terça-feira, 23 de novembro de 2021

PENSÃO POR MORTE. INCAPACIDADE RECONHECIDA APÓS A MAIORIDADE, MAS ANTES DO FALECIMENTO DA SEGURADA INSTITUIDORA. PROCEDÊNCIA.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Segue detalhada sentença sobre direito à pensão post mortem por parte de Pessoa cuja invalidez foi reconhecida depois da sua maioridade, mas antes do falecido da sua Genitora, segurada do INSS, com base em precedente da Segunda Turma do Superior Tribunal de Justiça - STJ. Indica-se também julgado da mesma Turma sobre data do início do benefício e julgado do Plenário do STF, a respeito da atualização(correção monetária de juros de mora) das verbas vencidas. 

Boa leitura. 


Obs.> sentença pesquisada e minutada pela Assessora Rossama Marques Cavalcanti. 



 PROCESSO Nº: 0815012-73.2020.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL

AUTORA: T R R L
ADVOGADO: Levi Santos Macieira
CURADOR À LIDE: F L J
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)


Sentença tipo A


EMENTA: - PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. QUALIDADE DE SEGURADA DA FALECIDA INSTITUIDORA. FILHA MAIOR INVÁLIDA. INVALIDEZ ANTES DO ÓBITO DA SEGURADA. DEPENDÊNCIA COMPROVADA. COMPROVAÇÃO DOS REQUISITOS. TUTELA DE URGÊNCIA CONCEDIDA.

-Comprovada a invalidez quando a falecida Segurada do INSS ainda estava viva e preenchidos os demais requisitos legais, faz jus a Autora ao benefício de pensão por morte.

-Tutela de urgência antecipada na Sentença, porque presentes os requisitos legais.

-Procedência.


Vistos etc.

1- Relatório

T R R L, qualificada na Petição Inicial, representada por seu curador/irmão, F L J, ajuizou esta "AÇÃO CONCESSÓRIA DE PENSÃO POR MORTE PREVIDENCIÁRIA AO MAIOR INVÁLIDO COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA E PROVA EMPRESTADA" em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS. Alegou, em síntese, que: seria filha e dependente econômica da falecida segurada Maria Inês Rabelo Lucchese, e teria requerido o benefício de pensão por morte em 12/06/2019, com atendimento presencial designado para o dia 14/06/2020 (sic.), na APS Olinda/PE, sob protocolo nº 1534199334; seria dependente na condição de maior inválida, pois teria problemas mentais desde a infância que a incapacitariam para o trabalho e vida civil, conforme laudos médicos particulares e pericial inserido aos autos; contudo, passados mais de um ano e dois meses sem a conclusão do processo administrativo, teria, em 05/08/2020,  realizado reclamação na ouvidoria informando da necessidade de prosseguimento do processo, da ausência de resposta pelos canais de atendimento, do não fechamento da exigência já cumprida e da inércia da Ré; sua manifestação teria sido respondida sem o fechamento da exigência e sem o andamento do processo administrativo; o interesse de agir estaria configurado em razão do indeferimento tácito, haja vista que teria apresentado a documentação no dia 14/06/2019, no dia do atendimento presencial, e já teria sido ultrapassado o prazo de 45 dias sem que o seu requerimento tivesse sido apreciado; estaria presente a qualidade de segurada da instituidora, que teria sido reconhecida no momento da concessão de sua aposentadoria por idade; e a Autora possuiria a qualidade de beneficiária, pois seria dependente econômica presumida, residiria com a sua genitora, seria sua dependente no imposto de renda, e teria o seus atos da vida civil gerenciados por sua genitora, não possuiria renda formal e informal, e seu único trabalho teria sido na escola da genitora ainda quando jovem, quando teria sido tentada a sua sociabilização e interação; estaria presente a incapacidade médica total, definitiva e irreversível, que abrangeria a incapacidade para o trabalho e para os atos da vida civil; a incapacidade teria iniciado nos primeiros anos da infância/adolescência; teria sido diagnosticada com esquizofrenia residual crônica (CID 10 F20.5); estariam presentes os requisitos para a concessão da tutela de urgência, sem a oitiva da Ré; seria interditada judicialmente desde o ano de 2003; o laudo pericial da perícia médica realizada no processo nº 0146229-05.2018.8.17.2990, que tramitou perante a 3ª Vara da Família e Registro Civil da Comarca de Olinda/PE, deveria ser utilizado como prova emprestada, o que diminuiria os custos ao Judiciário, e geraria celeridade na resolução da demanda, e autorizaria desde já a dispensa da perícia médica; deveria haver o julgamento antecipado da lide, pois as provas materiais acostadas seriam suficientes ao deslinde do feito. Ao final, requereu: "a) concessão do BENEFÍCIO DA JUSTIÇA GRATUITA, por se tratar de pessoa pobre no sentido jurídico do termo e CONCESSÃO DA TUTELA DE URGÊNCIA determinando implantação do benefício; b) Deferimento do pedido de prova emprestada dispensando exame pericial e audiência de instrução e julgamento; c) citação da parte ré para, querendo, apresentar resposta, no prazo legal, advertindo-a dos efeitos da revelia e do princípio da especificidade; d) intimação da parte ré para, obrigatoriamente, apresentar cópia integral do processo administrativo que não foi concluído. e) no mérito, PROCEDÊNCIA DA AÇÃO, nos termos do Artigo 487,I do CPC, confirmação da tutela de urgência condenando a Ré na concessão do benefício previdenciário na espécie B21 (pensão por morte previdenciária, com efeitos financeiros desde o óbito (18/09/2018). f) Condenar, INSS no pagamento de honorários de sucumbência e custas processuais. g) pagamento das parcelas atrasadas entre DIB/ÓBITO (18/09/2018) e DIP, acrescidas de correção pelo IPCA-E e juros nos moldes do art. 1º-F da Lei nº 9.494/1997, com a alteração promovida pela Lei nº 11.960/2009 (RE nº 870.947/SE), NÃO OCORRENDO PRESCRIÇÃO QUINQUENAL (absolutamente incapaz), mediante requisição de pequeno valor (RPV) ou PRECATÓRIO opção a ser manifestada na fase de execução após apuração dos cálculos judiciais. h) retenção de honorários contratuais no percentual de 30% (trinta por cento) sobre o valor integral da condenação na data do efetivo pagamento, fem favor do advogado LEVI SANTOS MACIEIRA, inscrito no CPF 092.361.944-51 e OAB/PE 41.814, conforme autorização contida na procuração e contrato de honorários anexo aos autos. VIII - DOS PROTESTOS, DECLARAÇÕES E REQUERIMENTOS FINAIS a) Protesta pela produção de todos os meios de prova em direito admitidos, especialmente testemunhal, documental, pericial e outras que se fizerem necessárias. b) Pugna que futuras intimações sejam realizadas exclusivamente em nome do causídico, Levi Santos Macieira, inscrito na OAB/PE 41.814, com endereço profissional, eletrônico e telefone inseridos no timbre da minuta sob pena de nulidade. c) Declara autenticidade das cópias xerográficas juntadas no processo, dispensando seu reconhecimento de firma, uma vez que a declaração do causídico goza de fé pública." Atribuiu valor à causa.  Juntou instrumento de procuração e documentos.

Decisão na qual foi concedido, provisoriamente, o benefício da assistência judiciária gratuita à Parte Autora; postergou-se a análise do pleito antecipatório para após o decurso do prazo da Contestação do Réu/INSS; determinou-se a citação do Réu, e a sua intimação para falar sobre a prova emprestada apresentada pela Autora (perícia médica realizada perante a Justiça do Estado de Pernambuco).

Regularmente citado, o INSS apresentou Contestação na qual alegou carência da ação por falta de pretensão resistida, haja vista que a Autora ingressara com esta ação quando ainda em curso a exigência administrativa no âmbito administrativo. No mérito, alegou, em síntese, que: não estariam presentes os requisitos para o benefício postulado, nos termos do art. 16, I da Lei nº 8.213/91; mesmo completando 21 anos, o filho continuaria dependente para fins previdenciários se, na forma da lei, estiver presente a invalidez e não tiver havido outra forma de emancipação diversa da idade; além da constatação da incapacidade total e permanente para o trabalho, seria imprescindível identificar o momento do início da invalidez, que deveria ser anterior tanto à data em que completou 21 anos, quanto à data de eventual outra causa de emancipação; a Autora não teria comprovado a incapacidade laborativa; não teria sido submetida a perícia médica no INSS; a incapacidade deveria ter se originado antes do evento morte do instituidor; salientou que a Autora teria trabalhado mais de dois anos exercendo a função de auxiliar de escritório; os documentos apresentados pela Autora não se prestariam para comprovar a alegada invalidez, nem quando teve início; os requisitos para a interdição judicial seriam diversos dos exigidos pela lei previdenciária; o laudo de interdição não invalidaria as conclusões da perícia médica do INSS; o INSS não teria integrado a referida lide, e não teria tido oportunidade de apresentar quesitos, impugnar o laudo ou pedir esclarecimentos, portanto, não poderia servir de prova emprestada; admitir o referido laudo importaria cerceamento ao direito de defesa. Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos, e ainda, pela admissão da prescrição quinquenal. Juntou documentos.

A Parte Autora apresentou Réplica. Rebateu a preliminar de ausência de interesse de agir e a exceção de prescrição e, no mérito, reiterou os pedidos formulados na Inicial, e pugnou pela concessão da tutela de urgência. Ademais, salientou, para o caso de não ser aceita a prova emprestada, que fosse designada perícia médica com especialista em psiquiatria.

Decisão na qual foi rejeitada a preliminar de carência da ação por ausência de pretensão resistida arguida pelo INSS; rejeitada a exceção de prescrição quinquenal; indeferida a tutela provisória de urgência antecipada; e designada perícia médica.

A Autora informou que o seu requerimento administrativo foi finalizado e indeferido, sob a alegação da perícia médica contrária;  concordou com a médica perita nomeada;  anuiu aos quesitos do Juízo. Juntou documentos.

O INSS também anuiu aos quesitos do Juízo e acrescentou um quesito a ser respondido pelo (a) médico (a) perito (a).

Certidão sob id. 4058300.18603909 na qual é atestada a juntada do Laudo Pericial. 

Manifestação da Autora sobre o Laudo pericial. Pugnou pela procedência dos pedidos formulados e aduziu que não pretende produzir novas provas.

Certificado o decurso do prazo sem manifestação do INSS quanto ao Laudo apresentado.

Determinada a abertura de vista dos autos ao MPF, eis que se trata de pessoa sob curatela.

O MPF ofertou r. Parecer no qual opinou pela procedência dos pedidos formulados na Inicial.

É o relatório, no essencial.

Fundamento e decido.

2- Fundamentação

2.1- A Autora requer a concessão do benefício previdenciário de pensão por morte, na qualidade de filha inválida da segurada falecida, Srª M I R L, e o pagamento das parcelas vencidas da pensão desde a data do óbito.

Com efeito, tratando-se de pleito no qual se postula a concessão de Pensão por Morte, há de se aplicar a legislação vigente na data do óbito do (a) instituidor (a).

Na data do óbito da Srª M I R L ocorrido em 18/09/2018, quanto ao benefício  de pensão por morte instituído em favor de filho (a) maior inválido (a), vigiam as disposições contidas na Lei nº 8.213/91, com o seguinte teor:

"Art. 16. São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição de dependentes do segurado:

I - o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou inválido ou que tenha deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;

(...)

§ 4º. A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida e a das demais deve ser comprovada.

(...)

Art. 74.  A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data do óbito ou da decisão judicial, no caso de morte presumida:  

I - do óbito, quando requerida até noventa dias depois deste;

II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior; 

(...)

Art. 75. O valor mensal da pensão por morte será de cem por cento do valor da aposentadoria que o segurado recebia ou daquela a que teria direito se estivesse aposentado por invalidez na data de seu falecimento, observado o disposto no art. 33 desta lei."    

Portanto, à luz das disposições legais acima transcritas, a concessão do benefício de pensão por morte ao (à) filho (a) maior inválido (a) depende do preenchimento dos seguintes requisitos: (1) ocorrência do evento morte, (2) condição de dependente de quem objetiva a pensão e (3) demonstração da qualidade de segurado do de cujus por ocasião do óbito.

2.2 - Do caso concreto

2.2.1 - Os documentos que instruíram a petição inicial comprovam, satisfatoriamente, o evento morte ocorrido em 18/09/2018 (v. certidão de óbito - id. 4058300.15628900) e a condição de aposentada (Aposentadoria por Idade) da segurada da Srª M I R L (v. INFBEN - id. 4058300.15628912).

A carteira de identidade (RG) anexada sob o id. 4058300.15628739, comprova que a Autora é filha da falecida segurada, Srª M I R L.

Portanto, resta inconteste a qualidade de segurada da falecida.

2.2.2 - A controvérsia restringe-se à qualidade de dependente da Autora, na condição de filha maior inválida, a qual, na data do ajuizamento da ação (11/09/2020), estava com 43 anos de idade (nascida em 05/06/1977) e, na data do óbito da segurada, com 40 anos de idade.

A constatação da dependência econômica está condicionada à verificação da invalidez à época do óbito do instituidor da pensão e, se existente, é aquela presumida, nos termos do §4º do art. 16 da Lei nº 8.213/91, acima transcrito.

Preenchidos os dois primeiros requisitos, cumpre verificar a qualidade de dependente da Autora, na condição de filha maior inválida.

2.2.2-1 - De início, importante destacar que prevalece no E. STJ o entendimento no sentido de ser irrelevante o fato de a invalidez ser anterior ou posterior à maioridade da dependente, mas tem que ser contemporânea ao óbito do (a) instituidor (a), in verbis:

"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE. FILHO MAIOR INVÁLIDO. INCAPACIDADE ANTERIOR AO ÓBITO E POSTERIOR À SUA MAIORIDADE. IRRELEVANTE O FATO DE A INVALIDEZ TER SIDO APÓS A MAIORIDADE DO POSTULANTE. ART. 16, III, C/C O § 4º DA LEI N.8.213/91. MERAMENTE NECESSÁRIA A COMPROVAÇÃO DE QUE A INVALIDEZ É ANTERIOR AO ÓBITO.

I - Na origem, trata-se de ação ordinária cumulada com pedido de tutela antecipada, proposta contra o Instituto Nacional do Seguro Social - INSS objetivando a concessão de benefício de pensão por morte. Na sentença, julgou-se procedente o pedido para conceder a pensão. No Tribunal a quo, a sentença foi reformada para julgar improcedente o pedido.

II - Nesta Corte deu-se provimento ao recurso especial para reformar o acórdão recorrido e restabelecer a concessão da pensão por morte.

III - Nas hipóteses em que há o provimento do recurso, a Corte Especial deste Tribunal já se manifestou no sentido de que o juízo de admissibilidade do especial pode ser realizado de forma implícita, sem necessidade de exposição de motivos. Assim, o exame de mérito recursal já traduz o entendimento de que foram atendidos os requisitos extrínsecos e intrínsecos de sua admissibilidade, inexistindo necessidade de pronunciamento explícito pelo julgador a esse respeito. (EREsp 1.119.820/PI, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Corte Especial, DJe 19/12/2014). No mesmo sentido: AgRg no REsp 1.429.300/SC, relator Ministro Humberto Martins, Segunda Turma, DJe 25/6/2015; AgRg no Ag 1.421.517/AL, relatora Ministra Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 3/4/2014.

IV - Verifica-se que o Tribunal a quo reconheceu que a invalidez do segurado ocorreu em período anterior ao óbito do instituidor, tendo o benefício sido indeferido em razão de não ficado comprovado nos autos que a invalidez se deu antes da implementação da maioridade do recorrente.

V - O entendimento do Superior Tribunal de Justiça, contudo, no que tange à invalidez do recorrido, é no sentido de que é irrelevante o fato de a invalidez ter sido após a maioridade do postulante, porquanto, nos termos do art. 16, III c/c § 4º da Lei n. 8.213/91, a pensão por morte é devida ao filho inválido, não apresentando nenhum outro requisito quanto ao tempo em que essa invalidez deva ser reconhecida, bastando apenas a comprovação de que a invalidez é anterior ao óbito. Nesse sentido: REsp n. 1.551.150/AL, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 13/10/2015, DJe 21/3/2016.

VI - Portanto, correta a decisão recorrida que restabeleceu a sentença e concedeu o benefício de pensão por morte.

VII - Agravo interno improvido."[1]

Com efeito, a Autora teve instituída em seu favor, por Decisão Judicial (Justiça Estadual), de 03.05.2019(id id. 4058300.15628759), Curador provisório F L J (irmão da Autora), o que foi confirmado por r. Sentença exarada em 02/04/2020(id. 4058300.15628776).

2.2.2-2 - Nesse contexto, com a finalidade de apurar se a invalidez estava presente quando do falecimento do (a) segurado (a), o julgador, via de regra, firma seu convencimento com base na prova pericial.

Deferiu-se a perícia médica, e a Médica Perita do Juízo apresentou o Laudo Pericial suficientemente esclarecedor acerca do histórico clínico e também sobre os diagnósticos dados pelas médicas assistentes da Autora (Esquizofrenia  Indiferenciada e Esquizofrenia Residual), em documentos médicos anexados aos autos, e apresentou a seguinte conclusão a respeito da enfermidade que acomete a Autora:

"Levando-se em consideração o até então constante neste trabalho, esta Expert conclui que a periciada é incapaz para todos os atos de vida civil de modo total e permanente, é dependente de terceiros para realizar atividades instrumentais de vida diária (pagamentos, lidar com dinheiro, organização da casa) e necessita de supervisão para atos de vida diária (higiene pessoal e alimentação) e não pode realizar atividades laborativas de modo total e permanente."

A Srª Médica Perita respondeu aos quesitos do Juízo e das Partes, dos quais destacam-se:

"I)A Parte Autora é portadora de doenças, lesões ou enfermidades? Quais são elas?

Sim. Esquizofrenia indiferenciada (CID10- F20.3).

II) Essas lesões, doenças ou enfermidades podem diminuir a capacidade de trabalho da Parte Autora?

Sim

III) Em caso afirmativo, a incapacidade é temporária ou permanente, total ou parcial?

Permanente e total.

IV) Considerando a existência de incapacidade, é possível precisar a data de início e sua data de cessação?

A doença teve início na adolescência, com a incapacidade ocorrendo ao longo dos anos, estando, de acordo com os relatos, incapaz desde o início da idade adulta. É um transtorno crônico, não há cessação da incapacidade.

V) Essa incapacidade é decorrente de progressão ou agravamento das doenças indicadas no primeiro item?

Sim

VI)Possuem algum tipo de prognóstico?

Prognóstico reservado. Com as terapêuticas disponíveis, não há possibilidade de retorno às atividades de forma independente.

VII) Sendo o caso de incapacidade definitiva, a Parte Autora precisa da assistência permanente de outra pessoa para as atividades diárias básicas?

Sim.

VIII) quesito prejudicado

IX) A Parte Autora apresentou exames, relatórios, atestados e laudos médicos no dia da realização da perícia? Quais?

Sim. Os anexados ao processo - laudo da psiquiatra assistente e da perita judicial.

X) Existem pareceres ou laudos médicos juntados aos autos favoráveis à incapacidade? O (A) Perito (a) concorda com esses pareceres? Se não concorda, qual o motivo e o fundamento da discordância?

Sim. Concordo.

Quesito do INSS:

1 - Em sendo reconhecido que a parte autora é incapaz para o trabalho, seja total ou parcialmente, temporária ou permanentemente, é possível afirmar se, ao tempo do óbito do instituidor da pretendida pensão por morte, em 18/09/2018, já havia tal incapacidade? Em que grau?

Sim. Total."

Pois bem, a Médica Perita do Juízo, no desenvolvimento do trabalho pericial, sob o princípio do contraditório, analisou minuciosamente e de forma segura, os documentos médicos anexados com a petição inicial e, após examinar a Autora, confirmou o diagnóstico dado pela médica assistente da Autora, no caso, que a Autora é portadora de Esquizofrenia Indiferenciada, desde a adolescência.

Ademais, verificou que a Autora apresenta enfermidade que a torna incapaz para os atos da vida civil, bem como para o exercício das atividades laborais, desde o início da idade adulta, e que a Autora depende de terceiros para realizar atividades instrumentais da vida diária, e necessita de supervisão para atos da vida diária.

Além disso, respondeu afirmativamente quando perguntada pelo INSS/Réu se, ao tempo do óbito da instituidora da pretendida pensão por morte, em 18/09/2018, já havia tal incapacidade, e aduziu que a incapacidade é total.

Portanto, à luz da conclusão da Perícia Médica, realizado por Perita da confiança deste Juízo Federal, equidistante das Partes, sob os princípios da ampla defesa e do contraditório,  tem-se que ficou demonstrada a total incapacidade mental da Autora e a sua dependência econômica para fins de obtenção/concessão da Pensão por Morte, haja vista a incapacidade de gerir a si própria, eis que necessita de auxílio e supervisão de terceiros até mesmo para realizar simples atividades do cotidiano, e também a incapacidade de se sustentar, pois incapacitada totalmente e permanentemente para o exercício de atividades laborais.

Cumpre salientar que o INSS não impugnou as conclusões do Laudo Médico Pericial; aliás, a seu respeito nem, sequer,  manifestou-se, embora para tanto tenha sido regularmente intimado. Então, tacitamente, com ele concordou.

2.2.2,3 - Assim, a Autora faz jus à pensão por morte, porque, pelo que se apurou dos autos, ao tempo do óbito da instituidora da pensão, já ostentava a qualidade de dependente econômica de sua  genitora, que faleceu na condição de segurada do INSS, conforme visto alhures.

Nesse ponto, cumpre destacar que a Autora estava incluída na Declaração do IRPF da falecida instituidora como sua dependente (id. 4058300.15628936).

2.2.2.4 - O MPF, no r. parecer acostado sob id 4058300.19878031, assinado pelo d. Procurador da República EDSON VIRGINIO CAVALCANTE JÚNIOR, fez um alentado levantamento de todos os passos do processo, e findou por opinar pela procedência do pedido. 

2.3 - Da tutela de urgência antecipada

Considerando, nesta ocasião, a presença  dos requisitos da tutela de urgência (art. 300, caput, do CPC/2015), sobretudo por se tratar o bem da vida reclamado de prestação de natureza alimentar, há de ser concedida a tutela de urgência, para determinar ao INSS que implante, no prazo de 15 (quinze) dias, a pensão por morte em favor da Autora, dispensada caução na forma do § 1º, parte final, do art. 300, do CPC/2015.

O prazo ora fixado para a implantação segue a orientação consolidada no  Acordo homologado pelo C. STF no RE 1.171.152/SC.

2.2.2 - Do termo inicial da Pensão por Morte e respectivos efeitos financeiros

O E. STJ, em julgamento recente, reafirmou o entendimento  no sentido de que, existindo dependentes previamente habilitados - pertencentes ou não ao mesmo grupo familiar - , o pagamento do benefício ao dependente que se habilita tardiamente, seja capaz ou incapaz, surtirá efeito somente a partir da data do respectivo requerimento, e não retroage à data do óbito do instituidor. Considerou o E. STJ que, assim, dá-se cumprimento ao art. 76 da Lei n. 8.213/1991, preservando a Previdência Social do indevido pagamento em duplicidade.

Eis o precedente da Segunda Turma do E. STJ:

"PROCESSUAL CIVIL. PREVIDENCIÁRIO. AUTARQUIA FEDERAL. PENSÃO POR MORTE DE GENITOR. FILHO ABSOLUTAMENTE INCAPAZ. HABILITAÇÃO TARDIA. BENEFÍCIO DEVIDO DESDE A DATA DO ÓBITO.

I - Na origem, trata-se de ação de concessão de benefício de pensão por morte contra o INSS, objetivando o pagamento dos valores atrasados da pensão por morte desde a data do óbito do genitor, em sua integralidade, até a habilitação da autora, inclusive 13º salários. Na sentença, julgaram-se procedentes os pedidos. No Tribunal a quo, deu-se parcial provimento à apelação do INSS, afim de fixar, provisoriamente, a adoção dos critérios de correção e juros de mora previstos na Lei n. 11.960/2009, possibilitando a execução do valor incontroverso até a solução definitiva do STF sobre o tema. Esta Corte conheceu do agravo para dar provimento ao recurso especial, e determinar que o termo inicial para pagamento da pensão por morte é a data do requerimento administrativo realizado pelo segurado.

II - Primeiramente, cumpre destacar que a questão ora controvertida está relacionada à habilitação tardia de dependente incapaz para receber pensão por morte que já estava sendo paga regularmente a outros dependentes. Nesse contexto, a jurisprudência do Superior Tribunal de Justiça é pacífica ao afirmar que, para evitar o pagamento em duplicidade pelo INSS, o termo inicial para a concessão da pensão por morte é a data do requerimento administrativo do segurado tardiamente habilitado, quando o mencionado benefício previdenciário já estiver sendo pago pela autarquia aos demais dependentes do falecido. Nesse sentido: REsp 1.664.036/RS, relator Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, julgado em 23/5/2019, DJe 6/11/2019; REsp 1.572.524/SP, relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, relator p/ Acórdão Ministro Benedito Gonçalves, Primeira Turma, julgado em 26/2/2019, DJe 14/3/2019.

III - Agravo interno improvido."[2] (G.N.)

No caso dos autos, embora tardia a habilitação, não existia dependente (s) anteriormente habilitado (s) à ora almejada pensão por morte instituída pela falecida genitora da Autora.

Assim, não obstante o disposto no inciso II do art. 74 da Lei nº 8.213/91, tenho que o absolutamente incapaz (caso dos autos) não pode ser prejudicado pala inércia de seu representante legal, de modo que o termo inicial do pagamento das parcelas vencidas da pensão por morte há de ser a partir do dia seguinte à data do óbito da falecida Segurada.

3- Dispositivo

Posto isso:

3.1- diante da total probabilidade do direito e do risco de inutilidade do processo(art. 300 do CPC), concedo a tutela provisória de urgência e determino ao INSS que, no prazo de 15 (quinze) dias, implante a pensão por morte em prol da Autora, sob pena da incidência de multa mensal de 10%(dez por cento) do valor do benefício, considerando-se mês para período parcial 16(dezesseis) dias,  multa essa passível de majoração (art. 537, § 1.º, I, do Código de Processo Civil). 

Saliento que o prazo do parágrafo anterior terá início a contar da intimação desta Sentença, independentemente de interposição de embargos de declaração, ante a ausência de efeito suspensivo (art. 1.026 CPC).

3.2 - Julgo procedentes os pedidos formulados na Petição Inicial, condeno o INSS a pagar à Autora T R R L, a pensão por morte previdenciária, na qualidade de filha maior inválida da falecida Segurada M I R L, bem como a pagar as diferenças vencidas e vincendas, aquelas a contar de 09/09/2018 (dia imediatamente posterior à data do óbito da genitora da Autora) até a data da implantação do benefício, atualizadas(correção monetária e juros de mora) desde a data dos respectivos vencimentos até a data da expedição do(s) requisitório(s),  conforme [STF, Plenário, RE 579-431/RS] e [STJ, Corte Especial, QO no REsp nº 1665599RS, Questão de Ordem no REsp nº 2017/0086957-6, Tema Repetitivo 291], pelos índices do manual de cálculos do CJF, no qual já se encontra consignado o entendimento do julgado do Plenário do STF no RE 870.947/SE, atualização essa a ser efetuada pelo setor próprio do TRF5R,  conforme Resolução nº 2017/00458 do CJF-RES, de 04/10/2017.

3.3 - Condeno ainda o Instituto-Réu ao pagamento de honorários advocatícios que, por força da simplicidade do caso, com base no § 2º do art. 85 do CPC, arbitro no mínimo legal, observada a gradação do § 3º desse mesmo artigo do CPC e, se necessário, também as regras dos seus §§ 4º e 5º, quando da apuração, por cálculos do Contador, na fase executiva.

3.4- Outrossim, os valores devidos até o momento do cumprimento da tutela de urgência ora deferida, devem ser colocados à disposição do Juízo Estadual por onde tramita a ação de interdição. Além disso, desde já determino que os demais pagamentos a ser feitos à Autora, decorrentes desta ação, por meio de seu Curador, concretizem-se no momento oportuno, com prévia autorização do d. Juízo da Curatela, o qual, certamente, também previamente, ouvirá o Ministério Público que por lá atua, e determino que tais valores sejam colocados à disposição do referido d. Juízo da Curatela, para tais fins, com a observância das eventuais limitações de poderes conferidos na r. Decisão do d. Juízo.

3.5 - Finalmente, providencie, a Secretaria do Juízo, o pagamento dos honorários periciais, pela via administrativa própria, e dou este processo por extinto, com resolução do mérito (CPC, art. 487, I).

De ofício, submeto esta Sentença ao reexame necessário.

R.I. 

Recife, 22.11.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior 

 Juiz Federal da 2a Vara da JFPE

 

(rmc)

_________________________________________________

[1] BRASIL. Superior Tribunal de Justiça - STJ. Segunda Turma. AgInt no REsp 1769669/CE, Relator Ministro Francisco Falcão, julgado em 14/05/2019, in Diário da Justiça Eletrônico - DJe de 21/05/2019.

Disponível: site do STJ.

Consulta em: 10/03/2021.

[2] BRASIL. -------------------------------------------.AgInt no AREsp 1699836/SC, Relator Ministro Francisco Falcão,  julgado em 07/12/2020, in DJe 10/12/2020.




 

segunda-feira, 22 de novembro de 2021

JUROS DE MORA. NATUREZA INDENIZATÓRIA. NÃO INCIDÊNCIA DO IR, NEM DA CSLL.

 Por Francisco Alves dos Santos Júnior

As parcelas recebidas a título de juros de mora não podem sofrer incidência do IR, nem da CSLL, porque têm natureza indenizatória, logo não geram acréscimo patrimonial, muito menos lucros. 

O Plenário do STF já decidiu que salários, vencimentos e verbas previdenciárias recebidas por pessoas físicas com atraso, as respectivas parcelas de juros de mora não caracterizam o fato gerador do IRPF. 

No campo da pessoa jurídica, chegou a conclusão semelhante apenas com relação a juros de mora, apurados pelos índices da tabela SELIC, nas restituições de tributos que tenham sido pagados indevidamente. 

Creio que avançará quanto aos demais juros de mora, pois estes sempre têm natureza tributária. 

Essas matérias são debatidas na sentença que segue. 

Boa leitura. 



PROCESSO Nº: 0819484-83.2021.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL

IMPETRANTE: PRIME - IMPORTACAO E EXPORTACAO S/A
ADVOGADO: Erick Macedo
IMPETRADO: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL NO RECIFE/PE e outro
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE-PE
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)


Sentença tipo B

EMENTA: -  TRIBUTÁRIO. AÇÃO ORDINÁRIA. JUROS  DE MORA. TABELA SELIC. IRPJ. CSLL. NÃO INCID}ENCIA.

-As Leis que introduziram os índices da tabela SELIC na atualização dos tributos denominaram essa atualização de juros de mora, tanto quando o Contribuinte papa com atraso, como quando a Fazenda Pública ressarce, restitui ou admite a compensação de parcelas que, respectivamente, ressarciu com atraso ou cobrou indevidamente.. 

-Juros de mora têm natureza indenizatória e, por isso, como não comportam aumento patrimonial, não podem, em qualquer situação,  ser submetidos à incidência do Imposto de Renda, tampouco, quando o Contribuinte é Pessoa Jurídica, à incidência da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL.

- O Tribunal Pleno do STF, por ocasião do julgamento do Tema 962 da repercussão geral, conferiu interpretação conforme à Constituição Federal ao § 1º do art. 3º da Lei nº 7.713/88, ao art. 17 do Decreto-Lei nº 1.598/77 e ao art. 43, inciso II e § 1º, do CTN (Lei nº 5.172/66), de modo a excluir do âmbito de aplicação desses dispositivos a incidência do imposto de renda e da CSLL sobre Juros de Mora, apurados pelos índices da Tabela SELIC, recebidos  pelo Contribuintes na repetição de indébito tributário, fixando a seguinte tese: "É inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário"

-Concessão da segurança.


 

Vistos, etc.

1. Breve Relatório 

Busca o Impetrante provimento jurisdicional que lhe assegure a concessão de medida liminar, com autorização para que, desde logo, interrompa os recolhimentos de IRPJ/CSLL sobre os ingressos caracterizados como juros moratórios, inclusive os decorrentes de restituição/compensação de indébito tributário, nos âmbitos federal (juros de mora pelos índices da tabela SELIC), estadual e municipal - e os provenientes de atraso de pagamento devido por adquirentes de seus produtos, devendo abster-se a Atoridade apontada como coatora de impor-lhe medidas constritivas em razão disso (tais como aplicação de multas,  negativa de CND, CNEN,  inscrição no CADIN etc.).

Teceu outros comentários e requereu, ao final: 

(e.1) seja assegurado o direito líquido e certo da impetrante de não se submeter às incidências de Imposto de Renda e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido sobre os ingressos caracterizados como juros moratórios, inclusive, os decorrentes de restituição/compensação de indébito tributário - nos âmbitos federal (juros de mora equivalentes à SELIC), estadual e municipal - e os provenientes de atraso de pagamento devido por adquirentes de seus produtos;

(e.2) seja reconhecida a compensabilidade do indébito correspondente aos recolhimentos feitos a título de Imposto de Renda e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido sobre ingressos caracterizados como juros de mora, devidamente acrescidos da SELIC, com quaisquer tributos administrados pela RFB, conforme orientação firmada pelo STJ, sob o regime de recursos repetitivos, especialmente no item 12 da ementa do REsp 1.365.095/SP (e Súmula 461/STJ).

Decisão sob Id. 4058300.20500029 em que foi deferido o pleito de medida liminar.

A autoridade apontada como coatora apresentou Informações em que pugnou pela denegação da segurança (Id. 4058300.20845964).

O Ministério Publico Federal não se manifestou sobre o mérito da questão (Id. 4058300.20867801).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.1. Do mérito propriamente dito

Examinemos, em primeiro lugar o pedido de suspensão da exigibilidade do IRPJ e da CSLL sobre o valor dos juros, apurados pelos  índices da tabela SELIC.

Depois, veremos idêntico pleito com relação à não incidência desses tributos sobre juros de mora decorrentes de recebimentos de pagamentos em atraso e da repetição de tributos estaduais e municipais.

2.2.1 - Atualização pelos índices da tabela SELIC

Como se sabe, a substituição dos índices de correção monetária e de índices juros de mora na atualização dos tributos federais pagos com atraso pelos índices da tabela SELIC ocorreu por meio da Lei nº 8.981, de 1995, no seu art. 84, verbis:

"Art. 84 - Os tributos e contribuições sociais arrecadados pela Secretaria da Receita Federal, cujos fatos geradores vierem a ocorrer a partir de 1º de Janeiro de 1995, não pagos nos prazos previstos na legislação tributária, serão acrescidos de:

I - Juros de mora, equivalentes à taxa média mensal de captação do Tesouro Nacional relativa à Dívida Mobiliária Federal Interna.

(...).

Os juros de mora de que trata o inciso I, deste artigo, serão aplicados também às contribuições sociais arrecadadas pelo FISCO e aos débitos para com o patrimônio imobiliário, quando não recolhido nos prazos previstos na legislação específica".

Por sua vez o art. 13 da Lei nº 9.065/95 determinou:

"Art. 13 - A partir de abril de 1995, os juros de que tratam a alínea c do parágrafo único do art. 14 da Lei nº 8.847, de 28 de janeiro de 1994, com redação dada pelo art. 6º da Lei 8.850 de 28 de janeiro de 1994, e pelo art. 90 da Lei 9.981, de 1995, o art. 84, inciso I, e o art. 91, parágrafo único, alínea a, da Lei 9.891 de 1995, serão equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para os títulos federais acumulada mensalmente".

E para que os Contribuintes tivessem igual tratamento, quando recebessem, em restituição ou em compensação, parcelas de tributos que tivessem pagado indevidamente, por erro de fato ou de direito, a Lei nº 9.250, de 1995, fixou o mesmo índice para atualização:

"Art. 39 - (....)

§ 4º A partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada.".  

A Lei nº 9.532, de 1997, estabeleceu, no seu art. 74, que a incidência do índice da tabela SELIC, na atualização dos valores nos casos de repetição de indébito ou compensação tributárias, ocorreria a partir do primeiro dia do mês seguinte ao do pagamento indevido, verbis:

"Art. 73. O termo inicial para cálculo dos juros de que trata o § 4º do art. 39 da Lei nº 9.250, de 1995, é o mês subseqüente ao do pagamento indevido ou a maior que o devido.".

E de 1%(um por cento) sobre o valor do mês da efetiva restituição ou compensação(v. final do § 4º do art. 39 da Lei nº 9.250, de 1995, acima  transcrito).

Então, pela linguagem utilizada nessas Leis, na atualização dos créditos tributáriosb, tanto quando pagos com atraso, como quando houver repetição de indébito,  deixou de existir correção monetária e passou a existir apenas juros de mora, extraídos da Tabela SELIC.

É verdade que há julgados do Superior Tribunal de Justiça, nos quais se sustentou que dentro do índice da Tabela SELIC há parcela de correção monetária e parcela de juros de mora.

Mas a legislação bancária que deu origem aos índices dessa Tabela SELIC outorga-lhe apenas a natureza de juros bancários, no Sistema Integrado de Liquidação e Custódia (SELIC) para títulos federais.

A respeito desse assunto, ensina  Édison Freitas de Siqueira no artigo acima invocado e indicado na nota de rodapé [1]] infra:

  "A Resolução nº 1.124/96 do Conselho Monetário Nacional instituiu a Taxa SELIC, definida pelas Circulares BACEN 2.868/99 e 2.900/99, assim dispondo: "define-se Taxa SELIC como a taxa média ajustada dos financiamentos apurados no Sistema Integrado de Liquidação e Custódia (SELIC) para títulos federais".[1] 

Essa taxa, além de refletir a liquidez dos recursos financeiros no mercado monetário, tem a característica de juros remuneratórios ao investidor.

E o Legislador Ordinário, repito, concedeu a esses juros bancários, no campo tributário, natureza de juros de mora, ora para compensar prejuízo da Fazenda Pública, quando o Contribuinte paga com atraso, ora para recompor perdas do Contribuinte, quando este paga tributo acima do valor realmente devido e a Fazenda Pública demora, além do prazo legal, para restituí-los ou para autorizar a compensação.

Assim, desconsiderando a natureza deste índice, a SELIC foi utilizada no campo dos tributos para driblar a limitação legal dos juros moratórios dos débitos/créditos tributários, de 1% ao mês, de acordo com o art. 161, § 1º do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25/10/1966).

Essa burla à mencionada regra da Lei nº 5.172, de 1966, que instituiu o Código Tributário Nacional e que hoje tem  status  de Lei Complementar(v. art. 146 da vigente Constituição da República), findou por ser aceita pelo Superior Tribunal de Justiça.

2.2.1-1 - A questão deste Mandado de Segurança

Agora, adentrando na questão do mandado de segurança ora sob análise, se os juros decorrentes da aplicação da Tabela SELIC, na repetição de indébito tributário, sofre ou não incidência do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza de Pessoa Jurídica, bem como da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido, penso que não, pelas razões que seguem.

Explico.

Do acima exposto, temos que, legalmente os valores decorrentes da aplicação dos índices da Tabela SELIC têm natureza de juros e, na repetição de indébito tributário, tem natureza de juros de mora, pois representa a paga pelo uso indevido, no caso, pela Fazenda Pública, do dinheiro daquele que faz jus à repetição do indébito, além do prazo legal ou do prazo contratual para a restituição ou para o ressarcimento, conforme seja o caso.

Uma leitura atenta da íntegra do art. 43 do Código Tributário Nacional leva, facilmente, à conclusão que só ocorre o fato gerador do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza quando o Administrado/Contribuinte adquire a disponibilidade de renda que implique em acréscimo do seu patrimônio.

Como os juros de mora, seja na área privada, seja na área pública, têm sempre natureza indenizatória, então, nada acresce ao patrimônio Daquele que os recebe, apenas repõe alguma verba ou algum rendimento que deixou de obter em determinado momento, por culpa de Alguém que "reteve indevidamente  o seu dinheiro e foi obrigado a lhe indenizar, com o pagamento desses juros, de forma que a aquisição da disponibilidade jurídica ou econômica dos valores relativos a esses juros de mora fica à margem do fato gerador do Imposto de Renda, seja com relação à Pessoa Jurídica(Coletiva, como se diz, com maior propriedade, em Portugal) ou à Pessoa Física que os recebe.

E, por consequência, também fica à margem do fato gerador da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, cujo fato gerador é em tudo por tudo igual ao fato gerador do Imposto sobre Renda e Proventos da Pessoa Jurídica(Coletiva) e não se pode dizer que alguém obtém lucro com o recebimento de juros de mora, pelas razões já expostas.

2.2.1-2 - A 1ª Seção do STJ

No entanto, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.138.695/SC, em julgamento submetido ao regime dos recursos repetitivos,  decidiu:

"PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLL. DISCUSSÃO SOBRE A BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE RENDA DA PESSOA JURÍDICA - IRPJ E DA EXCLUSÃO DOS JUROS SELIC INCIDENTES QUANDO DA DEVOLUÇÃO DE VALORES EM DEPÓSITO JUDICIAL FEITO NA FORMA DA LEI N. 9.703/98 E QUANDO DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO NA FORMA DO ART. 167, PARÁGRAFO ÚNICO DO CTN.

1. Não viola o art. 535, do CPC, o acórdão que decide de forma suficientemente fundamentada, não estando obrigada a Corte de Origem a emitir juízo de valor expresso a respeito de todas as teses e dispositivos legais invocados pelas partes.

2. Os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais possuem natureza remuneratória e não escapam à tributação pelo IRPJ e pela CSLL, na forma prevista no art. 17 do Decreto-lei n. 1.598/77, em cuja redação se espelhou o art. 373, do Decreto n. 3.000/99 - RIR/99, e na forma do art. 8º da Lei n. 8.541/92, como receitas financeiras por excelência. Precedentes da Primeira Turma: AgRg no Ag 1359761/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 6/9/2011; AgRg no REsp 346.703/RJ, Primeira Turma, Rel. Min.Francisco Falcão, DJ de 02.12.02; REsp 194.989/PR, Primeira Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 29.11.99. Precedentes da Segunda Turma: REsp. n. 1.086.875 - PR, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, Rel. p/acórdão Min. Castro Meira, julgado em 18.05.2012; REsp 464.570/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 29.06.2006; AgRg no REsp 769.483/RJ, Segunda Turma, Rel. Min.Humberto Martins, DJe de 02.06.2008; REsp 514.341/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 31.05.2007; REsp 142.031/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 12.11.01; REsp. n.395.569/RS, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 29.03.06.

3. Quanto aos juros incidentes na repetição do indébito tributário, inobstante a constatação de se tratarem de juros moratórios, se encontram dentro da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, dada a sua natureza de lucros cessantes, compondo o lucro operacional da empresa a teor art. 17, do Decreto-lei n. 1.598/77, em cuja redação se espelhou o art. 373, do Decreto n. 3.000/99 - RIR/99, assim como o art. 9º, §2º, do Decreto-Lei nº 1.381/74 e art. 161, IV do RIR/99, estes últimos explícitos quanto à tributação dos juros de mora em relação às empresas individuais.

4. Por ocasião do julgamento do REsp. n. 1.089.720 - RS (Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10.10.2012) este Superior Tribunal de Justiça definiu, especificamente quanto aos juros de mora pagos em decorrência de sentenças judiciais, que, muito embora se tratem de verbas indenizatórias, possuem a natureza jurídica de lucros cessantes, consubstanciando-se em evidente acréscimo patrimonial previsto no art. 43, II, do CTN (acréscimo patrimonial a título de proventos de qualquer natureza), razão pela qual é legítima sua tributação pelo Imposto de Renda, salvo a existência de norma isentiva específica ou a constatação de que a verba principal a que se referem os juros é verba isenta ou fora do campo de incidência do IR (tese em que o acessório segue o principal). Precedente: EDcl no REsp. nº 1.089.720 - RS, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 27.02.2013.

5. Conhecida a lição doutrinária de que juros de mora são lucros cessantes: "Quando o pagamento consiste em dinheiro, a estimação do dano emergente da inexecução já se acha previamente estabelecida. Não há que fazer a substituição em dinheiro da prestação devida. Falta avaliar os lucros cessantes. O código os determina pelos juros de mora e pelas custas" (BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado, V. 4, Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1917, p. 221).

6. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ n. 8/2008".[2] - Destaquei em tom escuro alguns trechos.

Ou seja, à luz desse julgado, de efeito repetitivo, os juros de mora só não serão ofertados à tributação do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza e à Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, se o valor do qual se originaram não for tributado ou goze de isenção desses Tributos.

Vale dizer, esse E. Tribunal deu aos juros de mora a mesma natureza do valor dos quais se originaram, logo, não teriam natureza indenizatória.

Data maxima venia, esse entendimento não se amolda à tradição dos velhos comercialistas português e brasileiros, no sentido de que os juros de mora têm sempre natureza indenizatória, reparadora do uso do dinheiro alheio à margem da Lei ou do Contrato.

Na verdade, os juros de mora sempre têm natureza indenizatória, pois representam a recomposição da perda do uso de dinheiro alheio(Credor)  por outrem(Devedor).

Data maxima venia, nesse julgado da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça findou-se por admitir que Leis Ordinárias e Diplomas Legais, como Decretos-Leis, que têm natureza de Lei Ordinária, modifiquem o art. 43 da Lei nº 5.172, de 1966(CTN, a qual, como já dissemos,  tem  status  de Lei Complementar), pois arrolou como fato gerador do IR fato não abrangido nesse artigo desse Código.

Então, no campo tributário, as definições do direito privado(civil e comercial) não podem ser alteradas pela legislação do Direito Tributário(art. 110 do Código Tributário Nacional), de forma que os juros de mora, decorrente de qualquer verba(submetida  ou não ao IRPJ e à CSLL), em face da sua natureza indenizatória, não podem sofrer a incidência do IRPJ, pois não causam nenhum acréscimo patrimonial, uma vez que apenas repõem aquele valor que não se obteve ou que deixou de ser obtido pelo uso indevido(no caso, cobrança indevida ou não ressarcimento no prazo legal) do dinheiro daquele que recebe tais juros(o Contribuinte) pelo Terceiro(no caso, a Fazenda Nacional).

E, consequentemente, os juros de mora também não podem sofrer incidência da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, que tem, quanto ao fato gerador, a mesma estrutura do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza da Pessoa Jurídica - IRPJ. Ademais, não se pode admitir que quem recebe juros de mora goza de algum tipo de lucro, senão apenas reparação jurídico-econômico-financeira.

2.2.1-3 - O Plenário do Supremo Tribunal Federal e Juros de Mora Recebidos por Pessoas Físicas.

O Plenário do Supremo Tribunal Federal, quanto às pessoas físicas, já pacificou o assunto, quando julgou o Recurso Extraordinário - RE nº 855.091, sob repercussão geral,  e o respectivo acórdão ficou com a seguinte ementa:

"EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão Geral. Direito Tributário. Imposto de renda. Juros moratórios devidos em razão do atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função. Caráter indenizatório. Danos emergentes. Não incidência.

1. A materialidade do imposto de renda está relacionada com a existência de acréscimo patrimonial. Precedentes.

2. A palavra indenização abrange os valores relativos a danos emergentes e os concernentes a lucros cessantes. Os primeiros, correspondendo ao que efetivamente se perdeu, não incrementam o patrimônio de quem os recebe e, assim, não se amoldam ao conteúdo mínimo da materialidade do imposto de renda prevista no art. 153, III, da Constituição Federal. Os segundos, desde que caracterizado o acréscimo patrimonial, podem, em tese, ser tributados pelo imposto de renda.

3. Os juros de mora devidos em razão do atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função visam, precipuamente, a recompor efetivas perdas (danos emergentes). Esse atraso faz com que o credor busque meios alternativos ou mesmo heterodoxos, que atraem juros, multas e outros passivos ou outras despesas ou mesmo preços mais elevados, para atender a suas necessidades básicas e às de sua família.

4. Fixa-se a seguinte tese para o Tema nº 808 da Repercussão Geral: "Não incide imposto de renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função".

5. Recurso extraordinário não provido."[3].

Ora, o Trabalhador que recebe parcelas de remuneração em atraso, não sofre apenas danos emergentes, como parece ter constado na fundamentação desse d. julgado do Plenário da Suprema Corte, mas também poderia sofrer perdas de possíveis lucros cessantes, com operações nas quais aquele dinheiro, indevidamente retido pelo Empregador e que lhe foi pago com atraso, poderia ter sido aplicado  em atividade lucrativa ou, no mínimo, no mercado financeiro.

Dessa forma, os juros de mora, em qualquer vertente, sempre têm natureza indenizatória, natureza essa, estruturada no direito privado, pelo que não pode, como vimos, por força do art. 110 do Código Tributário Nacional - CTN, ser modificada para fins tributários.

Diante desse julgado da Suprema Corte, a mencionada 1ª Seção do STJ, no julgamento do Resp 1.470.443/PR, 1ª SEÇÃO DO STJ, 25.08.2021, tendo por Relator o Ministro Mauro Campbell, findou por mudar aquele julgado acima transcrito, e adaptou o entendimento dessa Corte Especial .ao do Plenário do Supremo Tribunal Federal.

2.2.1.4 - O Plenário do Supremo Tribunal Federal e os Juros de Mora Recebidos por Pessoas Jurídicas.

No que diz respeito à pessoa jurídica, o assunto foi enfrentado pelo Plenário do Supremo Tribunal Federal, sob repercussão geral nos autos do referido RE 1.063.187/SC, em julgado realizado em 27/09/2021, decidir

"..., por unanimidade, apreciando o Tema 962 da repercussão geral, negou provimento ao recurso extraordinário, dando interpretação conforme à Constituição Federal ao § 1º do art. 3º da Lei nº 7.713/88, ao art. 17 do Decreto-Lei nº 1.598/77 e ao art. 43, inciso II e § 1º, do CTN (Lei nº 5.172/66), de modo a excluir do âmbito de aplicação desses dispositivos a incidência do imposto de renda e da CSLL sobre a taxa SELIC recebida pelo contribuinte na repetição de indébito tributário, nos termos do voto do Relator. Os Ministros Gilmar Mendes e Nunes Marques, inicialmente, não conheciam do recurso e, vencidos, acompanharam o Relator, para negar provimento ao recurso extraordinário da União, pelas razões e ressalvas indicadas em seus votos. Foi fixada a seguinte tese: "É inconstitucional a incidência do IRPJ e da CSLL sobre os valores atinentes à taxa Selic recebidos em razão de repetição de indébito tributário". Falaram: pela recorrente, a Dr. Andrea Mussnich Barreto, Procuradora da Fazenda Nacional; pelo recorrido, o Dr. Juliano Fernandes de Oliveira; e, pelo amicus curiae, o Dr. Roque Antonio Carrazza. Plenário, Sessão Virtual de 17.9.2021 a 24.9.2021".[4] 

Então, esse entendimento da Suprema Corte afasta o acima referido julgado da 1º Seção do STJ, segundo o qual os juros de mora recebidos por pessoas jurídicas só não necessitarão ser ofertados a tais tributos, se originados de verbas que sejam  isentas ou não sofram a incidência de tais tributos, de forma que sinto-me dispensado da obrigação do inciso III do art. 927 do CPC quanto ao julgado dessa Corte Especial, passando a ser obrigado, pela mesma regra legal, a seguir o referido julgado do STF, cujo entendimento amolda-se àquele que venho adotando há muitos anos.

2.2.1 5- Juros de Mora não decorrentes de índices da tabela SELIC

Os juros  de mora recebidos por Trabalhadores, decorrentes de recebimento de parcelas de salários/vencimentos em atraso, não são apurados pelos índices da tabela SELIC, e, mesmo assim, em face da sua natureza indenizatória, o Plenário do STF firmou o entendimento que sobre tais valores não incide o IRPF(v. subitem 2.2.1-3 supra).

O importante não é o índice pelo qual se apuram os juros de mora, mas sim a natureza jurídica destes, qual seja, natureza jurídica indenizatória, pelo que o respectivo valor não gera acréscimo patrimonial, pelo que não se submete ao fator gerador do IR(art. 43 do Código Tributário Nacional), pelo que nunca poderá sofrer incidência desse imposto e, se for pessoa jurídica, também não poderá sofrer incidência da CSLL, pelas razões já expostas(v. subitem 2.2.1-4 supra).

Logo, os valores relativos a juros de mora que a ora Impetrante recebe de pessoas físicas, pessoas jurídicas privadas ou pessoas jurídicas públicas(decorrenes de repetição de indébito tributário ou de outros créditos não tributários)também não sofrem  incidência desses dois tributos, pela mesma fundamentação supra.

2.2.2 - Tem-se que, em mandado de segurança,  persiste a validade de suas Súmulas  267 e 269, com as quais não se chocam as seguintes Súmulas do STJ: Súmula nº 271 do STJ: "A concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria"; Súmula 213 do STJ "O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária."; e Súmula 212 do STJ "A compensação de créditos tributários não pode ser deferida em ação cautelar ou por medida liminar cautelar ou antecipatória.". 

Logo, quanto ao pedido de restituição/compensação, será, na sentença, reconhecido esse direito apenas com relação às verbas a partir da data da impetração deste mandamus, sem prejuízo da observância das regras do art. 166 e 170-A do CTN.

Assim, as parcelas anteriores à data da distribuição deste mandado de segurança não podem ser objeto de delibração neste processo de mandado de segurança.

3. Dispositivo

Diante de todo o exposto

3.1. Diante de todo o exposto, ratifico a decisão sob Id. 4058300.20500029 e concedo a segurança em caráter definitivo, assegurando à Impetrante o direito líquido e certo de não submeter à incidência do Imposto de Renda e de Contribuição Social sobre o Lucro Líquido os ingressos caracterizados como juros moratórios, inclusive, os decorrentes de restituição/compensação de indébito tributário - nos âmbitos federal (juros de mora equivalentes à SELIC), estadual e municipal - e os provenientes de atraso de pagamento devido por adquirentes de seus produtos;

 3.2 - autorizo a ora Impetrante a requerer, na via administrativa própria, observadas as regras da Lei 9.430, de 1996 e as regras dos arts. 166 e 170-A do CTN, a restituição ou compensação das parcelas indevidamente pagas e que incidiram a partir da data da impetração deste mandado de segurança, parcelas essas que serão atualizadas pelos índices da tabela SELIC;

 3.3. Sem honorários, nos termos do art. 25 da Lei n.º 12.016/2009 e Súmula 512 do STF.

 3.4. Custas ex lege.

 3.5. De ofício, submeto esta sentença ao duplo grau de jurisdição(§ 1º do art. 14 da Lei nº 12.016, de 2009), sem efeito suspensivo(§ 3º do mesmo artigo). 

 Recife, 22.11.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal da 2a Vara da JFPE

(lsc)


___________ 

[1] Nesse sentido, Édison Freitas de Siqueira, in "Taxa SELIC - Origem, Conceito, Bórmula e Legalidade" no site Thomsom Reuters FISCO on Line 

[2]  Brasil. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Agravo de Instrumento no Recurso Extraordinário 1216078 RG/ SP, Relator Ministro Dias Tofolli, julgado em 29.08.2019.

Disponível em

https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=750934994

Acesso em 01.10.2021, às 10h32.

[3]  Brasil Superior Tribunal de Justiça. 1ª Seção REsp 1.138.695 / SC RECURSO ESPECIAL 2009/0086194-3, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, Julgamento em 22.05.2013, in DJe de 31.05.2013 e in RDTAPET vol. 38 p. 223.

Disponível em

https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?i=1&b=ACOR&livre=((%27RESP%27.clas.+e+@num=%271138695%27)+ou+(%27REsp%27+adj+%271138695%27.suce.))&thesaurus=JURIDICO&fr=veja

Acesso em 06.08.2021[4]  Brasil. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário 855.091, Relator Ministro Dias Toffoli, Julgamento em 15.03.2021, Publicação em 08.04.2021.

Disponível em

https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search?base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&page=1&pageSize=10&queryString=855091%20&sort=_score&sortBy=desc

Acesso em 06.08.2021

[5] BRASIL. Supremo Tribunal Federal. Plenário. RE 1.063.187/SC. Julgado em 27/09/2021(repercussão geral)..

  Disponível em

stjus.br

Acesso em 27.09.2021. 

[6] ________________________________Recurso Extraordinário  870.947/Sergipe. Relator Ministro Luiz Fux, julgado em 20/09/2017(repercussão geral)

Disponível em

https://redir.stf.jus.br/paginadorpub/paginador.jsp?docTP=TP&docID=14080728

Acesso em 01.10.2021.

Processo: 0816921-19.2021.4.05.8300
Data e hora da inclusão: 16/11/2021 13:14
Identificador: 4058300.21188275