Por Francisco Alves dos Santos Júnior*
Reza a vigente
Constituição da República:
“Art. 155. Compete aos Estados e ao Distrito Federal instituir impostos
sobre: (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de
1993)
I - transmissão causa mortis e doação, de quaisquer bens ou
direitos; (Redação dada pela Emenda Constitucional nº 3, de
1993)
§ 1º O imposto previsto no inciso
I: (Redação
dada pela Emenda Constitucional nº 3, de 1993)
I - relativamente a
bens imóveis e respectivos direitos, compete ao Estado da situação do bem, ou
ao Distrito Federal
II - relativamente a bens móveis, títulos e créditos, compete ao
Estado onde se processar o inventário ou arrolamento, ou tiver domicílio o
doador, ou ao Distrito Federal;
III - terá
competência para sua instituição regulada por lei complementar:
a) se o doador tiver
domicilio ou residência no exterior;
b) se o de cujus possuía
bens, era residente ou domiciliado ou teve o seu inventário processado no
exterior;
IV - terá suas
alíquotas máximas fixadas pelo Senado Federal;”.(Destaquei)
A Lei Complementar
prevista no inciso III do § 1º do art. 155 da vigente Constituição da
República, acima transcrito, nunca foi editada.
Na ausência desse tipo de
Lei, ficam os Estados impedidos de instituir esse imposto sobre as situações
descritas nas alíneas do referido inciso?
Há julgados do Supremo Tribunal Federal, relativamente a outras
situações em que a Lei Complementar ainda não foi editada, no sentido de que
enquanto houver a omissão do Congresso Nacional, o Ente Tributante pode, por
Lei própria, instituir o tributo, inclusive com as regras gerais que deveriam
constar da Lei Complementar não editada pelo Congresso Nacional.
E como exemplo podemos indicar o acórdão do Recurso Extraordinário nº 236.931-8/SP[1], relativo
ao Imposto sobre Propriedade de Veículo Automotor
– IPVA, cuja Lei Complementar exigidas pelas alíneas “a” e “b” do inciso
III do art. 146 da Constituição, fixando as respectivas regras gerais,
inclusive com delimitação do seu fato gerador, da sua base de cálculo e da
figura do Contribuinte, nunca foi editada pelo Congresso Nacional, e, no entanto, todos os Estados e o Distrito
Federal o instituíram por Lei própria. Nesse acórdão, a 1ª Turma da Suprema Corte concluiu que a Lei do Estado
de São Paulo, pela qual se instituiu o
IPVA, não era inconstitucional, porque, com
base nas regras do § 2º do art. 24 da mencionada vigente Constituição da
República, os Estados, o Distrito Federal e os
Municípios gozam de competência suplementar, enquanto não exercida pela
UNIÃO, no estabelecimento de regras gerais da competência desta, até que a
UNIÃO exerça a sua competência, providenciando, perante o Congresso Nacional, a edição da Lei Complementar pertinente,
hipótese em que as Leis das demais Unidades da Federação, que tenham tratado
da matéria, ficarão suspensas(§ 3º do
mencionado art. 24).
Esse entendimento foi mantido por essa 1ª Turma em vários outros
julgados.
No que foi seguida por sua 2ª Turma, conforme se vê, por exemplo, no Recurso
Extraordinário – RE 414.259 AgR, verbis:
“Ementa
EMENTA: AGRAVO REGIMENTAL NO RECURSO
EXTRAORDINÁRIO. IPVA. LEI ESTADUAL. ALÍQUOTAS DIFERENCIADAS EM RAZÃO DO TIPO DO
VEÍCULO.
1. Os Estados-membros estão legitimados
a editar normas gerais referentes ao IPVA, no exercício da competência
concorrente prevista no artigo 24, § 3º, da Constituição do Brasil.
2. Não há tributo progressivo quando as
alíquotas são diferenciadas segundo critérios que não levam em consideração a
capacidade contributiva. Agravo Regimental a que se nega provimento.”[2].
Pois bem.
Se, quanto à necessidade de Lei Complementar, que ainda não veio a lume,
esse mesmo entendimento se aplica, ou
não, às situações relativas à incidência do Imposto sobre Transmissão “Causa Mortis” e Doação – ITCMD, nas
situações descritas nas alíneas do acima transcrito inciso III do
§ 1º do art. 155 da vigente Constituição da República, encontra-se sub judice, sob repercussão
geral, no Plenário da Suprema Corte, desde agosto de 2015, no aguardo de
julgamento.
Eis a ementa do julgado da Suprema
Corte, no qual se decidiu
pela submissão do tema à repercussão
geral:
“RE 851.108 RG/SP - SÃO PAULO
REPERCUSSÃO GERAL NO RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a): Min. DIAS TOFFOLI
Julgamento: 25/06/2015
Publicação: 20/08/2015
Órgão julgador: Tribunal Pleno
Repercussão Geral – Admissibilidade
Publicação
PROCESSO ELETRÔNICO DJe-163 DIVULG
19-08-2015 PUBLIC 20-08-2015
Partes
RECTE.(S) : ESTADO DE SÃO PAULO
PROC.(A/S)(ES) : PROCURADOR-GERAL DO ESTADO DE SÃO PAULO RECDO.(A/S) : VANESSA
REGINA ANDREATTA ADV.(A/S) : REGINA MARIA PEREIRA ANDREATTA
Ementa
EMENTA RECURSO EXTRAORDINÁRIO.
REPERCUSSÃO GERAL. ITCMD. BENS LOCALIZADOS NO
EXTERIOR. ARTIGO 155, § 1º, III, LETRAS A E B,
DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL. LEI COMPLEMENTAR. NORMAS GERAIS. COMPETÊNCIA PARA
INSTITUIÇÃO. É de se definir, nas hipóteses previstas no art. 155, § 1º, III,
letras a e b, da Constituição, se, ante a omissão do legislador nacional em
estabelecer as normas gerais pertinentes à competência para instituir imposto
sobre transmissão causa mortis ou doação de quaisquer bens ou
direitos (ITCMD), os Estados-membros podem fazer uso de sua competência legislativa
plena com fulcro no art. 24, § 3º, da Constituição e no art. 34, § 3º, do ADCT.
Decisão
Decisão: O Tribunal, por unanimidade,
reputou constitucional a questão. O Tribunal, por unanimidade, reconheceu a
existência de repercussão geral da questão constitucional suscitada. Ministro
DIAS TOFFOLI Relator
Indexação
- VIDE EMENTA.
Legislação
LEG-FED CF ANO-1988 ART-00024 INC-00001
PAR-00003 ART-00155 INC-00001 PAR-00001 INC-00002 INC-00003 LET-A LET-B CF-1988
CONSTITUIÇÃO FEDERAL LEG-FED ADCT ANO-1988 ART-00034 PAR-00003 PAR-00004 ATO
DAS DISPOSIÇÕES CONSTITUCIONAIS TRANSITÓRIAS LEG-EST LEI-010705 ANO-2000 ART-00004
INC-00002 LET-B LEI ORDINÁRIA, SP LEG-EST DEC-046655 ANO-2002 ART-00003
DECRETO, SP
Tema
825 - Possibilidade de os
Estados-membros fazerem uso de sua competência legislativa plena, com fulcro no
art. 24, § 3º, da Constituição e no art. 34, § 3º, do ADCT, ante a omissão do
legislador nacional em estabelecer as normas gerais pertinentes à competência
para instituir o Imposto sobre Transmissão Causa Mortis ou Doação de
quaisquer Bens ou Direitos - ITCMD, nas hipóteses previstas no art. 155,
§ 1º, III, a e b, da Lei Maior.
Observação
Número de páginas: 11. Análise:
31/08/2015, JRS.”[3]
Será que o Supremo Tribunal Federal, na sua composição Plenária, vai
adotar a tese que a sua Primeira Turma,
no já distante ano de 1999, adotou no julgamento do Recurso
Extraordinário nº 236.931-8/SP e que também passou a ser adotada por sua 2ª
Turma?
A questão envolve muito dinheiro e é do interesse dos Estados e do
Distrito Fedral.
Acredito que o Plenário da Suprema Corte vai adotar o entendimento acima
consagrado por suas duas Turmas, até mesmo porque não poderiam os Estados e o
Distrito Federal se prejudicados pela omissão da UNIÃO e do seu Congresso
Nacional na elaboração e publicação da Lei Complementar exigida no referido
dispositivo constitucional.
Eduardo Cucolo, na sua coluna do Jornal “Folha de São Paulo”, na edição de
hoje(23/10), noticia que o julgamento
desse Recurso Extraordinária, sob repercussão geral, no Plenário do Supremo
Tribunal Federal, teria começado no dia de ontem(22/10).
Aguardemos, pois, o resultado.
· O articulista é
graduado em Direito pela FADUSP(1979), pós-graudado pela FDRUFPE, mestrado(2000), Juiz Federal desde 1988, e autor dos livros “Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil, Renovar, Coleção Teses(Rio de
Janeiro, 2000), “Finanças Públicas, Orçamento Público e Direito Financeiro”,
Livro Rápido(Olinda-PE, 2008) e Direito Tributário do Brasil – Aspectos Gerais
do Sistema Tributário Brasileiro(Livro
Rápido, Olinda-PE, 2010) e de inúmeros trabalhos jurídicos publicados em
Jornais e Revistas Especializadas. Também é titular do blog jurídico:
franciscoalvessantosjr.blogspot.com/
[1] Brasil. Supremo Tribunal Federal.
1ª Turma. Recurso Extraordinário nº 236.031-8/SP. Relator Ministro Ilmar
Galvão. ANO-1999. In Diário da Justiça - DJ de
29-10-1999, p.00022. Total de Páginas 10, EMENTÁRIO VOL-01969-06 P. 01145.
[2] ___________________________.2ª
Turma. RE 414.259AgR. Relator Ministro Eros Grau. Julgamento em 24.06.2009. Publicado
no Diário da Justiça Eletrônico - DJe de 15.08.2008. EMENTÁRIO
VOL-02328-05 p.-00931
Disponível
em
https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/sjur2641/false
Acesso
em 23.10.2020.
[3] ___________________________Pleno.
Recurso Extraordinário nº .Relator
Ministro Dias Toffoli. Julgamento em, in Diário
Judicial Eletrônico – Dje nº 163,
divulgado em 19-08-2015, publicado em 20-08-2015.
Disponível em
https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search/repercussao-geral7622/false
Acesso em 23.10.2020.
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