sábado, 27 de novembro de 2010

Breves Dados Históricos sobre os Tributos(nota 1)

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Tributo vem do latim tributum, que significava dar, presentear.
Na época dos Romanos, inicialmente, significava exigências em bens ou serviços que as tribos vencedoras faziam das tribos vencidas. Depois, a própria sociedade passou a ser o alvo de tais exigências.
Já o termo Fisco vem de Fiscus-i, que correspondia ao cesto de junco ou de vime no qual o Coletor de impostos romano colocava o dinheiro que arrecadava. Depois, lá pelo ano 106 A. C. a 43 A. C., por metonímia, Fisco passou a ser a representação do Tesouro Público.
Os historiadores vinculam a origem dos tributos ao surgimento da figura do Estado, como forma de gerir recursos para que este defendesse sua população contra os povos inimigos.
Todavia, antes, há o registro da existência do dízimo religioso, uma Breves Dados Históricos sobre os Tributos
(nota 1)
espécie de tributo pago à divindade, na Lei Mosaica dos Hebreus, cujas raízes chegaram até nossos dias
Na Bíblia Sagrada, consta que o Faraó do Egito, depois de ouvir as previsões dos sonhos de José, segundo as quais, após sete anos de fartura, haveria sete anos de pobreza, pelo que recomendou que o dízimo fosse cobrado em dobro(o quinto dos produtos da terra), para fazer reservas necessárias aos sete futuros anos de “vacas magras”, período em que não seria possível a cobrança de impostos.(nota 2)
Mas foi na época do Império romano que o tributo foi exigido dos seus cidadãos, principalmente dos povos dominados, para os fins semelhantes a que os tributos têm na atualidade: manter a máquina do Estado em funcionamento.
No ano 168 A C., quando Roma conquistou a Macedônia, esta passou a pagar àquela tantos tributos, que os cidadãos romanos foram dispensados, internamente, do pagamento de qualquer tipo de tributo.
As sociedades antigas, próximas do mediterrâneo, tinham por principal tributo o que incidia sobre as importações. No Egito, também se tributava as grandes propriedades de terra.
Na época do Feudalismo, quando houve grande descentralização da administração pública, cada Feudo tinha seu sistema próprio de administração. Os tributos exigidos pelo Senhorio dos Servos receberam diversas roupagens: ora era parte da produção, para que pudessem se utilizar das pontes, das estradas, dos fornos e dos moinhos do Feudo; ora era a corvéia, que consistia em trabalho forçado dos servos nas terras do Feudo, por três dias na semana, sem nenhuma remuneração; ora eram as redevances, retribuições pagas em produtos ou em dinheiro, como a talha(parte da produção), banalidades(presentes obrigatórios), taxa de casamento(quando o servo casava-se com mulher de fora do Domínio do Feudo), mão-morta(tributo pela transmissão de herança), e ainda o dízimo pago à Igreja Católica.
No final do Século XIV(nota 3), com a decadência do feudalismo, começa a surgir o capitalismo e o Capitalista buscou maior segurança(nota 4), fugindo do anarquismo jurídico, inicialmente do Estado personalista, centralizado na figura do Rei, depois dos Feudos(no sentido de que cada Feudo tinha a sua Lei) e centralizou o sistema jurídico no Estado despersonalizado(final das Monarquias Absolutas, principalmente após Século XVII), neutro, composto de Órgãos, preferencialmente controlados pelo poder do dinheiro(nota 5).
No Brasil, no período denominado pré-colonial(1500-1530), Portugal limitou-se à atividade de exploração do pau-brasil, e aquele que exercia essa atividade pagava os tributos existentes em Portugal.
No período de 1530 a 1580, quando houve avanço na produção do açúcar de cana não refinado, a atividade comercial em si era muito rendosa, mas mesmo assim cobravam-se inúmeros tributos, principalmente taxas, existentes em Portugal, para manutenção da burocracia portuguesa em terras da colônia.
No período de 1580-1640, conhecido como União Ibérica, quando a coroa espanhola passou a controlar também a coroa portuguesa, o Brasil passou a ser domínio do então império espanhol. Nesse período, os holandeses ocuparam Pernambuco, e o sistema tributário nessa então província seguiu regras dos flamengos.
Entre 1640 e 1808, que passa pela restauração da coroa portuguesa até a vinda da família real para o Brasil, tivemos as seguintes etapas: 1) 1640-1700 – Portugal desliga-se da coroa espanhola(restauração portuguesa), pagando caro por isso, pois perdeu grande parte das colônias da África e da Ásia e ficou de cofres vazios. Volta-se então para o Brasil, num acirramento da colonização. Registra-se a centralização político-administrativa, com grande opressão fiscal. Os holandeses são expulsos de Pernambuco(1654), pelo que se cobrou uma taxa dos colonos para contratação de tropas mercenárias. Com a decadência da produção açucareira do Brasil(os holandeses, daqui expulsos, passaram a explorar a produção de açúcar de cana nas Antilhas e, como era de melhor qualidade, ganharam o mercado consumidor europeu), os bandeirantes portugueses iniciaram a exploração de metais e pedras preciosas(década de 80 do Séc. XVII). 2) 1700 a 1808 – Bandeirantes paulistas descobrem ouro em Minas Gerais. Portugal passa a depender da Inglaterra, dependência essa ratificada no Tratado de Methuen(1703), pelo qual Portugal obriga-se a comprar tecidos dos ingleses e estes vinhos de Portugal, com grande desvantagem comercial para este(balanço comercial negativo). Aumentou a opressão fiscal no Brasil, em face das constantes dificuldades financeiras de Portugal. Quando a arrecadação de impostos caia, aumentava-se a carga tributária, com constantes mudanças na tributação. Ignorava-se a capacidade tributária . Os impostos eram fixos, per capita. Regressivos.
Em 1750, período pombalino(Marquês de Pombal), há registro da queda na produção do ouro. Então passou a ser comum a derrama, cobrança periódica de impostos atrasados, causando preocupação nas elites da colônia e provocando os primeiros movimentos de libertação, dentre os quais destaca-se a Inconfidência Mineira, que gerou o mártir Tiradentes, Joaquim José da Silva Xavier.
No ano de 1808, a família real, fugindo do francês Napoleão Bonaparte, muda-se para a colônia Brasil. Novos impostos foram criados, para custear a estadia da família real. A nova opressão fiscal dá origem à Revolução de 1817, em Pernambuco. Primeira república dentro do Brasil, que foi massacrada em pouco tempo. Nesse período, é criado o Banco do Brasil(1808) e a Fazenda Real(1808).
No período de 1822-1831, o Brasil desvincula-se juridicamente de Portugal, dele ficando independente, mas a estrutura econômica, social e política continua a mesma. Houve poucas mudanças no campo dos tributos. As taxas alfandegárias continuaram sendo as responsáveis pela maior fonte de arrecadação. As aventuras militares, internas e externas, do Imperador, foram cobertas com o aumento da carga tributária, e com empréstimos externos.
No período das Regências, 1831-1840, D. Pedro I é vencido pela aristocracia rural brasileira e é obrigado, em 07.04.1831, a renunciar. Como D. Pedro II era menor, criou-se o Governo Regencial, até o advento da sua maioridade. Estoura no sul do País, Rio Grande do Sul(RS) e Santa Catarina(SC), a revolta farroupilha, contra o excesso de tributos que incidia sobre a carne de charque e o couro, então principais produtos dessa região.
Período de 1840-1889, II Império, sob a regência de D. Pedro II, que, com a finalidade de evitar as rebeliões do período regencial, foi coroado com apenas 15 anos de idade, quando então a aristocracia rural assumiu de uma vez por todas o poder político-econômico. Surgiu o período da grande produção do café, podendo esse período ser subdividido em: 1840 a 1870 – domínio da aristocracia rural do centro-sul. A mão de obra escrava e a exportação formavam o carro chefe da economia. Taxas alfandegárias continuaram sendo o forte da receita tributária estatal. Em 1844, criou-se a Tarifa Alves Branco, sobretaxa para produtos importados, visando proteger a produção nacional e aumentar a arrecadação do Tesouro; 1870 a 1889 – o País sentiu os efeitos da Lei Eusébio de Queirós, de 1850, que proibiu o tráfico de escravos. O dinheiro que era empregado no tráfico negreiro, foi destinado à indústria(então nascente), ao comércio e a área financeira. Há o início do processo de imigração de estrangeiros para o Brasil, para substituir a extinta mão de obra escrava. O café passa a ser a estrela da economia. Surge o trabalho assalariado. O sistema tributário adaptou-se a essa nova ordem, beneficiando as regiões mais ricas do País, na aliança entre o Exército Brasileiro e as oligarquias cafeeiras do oeste paulista.
No período de 1889-1930, os Estados-membros da recém-instalada República Federativa do Brasil tinham grande autonomia tributária, cabendo a cada um deles fixar sua política tributária. Havia grande descentralização político-administrativa.
No tempo da ditadura Vargas, 1930-1945: exatamente no ano de 1930, o Brasil estava endividado, por conta dos empréstimos obtidos pelos Estados. A moeda nacional perdeu o seu lastro. Nesse mesmo ano, tivemos a “revolução” liderada por Getúlio Vargas, que gerou uma grande centralização. Os Estados ficaram proibidos de obter empréstimos externos, exceto com autorização do governo central. Buscou-se eliminar benefícios regionais e incentivar a industrialização. As relações trabalhistas passaram a ser mediadas pelo Estado. Instituiu-se a Consolidação da Legislação Trabalhista-CLT(1943). A política tributária adquiriu um caráter nacional. Incentivou-se fiscalmente a importação de máquinas e dificultou-se a importação de produtos que o País pudesse produzir. O sistema tributário passou a ser complexo.
O crescimento industrial continuou no período da denominada República Populista(1945 a 1964). Na época de Juscelino Kubitschek, a era JK(1955-1960), do grande plano de metas, “cinqüenta anos em cinco”, houve a criação de incentivos fiscais regionais(SUDENE e SUDAM).
As forças conservadoras, temendo o crescimento dos movimentos socialistas, apoiou um golpe militar e então o Brasil caiu na escuridão político-administrativa. Instalou-se no País um violento e autoritário regime militar. Os Generais passaram a se alternar na Presidência da República, eleitos por um colégio eleitoral, controlado no congresso nacional, por uma maioria do partido político que lhe dava apoio, integrado inclusive por senadores “biônicos”, que não eram eleitos, mas sim nomeados pelo Presidente-General. Nesse período, 1964-1985, houve grande crescimento econômico e aumento da carga tributária. Foram instituídas isenções tributárias, beneficiando grandes grupos econômicos. Disseminação dos subsídios para insumos industriais e para produtos de largo consumo popular(subvenções econômicas, previstas na Lei n. 4.320, de 1964). Esse período é de grande importância para o direito tributário, porque nele foi adotado o novo sistema tributário, pela Emenda Constitucional nº 18, de 1965, que entrou em vigor em 01.01.1966, sistema esse que foi mantido na Constituição de 1967 e na Emenda Constitucional nº 1, de 1969, com pequenas alterações. A Constituição de 1988 manteve sua estrutura, nele introduzindo alguns acréscimos, que indicaremos abaixo. Nele(sistema tributária da Emenda Constitucional nº 18, de 1965)surgiu a figura do empréstimo compulsório e foi instituído o Código Tributário, Lei nº 5.172, de 25.10.1966, o qual entrou em vigor em 01.01.1967, Código esse que, posteriormente, recebeu o adjetivo “Nacional”, pelo Ato Complementar nº 36, de 13.03.1967(art. 7º), adjetivo esse que teve por finalidade demonstrar que ele seria vinculante para todas as Unidades da Federação.
O regime militar findou no ano de 1985, com o retorno ao sistema democrático, no qual foi restabelecida a escolha do Presidente da República por eleições diretas. Em 1987, foi eleita uma Constituinte, que deu ao País a Constituição de 1988, publicada em 05 de outubro daquele ano, com um sistema tributário semelhante ao da Emenda Constitucional 18, de 1965 e da Constituição de 1967, modificando apenas algumas competências tributárias, criando a Seguridade Social e permitindo a instituição das respectivas Contribuições, numa clara demonstração que o controle econômico-financeiro do País não mudou.

NOTAS
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Nota 1 – Este trabalho corresponde ao Capítulo I de um livro Autor, denominado "Direito Tributário do Brasil: Aspectos Estruturais do Sistema Tributário Brasileiro", 2ª Edição, Olinda: Livro Rápido, 2010.
Boa parte das informações do Capítulo I do mencionado livro foram extraídas de AMARAL, Fernando José et NEGREIROS, Plínio José Labriola de Campos. "História dos Tributos no Brasil". São Paulo: Edições SINAFRESP, 2000. p. 212.

Nota 2 - Tenho que esta seja a origem do denominado Orçamento Cíclico, desenvolvido pelo economista John M. Keynes. Nesse sentido, SANTOS JR, Francisco Alves dos. Finanças Públicas, Orçamento Público e Direito Financeiro. 1ª Ed. Recife: Livro Rápido, 2008. p. 79[nota de rodapé 60].

Nota 3 - Mesmo antes, no ano de 1215(Séc. XIII), os Barões e o Clero britânicos, diante de um fragilizado Rei João Sem Terra, impuseram-lhe a chamada Carta Magna Libertatum, na qual o Rei se obrigou a instituir tributos apenas depois que o Conselho Geral do Reino o autorizasse por escrito a nomear cardeais indicados pelo Papa. Aí está, segundo a unanimidade da doutrina, a origem do princípio da Legalidade tributária(maiores detalhes, v., SANTOS JÚNIOR, Francisco Alves dos. Direito Tributário do Brasil: Aspectos Estruturais do Sistema Tributário Brasileiro, 2ª Edição, Olinda: Livro Rápido, 2010, p. 64[no Capítulo III, “O princípio da legalidade – Breves Dados Históricos”].

Nota 4 - Karl Marx esclarece que o dono do capital tem pavor da insegurança jurídica, por isso busca, desesperadamente, essa segurança, como garantia da manutenção do seu patrimônio, daí ter contribuído para a formação do Estado, garantidor, em tese, dessa segurança. MARX, Karl. A Questão Judaica. 2ª Ed. São Paulo: (n/c editora),1991, p. 14.

Nota 5 – SANTOS JÚNIOR, Francisco Alves dos. Op. cit. na Nota 2 supra, p. 15-16