À EMPRESA DE CARTÃO DE CRÉDITO POR ESTABELECIMENTO QUE ACEITA O CARTÃO. VALOR DA "TAXA" COMPÕE A SUA RECEITA BRUTA



Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O valor que o Estabelecimento(industrial, comercial ou de prestação de  serviço) paga à Empresa de Cartão de Crédito quando aceita esse tipo de pagamento dos seus Clientes, valor aquele que finda por compor preço das mercadorias ou dos serviços,  inclue-se na sua receita bruta e, por isso, sofre incidência das COPIS e a COFINS. 
A decisão abaixo trata desse assunto.  
Boa leitura!



PROCESSO Nº: 0810154-96.2020.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: D R DE  LTDA
ADVOGADO: A A Da S e outro
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE/PE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)
D E C I S Ã O 
1. Breve Relatório 

D R DE P LTDA, qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança com pedido liminar em face do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE/PE. Aduziu, em síntese, que: seria sociedade empresária com finalidade eminentemente lucrativa, que desempenharia atividades econômicas (doc. 06 - Amostra de Notas Fiscais) e com acentuada frequência - perceberia a contraprestação pecuniária de seus clientes por intermédio de Instituições Financeiras que operam Cartões de Crédito e Débito; nos contratos de prestação de serviços financeiros estariam previstos percentuais sobre o valor de cada uma das transações eletrônicas realizadas, a fim de remunerar as respectivas Operadoras de Cartões; seria patente que a ausência desse meio de pagamento implicaria evidentemente em uma redução no resultados e nas vendas do negócio, uma vez que 170.000,00 (cento e setenta mil reais) seriam vendidos por meio de cartão, o que qualificaria tal serviço como insumo, pela tese do impacto no resultado/operação da empresa, ou seja, relevância, pois sem tal haveria uma volumosa queda nas vendas da empresa; não haveria de se falar em relevância de tal insumo, pois, os meios de pagamentos disponibilizados ao cliente fariam evidentemente parte do serviços (contexto, estrutura da loja, meios de pagamento e qualidade e condições do produto) ofertados pela empresa, os quais representariam uma oportunidade e conveniência para o cliente (serviço de meio para geração das vendas), sem o qual, haveria inclusive de se estabelecer uma verdadeira subtração do serviço ofertado, mudando assim a qualidade do complexo (produto + estabelecimento + atendimento = serviço) ofertado ao cliente; tais importâncias sequer chegariam a se incorporar ao caixa da Autora, porquanto seriam retidas diretamente pela Instituição Financeira, por ocasião do pagamento dos recebíveis (doc. 10 - Amostra dos Pagamentos pelas Administradoras); não se trataria, pois, de receita sua, mas de verdadeira prestação de serviços de intermediação de negócios, que na realidade seria pago pela clientela da Impetrante; teriam sido editados editados dois precedentes vinculantes (artigo 927, inciso III, do CPC/15) plenamente aplicáveis em favor da Postulante; o Recurso Extraordinário com Repercussão Geral nº 574.706/PR, por intermédio do qual o Supremo Tribunal Federal teria asseverado que uma receita de terceiro, ainda que implicasse ingresso temporário de caixa, não poderia integrar a base de cálculo das Contribuições para o PIS/PASEP e da COFINS (doc. 13 - Acórdão 1); ii) ao Recurso Especial Representativo de Controvérsia nº 1.221.170/PR, em cujo seio a Primeira Seção do Superior Tribunal de Justiça pontificou que o conceito de insumo, para  fins de creditamento das Contribuições para o PIS/PASEP e da COFINS não-cumulativos deveria ser aferido sob a óptica da essencialidade ou relevância, imprescindibilidade ou importância, ao desenvolvimento das atividades econômicas da Contribuinte; diante de tal contexto fático,  a Contribuinte buscaria o reconhecimento de seu direito líquido e certo, mormente para:  
"(a) ter o seu direito à restituição - via compensação ou precatório - daquilo que excessivamente pagou nos últimos 5 (cinco) anos; e, de agora em diante, (b) apurar a Contribuição para o PIS/PASEP e a COFINS com as exclusões ou creditamentos dos valores relativos às taxa/comissões retidas pelas entidades que operam os cartões de crédito e débito utilizados pelos consumidores na hora de adquirir produtos, mercadorias ou serviços." 
Protestou o de estilo. Inicial instruída co procuração e documentos.
É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

A concessão de medida liminar em mandado de segurança requer a coexistência de dois pressupostos, consubstanciados no artigo 7º, III, da Lei 12.016/2009, quais sejam: [i] a relevância do fundamento alegado pelo impetrante, que deve comprovar a violação do seu direito líquido e certo, ou a sua iminente ocorrência - fumus boni juris; e [ii] a possibilidade de ineficácia da medida se concedida apenas ao final - periculum in mora -, em segurança definitiva.

Examinemos a questão posta pela  Parte Impetrante.
Já faz algum tempo que as COPIS e COFINS têm por base de cálculo a receita bruta total, sendo que a definição de receita bruta encontra-se na atual redação do art. 12 e respectivos incisos e parágrafos do Decreto-lei nº 1.598, de 1977.

A Impetrante quer ser autorizada a não incluir nessa receita bruta total os valores que paga a título de taxa para as  Empresas de Cartões de Crédito, de cujas bandeiras se utiliza, porque teria por receita apenas  o valor da comissão que recebe por cada operação de crédito.

O RE 574.706/PR, do Plenário do STF, não se aplica ao caso, porque tratou da exclusão do valor do ICMS da base de cálculo das COPIS e COFINS, com utilização de argumentos constitucional-tributários inaplicáveis à "taxa" de que a ora Impetrante alega pagar para as Empresas de Cartões de Crédito. 

A Impetrante também invocou o Resp nº 1.221.170/PR.

Eis a ementa desse d. julgado:

"PROCESSUAL CIVIL E TRIBUTÁRIO. AGRAVO INTERNO NOS EMBARGOS DE DECLARAÇÃO NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. VIOLAÇÃO DO ART. 535 DO CPC/1973. INEXISTÊNCIA. CONTRIBUIÇÕES AO PIS/PASEP E COFINS NÃO CUMULATIVAS. TAXA PAGA ÀS OPERADORAS DE CARTÃO DE CRÉDITO E DÉBITO.
FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL. CONCEITO DE INSUMO AFERIDO À LUZ DOS CRITÉRIOS DA ESSENCIALIDADE OU RELEVÂNCIA. NÃO PROVIMENTO.
1. Não ocorre contrariedade ao art. 535, II, do CPC/1973 quando o Tribunal de origem decide fundamentadamente todas as questões postas ao seu exame, assim como não há que se confundir entre decisão contrária aos interesses da parte e inexistência de prestação jurisdicional.
2. Segundo a jurisprudência desta Corte Superior, o tema da inclusão da taxa paga às operadoras de cartão de crédito e débito na base de cálculo do PIS e da COFINS passa pela definição e conceito de receita e faturamento previstos no art. 195, I, "b", da Constituição Federal/1988, sendo, portanto, matéria afeta à competência do Supremo Tribunal Federal. Precedentes.
3. "O conceito de insumo deve ser aferido à luz dos critérios da essencialidade ou relevância, vale dizer, considerando-se a imprescindibilidade ou a importância de determinado item - bem ou serviço - para o desenvolvimento da atividade econômica desempenhada pelo contribuinte" (REsp 1.221.170/PR, Rel. Min. Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Seção, DJe 24/4/2018).
4. Inviável reconhecer que as despesas com as operadoras de cartão de crédito e débito sejam consideradas insumos em face da sua não essencialidade no processo produtivo, na medida em que se trata de forma de pagamento complementar à disposição dos consumidores.
5. Agravo interno a que se nega provimento.".
[1]

Noto que nesse julgado não se adotou a tese invocada pela ora  Impetrante, pois nele não se analisou a questão da composição da receita bruta e não se admitiu que a ora  Impetrante se creditasse,  a titulo de insumo, dos valores que paga como "taxa" às Empresas de Cartões de Crédito. 

Embora o STJ, no julgado supra, tenha entendido que a matéria seria  constitucional, data maxima venia, não vejo assim, pois a vigente  Constituição da República, no seu art. 195, I. b, apenas elegeu como possíveis bases de cálculo da COFINS o faturamento ou a receita bruta e, quanto à COPIS-PASEP, da base de cálculo não tratou.

O Legislador Ordinário elegeu a receita bruta total como base de cálculo para essas duas Contribuições.

Então, a questão posta diz respeito ao que compõe a receita bruta legal, portanto, nada tendo a matéria de constitucional.

Na definição de receita bruta, no acima referido art. 12 e respectivos incisos e parágrafos do Decreto-lei 1.598, de 1977, não há nenhuma regra que autorize a não incluir na receita bruta os valores que a ora  Impetrante paga a título de "taxa" às Empreas de Cartões de Crédito, quando realiza vendas por esse meio de pagamento.

Com efeito, a única verba que pode ser  excluída é a indicada  no § 4ª do referido dispositivo legal, na qual não se  enquadra mencionado encargo que a ora  Impetrante cobra dos seus Clientes, nos  preços dos seus  produtos/serviços, e depois repassa para as Empresas de Cartões de Crédito.

Então, prima facie, não encontro o requisito do fumus boni iuris que autorizaria a concessão de medida liminar.

3. Dispositivo

Diante de todo o exposto:

a) Indefiro a pretendida concessão de medida liminar.

b) Notifique-se a DD. Autoridade Coatora para apresentação de informações (art. 7º,I, da Lei nº 12.016, de 2009) e dê-se ciência desde writ ao órgão de representação judicial da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, qual seja, a Procuradoria Geral da Fazenda  Nacional em  Recife-PE, para os fins do inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009.

c)  Após, abra-se vista ao Ministério Público Federal para o r. parecer (art. 12 da Lei nº 12.016/2009).

d) Proceda a Secretaria às anotações pertinentes, uma vez que inexiste a prevenção acusada pelo Pje.

Intimem-se. Cumpra-se.

Recife, 10.06.2020
Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara/PE

 ______________________________________
[1] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. (AgInt nos EDcl no AREsp 1176156/SP, Rel. Ministro OG FERNANDES, SEGUNDA TURMA, julgado em 21/05/2019, DJe 07/06/2019.
Disponível em https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=1.221.170%2FPR+E+TAXA+E+CART%C3O+E+CR%C9DITO&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true.
Acesso em 09.06.2020.

terça-feira, 9 de junho de 2020

INCOMPETÊNCIA ABSOLUTA: RECONHECIMENTO DE OFÍCIO PELO JUIZ.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

De ofício, cabe ao Juiz reconhecer a sua incompetência absoluta para o caso, com a finalidade de evitar nulidade da sua futura sentença. 
Aqui, temos  um caso deste. 
Boa  leitura. 



PROCESSO Nº: 0809499-27.2020.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: C  DA  B  e outro
ADVOGADO: J C De S M
RÉU: CAIXA ECONOMICA FEDERAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)


DECISÃO



Ementa: - PROCESSUAL CIVIL. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL CÍVEL.  
  
 De ofício, declaração de  incompetência absoluta e encaminhamento para  o Juizo competente.


1. Breve Relatório

C DA S B e o fiador, J B DA S, ambos qualificados na Inicial, ajuizaram esta AÇÃO REVISIONAL (com pedido de tutela provisória de urgência) em face da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL - CEF. Requereram, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita. Aduziram, em síntese, que:  a Ré teria celebrado com os Autores, na data de 02/06/2009, o contrato nº. 15.2348.185.0003921/80, relativamente ao Fundo de Financiamento ao Estudante de Ensino Superior (FIES); em tal contrato, figuraria o segundo Autor como fiador; referido contrato teria visado obter recurso, por empréstimo, para honrar as parcelas mensais do curso de ENFERMAGEM; concluído o curso e operado o prazo de carência previsto em Lei, o primeiro Autor teria iniciado o pagamento do empréstimo, em que, de início, seria a quantia mensal de R$ 252,42 (duzentos e cinquenta e dois reais e quarenta e dois centavos), o que se constataria pelos documentos ali carreados; decorridos apenas dez meses, a prestação já se encontraria em patamar inacessível financeiramente aos Promoventes, justamente em face da ilegalidade dos encargos; desde a assinatura do contrato que as parcelas viriam em uma crescente, tendo os Autores honrados com os pagamento com bastante sacrifício; todavia, a parcela que em julho de 2019 corresponderia a pouco mais de duzentos e cinquenta reais e atualmente já estaria em quase quatrocentos reais, somando isso a situação de pandemia do novo Coronavírus (Covid19) e dificuldades econômicas a ela inerentes; a partir de abril do corrente ano, teria se visto totalmente, impossibilitada de cumprir suas obrigações para com o Réu, apesar de ter procurado a parte ré, sem sucesso. Teceu outros comentários, notadamente acerca da função social do contrato e impertinência da cobrança dos juros capitalizados. Pugnou, ao final, pela:
a) A designação de audiência conciliatória (CPC, art. 319, inc. VII), razão qual requer a citação da Promovida, por carta (CPC, art. 247, caput) para comparecer à audiência designada para essa finalidade (CPC, art. 334, caput c/c § 5º), devendo, antes, ser analisado o pleito de tutela de urgência;  

b) A concessão dos benefícios da Justiça Gratuita e, igualmente, a inversão do ônus da prova;

c) A concessão, sem a oitiva prévia da parte contrária (CPC, art. 9º, parágrafo único, inc. I c/c art. 300, § 2º), independente de caução (CPC, art. 300, § 1º), da tutela de urgência antecipatória no sentido de autorizar o depósito das quantias legalmente devidas, referente as  parcelas periódicas vencidas, e das demais que se vencerem sucessivamente, no valor de R$ 188,62 (cento e oitenta e oito reais e sessenta e dois centavos), relativo a cada prestação a ser consignada, conforme apuração nos moldes da planilha em anexo, ficando os Autores autorizados a depositar em juízo nas mesmas datas aprazadas contratualmente, bem como fique a empresa Ré impedida de inserir o nome dos Autores junto aos órgãos de restrições, além de não promover informações à Central de Risco do BACEN;

d) A citação da Demandada para que, querendo, responda a todos os termos da presente ação, sob pena de revelia;

e) Sejam julgados PROCEDENTES os pedidos, tornando em definitiva a medida liminar de tutela de urgência, para proibir a ré de negativar os nomes dos autores, e declarando a revisão do Contrato para o valor de R$ 188,62 (cento e oitenta e oito reais e sessenta e dois centavos) mensais fixos, a fim de estabelecer uma relação de equilíbrio e adequação financeira a realidade dos autores;

f) Exclusão do pacto os juros capitalizados, esses cobrados durante o período de normalidade contratual, compensando-se do que fora cobrado em excesso;

g) Sejam afastados do débito todos os encargos moratórios, em face da ausência de inadimplência;

h) Os juros remuneratórios sejam limitados a 3,4% ao ano, a contar da vigência da Lei n. 12.202, de 14 de janeiro de 2010;"

i) Seja a Ré condenada a pagar o todos os ônus pertinentes à sucumbência, máxime honorários advocatícios, esses de já pleiteados no patamar máximo de 20%(vinte por cento) sobre o proveito econômico obtido pelos Autores ou, não sendo possível mensurá-los, sobre o valor atualizado da causa (CPC, art. 85, § 2º).

Deram à causa o valor de R$ 19.212,66 (dezenove mil, duzentos e doze reais e sessenta e seis centavos), protestaram o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.
A parte Ré apresentou Contestação (Id. 4058300.14611668).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.


2. Fundamentação

Verifico que a parte autora ajuizou ação cujo valor da causa foi quantificado em R$ 19.212,66 (dezenove mil, duzentos e doze reais e sessenta e seis centavos).

Esta ação, por força da Lei 10.259/01, não poderia ter sido distribuída para esta Vara Cível Comum desta Justiça Federal, mas sim para uma das Varas do Juizado Especial Cível Federal, porque foi atribuído à causa valor inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, tudo conforme art. 3º e respectivo § 1º da Lei nº 10.259, de12/07/2001. 

Acerca da matéria debatida nos autos e respectiva competência para processamento, confiram-se os julgados que se seguem:

"CONFLITO DE COMPETÊNCIA. JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO ESPECIAL E JUÍZO FEDERAL DE JUIZADO COMUM. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL - FIES. CAUSA DE VALOR INFERIOR A SESSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. COMPETÊNCIA DOS JUIZADOS ESPECIAIS.
1. A Lei 10.259/01, que instituiu os Juizados Cíveis e Criminais no âmbito da Justiça Federal, estabeleceu que a competência desses Juizados tem natureza absoluta e que, em matéria cível, obedece como regra geral a do valor da causa: são da sua competência as causas com valor de até sessenta salários mínimos (art. 3º). A essa regra foram estabelecidas exceções ditadas (a) pela natureza da demanda ou do pedido (critério material), (b) pelo tipo de procedimento (critério processual) e (c) pelos figurantes da relação processual (critério subjetivo).
2. É certo que a Constituição limitou a competência dos Juizados Federais, em matéria cível, a causas de "menor complexidade" (CF, art 98, § único). Mas, não se pode ter por inconstitucional o critério para esse fim adotado pelo legislador, baseado no menor valor da causa, com as exceções enunciadas. A necessidade de produção de prova pericial, além de não ser o critério próprio para definir a competência, não é sequer incompatível com o rito dos Juizados Federais, que prevê expressamente a produção dessa espécie de prova (art. 12 da Lei 10.259/01).
3. Conflito conhecido, declarando-se a competência do Juizado Especial, o suscitante." [1]

* * *
"PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO DECOMPETÊNCIA. AÇÃO REVISIONAL DE CONTRATO DE FINANCIAMENTO ESTUDANTIL - FIES. CAUSA DE VALOR INFERIOR A SESSSENTA SALÁRIOS MÍNIMOS. ANULAÇÃO MERAMENTE REFLEXA. COMPETÊNCIADOS JUIZADOS ESPECIAIS.
1. Caso em que as tentativas de ajuizamento da ação pelo autor foram interditadas, tanto no juízo da vara comum (2ª Vara SJPB) quanto no do Juizado Especial Federal (13ª Vara SJPB), cada um deles atribuindo ao outro a competência para a causa, mas extinguindo o processo sem a suscitação do Conflito de Competência.
2. Impossibilidade de a Turma determinar a remessa dos autos ao Juizado Especial Federal por ausência de competência, ocorrendo o provimento da apelação para suscitar o conflito de competência para o Plenário. Precedente (TRF 5, Processo nº 08029305420134058300, AC/PE, Desembargador Federal Paulo Roberto de Oliveira Lima, Segunda Turma, julgamento 18/02/2014).
3. O Supremo Tribunal Federal, em sede de repercussão geral, estabeleceu que compete ao Tribunal Regional Federal o julgamento de conflito de competência estabelecido entre Juizado Especial Federal e juiz de primeiro grau da Justiça Federal da mesma Seção Judiciária (RE 590.409/RJ, Relator Ministro Ricardo Lewandowski, Tribunal Pleno, Sessão Plenária de 26/08/2009).
4. Ação em que a parte autora postula a revisão das parcelas do contrato de financiamento Estudantil, com a exclusão do encargo mensal dos juros capitalizados, a retirada de seu nome do cadastro restritivo, bem como indenização por danos morais. Valor atribuído à causa de R$47.280,00 (quarenta e sete mil, duzentos e oitenta reais), inferior a sessenta salários mínimos na data do ajuizamento da ação.
5.  Competência do Juizado Especial Federal para processar e julgar causas até o valor de sessenta salários mínimos (art. 1.º, caput, da Lei n. 10.259/2001). A pretensão formulada não pretende a anulação ou cancelamento de ato administrativo típico, mas a revisão de contrato de financiamento. Hipótese em que a nulidade das cláusulas contratuais, se vier a ocorrer, decorrerá da procedência do pedido, apenas de maneira reflexa. Inaplicabilidade do art. 3º, parágrafo 1º, III, da Lei n. 10.259/2001. Precedente (STJ, CC nº 98365/GO, Primeira Seção, Rel. Ministro Teori Zavascki, DJe 09.12.2008). Hipótese distinta dos precedentes deste TRF em que a pretensão autoral é o aditamento do contrato do FIES para viabilização da matrícula sem a exigência de qualquer cobrança (TRF 5, Processo 08067885920164050000, CC/SE, Desembargador Federal Élio Wanderley de Siqueira Filho, Pleno, julgamento 28.10.2016).
6. Conflito de Competência que se conhece e se declara como competente o Juízo Federal da 13ª Vara Federal da Seção Judiciária da Paraíba (Juizado Especial Federal)." [2]

Como se trata de incompetência absoluta deste Juízo desta 2ª Vara Federal comum a já  há contestação da Parte Ré, tenho que deva reconhecê-la de ofício, com encaminhamento para  o Juízo competente.
 

3. Dispositivo 

Posto isso, declaro-me, de ofício(§ 1º do art. 64 do CPC), absolutamente incompetente para esta causa e a declino para um dos(as) Juízes(as) do Juizado Especial Federal Cível desta Seção Judiciária, para onde determino seja este feito remeitdo, na forma da legislação aplicável ao caso, após regular baixa nesta 2a Vara Federal de Pernambuco.

intime-se.   

Recife, data da assinatura. 

Francisco Alves dos Santos Júnior 

Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE 
 


  _____________________________________

[1] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça. (CC 98.365/GO, Rel. Ministro TEORI ALBINO ZAVASCKI, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 26/11/2008, DJe 09/12/2008)

Disponível em https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?livre=REVISIONAL+E+CONTRATO+E+FINANCIAMENTO+E+FIES+E+COMPET%CANCIA&b=ACOR&thesaurus=JURIDICO&p=true.

Acesso em 08/06/2020


[2] BRASIL. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. PROCESSO: 08015319120164058200, CC - Conflito de Competencia - , DESEMBARGADOR FEDERAL RODRIGO VASCONCELOS COELHO DE ARAÚJO (CONVOCADO), 1º Turma, JULGAMENTO: 28/11/2016, sem indicação de veículo de publicação.

Disponível em https://www4.trf5.jus.br/Jurisprudencia/JurisServlet?op=exibir&tipo=1,

Acesso em 08/05/2020