sexta-feira, 26 de março de 2021

DESISTÊNCIA. EXIGÊNCIA DE RENÚNCIA AO DIREITO PELA PARTE DO POLO PASSIVO. STJ. CONVERSÃO, PELO JUIZ, EM SUPERVENIENTE FALTA DE INTERESSE PROCESSUAL DE AGIR.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior

O atual entendimento do STJ a respeito da exigência da Fazenda Pública, que se encontra no polo passivo, para que a Parte Autora renuncie ao direito pleiteado na petição inicial, para que o Juiz possa homologar a desistência. 

Conversão, pelo Juiz, de caso do advento de superveniente falta de interesse processual de agir. 

Boa leitura. 



Obs.: decisão pesquisada e minutada pela Assessora MARIA PATRICIA PESSOA DE LUNA



PROCESSO Nº: 0812568-04.2019.4.05.8300 - TUTELA CAUTELAR ANTECEDENTE
REQUERENTE: C M DA F DE A S
ADVOGADO: M C Da F De A S
REQUERIDO: RECIFE CARTORIO DE PROTESTOS 2 OFICIO e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)





Sentença tipo C

 

EMENTA:- PROCESSUAL CIVIL. DESISTÊNCIA DA AÇÃO. AUSÊNCIA SUPERVENIENTE DO INTERESSE DE AGIR. EXTINÇÃO DO PROCESSO SEM RESOLUÇÃO DO MÉRITO.

- Não se homologa pedido de desistência da ação quando a Fazenda Pública se opõe com fundamento no art. 3º da Lei 9.469/97 e a Parte Autora não renuncia expressamente ao direito no qual se funda a ação.

- Extinção do processo, sem resolução do mérito por superveniente falta de interesse processual de agir da Parte Autora.

 

Vistos etc.

1. Relatório

C M DA F DE A S, qualificada na inicial, ajuizou esta "Ação de Tutela Cautelar Antecedente para Sustação de Protestos e Desconstituição de Inscrição de Dívida Ativa" em face da FAZENDA NACIONAL - DÍVIDA ATIVA DA UNIÃO e do 2º TABELIONATO DE PROTESTO DE RECIFE. Requereu, inicialmente, a prioridade na tramitação processual. Alegou, em síntese, que: teria sido surpreendida com a intimação enviada pelo 2º Réu, para pagamento, em 03 (três) dias, de um suposto débito, no valor de R$ 3.050,73; na mencionada intimação constaria como Cedente a 1ª Ré (Fazenda Nacional) e possuiria como natureza a seguinte descrição: CÉDULA DA DÍVIDA ATIVA, nº do título 40614006641, com emissão em 09/11/2018; ter-se-ia dirigido à mesma, a fim de obter maiores informações sobre as cobranças, sendo informada que o protesto ora contestado se referiria à suposta dívida de foro, do imóvel sob o a matrícula nº 39.119, Ficha 01F, junto ao 1º Registro de Imóveis de Recife/PE, sito a Lote de terreno acrescido de marinha, sob o regime de ocupação, nº 08, da quadra H, do loteamento denominado JARDIM BOA VIAGEM, situado a Rua Exu, no Bairro de Boa Viagem, freguesia de Afogados, nesta cidade; a CDA se referiria a suposto débito referente a taxa de Foro do ano de 2018; a Autora e seu esposo teriam procedido com a venda do referido imóvel no ano de 2012 à empresa SENGEL - SERVIÇOS DE ENGENHARIA LTDA - EPP, como se verifica na certidão em anexo, R - 5 - 39.119: Título prenotado sob nº 379.070, do Protocolo 1DK, em 10/09/2012, COMPRA E VENDA, lavrada em 11/05/2012, no livro 914-E, fls. 18/19, pelo 7º Ofício de Nota da Capital; a Autora desde o ano de 2012 não seria mais a proprietária do referido imóvel que gerou o suposto débito inscrito em Dívida Ativa; o procedimento dos Réus, encaminhando a protesto o título em referência, colocaria a Autora em situação de extremo constrangimento, pois a concretização do protesto poderá resultar em lesão de difícil reparação, obrigando a adoção das medidas judiciais necessárias a defesa dos seus direitos. Teceu outros comentários. Pugnou pela concessão de Tutela Antecipada de Urgência, inaudita altera parte, "para obter a imediata sustação do protesto do título protocolado sob os nº 2018-11-0152959-8, mediante comunicação expressa desse Juízo ao 2º TABELIONATO DE PROTESTO DE RECIFE , situado à Rua Gervásio Pires, nº 233, Boa Vista, Recife - PE, CEP 50.060-090, ou, caso já tenha sido protestado, que seja dada a imediata baixa e cancelamento do referido protesto, bem como a desconstituição das certidões de dívida ativa de nºs40.6.14.006641-63, como única forma de evitar a consumação do dano iminente e de difícil reparação". Requereu, ao final: "a) Como pedido final a Autora indica os seguintes pleitos: Declaração de inexigibilidade da obrigação levada a Protesto e a nulidade do título, ilegitimidade de cobrança e prescrição, cumuladas com pedido de danos materiais e morais, regularização do cadastro junto à 1ª Ré, do novo proprietário do imóvel objeto da presente demanda, devidamente informado nos autos; b) Requer a V. Exa o prazo legal a fim de se aditar a petição inicial, com a complementação de argumentação, a juntada de novos documentos e a confirmação do pedido de tutela final; c) A citação dos Réus, pelo correio, através de Carta Registrada com aviso de recebimento - AR, para que venha apresentar sua contestação, sob pena de revelia, julgando-se, afinal, procedente o feito para sustar em definitivo o protesto, condenando os Réus em danos morais e patrimoniais, além do pagamento das despesas processuais e honorários advocatícios. d) A título de requerimento final, caso ache necessário, o Autor se compromete a apresentar caução idônea, no prazo máximo de 05 (cinco) dias". Protestou o de estilo. Deu valor à causa. Inicial instruída com procuração e documentos.

Decisão proferida em 08/07/2019 (id. 4058300.11103080), na qual foi concedido em parte o pedido cautelar antecedente, para determinar que o protesto em questão não fosse realizado e, se já tivesse se concretizado, que fosse imediatamente sustado; bem como determinada a citação da Parte Ré e intimação da Parte Autora para os fins do art. 308 do CPC.

Expedido ofício ao 2º Tabelionato de Protesto de Recife (id. 4058300.11190533).

A UNIÃO - FAZENDA NACIONAL apresentou contestação (id. 4058300.11234792), pugnando, ao final, pela improcedência da ação. Juntou documentos.

Despacho exarado em 13/09/2019 (id. 4058300.11802718), no qual se determinou a intimação da Parte Autora para se pronunciar sobre a petição da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL e documentos juntados (id. 4058300.11234792); bem como para os fins do art. 308 do CPC.

A Parte Autora formulou pedido de desistência do feito (id. 4058300.11811398).

Decisão proferida em 19/09/2019 (id. 4058300.11863619), na qual foi revogada  a decisão liminar, que concedeu em parte o pleito cautelar; determinado que o 2º Tabelionato de Protesto de Recife fosse cientificado desta nova decisão; bem como intimação da Parte Ré acerca do pedido de desistência.

Instada a se manifestar sobre o pedido de desistência formulado pela Parte Autora, a UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, ora Requerida, não se opôs ao pedido em tela, desde que a Parte Autora renunciasse ao direito sobre o qual se funda a ação, bem como sua condenação em honorários advocatícios (art. 90 do CPC) (id. 4058300.11891211).

Despacho no qual foi a Parte Autora intimada para se manifestar acerca da renúncia ao direito sobre que se funda a ação (id. 4058300.13550563).

Certificado o decurso de prazo sem manifestação da Parte Autora (id. 4058300.14368608).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1 - Não há a prevenção, tampouco litispendência com o processo acusado pelo sistema, no quadro inicial supra, devendo a Secretaria providenciar a sua exclusão(baixa).

2.2 - A Parte Autora ingressou com petição requerendo a desistência da ação.

Ocorre que a UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, ora Requerida, instada a se manifestar sobre tal pedido, embora a ele não se tenha oposto, condicionou a sua anuência à renúncia pela Parte Autora ao direito sobre que se funda a ação.

O artigo 485, § 4º, do CPC dispõe que "oferecida a contestação, o autor não poderá, sem o consentimento do réu, desistir da ação".

Por sua vez, reza o art. 3º da Lei 9.469/1997:

"Art. 3º As autoridades indicadas no caput do art. 1º poderão concordar com pedido de desistência da ação, nas causas de quaisquer valores desde que o autor renuncie expressamente ao direito sobre que se funda a ação (art. 269, inciso V, do Código de Processo Civil)."

Sobre o assunto, o Col. STJ tem jurisprudência pacificada, firmada sob o regime dos recursos repetitivos - Tema 524 (REsp 1267995/PB[1]):

Tema 524:

"Após o oferecimento da contestação, não pode o autor desistir da ação, sem o consentimento do réu (art. 267, § 4º, do CPC), sendo que é legítima a oposição à desistência com fundamento no art. 3º da Lei 9.469/97, razão pela qual, nesse caso, a desistência é condicionada à renúncia expressa ao direito sobre o qual se funda a ação."

Conforme certificado nos autos, quanto à exigência da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, a Parte Autora, embora regularmente intimada, quedou-se silente, situação essa que impede a apreciação/homologação do pedido de desistência da ação, conforme o indicado entendimento do STJ.

Todavia, na citada petição identificada sob o nº 4058300.11811398, a Parte Autora informa expressamente que "não tem mais interesse no presente feito". E, de fato, examinando os autos, vê-se que a mencionada Parte não apresentou nem mesmo réplica, denotando que a Parte Autora não tem mais interesse processual para agir neste feito.

Exsurge, dessa forma, a superveniente falta de interesse processual de agir da mencionada Parte, exigindo, assim, por força de regras processuais(art. 493 CPC) e do princípio da utilidade do processo, a sua extinção, sem resolução do mérito(art. 485, VI, do CPC).

Assim, como a Parte Ré já tinha sido citada e apresentado contestação, a Parte Autora, quer pelo princípio da causalidade, quer por regra expressa do § 10 do art. 85 do CPC, deverá ser responsabilizada pelas verbas de sucumbência, inclusive honorários de advogado, os quais serão arbitrados, à luz do § 8º do art. 85 do CPC, em valor fixo, porque o valor da causa é muito baixo(R$ 3.050,73), mas em valor  módico, pela simplicidade da causa.

Configurada a ausência superveniente de interesse processual, cumpre ser decretada a extinção do feito sem julgamento do mérito, de ofício, por se tratar de matéria de ordem pública.

3. Dispositivo

Posto isso:

3.1 - Cumpra a Secretaria o consignado no subitem 2.1 supra.

3.2 - Reconheço a falta superveniente do interesse processual de agir da Parte Autora e, de ofício, dou o processo por extinto, sem resolução do mérito (CPC, art. 485, VI, §3º).

3.3 - Outrossim, em virtude do princípio da causalidade, condeno a Parte Autora ao pagamento de honorários advocatícios em favor da UNIÃO-FAZENDA NACIONAL, que arbitro em R$ 1.000,00 (um mil reais), à luz do que preceitua o art. 85, § 8º do CPC, valor este que será atualizado(correção monetária) desde a data da citação, e acrescido de juros de mora, a partir da data do trânsito em julgado desta sentença(§ 16 do art. 85, CPC), até a data do efetivo pagamento ou depósito judicial.

Custas, ex lege.

Registre-se. Intimem-se.

Recife/PE, 26.03.2021.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal da 2ª Vara da JFPE



 

 

 

(mppl)

 

 

 


[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. REsp 1267995/PB, Rel. Ministro MAURO CAMPBELL MARQUES, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 27/06/2012, DJe 03/08/2012.

Disponível em

https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=201101730744&dt_publicacao=03/08/2012

Acesso em 23.03.2021.

Competência do Juizado Especial Cível Federal para ações previdenciárias de valor inferior a 60(sessenta) salários mínimos e o que vem a ser perícia de alta complexidade.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Cabe à(ao) Magistrada(o) do Juizado Especial Cível Federal concluir que o processo exige ou não perícia complexa, mas este continua sendo o Juízo Natural para causas previdenciárias com valor inferior a 60(sessenta) salários mínimos. 

Mesmo que se trate de perícia para apuração de fatos para concessão de aposentadoria especial, o Plenário do E. TRF5R concluiu que isso não corresponde a perícia de alta complexidade, que poderia afastar a competência desse tipo de Juizado. 

Na decisão que segue, esse assunto é debatido minudentemente. 

Boa leitura. 


Obs.: decisão pesquisada e minutara pela Assessora Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques


 PROCESSO Nº: 0813112-26.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

AUTOR: CARLOS BERNARDINO DO NASCIMENTO
ADVOGADO: Elainy Cristiany Pereira De Souza Santos
RÉU: S B MOURA CIA LTDA e outro
ADVOGADO: Manoel Alvares De Alencar e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

DECISÃO

1- Relatório

CARLOS BERNARDINO DO NASCIMENTO, qualificado na petição inicial, propôs em 12/09/2018, esta ação em face do INSS e S.B. MOURA & CIA LTDA., na qual pretende a condenação do INSS a lhe conceder o benefício previdenciário de aposentadoria, e pagar as parcelas vencidas; e, ainda, a condenação da S.B. MOURA & CIA LTDA, a apresentar o PPP pertinente ao Autor. Atribuiu à causa o valor de R$29.000,00 (vinte e nove mil reais). Apresentou documentos.

O INSS apresentou Contestação e anexou documentos. O Autor apresentou Réplica.

O S.B. MOURA & CIA LTDA apresentou Contestação e Anexou documentos

O Autor apresentou novos documentos e, em seguida, apresentou Réplica à contestação da S.B. MOURA & CIA LTDA.

O Autor pediu que o processo fosse concluso.

Despacho no qual este Juízo verificou que a Parte Autora ajuizou esta ação em 12/09/2018 e atribuiu à causa o valor de R$29.000,00 (vinte e nove mil reais), o que insere o presente feito na alçada dos Juizados Especiais Federais; portanto, antes de decidir a respeito da competência deste Juízo, determinou que a Parte Autora fosse intimada para se manifestar, com fundamento no art. 10 do CPC.

Manifestação da Parte Autora na qual alegou, em síntese, que, mesmo o feito sendo da alçada dos Juizados Especiais Federais, a Causídica não o fez, uma vez que a referida causa "era complexa e poderia precisar de perícia", o que não ocorreu, uma vez que a empresa, mesmo fechada, na pessoa do seu empresário, depois de citada, reconheceu seu erro e anexou os documentos exigidos pelo Juízo.

É o relatório no essencial, passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Verifico que a Parte Autora ajuizou ação cujo valor da causa foi quantificado em R$29.000,00 (vinte e nove mil reais), em 12/09/2018.

O valor atribuído à causa se enquadra nos limites da competência dos Juizados Especiais Federais, pois inferior a 60 (sessenta[1]) salários mínimos vigentes na data do ajuizamento da ação.

Ocorre que processo dessa natureza, com valor inferior a 60 (sessenta) salários mínimos, é da competência absoluta do Juizado Especial Federal Cível (art. 3º e respectivos parágrafos da Lei nº 10.259, de 12 de julho de 2001).

Diante da incompetência absoluta deste Magistrado desta 2ª Vara Federal de Pernambuco, devo reconhecê-la de ofício (§ 1º do art. 64 do CPC) e encaminhar o feito para o Juízo natural competente.

Embora o sistema PJe, ao qual se encontra submetido este Juízo desta 2ª Vara Federal de Pernambuco seja incompatível com o sistema CRETA, ao que se submete o mencionado Juizado, deve a Secretaria providenciar o encaminhamento dos autos com base nas regras do § 2º do art. 12 da Lei nº 11.429, de 2010, ou, se possível, por meio de malote digital.

2.2- Durante a instrução do feito este Juízo verificou que o valor atribuído à causa insere a presente ação na alçada dos Juizados Especiais Federais e, assim, determinou que a Parte Autora se manifestasse, antes de decidir sobre a competência.

E a Parte Autora, na petição sob id. 4058300.16297759, observou que, mesmo o feito sendo da alçada dos Juizados Especiais Federais, a Causídica não o fez, uma vez que a referida causa era complexa e poderia precisar de perícia.

Data venia, não lhe assiste razão, primeiro, porque há fortes indícios da desnecessidade de perícia, pois não se pede aposentadoria especial e, segundo,  porque a possível necessidade de realização de perícia técnica não afasta, de modo algum, a competência dos Juizados Especiais.

E mesmo que se tratasse de pedido de aposentadoria especial, conforme será demonstrado abaixo, o TRF5R firmou o entendimento de que isso não afasta a competência das Varas da JUSTIÇA ESPECIAL FEDERAL CÍVEL.

Por outro lado, caso se constate a necessidade de perícia realmente complexa, então caberá à(ao) Magistrada(o) do Juizado, o competente natural para a causa, declinar a competência para uma das Varas Comuns, e não ao contrário.

O certo é que este tipo de demanda em que se pleiteia a concessão de benefício previdenciário, com valor abaixo de 60(sessenta) salários mínimos,  faz parte do cotidiano dos Juizados Especiais Federais.

Eis os julgados do Plenário do E. TRF-5ª, aos quais acima se fez menção:

"PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. AÇÃO PREVIDENCIÁRIA. VALOR DA CAUSA. NECESSIDADE DE PERÍCIA TÉCNICA. ATIVIDADE ESPECIAL. NÃO COMPLEXIDADE. COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL.

  1. Conflito negativo de competência suscitado pela Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Seção Judiciária de Sergipe frente ao Juízo Federal da 3ª Vara da mesma Seção (Vara Comum),em ação ordinária onde a parte demandante objetiva a concessão de aposentadoria por tempo de contribuição, com reconhecimento de período de atividade especial e sua conversão em comum, junto ao INSS;

 2. No que respeita ao teto dos Juizados, nos termos do que dispõe o art. 3º da Lei nº 10.259/2001, a lide seria da competência do JEF, em razão de importar em valor inferior a sessenta salários mínimo;

 3. Quanto à realização de perícia técnica, o Pleno desta Corte consolidou o entendimento no sentido de que essa mera circunstância não tornaria incompatível a realização da prova no JEF - até porque, de acordo com o art. 12 da Lei 10.259/2001, "a necessidade de produção de prova pericial, além de não ser o critério próprio para definir a competência, não é sequer incompatível com o rito dos Juizados Federais, que prevê expressamente a produção dessa espécie de prova".

Dessa forma, a menor complexidade que confere competência aos juizados especiais é, em via de regra, estabelecida pelo valor econômico da pretensão ou pela matéria envolvida. Exige-se, assim, a presença de apenas um desses requisitos, e não a sua cumulação;

 4. In casu, o valor da pretensão perseguida é inferior a 60 (sessenta) salários, enquanto que a prova técnica que se faz necessária para o caso, buscando esclarecer se as atividades exercidas pelo demandante o foram sob condições especiais, se faz por meio de documentos técnicos específicos exigidos pela legislação;

 5. Conflito conhecido para declarar competente a Turma Recursal do Juizado Especial Federal da Seção Judiciária de Sergipe"[2].


"PROCESSO Nº: 0806957-12.2017.4.05.0000 - CONFLITO DE COMPETÊNCIA SUSCITANTE: JUÍZO DA 18ª VARA FEDERAL DO CEARÁ-SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SOBRAL SUSCITADO: JUÍZO DA 19ª VARA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DO CEARÁ-SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SOBRAL JUIZ FEDERAL SÉRGIO DE NORÕES MILFONT JÚNIOR JUIZ FEDERAL THIAGO MESQUITA TELES DE CARVALHO RELATOR(A): DESEMBARGADOR(A) FEDERAL ROGERIO DE MENESES FIALHO MOREIRA - PLENO EMENTA PROCESSUAL CIVIL. CONFLITO NEGATIVO DE COMPETÊNCIA. JUIZADO ESPECIAL FEDERAL E VARA COMUM FEDERAL. PRELIMINARMENTE. AÇÃO PROPOSTA NA VARA COMUM FEDERAL E NO JEF. EXTINÇÃO DO FEITO. PROCESSO ELETRÔNICO. CONHECIMENTO DO CONFLITO. MÉRITO. PERÍCIA TÉCNICA PARA AVERIGUAÇÃO DE SUBMISSÃO A AGENTES NOCIVOS PARA EFEITO DE APOSENTADORIA ESPECIAL. COMPATIBILIDADE COM O ARTIGO 12 DA LEI Nº 10.259/01. INEXISTÊNCIA DE COMPLEXIDADE QUE AFASTE A COMPETÊNCIA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL.

1. Conflito Negativo de Competência, suscitado pelo JUÍZO DA 18ª VARA FEDERAL DO CEARÁ - SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SOBRAL diante do JUÍZO DA 19ª VARA DO JUIZADO ESPECIAL FEDERAL DO CEARÁ - SUBSEÇÃO JUDICIÁRIA DE SOBRAL nos autos da ação ordinária em que LUIS CARLOS ARAÚJO pleiteia a aposentadoria especial em face do INSS.

2. A ação foi intentada inicialmente no Juízo da 19ª Vara Federal do Ceará - Juizado Especial, que extinguiu o feito sem resolução do mérito, sob o argumento de que é imprescindível para o deslinde da causa a realização de perícia no local de trabalho do autor, "prova técnica de maior complexidade, para se aferir, com exatidão, os fatores de riscos existentes, os EPIs de fato utilizados, e, consequentemente, a configuração ou não do labor de natureza especial".

3. Vislumbrou divergência entre o PPP e o LTCAT em relação ao período de 1/8/88 a 28/02/2011, na medida em que "malgrado o PPP registre que não há exposição a fator de risco, o LTCAT consigna que há exposição habitual e permanente a agentes biológicos (vírus, bactérias, fungos e outros agentes disseminados no ambiente)".

4. Intentada a ação no Juízo da 18ª Vara Federal do Ceará, este suscitou o conflito, asseverando não ter competência para apreciar a demanda, sob o argumento de que a causa se insere no âmbito da competência absoluta dos Juizados Especiais Federais, uma vez que o valor da causa é inferior a sessenta salários mínimos, bem como por tratar-se a prova técnica proposta, "de perícia ordinária, a ser realizada por profissional com especialização lato sensu em Engenharia de Segurança do Trabalho, nos moldes da Lei nº 7.410/85".

5. O Pleno, expressamente fundamentado na teoria instrumentalista do processo, vem entendendo pela admissibilidade de conflitos de competência similares ao presente, desde que se configure uma efetiva colisão de pronunciamentos entre juizado especial federal e vara comum da Justiça Federal no que atine à competência, mesmo quando uma das manifestações tenha sido mediante sentença extintiva do processo por incompetência.

6. O valor da causa atribuído na peça exordial foi de R$ 32.200,00 (trinta e dois mil e duzentos reais) de modo que, sendo inferior a sessenta salários mínimos, está compreendido no limite estabelecido pelo artigo 3° da Lei n° 10.259/01.

7. A jurisprudência deste Eg. Plenário se firmou no sentido de que perícias técnicas que não possuem alta complexidade, o que é o caso dos autos, são compatíveis com a celeridade e a simplicidade que orientam o processo nos Juizados Especiais.

8. Conflito negativo de competência que se conhece para declarar competente a 19ª Vara Federal do Ceará - Juizado Especial Federal (Suscitado)[3]."

É o caso dos autos.

3- Dispositivo

Ante o exposto, de ofício, declaro a minha incompetência absoluta para esta ação (§ 1º do art. 64 do CPC) e a declino para um(a) dos(as) d. Magistrados(as) do Juizado Especial Federal Cível desta Seção Judiciária, para onde determino seja este feito encaminhado, observando as regras do § 2º do art. 12 da Lei 11.419, de 2010 ou, se possível, por malote digital, após regular baixa nesta 2a Vara Federal.

Intimem-se.

Cumpra-se.

Recife, 26.03.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

(rmc)

 



[1] O valor do salário mínimo, em 2018,  era de R$ 954,00 (novecentos e cinquenta reais). 60 x 954 = 57.240,00

[2] BRASIL. TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO. PLENO. Processo: 08118256220194050000, CC - Conflito de Competência, Relator Desembargador Federal Rubens de Mendonça Canuto, Julgamento: 23.9.2019.

[3]_________________________________ Processo: 08069571220174050000, CC, Desembargador Federal Rogério de Meneses Fialho Moreira, julgamento: 29/11/2017) 

domingo, 21 de março de 2021

PREVIDENCIÁRIO. VERBAS PRETÉRITAS. UM CASO BEM INTERESSANTE.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Na sentença que segue, interessantes matérias processuais e de direito financeiro, portanto, orçamentárias,  são debatidas. 

Boa leitura.  

 
PROCESSO Nº: 0802557-42.2021.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: M J DA S
ADVOGADO: J C V N
ADVOGADO: A R A De M
IMPETRADO: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

Sentença tipo C


EMENTA: - DIREITO PROCESSUAL CIVIL E PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO PREVIDENCIÁRIO. PARCELAS VENCIDAS.

Se o pedido de concessão de revisão do benefício já foi apreciado e concedido, falta interesse processual de agir ao Impetrante para pleitear, via MS, apreciação pela Autoridade quanto às parcelas vencidas, porque não há pleito administrativo específico a respeito de tais verbas.

Extinção, sem resolução do mérito.


Vistos etc.

1-Relatório

M J DA S, qualificado na Petição Inicial, impetrou este mandado de segurança com pedido de liminar em face do Ilmº Sr. GERENTE EXECUTIVO DO INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS (Av. Mário Melo, Santo Amaro). Alegou, em síntese, que: em 16/12/2020 teria protocolado requerimento de revisão do benefício previdenciário que lhe teria sido concedido, mas que necessitaria de reajustes quanto aos valores; a revisão teria sido realizada, no entanto, mesmo com o decurso de mais de um mês desde a data da conclusão do pedido de revisão, a Autoridade não teria efetuado pagamento dos valores, tampouco teria se pronunciado acerca de quando os valores estariam disponíveis e, assim, teria incorrido em ilegalidade.

Em razão do exposto, requer:

"Em sede de liminar:

A concessão da medida liminar, determinando à autoridade impetrada que promova a apreciação do requerimento formulado pelo impetrante, no prazo máximo de 5 dias, eis que o prazo de 45 dias já foi superado, sob pena de multa diária a ser arbitrada por este d. juízo;

No mérito a) Seja a autoridade impetrada notificada para prestar as informações que entender pertinente; b) Seja concedido ao impetrante o beneplácito da assistência judiciária gratuita, por ser pobre no sentido legal; c) A concessão da segurança, confirmando a liminar, condenando a autoridade impetrada a promover o julgamento do requerimento protocolado pelo segurado, no prazo máximo de 5 (cinco) dias, sob pena de multa diária a ser arbitrada por este d. Juízo; d) A notificação do Ministério Público Federal."

Atribuiu valor à causa e juntou instrumento de procuração e documentos.

Em atenção a determinação do Juízo, reapresentou a Petição Inicial no formato do editor de texto do sistema PJE.

2- Fundamentação

Noto que a Parte Impetrante não quer que se obrigue a Autoridade apontada como coatora a lhe pagar parcelas vencidas do seu benefício previdenciário, mas apenas e tão somente que essa Autoridade aprecie o seu pedido, a tempo e modo.

A Parte Impetrante protocolou pedido de revisão do seu benefício em dezembro de 2020 e em fevereiro de 2021 recebeu a carta do INSS, comunicando que fora feita a revisão, com a respectiva implantação.

Todavia, as parcelas vencidas ainda não lhe foram pagas.

Então, o pedido da petição inicial, para obrigar a Autoridade apontada como coatora a apreciar o pleito administrativo, protocolado em dezembro  de 2020, resta sem sentido, porque referido pleito já foi apreciado e acolhido.

A percepção das verbas vencidas de exercícios anteriores constitui outro fato a ser enfrentado primeiro na via administrativa, ou seja, caso não seja efetuado o pagamento pelo INSS no exercício seguinte e, no caso, pode ser neste exercício de 2021(se houver dotação orçamentária) ou no exercício de 2022, pois, se não houver aquela dotação orçamentária para este exercicio de 2021, o INSS indicará os respectivos valores de dívidas de exercícios findos na sua proposta do INSS para o projeto de orçamento para ser incluídas no projeto da Lei do Orçamento da UNIÃO a ser feito neste 2021 para o exercício de 2022, é que referidas parcelas vencidas deverão ser incluídas e nesse sentido já decidiu o STF, verbis:

"3) - Na ausência ou na insuficiência de disponibilidade orçamentária no exercício em curso, cumpre à União promover sua previsão no projeto de lei orçamentária imediatamente seguinte.
[Tese definida no RE 553.710, rel. min. Dias Toffoli, P, j. 23-11-2016, DJE 195 de 31-8-2017,Tema 394.]".

Por outro lado, se o Impetrante tivesse pedido, na via administrativa, especificamente, que as mencionadas verbas passadas fossem devidamente pagas, o que não aconteceu, e a Autoridade não tivesse apreciado tal pleito a tempo e modo, nos prazos e forma fixados em Lei, aí sim, caberia MS apenas para determinar que o seu pleito administrativo fosse apreciado, cabendo o indeferimento ou deferimento apenas à referida Autoridade. 

Ou seja, teria que esgotar, previamente, a respeito da matéria, a via administrativa e nesse sentido já decidiu o Plenário do STF, no julgamento do Recurso Extraordinário - RE nº 631.240[1]

Mas não poderia pedir que o Juízo determinasse o pagamento de tais verbas vencidas, porque o MS não se presta para cobrança de verbas passadas(Súmula 271 do STF).

Então, constato que o ora Impetrante não tem interesse processual de agir, primeiro, porque o seu pleito administrativo de dezembro de 2020 já foi apreciado, segundo porque o ora Impetrante não fez pleito administrativo específico para a percepção das parcelas vencidas, ainda não apreciado pela Autoridade.

O reconhecimento da falta de interesse processual de agir poder ser feito de ofício pelo Juízo(§ 3º do art. 485 do CPC).

3. Dispositivo

Posto isso, indefiro de plano a petição inicial, por faltar ao Impetrante interesse processual de agir(art. 330, II, CPC) e dou este processo por extinto, sem resolução do mérito(art. 485, VI, § 3º, CPC).

Sem verba honorária (Lei nº 12.016/2009, art. 25).

Recife, 21.03.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara Federal/PE

______________________________________________

[1]Brasil. Supremo Tribunal Federal. Pleno. Recurso Extraordinário - RE nº  631240, Relator  Ministro Roberto Barroso, julgado em 03/09/2014, ACÓRDÃO ELETRÔNICO REPERCUSSÃO GERAL - MÉRITO DJe-220 DIVULG 07-11-2014 PUBLIC 10-11-2014.

Disponível em

Disponível em: http://stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000217119&base=baseAcordaos Acesso em: 26/03/2020

Acesso em 26.03.2020

 

 

  

sábado, 20 de março de 2021

APOSENTADORIA ESPECIAL. TRABALHO COM ELETRICIDADE.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Segue interessante e bem fundamentada sentença relativa a aposentadoria especial concedida a trabalhador que lidava com eletricidade. 

Boa leitura. 



Obs.: pesquisa e minuta de sentença feitas pela Assessora Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques


PROCESSO Nº: 0809127-20.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: EDIMILSON AURELIANO DE CASTRO
ADVOGADO: Ricardo De Souza
ADVOGADO: Sofia Ferreira Alencar Correa Debassolles
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)





Sentença tipo A



EMENTA:- PREVIDENCIÁRIO. APOSENTADORIA ESPECIAL. REQUISITO DO TEMPO DE SERVIÇO ESPECIAL IMPLEMENTADO NA DER - DATA DE ENTRADA DO REQUERIMENTO. PROCEDÊNCIA.

-Implementado o tempo de 25 (vinte e cinco) anos de tempo de serviço especial, o Autor faz jus ao benefício na DER.

-Procedência.



Vistos etc.

1-Relatório 

EDMILSON AURELIANO DE CASTRO, qualificado na Inicial, ajuizou em 21/11/2016, esta ação em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS pretendendo a concessão do benefício de Aposentadoria Especial desde a data do requerimento administrativo, com o pagamento das prestações vencidas desde então. Requereu, inicialmente, o benefício da assistência judiciária gratuita e alegou, em síntese, que: teria ingressado na CBTU em 24/10/1984 e permaneceria na referida empresa até a presente data; teria requerido sua aposentadoria em 30/03/2015, sob o nº 171.741.418-1, que teria sido indeferida, pois o INSS teria entendido que o Autor não teria tempo mínimo de contribuição, o que seria descabido, pois o Autor teria exercido função com exposição de risco no tempo laborado, e teria apresentado os documentos necessários à comprovação do pleito; os documentos apresentados comprovariam a efetiva exposição ao risco eletricidade e ruído acima dos limites permitidos de forma habitual e  permanente, não ocasional e nem  intermitente, por mais de 25 anos, tempo necessário para a concessão da Aposentadoria Especial. Discorreu sobre o seu tempo de contribuição e aduziu que, no período anterior a Lei nº 9.032/95, estaria enquadrado como ferroviário, para fins de aposentadoria especial pela categoria profissional, o que dispensaria prova pericial; e aduziu que o INS teria o dever de conceder o benefício mais favorável ao segurado; faria jus a conversão da aposentadoria por tempo de contribuição em especial. Transcreveu ementas de decisões judiciais, e requereu, ao final: "(...) 3-Procedência da ação, com a condenação da Autarquia Previdenciária/Ré na concessão da Aposentadoria Especial do Autor, com fixação da renda mensal inicial nos termos da lei; acrescido de juros e correção monetária;4-Condenação da Acionada no pagamento das custas processuais e honorários advocatícios a se rem estabelecidos por V. Exa.; 5-Condenação da Acionada ao pagamento das prestações vencidas desde a data do requerimento administrativo, corrigidas monetariamente e acrescidas de juros de 1% ao mês;6-Produção de todos os meios de provas em direitos admitidos, por mais especiais que sejam tal como juntada de documentos, perícias médicas, depoimentos das partes, oitiva de testemunhas e tudo mais que se fizer necessário ao total esclarecimento da verdade;" Inicial instruída com instrumento de procuração e documentos.

Despacho no qual foi concedido à Parte Autora o benefício da justiça gratuita e determinou a citação do INSS.

O INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS apresentou Contestação na qual afirmou, em síntese, que: o requerimento administrativo do Autor teria sido indeferido porque a atividade do  Autor, de técnico em telecomunicações por ele exercida, não o sujeitaria ao agente eletricidade de forma habitual e permanente, durante toda a jornada de trabalho; o campo 15.5 do PPP do Autor, não conteria a técnica descrita para a avaliação do agente alegado; constaria no Laudo Técnico que o Autor teria formulado requerimento administrativo de adicional de periculosidade, mas o Autor teria omitido o resultado do requerimento; a eletricidade não constituiria agente nocivo após 05 de março de 1997; nem todo funcionário da CBTU estaria exposto ao agente eletricidade de forma habitual e contínua, com maior razão o Autor que exerceria a função de técnico em comunicações; os peritos do SST teriam se deparado com um documento da CBTU, no caso, a Ficha de Credenciamento ao Adicional de Periculosidade do segurado, e teriam constatado que, em tal documento haveria um campo específico em que constaria a informação a respeito da habitualidade e permanência da exposição do trabalhador ao agente eletricidade; embora a documentação fornecida pela CBTU (PPP e Laudos Técnicos) normalmente atestasse a exposição habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, a própria CBTU possuiria um documento que, em certos casos, infirmaria tais declarações; no caso dos autos, não constaria a Ficha de Credenciamento ao Adicional de Periculosidade, portanto, sem tal documentação, não se teria como concluir pela efetiva exposição do segurado ao agente em comento de forma habitual e permanente, ora impugnado pelo INSS, diante disso, o INSS requereu a "citação da CBTU" para apresentar a documentação; e acrescentou que não teria sido comprovada a habitualidade e permanência da exposição ao agente, pois, sem a mencionada Ficha, não haveria como  concluir pela efetiva exposição do Autor ao agente em comento de modo habitual e permanente, e também não seria possível considerar como especial o período posterior a 05/03/1997. Discorreu sobre o benefício de Aposentadoria Especial e, ao final, requereu, a improcedência dos pedidos; "(...) b) a condenação da parte autora, em qualquer caso, ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios (art. 23, da Lei nº 8.906/94, nos termos do art. 85, §3, §14 e §19, art. 98, parágrafo segundo, do CPC e art. 29 da Lei 13.327/2016 c) Na hipótese improvável de condenação: c.1) seja fixado o termo inicial da condenação na data da citação válida, desde que comprovado tempo de contribuição suficiente; c.2) a fixação dos juros de mora e da correção monetária, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97; c.3) sejam os honorários advocatícios arbitrados em respeito ao art. 85 do CPC, com a observância, em qualquer caso, do quanto estabelecido na Súmula n° 111, do STJ. c.4.) que sejam os honorários processuais decorrentes da sucumbência parcial devidos pela parte autora aos advogados públicos sejam retidos do precatório ou RPV que eventualmente vier a receber em decorrência desta lide Assim, pugna o Instituto Previdenciário: a) pela citação da CBTU - Companhia Brasileira de Trens Urbanos, empregadora do autor, cuja Superintendência em Recife fica na R. José Natário, 478 - Areias, Recife/PE, 50900-000, para que apresente a FICHA DE CREDENCIAMENTO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE referente ao autor, nos termos do art. 401 do CPC/15, como comprove: a) todas as atribuições do emprego público de assistente operacional, incluindo atribuições administrativas, em especial auxiliar de técnico em telecomunicações (vide fl. 12 da CTPS de ID 4058300.2599807); b) as atividades administrativas e de chefia desenvolvidas pelo autor e) as competências nas quais o autor não recebeu adicional de periculosidade, bem como as competências nas quais recebeu, especificando o nível\grau e a respectiva voltagem. b) PELO DEPOIMENTO como Testemunhas referidas nos autos, o Profissional responsável pelos registros ambientais no PPP e pela elaboração do Laudo Técnico Pericial Sr. ALEXANDRE MAURO ALBUQUERQUE DE LIMA, e a Técnica que assinou o referido PPP, como representante legal da CBTU, a Srª MONICA MARIA CANTINI RIBEIRO, para que prestem depoimento na audiência acima designada, relativamente ao conteúdo do PPP e do Laudo Técnico Pericial. As testemunhas referidas nos autos serão ouvidas após a oitiva da Partes Autora, que deverá ser intimada, por mandado, para depor sob pena de confissão. Requer que a Secretaria deste Juízo diligencie nos sistemas SERPRO e INFOJUD acerca dos endereços de ALEXANDRE MAURO ALBUQUERQUE DE LIMA e de LÍVIA MARTINS ESTRELA, para fins de intimação. Caso infrutífera a pesquisa, que seja expedido ofício à CBTU solicitando o fornecimento dos endereços ou para que já realize a intimação dos mesmos." Juntou documentos.

O Autor apresentou Réplica à Contestação; em seguida, ingressou com petição na qual informou a existência de alguns "casos selecionados", cujo conjunto probatório guardaria simetria com o caso em tela.

Decisão na qual foi determinada a expedição de ofício à CBTU solicitando a apresentação (s) FICHA (s) DE CREDENCIAMENTO DO ADICIONAL DE PERICULOSIDADE referente ao Autor, EDIMILSON AURELIANO DE CASTRO, bem como para informar  todas as atribuições do emprego público de assistente operacional, incluindo atribuições administrativas; as atividades administrativas e de chefia desenvolvidas pelo Autor; e as competências nas quais o Autor não recebeu adicional de periculosidade, bem como as competências nas quais recebeu.

Intimado para se manifestar sobre a última petição apresentada pelo Autor, o INSS afirmou que, nos casos trazidos pelo Autor, os Autores exerceriam na CBTU o cargo de Agente Operacional, diferente do cargo do Autor, que é de Técnico em Telecomunicações.

Certidão da Secretaria do Juízo que atesta a juntada do ofício resposta da CBTU (id. 4058300.6377055).

Regularmente intimado para se manifestar sobre os documentos apresentado pela CBTU, o INSS alegou, em síntese, que: "Percebe-se que o autor pleiteia o reconhecimento de tempo especial a partir de 24/10/1984. A CBTU ANEXA DOCUMENTOS QUE EVIDENCIA A PERCEPÇÃO DE ADICIONAL DE PERICULOSIDADE TÃO-SOMENTE A PARTIR DE OUTUBRO/87; OUTROSSIM, PERCEBE-SE DOS AUTOS QUE O AUTOR EXERCEU POPR DIVERSOS PERÍODOS FUNÇÕES ADMINISTRATIVAS, O QUE IMPEDE O RECONHECIMENTO DE TEMPO ESPECIAL. 3. Outrossim, percebe-se que o órgão da CBTU que responde ao ofício é diverso do setor de Recursos Humanos. Pela prática recorrente nesta justiça, restou comprovado que as informações constantes nos documentos desta empresa diferem, na prática, das atividades efetivamente desempenhadas pelos autores. A resposta da CBTU é embasada na documentação anexada. Mas não consta nenhuma afirmação do setor de Recursos Humanos que indique, de forma categórica, em que setor a parte demandante efetivamente desempenhou suas atividades."

O Autor ingressou com petição na qual juntou a cópia do Laudo Pericial produzido em processo que tramitou perante a 21ª Vara Federal/PE, e transcreveu observações contidas no laudo acerca da análise dos aspectos de intermitência, habitualidade e EPI.

Em seguida, o Autor atravessou petição com a qual juntou uma relação com decisões que teriam sido proferidas pelo E. TRF-5ª Região, favoráveis a sua tese.

Regularmente intimado, o INSS observou que a documentação acostada pelo Autor não fortaleceria a pretensão exordial, já que a função desenvolvida pelo Autor (técnico em telecomunicações) seria diversa daquela do Autor da ação que tramitou no Juízo da 21ª Vara Federal (agente de estação), objeto do laudo produzido naqueles autos; ratificou os termos da Contestação, e reiterou que seria improvável exposição à eletricidade no exercício do cargo de técnico de telecomunicações.

O Autor noticiou a desistência pelo INSS em processo similar ao presente, e requereu a intimação do INSS para se manifestar sobre a eventual intenção de renunciar à presente demanda, pelos motivos que teriam sido externados pelo INSS no mencionado feito. Juntou documentos.

O INSS, a respeito da manifestação e documentos juntados pelo Autor acima aludidos, salientou que, ao contrário do presente caso, as ações citadas pelo Autor estavam na fase recursal e eventual pedido de desistência de recurso interposto pelo INSS teria se dado em respeito ao enunciado da Súmula nº 07 do STJ (matéria fática); reiterou os termos da contestação, requereu a juntada do processo administrativo e requereu o regular prosseguimento do feito.  

Intimado acerca da manifestação do INSS, o Autor pugnou pelo prosseguimento do feito

É o relatório, no essencial.

Fundamento e decido.

2- Fundamentação

2.1- Tendo em vista que o conjunto probatório acostado aos autos, DOCUMENTOS E LAUDOS PERICIAIS, dispensa a realização de prova testemunhal, como pretendido pelo INSS. 

Então, à luzo do inciso I do art. 355 do CPC, tenho por bem partir para o julgamento antecipado, de acordo com a prova dos autos.

2.2- Sem preliminares ou exceções, examina-se o mérito.

2.3- O Autor pleiteia a concessão do benefício de Aposentadoria Especial, sob a alegação de que teria trabalhado em condições especiais por mais de 25 (vinte e cinco) anos. E, ainda, o pagamento das parcelas vencidas a contar do requerimento administrativo.

2.2.2 - A respeito da Aposentadoria Especial e da prestação do serviço em condições prejudiciais à saúde e à integridade física, regradas nos artigos 57 e 58 da Lei nº 8.213, de 1991, constato que, a teor do § 5º desse art. 57, é permitida a conversão do tempo de serviço prestado em condições especiais para tempo de serviço comum, com o acréscimo pertinente.

O tempo mínimo de exercício da atividade geradora do direito à Aposentadoria Especial é estipulado pelo art. 57 da Lei nº 8.213/91, em 15 (quinze), 20 (vinte) ou 25 (vinte e cinco) anos.

Registre-se, no tocante à conversão do tempo prestado em condições especiais para tempo de serviço comum, que, a despeito da vigência, durante determinado período, de norma obstativa da conversão, é esta atualmente permitida, como se extrai da letra expressa do artigo 1o do Decreto nº 4.827, de 3.9.2003, a seguir reproduzido:

"Art. 1º O art. 70 do Regulamento da Previdência Social, aprovado pelo Decreto nº 3.048, de 6 de maio de 1999, passa a vigorar com a seguinte redação:

'Art. 70. A conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum dar-se-á de acordo com a seguinte tabela:

§ 2o As regras de conversão de tempo de atividade sob condições especiais em tempo de atividade comum constantes deste artigo aplicam-se ao trabalho prestado em qualquer período'."






MULTIPLICADORES

MULHER (PARA 30)

HOMEM (PARA 35)

DE 15 ANOS

2,00

2,33

DE 20 ANOS

1,50

1,75

DE 25 ANOS

1,20

1,40

§ 1o A caracterização e a comprovação do tempo de atividade sob condições especiais obedecerá ao disposto na legislação em vigor na época da prestação do serviço."

Resta verificar, portanto, se o (s) período (s) referido (s) pelo Autor pode (em) ser tido (s) como prestado (s) em condições prejudiciais à saúde ou à integridade física.

A contagem do tempo de serviço é disciplinada pela lei vigente à época do serviço prestado(Lei do  tempo  dos fatos).

Lei novas com regras modificadoras, com novas exigências, não retroagem, aplicam-se apenas a fatos posteriores à respectiva vigência (princípio da irretroatividade das Leis). 

Relevante destacar que a obtenção de uma Aposentadoria Especial demandaria ter o segurado, ora Autor,  desempenhado todo o seu tempo de serviço sob condições penosas, insalubres e perigosas.

Verifica-se, assim, a seguinte evolução legislativa quanto ao tema:

Até a edição da Lei nº 9.032, de 29/04/1995, era possível o reconhecimento do exercício de atividade especial com base apenas na categoria profissional do trabalhador, observada a classificação constante nos anexos dos decretos nº 53.831/64 e 83.080/79 (Anexos I e II), cujo rol não é taxativo, não sendo necessário fazer prova efetiva da exposição às condições prejudiciais à saúde ou à integridade física; ou ainda quando demonstrada a sujeição do segurado a agentes nocivos, por qualquer meio de prova, exceto para os agentes nocivos ruído e calor, que exigem a mensuração de seus níveis por meio de perícia técnica, trazida aos autos ou noticiada em formulário emitido pela empresa, a fim de se verificar a existência ou não de nocividade.

A partir de 29/04/95, com a edição da Lei n.º 9.032/95, que alterou a Lei n.º 8.213/91, passou a ser exigida a comprovação da efetiva exposição aos agentes agressivos, mediante a apresentação de documentos conhecidos como SB 40, DISES-BE 5235, DSS-8030 e DIRBEN 8030.

Com o advento da Medida Provisória nº. 1.523/96, posteriormente convertida na Lei nº. 9.528/97 (DOU 11/12/1997), a redação do art. 58 da Lei nº. 8.213/91 foi modificada, passando-se a exigir a elaboração de laudo técnico assinado por médico do trabalho ou engenheiro de segurança do trabalho.

No entanto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça - STJ firmou posicionamento no sentido de que essa exigência só é possível a partir da edição daquele Lei de 1997, e não da data da Medida Provisória mencionada.

Saliento, por importante, que o laudo pericial não contemporâneo ao período trabalhado é apto à comprovação da atividade especial do segurado, consoante pacificado pela Turma Nacional de Uniformização dos Juizados Especiais Federais - TNU, nos termos da Súmula nº 68 de sua jurisprudência.

Ainda quanto à extemporaneidade dos laudos técnicos, os Tribunais já se manifestaram no sentido de que não desnatura a sua força probatória, uma vez que inexiste previsão legal para tanto, e, além disso porque as condições do ambiente de trabalho tendem a aprimorar-se com a evolução tecnológica, podendo se supor que, em tempos pretéritos, a situação era pior ou quando menos semelhante à constatada na data da elaboração.

E, quanto à utilização de equipamentos de proteção coletiva ou individual, nos termos do § 2º do art. 58 da Lei nº 8.213/91, o Supremo Tribunal Federal concluiu, nos autos do ARE nº 664.335/SC, com repercussão geral, que "na hipótese de exposição do trabalhador a ruído acima dos limites legais de tolerância, a declaração do empregador, no âmbito do Perfil Profissiográfico Previdenciário (PPP), no sentido da eficácia do Equipamento de Proteção Individual - EPI, não descaracteriza o tempo de serviço especial para aposentadoria".[1]

No que diz respeito ao ruído, a TNU,  na Súmula nº 09, seguiu essa orientação do STF.

Saliento que utilização de equipamentos de proteção individual é irrelevante para o reconhecimento das condições especiais, prejudiciais à saúde ou à integridade física do trabalhador, da atividade exercida no período anterior a 03 de dezembro de 1998, a partir de quando a exigência de seu fornecimento e uso foi disposta pela MP nº 1.729/98, convertida na Lei nº 9.732/89.

Com relação aos limites de tolerância do agente nocivo "ruído", aplica-se da seguinte maneira:

- superior a 80 decibéis, na vigência do Decreto n. 53.831/64 (1.1.6);

- superior a 90 decibéis, na vigência do Decreto n. 2.172, de 5/3/1997 (2.0.1) e,

- superior a 85 decibéis, a partir da edição do Decreto n. 4.882, de 18/11/2003.

No que concerne ao agente nocivo eletricidade, a previsão do referido agente nocivo consta no item 1.1.8, do quadro anexo ao Decreto nº 53.831/64.

Com o advento do Decreto nº 2.172/97 (DOU de 05/03/1977), deixaram de vigorar os Decretos nºs. 53.831/64 e 83.080/79, os quais previam diversas ocupações que ensejavam a contagem majorada do tempo de serviço, dentre elas a de eletricista. Passaram a ser listados apenas os agentes considerados nocivos ao trabalhador, classificados como químicos, físicos ou biológicos. Não há no Decreto nº 2.172/97 nenhuma referência à eletricidade e nem um único indicativo de periculosidade.

Entretanto, a supressão, pelo Decreto nº 2.172/1997, da eletricidade e demais agentes periculosos do rol de agentes nocivos não inviabiliza o reconhecimento do tempo especial a partir do advento do decreto regulamentar, conforme decidido pelo Egrégio Superior Tribunal de Justiça em sede de Recurso Especial submetido ao rito do art. 543-C do Código de Processo Civil. Confira-se a ementa do aludido recurso:

"RECURSO ESPECIAL. MATÉRIA REPETITIVA. ART. 543-C DO CPC E RESOLUÇÃO STJ 8/2008. RECURSO REPRESENTATIVO DE CONTROVÉRSIA. ATIVIDADE ESPECIAL. AGENTE ELETRICIDADE. SUPRESSÃO PELO DECRETO 2.172/1997 (ANEXO IV). ARTS. 57 E 58 DA LEI 8.213/1991. ROL DE ATIVIDADES E AGENTES NOCIVOS. CARÁTER EXEMPLIFICATIVO. AGENTES PREJUDICIAIS NÃO PREVISTOS. REQUISITOS PARA CARACTERIZAÇÃO. SUPORTE TÉCNICO MÉDICO E JURÍDICO. EXPOSIÇÃO PERMANENTE, NÃO OCASIONAL NEM INTERMITENTE (ART. 57, § 3º, DA LEI 8.213/1991).

1. Trata-se de Recurso Especial interposto pela autarquia previdenciária com o escopo de prevalecer a tese de que a supressão do agente eletricidade do rol de agentes nocivos pelo Decreto 2.172/1997 (Anexo IV) culmina na impossibilidade de configuração como tempo especial (arts. 57 e 58 da Lei 8.213/1991) de tal hipótese a partir da vigência do citado ato normativo.

2. À luz da interpretação sistemática, as normas regulamentadoras que estabelecem os casos de agentes e atividades nocivos à saúde do trabalhador são exemplificativas, podendo ser tido como distinto o labor que a técnica médica e a legislação correlata considerarem como prejudiciais ao obreiro, desde que o trabalho seja permanente, não ocasional, nem intermitente, em condições especiais (art. 57, § 3º, da Lei 8.213/1991). Precedentes do STJ.

3. No caso concreto, o Tribunal de origem embasou-se em elementos técnicos (laudo pericial) e na legislação trabalhista para reputar como especial o trabalho exercido pelo recorrido, por consequência da exposição habitual à eletricidade, o que está de acordo com o entendimento fixado pelo STJ.

4. Recurso Especial não provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C do CPC e da Resolução 8/2008 do STJ." (RESP 201200357988, HERMAN BENJAMIN, STJ - PRIMEIRA SEÇÃO, DJE DATA:07/03/2013.[1]) (G.N.)

Feitas essas observações iniciais, analisa-se o caso concreto.

Deve-se observar que não há nos documentos carreados aos autos qualquer indicação de que o Autor estivera exposto ao agente nocivo ruído no período em que trabalhara na CBTU, embora o referido fator de risco tenha sido mencionado na Petição Inicial, como gerador do direito à Aposentadoria Especial.

Disso resulta que não faz jus, a Parte Autora, ao benefício de Aposentadoria Especial, com fundamento no agente nocivo ruído, pois não comprovada a exposição ao mencionado agente insalubre (ruído) nos documentos anexados.

Ainda, deve-se observar que a nomenclatura da função do Autor na CBTU foi alterada no curso da prestação da atividade laboral, em função dos Planos de Cargos e Salários - PCS que aconteceram na referida Empresa, a saber: Técnico em Telecomunicação, Técnico de Manutenção e, finalmente, Técnico Industrial. Tais informações foram prestadas pelo representante da CBTU nos documentos trazidos pela CBTU/Empregadora do Autor, em cumprimento a decisão deste Juízo (id. 4058300.6377055).

Especificamente com relação ao agente nocivo eletricidade, verifica-se, na documentação constante dos autos (PPP, Laudos Técnicos e documentos apresentados pela CBTU), a informação de que o Autor esteve exposto ao agente nocivo eletricidade durante o seu vínculo laboral com a CIA Brasileira de Trens Urbanos, no período controvertido, compreendido entre 24/10/1984 e 30/03/2015 (DER).

Cumpre verificar se a exposição ao agente nocivo eletricidade ocorreu de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente, conforme exigido pela Lei nº 8.213/91 (art. 57, §3º) e o precedente (repetitivo-STJ) citado alhures, para fins de reconhecimento da especialidade do interstício laboral.

Nesse particular, no Laudo Técnico Pericial que embasou a elaboração do PPP, consta a informação do método e da técnica pertinentes à aferição do agente nocivo eletricidade, in verbis:

"Avaliação qualitativa /quantitativa da presença do agente; Análise das atividades executadas em suas respectivas áreas;".

Registrou-se, ademais, no referido Laudo Técnico, que:

"a empresa integra o sistema elétrico de potência, não havendo necessidade de usar equipamentos de medicação na avaliação, operando em níveis de tensão acima de 250 volts (380 volts, 3.300 volts, 6.600 volts, 13.800 volts e 69.000 volts) controlados por equipamentos instalados no sistema, tais como Waltímetro, Voltímetro e Amperímetro." (id. 4058300.2599810).

Diante de tais informações consignadas no Laudo Técnico, não prospera o argumento do INSS no sentido de que, por não constar no PPP, no campo 15.5, a técnica descrita para a avaliação do agente alegado, o Autor não faria jus ao benefício de Aposentadoria Especial.

Do mesmo modo, não prospera o argumento levantado pela defesa do INSS, no sentido de que a eletricidade, após 05 de março de 1997, não constituiria agente nocivo apto a ensejar a concessão do benefício de Aposentadoria Especial, ante o decidido em sentido contrário pelo E. STJ, no Recurso Especial com efeito repetitivo acima transcrito.

Note-se que o INSS, em sua peça de defesa, lançou dúvida sobre a efetiva exposição do Autor, de modo habitual e permanente, ao agente nocivo eletricidade e, com o objetivo de comprovar as suas alegações, de que não existiria a habitualidade e a permanência na exposição, o INSS requereu que a CBTU fosse instada a apresentar a Ficha de Credenciamento ao Adicional de Periculosidade, pois, segundo afirmou, os técnicos do INSS teriam constatado que, em tal documento, haveria um campo específico no qual constaria a informação a respeito da habitualidade e permanência da exposição do trabalhador ao agente eletricidade, o que foi deferido pelo Juízo.

A CBTU/Empregadora do Autor, apresentou Ficha de Credenciamento ao Adicional de Periculosidade e outros documentos pertinentes ao Autor (id. 4058300.6377055).

No tocante aos documentos apresentados pela CBTU, que dizem respeito às atividades exercidas pelo Autor na referida empresa, após a data da entrada do requerimento de concessão do benefício de aposentadoria, protocolado em 30/03/2015 (DER), não serão consideradas na presente análise.

Em razão disso, o Laudo Técnico de Periculosidade Individual datado de 19/04/2018, e a Verificação de Atividades Perigosas - VAP datada de 24/04/2018, relativas ao período em que o Autor passou a exercer as atividades inerentes ao cargo de Coordenador Operacional de Sistemas Eletrônicos, não serão objeto de análise, pois situados fora do período controvertido.

Especificamente quanto ao período controvertido, extraem-se da Ficha de Credenciamento ao Adicional de Periculosidade e demais documentos apresentados pela CBTU, as seguintes informações:

I)Atestou-se, na Ficha de Credenciamento ao Adicional de Periculosidade, que o trabalhador preenche os requisitos do Decreto nº 93.412/86.

O "atesto" no documento foi dado por três profissionais integrantes da Unidade de Segurança do Trabalho, dentre os quais um Engenheiro de Segurança do Trabalho, e o requerimento foi homologado.

Importante lembrar que o Decreto nº 93.412, de 14 de outubro de 1986, vigente à época, regulamentava a Lei nº 7.369/85, que instituiu o adicional de periculosidade para os trabalhadores que exercem Atividades/Áreas de Risco inseridas no quadro de seu Anexo.

O Decreto nº 93.412/86, ora revogado pelo Decreto nº 9.917/2019, condicionou a incidência do adicional de periculosidade, à permanência habitual do trabalhador em área de risco (art. 2º, inc. I); ou ao ingresso intermitente e habitual em área de risco (art. 2º, inc. II). E, no Anexo ao Decreto, foram estabelecidas as atividades em condição de periculosidade

Verifica-se, na Ficha de Credenciamento ao Adicional de Periculosidade, as seguintes observações:

"Em levantamento realizado em campo foi constatado que o requerente executa as seguintes atividades:

Inspeção em: conversores DCDC 72V 10a, transceptores RTU 151, variação a 220 volts, unidade de sonorização interfonia, sobressalente de energia 60Kv.

Utiliza os equipamentos: fonte de alimentação 300 volts, osciloscópio (medição até 1700 volts), retificadores de tensão, KS, aparelhos até 125 volts."

E a seguinte conclusão:

"O EMPREGADO SE ENQUADRA NO ITEM 03 DA COLUNA DE ATIVIDADES E NO ITEM 03 DA COLUNA DA ÁREA DE RISCO DO QUADRO DE ATIVIDADES/ÁREAS DE REISCO DO DECRETO Nº 93.412, DE 14.10.86. O PERCENTUAL SERÁ ESTABELECIDO PELA COMISSÃO PARITÁRIA ESPECIFICAMENTE CRIADA PARA ESTE FIM." (G.N.)

Também estão assinalados na Ficha aludida, que o Autor exercia as atividades constantes do Decreto e nas respectivas áreas de risco estabelecidas no seu art. 2º; o equipamento ou a instalação elétrica que opera ou ao qual está exposto, está energizado/desenergizado, mas suscetível de energização acidental por falha do sistema ou defeito do equipamento ou instalação, e as situações podem gerar incapacidade, invalidez permanente ou morte.

II) O requerimento de concessão do adicional de periculosidade datado de 09/03/1987 está atestado e homologado por três funcionários da CBTU, com a especificação das atividades periculosas exercidas pelo Autor.

III) O requerimento de concessão do adicional de periculosidade datado de 15/08/2012 também está atestado por funcionários da CBTU, com a especificação das atividades periculosas exercidas pelo Autor.

IV) Uma outra Ficha de Credenciamento assinada por dois funcionários da CBTU (técnico de segurança do trabalho e coordenador operacional de segurança do trabalho), com o atestado de que o empregado, ora Autor, preenche os requisitos do Decreto nº 93.412.

Consta, na mencionada ficha, a observação de que o requerente, ora Autor, enquadra-se no art. 2º, inciso I do Decreto nº 93.412/86, que diz respeito justamente ao recebimento do adicional de periculosidade em razão da permanência habitual do trabalhador em área de risco.

Pois bem, pela descrição das atividades na Ficha de Credenciamento ao Adicional de Periculosidade, verifica-se que o Autor se dedicava rotineiramente, de modo habitual e permanente ao trabalho com exposição a fontes energizadas de alta voltagem, superiores a 250 volts, o que representa risco concreto de acidente devido ao agente periculoso da eletricidade.

Mencionados documentos apresentados pela CBTU, que repercutem na esfera trabalhista, corroboram os documentos específicos previdenciários (PPP e Laudo Técnico) que foram juntados pelo Autor no momento da distribuição do feito, nos quais consta que a exposição ao agente nocivo eletricidade acima de 250 Volts, se dava de forma habitual e permanente, não ocasional nem intermitente.

Ademais, consta no Laudo Técnico Pericial que, mesmo o fornecimento dos equipamentos de proteção adequados, não elimina ou neutraliza a periculosidade do risco a que está exposto o trabalhador/Autor, pois não são 100% eficazes na proteção contra o choque elétrico, não sendo possível neutralizar eficazmente o perigo decorrente do desempenho da atividade de risco.

Portanto, à luz dos documentos carreados aos autos, cumpre reconhecer, no período em questão, o tempo especial da atividade laboral desenvolvida pelo Autor na CBTU, até mesmo porque o INSS não se desincumbiu do ônus de retirar a legitimidade da documentação coligida aos autos pela Parte Autora e também por sua Empregadora, a CBTU.

Note-se que o fato de o Autor ter passado a receber, conforme demonstrado na planilha apresentada pela CBTU, o adicional de periculosidade somente a partir de julho de 1987 (até set/2018), não significa que, anteriormente a este marco temporal, não tenha exercido atividade com exposição habitual e permanente, não eventual nem intermitente, ao agente nocivo eletricidade, ante o que se apurou nos autos.

Dessa forma, restando comprovado que a Parte Autora exerceu por mais de 25 anos as suas atividades sob condições especiais, é de se lhe conceder o benefício de Aposentadoria Especial, a partir do requerimento administrativo (DER 30/03/2015), porque, desde esse termo, os requisitos para o gozo do direito já se faziam presentes.

O tempo de atividade especial encontrado, descontados os interstícios em que exercera atividades administrativas de gerência e coordenação (de 09 a 28/01/2006; de 10 a 29/09/2007; de 07 a 26/01/2013; de 02 a 21/01/2014), no total de 30 anos, 02 meses e 12 dias, contados até 25/03/2015 (data informada no Laudo Técnico), supera os 25 anos mínimos na DER (30/03/2015).

3- Dispositivo

3.1- julgo procedente o pedido formulado na Petição Inicial, reconheço a especialidade do trabalho desempenhado pelo Autor nos períodos de 24/10/1984 a 08/01/2006, de 29/01/2006 a 09/09/2007, de 30/09/2007 a 06/01/2013, de 27/01/2013 a 01/01/2014, de 22/01/2014 a 25/03/2015, condeno o INSS a averbar como de atividade especial os mencionados períodos, e a conceder ao Autor o benefício de Aposentadoria Especial;

3.2 - outrossim, condeno o INSS ao pagamento dos atrasados desde a data do requerimento administrativo, ocorrido em 30/03/2015, uma vez que naquela data já ultrapassados 25 anos de contribuição e o exercício da atividade em condições especiais, até a data da implantação do benefício, atualizadas monetariamente e com juros de mora desde a citação, observados os índices e formas do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal que estiver em vigor no momento do cumprimento desta Sentença;

3.3 - condeno, ainda, o INSS ao pagamento de honorários advocatícios que, considerando a relativa simplicidade do caso, que não deve ter exigido muito esforço do(a) d. Patrono(a) da Parte Autora, arbitro em 10% (§ 2º c\c §3º-I do art. 85 do CPC) do total das parcelas vencidas e das 12(doze) primeiras parcelas vincendas decorrentes desta sentença(§ 9º do art. 85 do CPC);

De ofício, submeto esta Sentença ao duplo grau de jurisdição obrigatório.

R.I.

Recife,  19.03.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2a Vara Federal/PE


Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques