sábado, 12 de março de 2016

IBAMA. AUTORIZAÇÃO PARA CRIAÇÃO DE ANIMAIS, COM OU SEM FINALIDADE COMERCIAL.

Por Francisco Alves dos Santos Jr

Seguem sentenças que tratam de um delicado assunto ambiental: quando é que o IBAMA pode conceder autorização para criação de animais silvestres, quer seja para fins comerciais ou não. E também qual deve ser o comportamento dos Agentes Fiscais do IBAMA quando se deparam com pessoas que criam animais silvestres sem a respectiva autorização. 

Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0807335-02.2014.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTOR: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO (e outro)
RÉU: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS. - IBAMA
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL


Registro nº ...................................
Certifico que eu, ..................,  registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2015.


SENTENÇA TIPO A

EMENTA: - DIREITO AMBIENTAL. MACACO-PREGO. APREENSÃO E MULTA.PRÉVIA ADVERTÊNCIA. DESNECESSIDADE 

1. O IBAMA não orientou a Autora para que providenciasse a regularização dos animais, no sentido de pedir autorização ou permissão para criá-los, passando a pagar a respectiva taxa periódica.

1. A imposição de multa às infrações ambientais possui fundamento no art. 72 da Lei nº 9.605/98, de cujo § 3º extrai-se que o Administrado deve ser primeiro advertido e, caso não supra o consignado na advertência, é que poderá ser multado.

2. O IBAMA não alega que os animais estavam sendo maltratados, tampouco contestou a alegação de que um deles estava com a Autora há 28(vinte e oito)anos e o outro há seis anos, conforme carta da Autora ao IBAMA, acostada com a petição inicial e também conforme consta dessa petição. 

3. Procedência parcial.

Vistos, etc.

1. RELATÓRIO

M. P. DE A., qualificada na Inicial, propôs a presente ação ordinária, em face do INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA. Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita e apresentou as prerrogativas da Defensoria Pública da União. Aduziu a Autora, em síntese, que: a) no dia 28/02/2011, teria sido autuada por agentes do IBAMA, sob a alegação de manter em cativeiro 02 (dois) animais silvestres, macacos-prego, sem a devida autorização e de maneira irregular e que por conta de decisão administrativa, foi condenada ao pagamento de uma multa no valor de R$ 10.000,00 (dez mil reais); b) seria uma pessoa de poucos recursos, proprietária de um circo e que estaria criando um dos animais apreendidos há pelo menos 28 (vinte e oito) anos e o outro há 06 (seis) anos e ambos representam para ela um enorme valor sentimental; c) a penalidade da multa teria sido aplicada sem a prévia pena de advertência prevista em lei, ou porque teria criado embaraço à fiscalização como prescreve o parágrafo 3º e incisos do art. 72 da Lei nº 9.605/98; d) o valor da multa teria sido excessivamente elevado, não se adequando às suas condições financeiras e ferindo princípios constitucionais da proporcionalidade e da razoabilidade. Instruiu a inicial com procuração e documentos e ao final requereu:
1 - o benefício da assistência judiciária gratuita, em face da sua condição de hipossuficiente econômica;
2 - A intimação pessoal da Defensoria Pública da União, que lhe patrocina esta causa,  em todos os atos processuais, nos termos da Lei nº. 1.060/50 e da Lei Complementar nº. 80 de 1994, art. 44, inc. I, contando-se em dobro todos os prazos;
3 - fosse determinada a citação do requerido no endereço acima indicado, para, querendo, apresentar defesa, no prazo legal;
4 - Ao final fosse o pedido desta ação julgado PROCEDENTE para anulação do procedimento administrativo, bem como da multa, ou, subsidiariamente, seja aplicada a pena de advertência;
5 - A condenação da requerida aos ônus da sucumbência, com a fixação de honorários advocatícios em favor da Defensoria Pública da União;
Em 24/02/2015, foi exarada decisão concedendo à Autora os benefícios da Justiça Gratuita e determinado a citação do IBAMA.
O IBAMA apresentou Contestação, na qual aduziu em síntese que: 1. a Autora teria cometido grave infração descrita e capitulada pelo art. 29 da Lei nº 9.605/98, regulamentada pelo art. 24 do Decreto nº 6.514/2008; 2. a multa prevista na legislação para a conduta da autora seria de R$ 5.000,00 por cada exemplar de animal mantido em cativeiro, se ameaçado de extinção, o que teria resultado no valor total de R$ 10.000,00, por ter se tratado de apreensão de 02 macacos-prego; 3. Não caberia a conversão da multa aplicada em pena de advertência e o valor da multa aplicada não poderia reduzir-se, ser dosada ou ajustada, conforme este ou aquele critério, uma vez que prevista na legislação vigente e com valor vinculado e determinado, sem qualquer margem de discricionariedade; 4. os princípios da proporcionalidade e razoabilidade, previstos no art. 2º da Lei nº 9.784/99 não se prestariam ao fim de recusar cumprimento a dispositivos categóricos e explícitos da legislação, mas simplesmente para orientar a Administração e o Judiciário sobre a melhor interpretação a ser dada quando a lei comporta mais de uma interpretação possível; 5. a multa infligida à autora não seria passível de conversão em modalidade prevista no Decreto nº 6.514/2008.
Em petição datada de 22/05/15, a Autora, assistida pela DPU, apresentou sua réplica e requereu que a multa fosse anulada ou ao menos convertida em pena de advertência. Justifica seu pleito apresentando citações da jurisprudência pátria.
É o relatório, no essencial. Passo a decidir.

2. FUNDAMENTAÇÃO

2.1- Preliminarmente, constato erro na autuação do polo ativo. Consta como "Autor" a Defensoria Pública da União - DPU, quando esta apenas figura como representante judicial da Autora, devendo pois ser autuada no seu lugar a Autora e como advogado desta mencionada Defensoria.
2.2 - Insurge-se a Autora contra medida repressiva praticada por Agentes do IBAMA, que apreenderam 02 macacos-prego que estavam em seu poder, sem a devida autorização legal, e aplicaram-lhe pena administrativa correspondente à multa de R$ 10.000,00. Alegou ter havido ilegalidade na aplicação da pena, visto que, pelo disposto no art. 72, inciso II e III, do § 3º, da Lei 9.605/98, referida penalidade apenas poderia ser aplicada caso tivesse sido previamente notificada da alegada ilicitude de sua conduta. Assim, pugna pela anulação do procedimento administrativo e da multa e, no último caso, que seja esta reduzida ou aplicada, no lugar da multa, apenas a pena de advertência.
Pelo que se depreende do pedido da Autora, a matéria a ser resolvida diz respeito exclusivamente a três pontos: primeiramente, à verificação da legalidade do procedimento administrativo, se ele não foi eivado de vício capaz de ensejar sua nulidade, em segundo, quanto à legalidade da multa aplicada à Autora e em terceiro, quanto ao cabimento da redução da multa e da sua substituição pela pena de advertência.
Na hipótese dos autos, a Autora não negou a situação noticiada no auto de infração, isto é, a de que não possuía autorização do IBAMA para manter os 02 macacos-prego em cativeiro e para, segundo os fatos, a exploração de ambos no Circo do qual é proprietária.
Constato que, à luz dos arts. 24, 29, ambos da Lei nº 9.605, de 1998, que qualquer pessoa pode ter autorizaração ou permissão para, na qualidade de criador particular, manter sob os seus cuidados animais que não sejam perigosos e que sejam de pequeno porte, quer para uso próprio, quer para comercialização ou uso comercial, hipótese em que passam a pagar, por cada animal, uma taxa periódica ao IBAMA.
E nesse sentido há Portaria do próprio IBAMA tratando da matéria.
Tenho que os Agentes do IBAMA só podem apreender e aplicar diretamente a multa se flagrarem alguém maltratando animais da fauna silvestre brasileira, oportunidade em que podem aplicar diretamente multas e apreender os animais, para futura libertação ao seu habitat próprio.
Mas, quando os Agentes do IBAMA estiverem diante de caso semelhante ao da Autora, devem orientar o Administrado como proceder junto ao IBAMA para regularização própria, até mesmo para que receba orientação sobre o respectivo manejo e seja submetido, doravante,  a fiscalização mais frequente.
No entanto, arrancarem das mãos do Administrado, que cuida bem dos animais, e que os mantêm há muitos anos em seu poder, fazem mal não só ao Administrado, mas sobretudo aos animais, que findam por ser jogados em jaulas superlotadas dos Viveiros do IBAMA, onde não poucas vezes morrem, quer pelo choque psicológico, decorrente da abrupta separação, quer pelas péssimas condições físico-alimentares de tais Viveiros.[4]
E é esse o procedimento que se extrai do § 3º do art. 72 da Lei 9.605, de 1998.
A Autora só poderia ser multada se não observasse o consignado no auto de advertência.
Nessa situação, tenho que o auto de infração deve ser desconstituído, não cabendo mais a transformação em advertência, com prazo para o devido cumprimento, porque a Autora não pede a restituição dos animais, uma vez que a orientação que deveria constar da advertência seria exatamente para que providenciasse a regularização da posse dos animais perante o IBAMA, para continuidade da criação. Mas, repito, não há pedido nesse sentido. 

3. CONCLUSÃO

Diante de todo o exposto:
3.1 - determino que a Secretaria retifique a autuação, na forma indicada no subtópico 2.1 da fundamentação supra;
3.2 - julgo parcialmente procedentes os pedidos desta ação, desconstituo o auto de infração do Agente do IBAMA e cancelo as respectivas multas.
Deixo de condenar o IBAMA em verba honorária advocatícia, porque se trata de uma Autarquia da UNIÃO, à qual também pertence a Defensoria Pública da UNIÃO - DPU, orgão advocatício que está a defender a Autora.
Sem custas, ex lege.
P. R. I.
Recife, 12 de novembro de 2015.

Francisco Alves dos Santos Jr
Juiz Federal, 2ª Vara/PE


(ARF)






[1] Fotos dos macacos. Num identificador nº4058300.775967 pag. 01/05.
[2] Carta escrita pela Autora ao IBAMA. Num identificador 4058300.775962 pag. ½.
[3] Cópia do Processo Administrativo. Num identificador 4058300.776007
[4] Já tive oportunidade de julgar um processo(processo eletrônico 0802510-49.2013.4.05.8300 , publicado em 15.08.2013 no blog franciscoalvessantosjr.blogspot.com/, disponível em http://franciscoalvessantosjr.blogspot.com.br/search?q=papagaio, relativo a um papagaio, que estava com uma Cidadã há mais de oito anos, e foi abruptamente retirado do seu lar e lançado num dos Viveiros do IBAMA, onde faleceu quatro meses depois, antes mesmo do cumprimento da decisão liminar para a sua libertação. E, na época de tal processo, a TV Justiça fez um programa, que pode ser encontrado no respectivo site, no qual o Dirigente do IBAMA local falou das péssimas condições dos Viveiros dessa Autarquia, inclusive da falta de espaço e de dotação orçamentária para melhoria.

O IBAMA, com relação à sentença supra, opôs um longo recurso de Embargos de Declaração, alegando que haveria omissão, porque o juiz não houvera indicado qual ato administrativo daria respaldo ao raciocínio nela desenvolvido, tendo gerado a sentença que segue.


PROCESSO Nº: 0807335-02.2014.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTOR: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO (e outro)
RÉU: INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVAVEIS. - IBAMA
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL


 
Sentença em Embargos de Declaração

 EMENTA:- PROCESSUAL CIVIL. DIREITO ADMINISTRATIVO. 
-Instrução Normativa da presidência do próprio IBAMA, indicada na fundamentação desta sentença, orienta no sentido de que pessoas leigas, que mantenham animais silvestres em cativeiro, podem e devem buscar a regularização da criação desses animais perante o próprio IBAMA, quer para mera criação, quer para criação com finalidade comercial. 
-Procedência parcial.

Vistos, etc.

1 -RELATÓRIO

O INSTITUTO BRASILEIRO DO MEIO AMBIENTE E DOS RECURSOS NATURAIS RENOVÁVEIS - IBAMA opôs, à sentença proferida nestes autos[1], o recurso embargos de declaração.[2] Alegou, em síntese, que: a) teria havido obscuridade e omissão na fundamentação da Sentença embargada, especificamente quando afirma existir uma Portaria que prevê e disciplina a regularização da posse de animais silvestres por parte de seus captores; b) a sentença não diz que Portaria é essa, muito menos que dispositivo prevê essa medida; c) a sentença teria afirmado que os artigos 24 e 29 da Lei 9.605/98 preveem medida de regularização do cativeiro doméstico de animais silvestres, mas não destaca qual o trecho destes dispositivos que aborda a questão. Ao final requereu que reconhecida às obscuridades e omissões apontadas na sentença seja atribuído efeitos infringentes aos presentes embargos, para os fins de modificar a parte dispositiva da sentença e julgar improcedente a ação intentada.
Ato Ordinatório intimando a Embargada para se manifestar sobre os Embargos de Declaração[3]
A Autora/Embargada apresentou contrarrazões[4], alegando, em síntese, que os Embargos de Declaração estariam sendo utilizados para a rediscussão das questões que já teriam sido decididas na Sentença embargada e que não se prestariam a tal finalidade, devendo ser rejeitados e a sentença mantida em todos os seus fundamentos.
É o relatório. Passo a decidir.

2 -Fundamentação

2.1 - No dia 15.08.2013, publiquei no meu blog(franciscoalvessantosjr.blogspot.com/)uma decisão que lancei nos autos do processo eletrônico nº 0802510-49.2013.4.05.8300, no qual se tratou de questão relativa a apreensão de um papagaio, sob o título de  "O PAPAGAIO, SUA PROPRIETÁRIA, O IBAMA E A JUSTIÇA FEDERAL: UMA QUESTÃO DEMASIADAMENTE HUMANA E COM FINAL MUITO TRISTE"
Na decisão acima referida, fiz referência aos atos administrativos, bem como  à Legislação que trata do assunto, sendo o principal ato administrativo ali invocado a Instrução Normativa nº 10, de 20.09.2011, da Presidência do IBAMA, expedida com base em Leis, Decretos e Portarias nela referidos, e na qual o próprio IBAMA traça normas sobre a  possibilidade de criação animais, com ou sem finalidade comercial, por Criadores Profissionais e Amadores, respectivamente.
Causa-me espanto, pois, que o I. Procurador do IBAMA, Dr. A. DE S. M. T.,  interponha os longos embargos de declaração ora sob análise para que este Magistrado perca tempo indicando-lhe número de Leis, Decretos, Portarias e Instruções que deveriam ser do seu conhecimento e que deram respaldo à sentença ora embargada.
Aliás, naquela decisão, invoquei um julgado do E. TRF/5ª R, que também respalda, no campo judicial, a sentença ora embargada, verbis:

"AMBIENTAL. ADMINISTRATIVO. APREENSÃO DE ANIMAL SILVESTRE EM CATIVEIRO. PAPAGAIO DE ESTIMAÇÃO EM CONVÍVIO COM OS DONOS HÁ MAIS DE 14 ANOS. ESPÉCIE NÃO AMEAÇADA DE EXTINÇÃO. BONS TRATOS. PRINCÍPIO DA RAZOABILIDADE. MANUTENÇÃO DA POSSE COM OS DONOS. 1. Apelação interposta pelo IBAMA em face da sentença que julgou parcialmente procedente o pedido para assegurar ao autor a posse de seu papagaio, bem como determinou ao IBAMA que procedesse às providências necessárias para regularização da guarda doméstica do animal pelo autor. 2. A legislação ambiental (art. 29 da Lei nº 9.605/98 e o art. 24, parágrafo 3º, III, do Decreto n. 6.514/2008) prevê a ocorrência de crime ambiental e infração administrativa no caso de guarda de animal silvestre sem a devida autorização do órgão ambiental competente. 3. O objetivo da legislação ambiental é a busca da efetiva proteção dos animais, devendo a intenção do legislador guiar a interpretação do julgador nos casos em que se discute questão ambiental. Todavia, devem ser consideradas as suas peculiaridades: animal não está ameaçado de extinção; longo tempo de convivência com seus donos; bons tratos. Interpretação da norma ambiental de acordo com o princípio da razoabilidade, mantendo-se a guarda do animal com os seus donos ante as especificidades do caso concreto. 4. Apelação não provida. (PROCESSO: 00075004220104058100, AC556507/CE, RELATOR:DESEMBARGADOR FEDERAL MARCELO NAVARRO, Terceira Turma, JULGAMENTO: 06/06/2013, PUBLICAÇÃO: DJE 11/06/2013 - Página 363)".  (Negritei).
2.2 - Aliás, na sentença ora embargada indiquei os dispositivos da Lei que tratam do assunto e invoquei princípios constitucionais.
Então, os embargos de declaração do IBAMA merecem acolhida em parte, apenas para que conste da fundamentação da sentença o consignado no subtópico, indicando o número e data do principal ato administrativo, no qual os demais são referidos, bem como Leis e Decretos, que tratam do assunto e da orientação dada na sentença ora embargada.
E, repito, dessa legislação se extrai, claramente, que os agentes fiscais do IBAMA, antes de autuarem e apreenderem animais silvestres, que se encontram sob criação de pessoas leigas, quer para mero deleite, quer para fins comerciais, devem, antes, orientar essas pessoas quanto à possibilidade de regularização, perante o IBAMA,  da manutenção dos animais em cativeiro, cujos técnicos, posteriormente, deverão orientar tais pessoas quanto ao manejo do animal. E isso é importante, porque gera receita para o IBAMA, pois esses Criadores passarão a pagar taxa pela manutenção dos animais a favor do próprio IBAMA, e passarão também a sofrer fiscalização mais amiúde dos Agentes do IBAMA, porque cadastrados ficarão.
Vale dizer, deve-se dar tratamento humano à questão, principalmente quanto aos seres humanos nela envolvidos e não já partir para o "quebro e arrebento", como parece ser a política de alguns  poucos preparados agentes de fiscalização dessa importante Autarquia ambiental.
E aconselho o d. Procurador do IBAMA, acima referido, ler com maior atenção os atos administrativos da Presidência do Ente Autárquico que representa, para que não perca o seu precioso tempo com embargos de declaração tão longos, como os ora examinados, e também para que não obrigue os ocupadíssimos Juízes Federais a gastar o seu precioso tempo com sentenças como esta que ora finalizo.

3 - Dispositivo

Posto isso, conheço e dou parcial provimento aos embargos de declaração do IBAMA, declaro a sentença embargada e determino que da sua fundamentação passe a contar o consignado no subtópico 2.1 da fundamentação supra, para todos os fins de direito, mantendo mencionada sentença quanto ao mais.

P.R.I.
Recife, 13 de março de 2016.


Francisco Alves dos Santos Júnior
      Juiz Federal, 2ª Vara/PE


(ARF)


[1]Sentença. Identificador Num.  4058300.1570435.
[2] Embargos de Declaração. Identificador Num. 4058300.1570435
[3] Ato Ordinatório. Identificador Num.4058300.1707393
[4] Contrarrazões aos Embargos Declaratórios. Identificador Num. 4058300.1746113.




sexta-feira, 11 de março de 2016

IRPJ. ISENÇÃO PARA MICROEMPRESAS. REVOGAÇÃO. PERDA DE VALIDADE DA SÚMULA 184 DO STJ.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.

Segue interessante julgado da E. Turma Recursal de Pernambuco, na 
qual se invocou sentença de nossa autoria, que foi publicada neste 
blog, sob o título de “IRPJ. MICROEMPRESA. ART 11 DA LEI 
7.296, DE 1984...”, tendo concluído, como na sentença, que a isenção 
do IR das microempresas foi revogada por Lei posterior, de forma 
que resta sem validade a Súmula 184 do Superior Tribunal de Justiça.

O acórdão que ora se publica foi relatado pelo d. Juiz Federal FREDERICO AUGUSTO LEOPOLDINO KOEHLER.

Boa Leitura.
           



Nr. do Processo          0510466-24.2015.4.05.8300
Data da Inclusão          24/02/2016 19:07:36  


Autora:            C R LTDA - ME

Ré: União Federal - Fazenda Nacional

Usuário que Anexou    FREDERICO AUGUSTO LEOPOLDINO KOEHLER

(Magistrado)    Última alteração           por FREDERICO AUGUSTO LEOPOLDINO KOEHLER às 24/02/2016 19:07:36         

Juiz(a) que validou       FREDERICO AUGUSTO LEOPOLDINO KOEHLER                               
Resultado:                                   
                       
Tipo Movimento CNJ 



0510466-24.2015.4.05.8300

EMENTA

TRIBUTÁRIO. IRPJ. MICROEMPRESA DE REPRESENTAÇÃO COMERCIAL. INEXISTÊNCIA DE ISENÇÃO. SÚMULA N.º 184 DO STJ. INAPLICABILIDADE AO CASO CONCRETO. ISENÇÃO PREVISTA NO ART. 11 DA LEI N.º 7.256/84. REVOGAÇÃO PELA LEI N.º 9.317/96. RECURSO DA PARTE AUTORA IMPROVIDO.

- Cuida-se de recurso inominado interposto pela parte autora contra a sentença que julgou improcedente o seu pleito de que seja declarada a isenção tributária e determinada a restituição do indébito tributário resultante do recolhimento indevido de IRPJ nos anos de 2010 a 2014.

- Alega a autora que o direito à isenção tributária conferida às microempresas de representação comercial no art. 11 da Lei n.º 7.256/84 vigorou até 31/12/2014, baseando seu pleito no enunciado da súmula n.º 184 do STJ.

- A isenção discutida foi criada pelo art. 11 da Lei n.° 7.256, de 27 de novembro de 1984, o qual previa que a microempresa ficava isenta, dentre outros tributos, do Imposto sobre a Renda e Proventos de qualquer Natureza.

- A Lei n.º 7.713, de 22 de dezembro de 1988, trouxe alguns casos em que a isenção referida não se aplicaria, como se lê em seu art. 51: “Art. 51. A isenção do imposto de renda de que trata o art. 11, item I, da Lei nº 7.256, de 27 de novembro de 1984, não se aplica à empresa que se encontre nas situações previstas no art. 3º, itens I a V, da referida Lei, nem às empresas que prestem serviços profissionais de corretor, despachante, ator, empresário e produtor de espetáculos públicos, cantor, músico, médico, dentista, enfermeiro, engenheiro, físico, químico, economista, contador, auditor, estatístico, administrador, programador, analista de sistema, advogado, psicólogo, professor, jornalista, publicitário, ou assemelhados, e qualquer outra profissão cujo exercício dependa de habilitação profissional legalmente exigida.”. (grifou-se)

- A súmula n.º 184 do STJ (“A microempresa de representação comercial é isenta do Imposto de Renda.”) foi elaborada justamente para consolidar a posição jurisprudencial de que as microempresas de representação comercial não se equiparam às empresas que prestem serviços profissionais de corretor, sendo-lhes aplicável, portanto, a isenção em tela.

- Ocorre que a Lei nº 9.317/96, que instituiu o Simples, em seu art. 31, revogou expressamente o art. 11 da Lei n.º Lei n.º 7.256/84, que previa a isenção do IR para microempresa. Assim, não tem aplicação atualmente a súmula n.º 184 do STJ, não cabendo falar-se em isenção para as microempresas de representação comercial após a Lei nº 9.317/96.

- Nesse sentido, peço licença para trazer à colação um elucidativo trecho da sentença proferida pelo Juiz Federal Francisco Alves dos Santos Júnior no Mandado de Segurança n.º 0802140-34.2014.4.05.8300[1]:

“Ementa: - TRIBUTÁRIO, REPRESENTANTES COMERCIAIS, BENEFÍCIOS FISCAIS CONCEDIDOS ÀS MICROEMPRESAS.PRECEDENTES DO STJ.

-A Lei nº 7.713/88 (art. 51) não exclui os representantes comerciais dos benefícios fiscais concedidos às microempresas, todavia o art. 11 da Lei nº 7.256, de 1984, que concedia a isenção do IR para microempresa, foi expressamente revogado pelo art. 31 da Lei nº 9.317, de 1996.

-Prescritas verbas anteriores a 30.04.2009.

-Negação da segurança.

Noto, que a decisão que deu origem a essa Súmula, embora seja datada de 12.03.1997, posterior à Lei nº 9.317, que é de 05.12.1996, não pode se impor a esta, que, pelo seu art. 31, revogou expressamente o art. 11 da Lei nº Lei nº 7.256, de 1984, base legal da isenção em debate.

Com efeito o art. 31 da Lei nº 9.317, de 05.12.1996, revogou expressamente os arts. 2º, 2º, 11 a 16, 19, incisos II e III, e 25 a 27 da Lei nº 7.256, de 27.11.1984.
Mais tarde, a Lei nº 9.841, de 05.10.1999, revogou, no seu art. 43,  integralmente a Lei 7.256,de 1984, mas, óbvio, apenas o que dela ainda restava, ou seja, o que não tivesse sido revogada por Leis anteriores.

É verdade que há um julgado do Superior Tribunal de Justiça, 2ª Turma, relatado pelo Ministro Ministro Benedito Gonçalves, datado de 10/03/2009, reconhecendo essa isenção, mas, embora tenha data bem posterior à Lei 9.317, de 05.12.1966, não se tratou, nesse julgado, da persistência, ou não, dessa isenção após o advento dessa Lei nº 9.317, de 05.12.1996.

Eis a ementa desse julgado, verbis:

(...).

Parece-me ter incidido em engano, data maxima venia, a 2ª Turma do mesmo E.
Tribunal, no julgamento do Recurso Especial(REsp) nº 330715/Rio Grande do Sul, tendo por Relator o Ministro Franciulli Netto,  em acórdão com ementa publicada no Diário da Justiça de  08/09/2003 p. 271, quando sustenta que a isenção em debate teria sido revogada apenas pela Lei nº 9.841, de 05.10.1999, verbis:

"até o advento da Lei n. 9.841, de 05 de outubro de 1999, que instituiu o novo Estatuto da Microenpresa e da Empresa de Pequeno Porte, vigoravam as Leis ns 8.864/94 e 7.256/84, expressamente revogadas pelo artigo 43 do novo Estatuto. O artigo 11 da Lei n. 7.256/84 concedia às microempresas isenção de diversos impostos, exigindo-se apenas a observância das exigências do art. 2º da Lei n. 9.756/84 e depois do art. 42. da Lei n. 8.383/91 e, mais tarde, do  art. 2º da Lei n. 8.864/94.
Considerando-se que essa última lei dispôs em seu artigo 35 que estariam revogadas as disposições a ela contrárias, sem fazer menção expressa à isenção prevista no artigo 11 da Lei n. 7.256/84, é de elementar inferência que o favor legal permaneceu em vigor para as empresas que auferiram receita bruta anual de até 250.000 UFIR.
Aliás, a própria Lei n. 8.864/94, assegurou em seu artigo 1°, "às microempresas e às empresas de pequeno porte, tratamento jurídico simplificado e favorecido nos campos administrativo, tributário, trabalhista, previdenciário e creditício", o que denota que não pretendia o legislador excluir do benefício as empresas cuja receita bruta anual estivesse entre 96.000 e 250.000 UFIRs".

Ora, conforme penso ter demonstrado acima, quando do advento da Lei 9.841, de 1999, o art. 11 da Lei nº 7.256, de 27.11.1984, já tinha sido revogado, expressamente, pelo art. 31 da Lei nº 9.317, de 05.12.1996.

Logo, a Lei nº 9.841, de 1999, conforme já sustentei acima, revogou apenas o que ainda restava em vigor da Lei nº 7.256, de 1984.

Então, é de se concluir que a isenção do Imposto de Renda ora em debate realmente deixou de existir a partir da entrada em vigor da Lei nº 9.317, de 05.12.1996, qual seja, na data da sua publicação, em 06.12.1996.” (grifou-se)

- A propósito, uma pesquisa pelos repositórios na internet demonstra que a jurisprudência dos nossos tribunais não percebeu a revogação da isenção prevista no art. 11 da Lei n.º Lei n.º 7.256/84, limitando-se a reproduzir indefinidamente os termos da Súmula n.º 184 do STJ, que não tem mais aplicação porquanto já não mais existe a base legal que lhe dava substrato.

- Por fim, como dito na sentença recorrida: “Ressalta-se, ademais, que não cabe aqui a discussão sobre o Regime de Lucro Presumido e ausência de opção pelo Simples Nacional, porquanto o pedido restringe-se a isenção do IR pelo fato de o autor ser microempresa de representação comercial.”.

- Destarte, descabida a intenção autoral.

- Por todas as razões acima expostas, bem como em razão de ser esta fundamentação suficiente para a apreciação de todos os pedidos formulados pelas partes, considero como não violados os demais dispositivos suscitados, inclusive considerando-os como devidamente prequestionados, possibilitando, de logo, a interposição dos recursos excepcionais cabíveis (RE e PU).

- Assim, e tendo em vista que os embargos de declaração não se prestam para um novo julgamento daquilo que já foi decidido, ficam advertidas as partes que a sua oposição protelatória ensejará a aplicação de litigância de má-fé, na forma dos arts. 18 e 538 do CPC.

- Recurso inominado improvido.

- Condenação da recorrente em honorários no montante de 10% (dez por cento) do valor da causa.

ACÓRDÃO

Decide a Turma Recursal dos Juizados Especiais Federais de Pernambuco, à unanimidade, NEGAR PROVIMENTO AO RECURSO, nos termos do voto supra.

Recife, data da movimentação.

FREDERICO AUGUSTO LEOPOLDINO KOEHLER
Juiz Federal Relator da 2ª Relatoria


________________________________________
[1] Disponível em: <http://franciscoalvessantosjr.blogspot.com.br/2015/11/irpj-microempresa-art-11-da-lei-7256-de.html>. Acesso em: 24 fev. 2016.




quinta-feira, 10 de março de 2016

PROTESTO EM CARTÓRIO DE TÍTULO DE CRÉDITO EXTRAJUDICIAL DA FAZENDA PÚBLICA NACIONAL.

Por Francisco Alves dos Santos Jr



A decisão que segue analisa, como questão de fundo, o protesto em cartório de título de crédito da Fazenda Pública, uma inovação do direito positivo do Brasil decorrente da Lei Federal nº  Lei nº 12.767/2012, e, como questão preliminar, a problemática da figura da Autoridade coatora ou impetrada. 

Obs.: a questão de fundo foi pesquisada e minutada pela Assessora Maria Patrícia Pessoa de Luna

Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0800264-75.2016.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA
IMPETRANTE: F C DE C LTDA - ME
ADVOGADO: M V G DOS S 
IMPETRADO: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR

 
D E C I S Ã O
1. Breve Relatório

F C DE C LTDA - ME, qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança com pedido de liminar em face de ato atribuído ao DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL NO RECIFE, pretendendo a suspensão do Protesto de Certidão de Dívida Ativa, na qual a protestante seria a Fazenda Nacional. Alegou, em apertada síntese, que teria sido surpreendida com a intimação de um protesto de certidão de dívida ativa, na qual a protestante seria a Fazenda Nacional, ora impetrada, sob a alegação de que a impetrante teria um débito no valor de R$ 4.771,12; em razão do protesto, a Impetrante estaria sendo impedida de conseguir crédito, inclusive para pagamento da folha de funcionários, o que agravaria ainda mais a sua situação financeira; nossa doutrina e jurisprudência teria entendimento bastante solidificado no sentido de que não seria possível aceitar protesto de certidão de dívida ativa; tal procedimento se afiguraria completamente irregular, uma vez que estaríamos diante de um caso onde não seria possível o protesto de certidão de dívida ativa, sendo tal procedimento irregular, e seu dispositivo inconstitucional; o entendimento predominante diz que a nossa legislação não permitiria o protesto de certidão de dívida ativa. Transcreveu dispositivos legais e decisões judiciais. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, que: seja deferida a liminar, no intuito de que se promova a suspensão do Protesto de Certidão de Dívida Ativa; se notifique a Impetrada do conteúdo desta inicial para se prestar as informações que achar necessárias; se julgue procedente o presente Mandado de Segurança para ratificar a liminar em sede de sentença, além de promover o imediato cancelamento do protesto em comento; por fim, requer seja ouvido o MPF, e espera a Impetrante a concessão em definitivo da segurança. Deu valor à causa. Inicial instruída com procuração e documentos.
Intimada para emendar a inicial, a Impetrante apresentou petição em 27/01/2016 (identificador nº 4058300.1660043), instruída com um documento.

É o relatório, no essencial. Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1 - Da autuação

A Impetrante, na petição sob identificador 4058300.166004, apresentada em 27.01.2016, emendou a petição inicial, indicando como Autoridade coatora o Sr.  PROCURADOR REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL da 5ª REGIÃO e juntou o documento sob identificador 4058300.1660044, segundo o qual o apresentante do título a protesto foi o PROCURADORIA GERAL DA FAZENDA NACIONAL. Como não é dado ao Judiciário escolher contra quem a Parte quer litigar, que se retifique a autuação, substituindo a Delegacia da Receita Federal, como constou da primeira autuação, feita pelo(a) Patrono(a) da Impetrante, pela Autoridade por ela indicada na petição de emenda à inicial acima referida, qual seja, PROCURADOR REGIONAL DA FAZENDA NACIONAL DA 5ª REGIÃO.
E se é assim, ao invés de UNIÃO FEDERAL - UNIÃO, como constou, que se substitua por UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, devendo esta, por meio do seu Órgão de Representação Judicial, a Procuradoria Regional da Fazenda Nacional da 5ª Região,  ser cientificada deste mandado de segurança, na forma e para os fins do inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009.

2.2 - Do pedido liminar

O presente mandado de segurança objetiva, em sede de liminar, obter a suspensão do Protesto de Certidão da Dívida Ativa.
A concessão de liminar em mandado de segurança exige a concorrência dos dois pressupostos legais: a relevância do fundamento (fumus boni juris) e  o perigo de um prejuízo se do ato impugnado puder resultar a ineficácia da medida caso, ao final, seja deferida (periculum in mora).
No caso dos autos, a Impetrante se insurge contra o protesto da CDA acima mencionada. Argumenta que a função do protesto seria provar a impontualidade e o inadimplemento do devedor para constituí-lo em mora, enquanto a da CDA seria a de executar o devedor; acentuando a desnecessidade de a Fazenda Pública realizar o protesto para o fim específico de constituir em mora o devedor, vez que a credora teria todos os instrumentos necessários para execução dos seus créditos, nos termos da Lei 6.830/80.
Não visualizo, contudo, a ilegalidade apontada pela Impetrante. Desde a promulgação da Lei nº 12.767/2012, que introduziu o parágrafo único ao art. 1º da Lei nº 9.492/1997, passou a existir previsão expressa no ordenamento jurídico acerca da possibilidade de protesto de certidão da dívida ativa, verbis:
"Art. 1º Protesto é o ato formal e solene pelo qual se prova a inadimplência e o descumprimento de obrigação originada em títulos e outros documentos de dívida.
Parágrafo único.  Incluem-se entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas. (Incluído pela Lei nº 12.767, de 2012)"
Nesse sentido, o Col. STJ acompanhou a mudança legislativa e passou a permitir o aludido protesto, com alteração de sua jurisprudência, conforme aresto abaixo colacionado:
PROCESSUAL CIVIL E ADMINISTRATIVO. PROTESTO DE CDA. LEI 9.492/1997.
INTERPRETAÇÃO CONTEXTUAL COM A DINÂMICA MODERNA DAS RELAÇÕES SOCIAIS E O "II PACTO REPUBLICANO DE ESTADO POR UM SISTEMA DE JUSTIÇA MAIS ACESSÍVEL, ÁGIL E EFETIVO". SUPERAÇÃO DA JURISPRUDÊNCIA DO STJ.
1. Trata-se de Recurso Especial que discute, à luz do art. 1º da Lei 9.492/1997, a possibilidade de protesto da Certidão de Dívida Ativa (CDA), título executivo extrajudicial (art. 586, VIII, do CPC) que aparelha a Execução Fiscal, regida pela Lei 6.830/1980.
2. Merece destaque a publicação da Lei 12.767/2012, que promoveu a inclusão do parágrafo único no art. 1º da Lei 9.492/1997, para expressamente consignar que estão incluídas "entre os títulos sujeitos a protesto as certidões de dívida ativa da União, dos Estados, do Distrito Federal, dos Municípios e das respectivas autarquias e fundações públicas".
3. Não bastasse isso, mostra-se imperiosa a superação da orientação jurisprudencial do STJ a respeito da questão.
4. No regime instituído pelo art. 1º da Lei 9.492/1997, o protesto, instituto bifronte que representa, de um lado, instrumento para constituir o devedor em mora e provar a inadimplência, e, de outro, modalidade alternativa para cobrança de dívida, foi ampliado, desvinculando-se dos títulos estritamente cambiariformes para abranger todos e quaisquer "títulos ou documentos de dívida". Ao contrário do afirmado pelo Tribunal de origem, portanto, o atual regime jurídico do protesto não é vinculado exclusivamente aos títulos cambiais.
5. Nesse sentido, tanto o STJ (RESP 750805/RS) como a Justiça do Trabalho possuem precedentes que autorizam o protesto, por exemplo, de decisões judiciais condenatórias, líquidas e certas, transitadas em julgado.
6. Dada a natureza bifronte do protesto, não é dado ao Poder Judiciário substituir-se à Administração para eleger, sob o enfoque da necessidade (utilidade ou conveniência), as políticas públicas para recuperação, no âmbito extrajudicial, da dívida ativa da Fazenda Pública.
7. Cabe ao Judiciário, isto sim, examinar o tema controvertido sob espectro jurídico, ou seja, quanto à sua constitucionalidade e legalidade, nada mais. A manifestação sobre essa relevante matéria, com base na valoração da necessidade e pertinência desse instrumento extrajudicial de cobrança de dívida, carece de legitimação, por romper com os princípios da independência dos poderes (art. 2º da CF/1988) e da imparcialidade.
8. São falaciosos os argumentos de que o ordenamento jurídico (Lei 6.830/1980) já instituiu mecanismo para a recuperação do crédito fiscal e de que o sujeito passivo não participou da constituição do crédito.
9. A Lei das Execuções Fiscais disciplina exclusivamente a cobrança judicial da dívida ativa, e não autoriza, por si, a insustentável conclusão de que veda, em caráter permanente, a instituição, ou utilização, de mecanismos de cobrança extrajudicial.
10. A defesa da tese de impossibilidade do protesto seria razoável apenas se versasse sobre o "Auto de Lançamento", esse sim procedimento unilateral dotado de eficácia para imputar débito ao sujeito passivo.
11. A inscrição em dívida ativa, de onde se origina a posterior extração da Certidão que poderá ser levada a protesto, decorre ou do exaurimento da instância administrativa (onde foi possível impugnar o lançamento e interpor recursos administrativos) ou de documento de confissão de dívida, apresentado pelo próprio devedor (e.g., DCTF, GIA, Termo de Confissão para adesão ao parcelamento, etc.).
12. O sujeito passivo, portanto, não pode alegar que houve "surpresa" ou "abuso de poder" na extração da CDA, uma vez que esta pressupõe sua participação na apuração do débito. Note-se, aliás, que o preenchimento e entrega da DCTF ou GIA (documentos de confissão de dívida) corresponde integralmente ao ato do emitente de cheque, nota promissória ou letra de câmbio.
13. A possibilidade do protesto da CDA não implica ofensa aos princípios do contraditório e do devido processo legal, pois subsiste, para todo e qualquer efeito, o controle jurisdicional, mediante provocação da parte interessada, em relação à higidez do título levado a protesto.
14. A Lei 9.492/1997 deve ser interpretada em conjunto com o contexto histórico e social. De acordo com o "II Pacto Republicano de Estado por um sistema de Justiça mais acessível, ágil e efetivo", definiu-se como meta específica para dar agilidade e efetividade à prestação jurisdicional a "revisão da legislação referente à cobrança da dívida ativa da Fazenda Pública, com vistas à racionalização dos procedimentos em âmbito judicial e administrativo".
15. Nesse sentido, o CNJ considerou que estão conformes com o princípio da legalidade normas expedidas pelas Corregedorias de Justiça dos Estados do Rio de Janeiro e de Goiás que, respectivamente, orientam seus órgãos a providenciar e admitir o protesto de CDA e de sentenças condenatórias transitadas em julgado, relacionadas às obrigações alimentares.
16. A interpretação contextualizada da Lei 9.492/1997 representa medida que corrobora a tendência moderna de intersecção dos regimes jurídicos próprios do Direito Público e Privado. A todo instante vem crescendo a publicização do Direito Privado (iniciada, exemplificativamente, com a limitação do direito de propriedade, outrora valor absoluto, ao cumprimento de sua função social) e, por outro lado, a privatização do Direito Público (por exemplo, com a incorporação - naturalmente adaptada às peculiaridades existentes - de conceitos e institutos jurídicos e extrajurídicos aplicados outrora apenas aos sujeitos de Direito Privado, como, e.g., a utilização de sistemas de gerenciamento e controle de eficiência na prestação de serviços).
17. Recurso Especial provido, com superação da jurisprudência do STJ.
(REsp 1126515/PR, Rel. Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em 03/12/2013, DJe 16/12/2013)
No caso em tela, ante os argumentos expostos, não tenho por preenchido o requisito do fumus boni juris a socorrer a tese da Impetrante.
Ausente o pressuposto supracitado, entendo desnecessária a análise da presença do periculum in mora, tendo em vista, conforme delineado no corpo desta decisão, que a concessão do provimento demanda a concomitância dos pressupostos.

3. Conclusão

Posto  isso:

3.1 - determino que a Secretaria deste Juízo retifique a autuação, quanto às pessoas que devem figurar no polo passivo, na forma indicada no subitem 2.1 da fundamentação supra; 

3.2 - indefiro a pretendida medida liminar;

3.3 - notifique-se a Autoridade apontada como coatora, na forma e para os fins do  inciso I do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009;

3.4 - dê-se ciência ao órgão de representação judicial da UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, na forma e para os fins do inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009;

3.5 - no momento oportuno, ao Ministério Público da União - MPU para, querendo, apresentar o r. parecer legal. 

P.I.

Recife, 10 de março de 2016.

Francisco Alves dos Santos Júnior


  Juiz Federal, 2ª Vara-PE