quarta-feira, 6 de julho de 2022

IMPORTAÇÃO. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. PRAZO.

`Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Discute-se, na decisão infra, o problema do prazo para finalização do desembaraço aduaneiro na importação de mercadorias. 

Boa leitura. 


 PROCESSO Nº: 0810784-84.2022.4.05.8300 - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL

IMPETRANTE: G B P LTDA
ADVOGADO: L  B A De A
IMPETRADO: DELEGADO DA ALFÂNDEGA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE e outro
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

 D E C I S Ã O

 1. Breve Relatório

G B P LTDA impetrou, em 30.06.2022, contra alegado ato omissivo, atribuído ao ILMO. SR. DELEGADO DA ALFÂNDEGA DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE/PE - ALF/REC, objetivando que se determine o imediato prosseguimento dos processos de despacho aduaneiro da Declaração de Importação de 22/1115065-8, registrada pela Impetrante no SISCOMEX em 13 de junho de 2022 e que, até o momento, não sofrera a verificação considerada necessária pela Receita Federal.

Para tanto, aduziu, em síntese, que:  seria empresa dedicada ao comércio exterior, com enfoque no ramo de importação e revenda de mercadorias importadas (doc. 01); a Impetrante teria efetuado operação de importação via Porto de Suape/PE, consignada na DI de nº 22/1115065-8, registrada em 13/06/2022 (doc. 04); a declaração de importação supracitada teria sido parametrizada para o canal vermelho de conferência aduaneira (doc. 05), e, posteriormente, no dia 17/06/2022, fora distribuída para realização da verificação física das mercadorias pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável pelo despacho aduaneiro (doc. 06); desde então, o despacho aduaneiro estaria interrompido, portanto, há mais de 13 (treze) dias, aguardando a realização da verificação física das mercadorias pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável, sem quaisquer novas movimentações, situação que, aliada ao largo período de trâmite das cargas na Alfândega (dezoito dias), estaria causando graves prejuízos à Impetrante, em razão da impossibilidade de continuidade do exercício de suas atividades, afora todos os custos de armazenamento da carga e de demurrage, cujo prazo de livre estadia foi encerrado no dia 28/06/2nada obstante a legislação estabelecer o prazo de 08 (oito) dias para a prática, pelo órgão ou autoridade responsável, dos atos do processo administrativo pelo qual este é responsável, as mercadorias importadas estão retidas pela Receita Federal desde o registro das Declarações de Importação, não sendo razoável a sujeição da Impetrante a um período de espera indefinido, superior à demora que poderia ser razoavelmente tolerada; seria de conhecimento público e notório que a Autoridade Coatora, por seus servidores, teria entabulado movimento paredista em busca de majorar os seus proventos, o que estaria prejudicando, também, o regular andamento do feito administrativo e, consequentemente, o exercício da atividade empresarial da Impetrante.

Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes.

Pugnou, ao final:

a) pela concessão de medida liminar para imediato e regular processamento da Declaração de Importação de nº 22/1115065-8, registrada pela Impetrante no SISCOMEX em 13 de junho de 2022; Receita Federal;

b) Deferida e cumprida a liminar requestada, requer a Impetrante a notificação da Autoridade Coatora Impetrada para prestar informações no prazo legal, bem como que seja dada ciência ao órgão público a que é vinculada e, após, seja intimado do Ilmo. Representante do Ministério Público Federal, para que traga aos autos o seu judicioso parecer, na forma da lei;

c) Que sejam julgados procedentes os pedidos formulados no presente Mandado de Segurança e concedida a segurança pleiteada no sentido de determinar o imediato prosseguimento dos processos de despacho aduaneiro da Declaração de Importação de 22/1115065-8, registrada pela Impetrante no SISCOMEX em 13 de junho de 2022. 
 

Inicial instruída com procuração e documentos. 

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

A Lei nº 12.016/2016, em seu art. 7º, III, autoriza a concessão de medida liminar, desde que se configure a presença de dois requisitos, o fumus boni iuris e o periculum in mora.

No caso, reputo presente esses dois requisitos.

Explico.

A fiscalização aduaneira é procedimento voltado à conferência de mercadorias oriundas de importações, para o qual não haja previsão de prazo específico para sua conclusão.

A despeito da inexistência de prazo específico, é farta a jurisprudência no sentido de que deve ser utilizado como parâmetro o prazo de 08 (oito) dias,  fixado no art. 4º  do Decreto Lei nº 70.235/71, que trata sobre o processo administrativo fiscal, o qual tem a seguinte redação: "Art. 4º Salvo disposição em contrário, o servidor executará os atos processuais no prazo de oito dias".

Nesse sentido, confira-se precedente recente do E. TRF5ª Região a seguir transcrito:

"PROCESSO Nº: 0810452-81.2021.4.05.8000 - REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL PARTE AUTORA: YARA BRASIL FERTILIZANTES S/A ADVOGADO: Fernanda Candido Siegmann Nery e outros PARTE RÉ: FAZENDA NACIONAL RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Fernando Braga Damasceno - 3ª Turma JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal André Luís Maia Tobias Granja EMENTA. TRIBUTÁRIO. MERCADORIA IMPORTADA. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. PRAZO. 8 DIAS. DECRETO Nº 70.235/1972. INOBSERVÂNCIA. 1. Trata-se de remessa necessária em face de sentença que confirmou a liminar e concedeu a segurança, para determinar que a parte impetrada conclua os procedimentos necessários para que a impetrante possa proceder com a retificação e desembaraço das DI's nºs 21/0223226-2 e 21/0223250-5, no prazo corrido de 08 (oito) dias previsto no Dec. 70.235/72, sob pena de multa.

2. Na inicial do presente mandamus, impetrado em 28 de junho de 2021, a parte impetrante relata ser pessoa jurídica que se dedica à industrialização, comércio, importação e exportação de fertilizantes simples ou compostos, matérias-primas correlatas e corretivos do solo. Que, no desenvolvimento da sua atividade, importou matérias-primas e produtos para revenda para o consumo, conforme DI's nºs 21/0223226-2 e 21/0223250-5 e respectivos CEMercante, Invoices, BL e laudos que instruíram a inicial. Que as referidas DIs foram devidamente registradas em 03/02/2021, mas até o momento, ainda não foram desembaraçadas, pois a Autoridade Portuária alega que, devido a problemas sistêmicos, não consegue informar no Siscomex a presença de carga no Porto. Que, na prática, o Porto de Maceió estaria em greve. Que, em razão de tal problema, está impossibilitada de prosseguir com a devida retificação das DIs e prosseguimento do desembaraço das suas mercadorias. Assim, busca que seja determinado ao Delegado da Alfandega do Porto de Maceió - AL que, no prazo máximo de 48 horas, "conclua procedimentos necessários para que a impetrante possa proceder com a retificação e desembaraço das DI's nºs 21/0223226-2 e 21/0223250-5, eis que transcorrido o prazo de 08 (oito) dias previsto no Dec. 70.235/72, sob pena de multa diária".

3. Inicio afastando a alegação de ilegitimidade passiva da autoridade impetrada, pois os documentos juntados aos autos demonstram claramente que a demora na liberação das mercadorias se deu em virtude de "problemas com a habilitação do porto de Maceió", que não estaria conseguindo realizar a "Presença de Carga" no sistema MANTRA. É o que se depreende da leitura de correspondência eletrônica trocada entre o impetrante e o Chefe do Subsetor de Operações - SUSOPE do Porto de Maceió.

4. No mérito, a partir das informações e documentos acostados nos autos, noto que as declarações de importação (DI's nºs 21/0223226-2 e 21/0223250-5), desde o dia 03/02/2021, foram registradas (...), porém, até o presente momento não houve o desembaraço para a liberação da matéria-prima.

5. Consta ainda do bojo da inicial informação prestada por Jeferson Ramos de Lima, Chefe do Subsetor de Operações - SUSOPE, no sentido de que "durante o período em que ficamos impossibilitados de operar nos Sistemas de Comércio Exterior - SISCOMEX, em razão de problemas com a habilitação do porto de Maceió, não foi possível informar o início e término da operação do Navio 'IRIS EXPRESS', Imo - 9403114, Escala 21000034889, Atracado em 07/02/2021 e Desatracado em 11/02/2021. Em virtude disso, não estamos conseguindo realizar a Presença de Carga no sistema MANTRA".

6. A despeito da inexistência de prazo específico para a apreciação de pedidos dessa natureza, tenho que o mandamento constitucional constante do inciso LXXVIII do art. 5º é claro quando assegura em favor de todos, no âmbito judicial e administrativo, a razoável duração do processo e os meios que garantam a celeridade de sua tramitação.

7. Destarte, se desde fevereiro ocorreu o registro dos produtos e até o presente momento o desembaraço não ocorreu, a omissão não pode ser fomentada pelo judiciário, até porque, como já frisado pela impetrante, a atividade empresarial fica prejudicada, o que atenta ainda mais contra a liberdade econômica, também assegurada no âmbito constitucional (art. 170), notadamente em tempos de pandemia, que assola as empresas em função das diversas restrições impostas pelos órgãos governamentais.

8. Como bem aventado pela impetrante, o Dec. 70.235/72, que dispõe sobre o processo administrativo fiscal, e dá outras providências, pode ser utilizado aqui para suprir a lacuna concernente à ausência de prazo específico para a resolução do caso, nos termos do art. 4º ("Art. 4º Salvo disposição em contrário, o servidor executará os atos processuais no prazo de oito dias").

9. Ademais, a própria parte impetrante, em 14 de julho, após o deferimento da liminar, em 1 de julho, atravessou petição para comunicar que "A parte Impetrada, informa que procedeu com as ações necessárias, em conjunto com a Agência de Navegação contratada pela Impetrante, com vistas ao registro da carga e do passe de saída, possibilitando assim, a retificação e desembaraço das DI's nºs 21/0223226-2 e 21/0223250-5 pela impetrante, nos termos da decisão". Assim, tem-se que se está diante de situação consolidada de fato. 10. Remessa Necessária improvida. acapf ".[1] (GN)

Nessa toada, historiou  que: 1) efetuou a operação de importação via Porto de Suape/PE, consignada na DI de nº 22/1115065-8, registrada em 13/06/2022 (Id. 4058300.2325678; 2) foi parametrizada  para o canal vermelho de conferência aduaneira, e, posteriormente, no dia 17/06/2022, foi distribuída para realização da verificação física das mercadorias pelo Auditor-Fiscal da Receita Federal do Brasil responsável pelo despacho aduaneiro; 3)  o despacho aduaneiro estaria interrompido, portanto,  aguardando a realização da verificação física das mercadorias por prazo superior ao legalmente previsto.

Diante de tal sucessão de acontecimentos, vê-se, pois, que restou extrapolado o prazo de 8 (oito) dias. 

Reputo, pois, presentes os requisitos autorizadores da liminar requerida.

Registro, entretanto, que considerando a complexidade inerente aos procedimentos de fiscalização aduaneira, inclusive com a devida checagem dos containers, tenho por razoável fixar mais 3(três) dias para a conclusão da declaração de importação objeto do presente mandado de segurança, desde que não haja outro impedimento, não noticiado nestes autos.

3. Dispositivo

Ante o exposto, defiro o pedido de medida liminar, e determino que a DD Autoridade coatora, no prazo máximo de 3(três) dias, conclua a operação aduaneira  com relação às mercadorias discriminadas na Declaração de Importação de 22/1115065-8,, com observação das formalidade legais, inclusive no campo fiscalizatório, desde que não haja outro impedimento, não noticiado nestes autos.

Notifique-se a DD Autoridade apontada como coatora para prestar, na forma e no prazo legal, as suas Informações, bem como para comprovar que CUMPRIU a decisão supra, sob as penas da Lei, sob as penas do art. 26 da Lei 12.016, de 2009.

Outrossim, dê-se ciência deste mandado de segurança à UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, por meio da sua representação judicial, a PGFN, na forma e para os fins do inciso II do art. 7º da Lei 12.016, de 2009 

Oportunamente, abra-se vista ao MPF, para os fins do  art. 12 da Lei por último invocada.

Finalmente, deve ser excluída a anotação de prevenção acusada pelo Pje, uma vez que inexistente.

Cumpra-se. Intimem-se. 

Recife, 06.07.2022

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal da 2ª Vara da JFPE

lsc

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[1] BRASIL. Tribunal Regional da 5ª Região.  PROCESSO: 08104528120214058000, REMESSA NECESSÁRIA CÍVEL, DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA DAMASCENO, 3ª TURMA, JULGAMENTO: 10/03/2022.

Disponível em Julia | Pesquisa Inteligente (trf5.jus.br).

Acesso em 30.03.2022.