terça-feira, 13 de setembro de 2016

CONTRATO PELO SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO-SFH: CES-COEFICIENTE DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL. ATUALIZAÇÃO PELA TR OU PES/CP. SISTEMÁTICA DE AMORTIZAÇÃO NO SALDO DEVEDOR DAS PRESTAÇÕES PAGAS. ACÓRDÃOS DE RECURSOS ESPECIAIS COM EFEITO REPETITIVO DA CORTE ESPECIAL DO SUPERIOR TRIBUNAL DE JUSTIÇA.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


      Segue sentença, que foi mantida pela 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por maioria, na qual importantes assuntos relativos ao Sistema Financeiro da Habitação – SFH foram discutidos.
         O recurso especial interposto pela Caixa Econômica Federal - CEF ficou suspenso até que fossem julgados recursos especiais de efeito repetitivo na Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça, conforme decisão do Ministro Luz Fux, lançada nos autos do REsp  nº 880.026/RS, então em tramitação nesse mesmo Tribunal. A Corte Especial desse Tribunal Superior findou, no julgamento dos mencionados recurso especiais com efeito repetitivo,  por dar ganho de causa aos Bancos quanto à atualização pela TR(exceto se no contrato houvesse a previsão de outro índice)e quanto à sistemática de atualização do saldo devedor pretendida pelos Bancos, qual seja, primeiro se atualiza o saldo devedor para depois abater o valor da prestação paga no mês, julgados esses que findaram, quanto a este assunto,  por dar origem à Súmula 450 desse Tribunal, com o seguinte teor: “Súmula 450 – Nos contratos vinculados ao SFH, a atualização do saldo devedor antecede sua amortização pelo pagamento da prestação”. Diante desse quadro, a própria 1ª Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por força do art. 543-C do Código de Processo Civil de 1973, então vigente, e de regras do seu Regimento Interno, adaptou o seu acórdão ao acórdão do Superior Tribunal de Justiça.
         Após a sentença, segue o acórdão da 1ª Turma do TRF da 5ª Região e um resumo do que aconteceu após o julgamentos dos recursos especiais com efeito repetitivo da Corte Especial do Superior tribunal de Justiça. 

         Boa leitura.


PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA


Juiz Federal: Dr. Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2000.83.00.4589-5 - Classe: 29 - Ação Ordinária
Autor: CLEBER SANTA ROSA
Adv.: Aramis Francisco Trindade de Souza, OAB-PE 011738.
Réu: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL
Adv.: Sandra Maria Garret Rios Siqueira – OAB/PE 12.636


Registro nº ...........................................
Certifico que eu, ..................,  registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2007.


Sentença tipo A.

                                    Ementa: - DIREITO ECONÔMICO. FINANCIAMENTO. SISTEMA FINANCEIRO DA HABITAÇÃO. REAJUSTES. COEFICIENTE DE EQUIPARAÇÃO SALARIAL. INÉPCIA DE PEDIDO GENÉRICO.

                                                Considera-se inepto o pedido genérico, sem especificação.

                                                Prevalece o índice salarial previsto no caput da cláusula contratual para reajuste do valor das prestações, sobretudo porque mais consonante com o sistema financeiro da habitação.

                                                O saldo devedor só deve ser reajusta após o pagamento da prestação e encargos do mês.

                                                Deve-se excluir o valor do Coeficiente de Equiparação Salarial –C.E.S. da primeira e das prestações subseqüentes, porque contrário a regras do Código de Proteção e Defesa do Consumidor e do atual Código Civil, além de não previsto claramente no contrato.  

                                                Procedência parcial.



VISTOS, ETC.

CLEBER SANTA ROSA propôs a presente “Ação de Acertamento de Dívida, Cumulada com Declaração de Nulidade de Cláusulas Contratuais e Revisão Judicial de Contrato”, em 23.03.2000, contra a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, aduzindo, em síntese, que teria contraído um empréstimo junto à Ré, para a aquisição de imóvel residencial; que os recursos para tal financiamento seriam oriundos do Sistema Financeiro de Habitação – SFH; que as prestações de amortização do empréstimo, compreendendo acessórios e juros, seriam reajustadas no segundo mês após a data de vigência dos aumentos salariais do Autor; que o plano de reajuste seguiria a chamada equivalência salarial por categoria profissional; que o saldo devedor sofreria reajustes mensais mediante atualização monetária, com aplicação de índice fixado para remuneração da poupança; que teria sido criado um abismo entre a renda do Autor e a obrigação pactuada, acarretando sua inadimplência; que o imóvel já estaria sendo objeto de execução extrajudicial; que o saldo devedor estaria sendo corrigido mensalmente pela taxa referencial – TR. Sustentou que, por ocasião da contratação do empréstimo, o comprometimento da renda do Autor com a prestação e todos os encargos não alcançaria um percentual de 30%; que atualmente o comprometimento de sua renda impossibilitaria a satisfação da obrigação, impondo a revisão do contrato; que seria ilegal a aplicação da TR; que os juros estariam sendo computados de forma cumulativa, incidindo juros sobre juros; que tal prática seria ilegal; que o coeficiente de equiparação salarial deveria ser expurgado da planilha de cálculos da composição das prestações. Teceu outros comentários. Invocou algumas decisões judiciais. Requereu: a citação da CAIXA ECONÔMICA FEDERAL; a procedência dos pedidos, para que fosse declarada nula a cláusula de atualização das prestações com eliminação da TR como fator de indexação do reajuste; fosse fixado novo valor da prestação mensal, compatível com o comprometimento de renda do Autor; fosse declarada a nulidade das cláusulas abusivas à luz do Código de Defesa do Consumidor; fosse recalculado o saldo devedor, considerando a amortização feita no mês; fosse aplicada a taxa de juros legal, sem a sua capitalização; fosse determinada a exclusão do coeficiente de equiparação salarial do valor da primeira prestação, recalculando todas as demais; fosse apurado novo saldo devedor. Pugnou, ainda, pela condenação da Ré nos ônus da sucumbência. Fez protestos de estilo. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com instrumento de procuração e cópia de documentos (fls. 13/69).
Comprovante de recolhimento de custas (fls. 71).
Citada, a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL apresentou Contestação, às fls. 76/99, levantando preliminarmente a falta de elemento da ação por ausência de causa de pedir, eis que os juros aplicados seriam menores que os requeridos pelo Autor. No mérito, sustentou que, ao contrário do alegado pelo autor, o plano de reajuste das prestações seria o PES e não o PES/CP; que somente haveria revisão de índices se o valor da prestação ultrapassasse o comprometimento de renda verificado no ato da contratação; que o procedimento da CAIXA, quando da amortização do saldo devedor, encontrar-se-ia respaldado no art. 20 da Res. BACEN nº 1.980/93; que o Autor não teria observado a máxima pacta sunt servanda; que não se poderia proceder a uma revisão de cláusulas contratuais; que a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL não estaria procedendo à capitalização mensal de juros; que a elevação do valor das prestações teria decorrido da inadimplência do autor; que o art. 192, § 3º, da Constituição da República não seria auto-aplicável; que o juro mensal seria pago no mesmo mês, impossibilitando o cálculo ou cobrança de juros sobre juros; que seria legal a execução extrajudicial; que o empreendimento financiado teria sido adquirido mediante a interveniência de cooperativa habitacional; que, em tal modalidade de aquisição, o valor do financiamento concedido ao mutuário seria representado pelo rateio do custo total da obra, respeitado o percentual de participação mínima exigido para o programa; que o imóvel não seria comercializado pelo preço de marcado; que o Código de Defesa do Consumidor seria inaplicável ao contrato em questão; que o Coeficiente de Equiparação Salarial – CES teria sido instituído com o objetivo de equilibrar as divergências entre os índices de reajuste das prestações (salário) e os do saldo devedor. Fez outros comentários. Transcreveu algumas decisões judiciais. Ao final, requereu fossem rejeitados os pedidos formulados na Inicial, condenando o Autor nos ônus da sucumbência. Protestou o de costume. Pediu deferimento. Juntou cópia de instrumento de procuração e documentos (fls. 100/118).
O Autor apresentou Réplica, às fls. 121/126, rebatendo os argumentos da Defesa e reiterando os termos da Inicial.
Às fls. 127, foi declarada a suspeição deste Juízo.
Deferida a realização de perícia contábil (fls. 134).
Quesitos apresentados pelo Autor e pela CAIXA ECONÔMICA FEDERAL, às fls. 136/137 e 138/139, respectivamente.
Proposta de honorários (fls. 148/149).
Às fls. 151, a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL juntou cheque recebido para depósito em conta judicial vinculada ao feito.
Às fls. 152/153, foi revogada a decisão de fls. 127, na qual este Juiz tinha se declarado suspeito.
O Autor prestou esclarecimentos quanto à devolução do cheque (fls. 158/159).
Arbitrados os honorários periciais (fls. 163).
A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL concordou com o desentranhamento do cheque, requerido pelo Autor (fls. 165).
Às fls. 168, a Sra. Perita declinou da perícia.
Nomeado outro perito judicial (fls. 168).
Laudo pericial apresentado às fls. 173/179.
O Autor requereu esclarecimentos do Sr. Perito (fls. 183/184).
A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL concordou com o laudo pericial (fls. 185).
Esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito (fls. 190/192).
Designada a realização de audiência de conciliação (fls. 196).
Realizada audiência de conciliação (fl. 203).
Decisão de fls. 207/208 determinou fosse o Autor intimado para proceder ao depósito do valor dos honorários periciais arbitrados e que as partes se manifestassem sobre os esclarecimentos prestados pelo Sr. Perito.
A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL concordou com os esclarecimentos acerca do laudo pericial (fl. 210).
À fl. 212-vº, a Secretaria deste Juízo certificou que a parte autora não se manifestou sobre a decisão de fls. 207/208.
À fl. 216, restou facultada às partes a apresentação de razões finais.
Razões finais apresentadas pelo Autor (fls. 219/221).
Às fls. 224/226, a CAIXA ECONÔMICA FEDERAL apresentou suas razões finais.

É o Relatório.

Fundamentação

Matérias Preliminares

1.      As matérias preliminares já foram enfrentadas na decisão de fls. 152-153.
2. De ofício, é de se considerar por inepto o pedido da alínea “c” dos pedidos da petição inicial, porque genérico, sem especificação de quais seriam as cláusulas nulas à luz do Código de Proteção e Defesa do Consumidor.

Matérias de Mérito

Enfrentarei as questões de mérito, segundo os pedidos da petição inicial, exceto quanto ao item 1 infra, que diz respeito a entendimento adotado por este Juiz em todas as Sentenças relativas ao assunto em questão.

1.      Lei nº. 8.078, de 1990 – Aplicação

Registro que neste julgamento será adotado o entendimento segundo o qual o contrato sob análise submete-se às regras do Código de Proteção e Defesa do Consumidor[1], pois o Autor figura como destinatário final dos recursos do financiamento. Obviamente, também se aplica, com os temperos pertinentes, a legislação relativa ao sistema financeiro da habitação e as Leis Civis, principalmente o Código Civil.
O contrato em questão caracteriza-se como contrato de adesão, porque padronizado pela Caixa Econômica Federal e apresentado ao Autor sem que este pudesse fazer qualquer modificação nas respectivas cláusulas, portanto perfeitamente amoldável ao art. 54 do Código de Proteção e Defesa do Consumidor.
Chamo a atenção para o fato de que o Código de Proteção e Defesa do Consumidor determina, no seu art. 47, que “as cláusulas contratuais serão interpretadas de maneira mais favorável ao consumidor”[2], norte esse seguido pelo novo Código Civil no seu art. 423, e também há que se considerar que o art. 421 deste limita a liberdade de contratar à função social do contrato.

2. Prestações: Reajuste pela variação salarial

O Autor pretende que se exclua da atualização do valor das prestações mensais o índice de atualização TR.
A Requerida alega, na defesa, que o plano previsto no contrato é o de mera equivalência salarial(PES) e não o de equivalência salarial por categoria profissional(PES/CP), como alegado na petição inicial.Mas não nega a aplicação da TR no reajuste.
Constato, na cópia do contrato juntada pelo Autor, que realmente sua Cláusula Décima Segunda estabelece que o reajuste das prestações será pelo Plano de Equivalência Salarial-PES, “na mesma periodicidade dos aumentos salariais da categoria profissional do DEVEDOR, definida na letra “A” deste contrato, aplicável no mês subseqüente ao de competência do aumento salarial.(...).”(fl. 20).
O Sr. Perito Judicial, respondendo ao segundo quesito formulado pelo Autor, confirmou que essa cláusula contratual não está sendo observada pela Requerida, pois o valor das prestações está sendo reajustado pelo índice de variação da TR-Taxa Referencial(v. fl. 174).
A Requerida, quando se manifestou sobre esse laudo, às fls. 185-186, não impugnou essa resposta do Sr. Perito, limitando-se a dizer que o valor das prestações estaria de acordo com o § 4º da Cláusula Décima Segunda do contrato e com o art. 8º da Lei nº. 8.692, de 1993.
Ocorre que esse § 4º da Cláusula Décima Segunda do contrato só poderia ser aplicado subsidiariamente e a Requerida não comprova que não estivesse tendo acesso aos índices de variação salarial do Autor. Ademais, Parágrafo de Cláusula contratual não pode se sobrepor a esta.
Nesta situação, merece acolhida este pleito da petição inicial.

3. Equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato

O Autor alega que esse equilíbrio teria sido rompido em face dos sucessivos reajustes, incompatíveis com comprometimento de sua renda. Na causa petendi da petição inicial, alega que o valor da prestação e de todos os encargos não atingiria, no início do contrato, 30% da sua renda mensal, e que na época da propositura desta ação esse comprometimento teria ultrapassado esse percentual. 
Esse pleito não merece acolhida, pois o Sr. Perito Judicial demonstrou que mencionado equilíbrio vem sendo mantido, tendo inclusive ocorrido uma redução do índice do comprometimento de renda, conforme se vê na resposta que deu ao primeiro quesito do Autor, à fl. 174 dos autos.

4. Revisão do Saldo Devedor

O Autor pede que o saldo devedor seja recalculado, “considerando para abatimento a amortização feita no mês”
A respeito desse assunto, a Requerida alegou na contestação que o valor da prestação é composto de a + j + prêmio de seguro, então, quando é realizado o pagamento da prestação, “retira-se o valor correspondente aos juros percebidos no período e o restante é destinado à amortização do saldo devedor, ocorrendo tal operação mensalmente, (...).”(fl. 80).
A respeito desse pedido, o Sr. Perito, respondendo ao quesito oitavo do Autor, respondeu que a Requerida primeiro corrige o saldo devedor para, posteriormente, fazer a dedução da amortização do valor pago da prestação mensal e complementa o Sr. Perito, em resposta ao quesito nono do Autor, que esse seria o procedimento correto(v. fl. 175)[3].
O contrato tratou do reajuste do saldo devedor na Cláusula Nona e nessa cláusula nada consta sobre a fórmula adotada pela Requerida, de primeiro atualizar o saldo devedor e depois amortizar o valor pago, na forma por ela descrita e acima transcrita, por isso não sei d’onde o Sr. Perito Judicial tirou a conclusão de que essa fórmula seria a correta.
Em outras ações, a Caixa Econômica Federal, alegou que mencionada prática teria base em Resoluções e Circular do BNH e do BACEN e decorreria do disposto no art. 7º e 8º do Decreto-lei nº. 2.291, de 21.11.1986. c/c art. 18 da Lei nº. 4.380, de 1964. Vejamos o assunto à luz da legislação e do contrato.

Examinemos mais detalhadamente esta questão.

Eis o texto da alínea “c” do art. 6º e do art. 18 da Lei nº. 4.380, de 1964, obtido, no dia de hoje, no site www.planalto.gov.br:

“Art. 6° O disposto no artigo anterior sòmente se aplicará aos contratos de venda, promessa de venda, cessão ou promessa de cessão, ou empréstimo que satisfaçam às seguintes condições: c) ao menos parte do financiamento, ou do preço a ser pago, seja amortizado em prestações mensais sucessivas, de igual valor, antes do reajustamento, que incluam amortizações e juros”
“Art. 18. Compete ao Banco Nacional da Habitação:  I - autorizar e fiscalizar o funcionamento das sociedades de crédito imobiliário;  II - fixar as condições gerais quanto a limites, prazos, retiradas, juros e seguro obrigatório das contas de depósito no sistema financeiro da habitação;  III - estabelecer as condições gerais a que deverão satisfazer as aplicações do sistema financeiro da habitação quanto a limites de risco, prazo, condições de pagamento, seguro, juros e garantias (Vide Medida Provisória nº 2.197-43, de 24.8.2001);  IV - fixar os limites, em relação ao capital e reservas, dos depósitos recebidos e dos empréstimos tomados pelas Sociedades de Crédito Imobiliário;  V - fixar os limites mínimos de diversificações de aplicações a serem observados pelas entidades integrantes do sistema financeiro da habitação;  VI - fixar os limites de emissão e as condições de colocação, vencimento e juros das Letras Imobiliárias, bem como as condições dos seguros de suas emissões;  VII - fixar as condições e os prêmios dos seguros de depósitos e de aplicações a que serão obrigadas as entidades integrantes do sistema financeiro da habitação;  VIII - fixar as condições gerais de operação da sua carteira de redesconto das aplicações do sistema financeiro da habitação;  IX - determinar as condições em que a rêde seguradora privada nacional operará nas várias modalidades de seguro previstas na presente lei;  X - (Vetado);  XI - exercer as demais atribuições previstas nesta lei. Parágrafo único No exercício de suas atribuições, o Banco Nacional da Habitação obedecerá aos limites globais e as condições gerais fixadas pelo Conselho da Superintendência da Moeda e do Crédito, com o objetivo de subordinar o sistema financeiro de habitação à política financeira, monetária e econômica em execução pelo Govêrno Federal.”.

O Decreto-lei nº. 2.291, de 21.11.1986, que extinguiu o Banco Nacional da Habitação-BNH e trouxe inúmeras regras sobre sua sucessão, tem as seguintes regras nos seus artigos 7º e 8º referidos acima:

“Art. 7º - Ao Conselho Monetário Nacional, observado o disposto neste Decreto-Lei compete: I - exercer as atribuições inerentes ao BNH, como órgão central do Sistema Financeiro da Habitação, do Sistema Financeiro do Saneamento e dos sistemas financeiros conexos, subsidiários ou complementares daqueles; II - deferir a outros órgãos ou instituições financeiras federais a gestão dos fundos administrados pelo BNH, ressalvado o disposto no Art. 1, § 1, alínea "b"; e III - orientar, disciplinar e controlar o Sistema Financeiro da Habitação. Art. 8º - Compete ao Banco Central do Brasil fiscalizar as entidades integrantes do Sistema Financeiro da Habitação e aplicar as penalidades previstas.”

Noto que nenhum dos dispositivos legais acima transcritos modificou a fórmula da alínea “c” do art. 6º da Lei nº. 4.380, de 1964. E a regra constante neste dispositivo parece-me clara no sentido de que a Autor tem razão, pois manda primeiro amortizar o valor da prestação e acessórios pagos e somente depois atualizar o saldo devedor. Ou seja, deve-se adotar o Sistema Hamburguês ou Sistema de Amortização Constante-SAC. E assim tem que ser, sob pena de o valor da prestação e dos acessórios sofrer, antes da amortização, redução correspondente ao percentual do reajuste do saldo devedor.
 A ser mantida a fórmula: atualizar o saldo devedor e depois amortizar o valor da prestação e dos encargos pagos, não só fere a mencionada alínea “c” do art. 6º da Lei nº. 4.380, de 1964, como também os artigos do Código de Proteção e Defesa do Consumidor e do Código Civil referidos no item “1” desta fundamentação.
Logo, este pedido da petição inicial também merece acolhida.

5. Coeficiente de Equiparação Salarial – C. E. S.

O Autor pede a exclusão do valor da prestação do valor do Coeficiente de Equiparação Salarial –C.E.S.
A Requerida não nega que tenha havido a cobrança do referido coeficiente. Apenas alega que mencionado coeficiente fora criado ainda na época do extinto Banco Nacional da Habitação, de acordo com a Rc 36/69, Diário Oficial da União de 18.11.1969, com fundamento no art. 17 da Lei nº. 4.380, de 21.08.1964, [4] e confirmou que para o contrato em questão o valor do CES teria sido de 1,05 sobre o valor da prestação inicial, obviamente com reflexo nas demais(fls. 97-98).
No contrato acostado aos autos(fls. 14-28), faz-se referência a esse Coeficiente na letra “C”, quadro 9(v. fl. 16 dos autos), mas não diviso nenhuma cláusula explicando o que vem a ser esse Coeficiente, a ele se fazendo referência apenas na Cláusula Quinta e assim mesmo de forma condicional(“quando for o caso”).
Não havia e não há autorização contratual, tampouco legal, para sua inclusão.
Os dispositivos do Código de Proteção e Defesa do Consumidor e do Código Civil invocados no item “1” desta fundamentação vedam a possibilidade de aumento de encargo contratual sem expressa previsão no contrato e sem base em Lei.
Aliás, o primeiro Código estabelece no seu art. 52 que para esse tipo de encargo ser exigido teria que ser previamente explicado ao Devedor, ora Autor, e só teria que estar previsto em Lei e não em resolução de Banco Estatal, regra geral dirigido por ex-Presidente ou ex-Proprietário do Banco privado.
Portanto, neste particular também merece acolhida este pedido da inicial.

6. Juros, Capitalização

O Autor alega que os juros são computados de forma cumulativa, incidindo juros sobre juros, o que seria ilegal.
A Requerida nega essa afirmação e sustenta que, segundo a planilha que anexou, o total dos juros não passaria de 12% ao ano e que estes seriam decrescentes, porque estaria sendo aplicado ao contrato a tabela price.
O Sr. Perito informou que não há incidência de juros sobre juros, sendo que estes estariam sendo cobrados apenas sobre o saldo devedor.
Nessa situação, tenho que este pleito não procede.

7. Sucumbência.

Há sete pedidos na petição inicial, sendo que dois deles representam um só, refiro-me aos pedidos da alínea “d” e “g”, que se resumem à revisão do saldo devedor.
Apenas três pedidos foram considerados procedentes.
Nessa situação, os honorários periciais devem ser rateados entre as Partes e cada Parte arcará com os honorários dos seus respectivos advogados.

Conclusão:

POSTO ISSO: a) de ofício, tenho por inepto o pedido da alínea “c” dos pedidos da petição inicial e, com relação a esse pedido, indefiro a petição inicial e extingo o processo, sem resolução do mérito; b) julgo procedentes os pedidos das alíneas “a”, “d”, “f” e “g” e determino que a Requerida revise o contrato em questão: b-1)excluindo o índice TR-Taxa Referencial do valor das prestações mensais, substituindo-o pelo índice de reajuste dos salários do Autor, na forma fixada no caput da cláusula décima segunda do contrato, ficando o ora Autor obrigado a trazer para os autos certidão do Empregador com todos os índices de reajustes/aumentos dos seus salários ou de cópia dos respectivos recibos de salários, em prazo que lhe será fixado na fase de liquidação-execução desta Sentença, sob pena de manter-se a fórmula que vem sendo adotada pela Requerida; b-2) amortizando os valores pagos mensalmente, antes do reajuste do saldo devedor, fazendo o recálculo deste; b-3) excluindo o valor do Coeficiente de Equiparação Salarial –C.E.S. do valor da primeira prestação e das subseqüentes.
 Após essa revisão, fica determinado que a Requerida amortize eventuais parcelas pagas em valor maior que o realmente devido, recalcular o valor real da prestação e, doravante, passar a adotar o acima determinado quanto ao reajuste das prestações e do saldo devedor, sob pena de pagamento de multa mensal, a favor do Autor, correspondente a 10%(dez por cento) do valor de cada prestação mensal, sem prejuízo da responsabilização civil, funcional e criminal do servidor ou dirigente que causar o pagamento dessa multa, ficando o Autor obrigado a apresentar à Requerida, sempre que receber reajuste e/ou aumento de salário, o respectivo índice, para os fins acima declinados, sob pena do já estabelecido.
Outrossim, condeno cada Parte a depositar, R$ 400,00(quatrocentos reais) a título de metade dos honorários periciais, neste momento reajustado para R$ 800,00(oitocentos reais), sob pena de ter-se por deserto eventual recurso que interponham e, desde já, autorizo o levantamento pelo Sr. Perito, mediante alvará deste Juízo.

P.R.I.
Recife,  24 de março de 2008

Francisco Alves dos Santos Júnior
                 Juiz Federal da 2ª Vara-PE[5]



A sentença acima foi mantida pela Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por maioria(tendo sido vencido o Relator), em acórdão com a seguinte Ementa:

“AC 452918-PE  2000.83.00.004589
APTE: Caixa Econômica Federal - CEF – CAIXA ECONÔMICA FEDERAL E   OUTRO
ADV/PROC: ANTONIO XAVIER DE MORAES PRIMEO E OUTROS
APDO: CLEBER SANTA ROSA
ADV/PROC: ARAMIS FRANCISCO TRINDADE DE SOUZA E OUTROS
RELATOR: DESEMBARGADOR FEDRAL ROGÉRIO FIALHO MOREIRA
ORIGEM: 2ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCO
JUIZ FEDERAL FRANCISCO ALVES DOS SANTOS JÚNIOR

EMENTA

CIVIL. SFH. SALDO DEVEDOR. ATUALIZAÇÃO. TR. SUBSTITUIÇÃO PELO PES/CP. SISTEMÁTICA DE AMORTIZAÇÃO DO SALDO DEVEDOR PRATICADA PELA Caixa Econômica Federal - CEF. LEGALIDADE. CES. NECESSIDADE DE PREVISÃO CONTRATUAL.
1.             Vencido o Relator quanto ao critério de reajuste do saldo devedor, prevalecendo o entendimento da Turma no sentido de que a aplicação do Plano de Equivalência Salarial em substituição ao índice de correção monetária da caderneta de poupança permite uma evolução do financiamento mais adequada à situação fática vivencida pelos mutuários do SFH.
2.             Vencido o relator quanto à sistemática de amortização praticado pela Caixa Econômica Federal - CEF, prevalecendo o entendimento da Turma no sentido de que na forma do art. 6º, “c”, da Lei nº 4.380/64, deve ser promovido primeiro o abatimento da prestação quitada, corrigindo-se posteriormente o saldo devedor.
3.             Do exame do contrato de financiamento habitacional objeto destes autos, constata-se que não existe previsão contratual de incidência do CES, devendo, portanto, ser mantida a sentença no ponto em que reconheceu a ilegalidade da cobrança do CES.
4.             Apelação da Caixa Econômica Federal - CEF nãoprovida.

ACÓRDÃO

Vistos, etc.

Decide a Primeira Turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, por maioria, vencido o relator quanto à aplicação do PES como índice de atualização do saldo devedor e à sistemátcia de amortização do saldo devedor, negar provimento à apelação, na forma do relatório e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte integrante do presente julgado.

Recife, 18 de março de 2010.

Des. Federal Relator ROGÉRIO FIALHO MOREIRA”.[6]

A Caixa Econômica Federal - CEF interpôs, contra esse acórdão, recurso especial, o qual ficou suspenso até que o Superior Tribunal de Justiça julgasse  recurso especial com efeito repetitivo, conforme despacho do Ministro Luiz Fux nos do recurso especial nº 880.026/RS, tratando das mesmas matérias.[7]

Despacho do Vice-Presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, noticiando que os recursos especiais com efeito repetitivo nº 969.129/MG e nº 1.110.903/PR, tratando das mesmas matérias deste feito, tinham sido julgados e, nos termos do art. 543-C, § 7º, II do CPC de 1973, então vigente, c/c o art. 220, § 1º, II, do Regimento Interno do TRF5R, deveria a 1ª Turma deste Tribunal fazer as devidas adaptações ao seu acórdão, acima transcrito, nele incluindo o teor dos acórdãos dos mencionados recursos especiais da Corte Especial do Superior Tribunal de Justiça – STJ.

Mencionada 1ª turma do Tribunal Regional Federal da 5ª Região fez as adaptações e o seu acórdão, acima transcrito, passou a ter a seguinte redação:

“APELAÇÃO CÍVIL 452918-PE (2000.83.00.004589-5)APTE: Caixa Econômica Federal - CEF – CAIXA ECONÔMICA FEDERAL E OUTROADV/PROC: ANTONIO XAVIER DE MORAES PRIMO E OUTROSAPDO: CLEBER SANTA ROSA
ADV/PROC. ARAMIS FRANCISCO TRINDADE DE SOUZA E OUTROSORIGEM: JUÍZO DA 2ª VARA FEDERAL DE PERNAMBUCORELATOR: DESEMBARGADOR FEDERAL MANOEL DE OLIVEIRA ERHARDT.

1.      (...).
2.      Prevalência do entendimento que assegura o reajuste do sldo devedor pela TR, nos contratos de financiamento de imóveis vinculados ao Sistema Financeiro da Habitação, e, ainda, que adota a sistemática de amortização utilizada pela Caixa Econômica Federal - CEF, ou seja, que, primeiro, atualiza o saldo devedor para, posteriormente, proceder ao abatimento da prestação.
3.      Decisão acolhida para dar provimento, em parte, à apelação da Caixa Econômica Federal - CEF, determinando-se o reajuste do saldo devedor pela TR, e mantendo-se a sistemática de amortização do saldo devedor aplicada pela Caixa Econômica Federal - CEF, procedendo-se primeiro a sua atualização e, posteriormente, a amortização da dívida.
Vistos, relatados e discutidos estes autos de AC 459918-PE, em que são partes as acima mencionadas, ACORDAM os Desembargadores Federais da Primeira Turma do TRF da 5ª Região, por unanimidade, em DAR PROVIMENTO, EM PARTE, À APELAÇÃO DA Caixa Econômica Federal - CEF, nos termos do relatório, voto e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte do presente julgado.
Recife, 16.01.2014”.[8]

A Caixa Econômica Federal - CEF discordou desse novo julgado e insistiu nos argumentos do seu recurso especial, pugnando por sua admissão e processamento, em petição protocolada em 29.01.2014.
O Vice-presidente do TRF5ªR inadmitiu o recurso especial da Caixa Econômica Federal – Caixa Econômica Federal - CEF, em decisão publicada no DJe TRF5R de 04.11.2014.
A Caixa Econômica Federal - CEF interpôs Agravo contra mencionada decisão.
Embora intimada, a Parte contrária não apresentou contraminuta a esse Agravo.
Esse Agravo da Caixa Econômica Federal - Caixa Econômica Federal – Caixa Econômica Federal - CEF recebeu no Superior Tribunal de Justiça – STJ o nome de  Agravo em Recurso Espeical nº 678.176-PE(2015/0060148-8) no Superior Tribunal de Justiça – STJ, que não foi provido pelo Ministro   Marco Buzzi, Relator, cuja decisão foi disponibilizada no DJe/STJ de 19.06.2015 e considerada publicada em 22.06.2015, tendo transitado em julgado em 30.06.2015, conforme certidão acostada à fl. 338 dos autos do processo físico.
Obs.: Atualmente, o feito está em execução, constando nos autos termo de conciliação das Partes, ainda dependente de homologação, porque falta a Parte Autora depositar a parte que lhe cabe da verba dos honorários do Perito Judicial.  


  




[1] Nesse sentido, o C. Supremo Tribunal Federal firmou o entendimento de que as regras do Código de Proteção e Defesa ao Consumidor aplicam-se aos contratos firmados com as Instituições Financeiras. ADI 2591/DF, rel. orig. in. Carlos Velloso, rel. p/ o acórdão Min. Eros Grau, 7.6.2006. (ADI-2591). FONTE: INFORMATIVO STF 430, DE 05.09.2006.
Bem antes, no mesmo sentido, era firme a jurisprudência do E. Superior Tribunal de Justiça, que findou por ser sumulada: “Súmula 297 – O Código de Defesa do Consumidor é aplicável às instituições financeiras”.
Esses E. Tribunais apenas ratificaram o que se encontra expresso no § 2º do art. 3º do Código de Proteção e Defesa do Consumidor, Lei nº. 8.078, de 1990.

[2] A respeito dessa regra, escreveu o magistrado e jurista Francisco de Queiroz Bezerra Cavalcanti:
O dispositivo encerra o princípio do favor consummatoris, consagrado em alguns diplomas legais alienígenas, como, v.g.: na Lei espanhola n. 26, de 29.07.1984; (...).
Visa, (...), o preceito assegurar o equilíbrio entre os contratantes, considerando-se, sobretudo, a desigualdade econômica entre as partes, o fato de, regra geral, os contratos serem minutados e elaborados pelo fornecedor de bens e produtos.”.
Comentários ao Código de Proteção e Defesa do Consumidor. Belo Horizonte: Del Rey, 1991, p. 107.
[3] Essa prática deve ser evitada pelo Sr. Perito Judicial, pois cabe ao Juiz julgar a correção da prática contratual, à luz do direito.
[4] Em outra ação(processo 2001.83.00.018817-0 Classe 029 Ação Ordinária), a Caixa Econômica Federal invocou Resolução nº.  E/74/69 de 08.12.1969 do BNH e com a Circular do Banco Central do Brasil nº. 1.278, de 1988.
Já no quesito quinto, apresentado ao Sr. Perito Judicial, invocou a Circular BACEN nº. 2.757, de 1997(v. resposta do Sr. Perito à fl. 176).

[5] Publicada através do Boletim nº 2008.000043, no Diário Oficial do Estado de Pernambuco – DOE do dia 05.04.2008, com circulação no dia 05.04.2008.
 Acostada às fls. 228-235 do respectivo processo físico, com arquivo eletrônico no TEBAS da JFPE.
[6] Disponibilizado no Diário de Justiça Eletrônico TRF5, nº 57/2010, de 26.03.2010, fls. 41-163 e considerado publicado em 27.03.2010, nos termos do art. 3º da Resolução nº 19, de 22.07.2009, da Presidência do TRF5ªR.
Acostado às fls. 280-281dos autos do respectivo processo físico, com arquivo eletrônico do TRF5ªR. .
[7] Decisão do Vice Presidente do Tribunal Regional Federal da 5ª Região, datada de 02.12.2010, publicada no Diário da Justiça Eletrônico TRF5, de 10.05.2011, acostada às fls. 300 dos autos do processo físico.
[8] Este acórdão foi divulgado no DJe do TRF5ª nº 16/2014, de 23.01.2014, considerado publicado em 24.01.2014. Está acostado nos autos do processo físico, à fs. 310.