quinta-feira, 30 de março de 2017

PRESCRIÇÃO ADMINISTRATIVA DO FUNDO DO DIREITO. UM CASO CONCRETO.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Um caso em que não foi aplicada a Súmulas 163 do extinto Tribunal Federal de Recursos, nem a sua semelhante Súmula 85 do Superior Tribunal de Justiça, porque se reconheceu a prescrição do fundo do direito. 

Boa Leitura. 

Obs.: pesquisa de legislação e de jurisprudência feita pelo Assessor 
Marcos Eduardo França Rocha


PROCESSO Nº: 0808741-24.2015.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: W S DA S
ADVOGADO: O D Da S N
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)





 

Sentença tipo B, registrada eletronicamente


EMENTA:- ADMINISTRATIVO. MILITAR. CABO DO EXÉRCITO. PROMOÇÃO À GRADUAÇÃO DE TERCEIRO SARGENTO. PRESCRIÇÃO DO FUNDO DO DIREITO. IMPROCEDÊNCIA.
-O alegado direito à promoção de Cabo para Terceiro-Sargento teria surgido em 04.07.1998 e só ter-se-ia concretizado em 01.06.1999, mas como esta ação só foi proposta em 17.12.2015,  tem-se por prescrita a pretensão para que se retifique a data de tal promoção, bem como a pretensão para que se condene a UNIÃO a pagar as respectivas diferenças remuneratórias do período de 04.07.1998 a 01.06.1999(art. 1º do Decreto nº 20.910, de 1932).
-Inaplicabilidade da Súmula 163 do extinto E. Tribunal Federal de Recursos e da Súmula 85 do E. Superior Tribunal de Justiça, por não se tratar de prestações de trato sucessivo para o futuro.
-Extinção,  com resolução do mérito.

Vistos, etc.


1. Relatório



W S DA S, qualificado na inicial, ajuizou em 17.12.2015, esta ação declaratória de retificação (do boletim interno do comando militar do nordeste) e cumulada com pedidos de ressarcimento do pagamento da diferença do soldo de Cabo e Terceiro-Sargento em face da UNIÃO. Requereu, inicialmente, os benefícios da justiça gratuita. Alegou, em síntese, que: a) foi Incorporado às Fileiras do Exército Brasileiro em 04.07.1983, posteriormente veio a ser transferido para outras Organizações Militares na mesma Guarnição de Recife; b) Em 01.10.1984, foi publicado a sua aprovação no Curso de Formação de Cabo - (CFC), a realizar-se no período de 24.10.1984 a 21.10.1984; c) concluiu o Curso com êxito, sendo promovido à graduação de Cabo no dia 03.06.1985; d) em 07.07.1992 foi publicado em Boletim Interno do 4º Batalhão de Polícia do Exército, no qual seu comportamento classificado de Ótimo para Excepcional; e) em 04.07.1993 foi reconhecido o direito a estabilidade, conforme a letra "a)", inc. IV, do art. 50 da Lei nº 6.880/80 (Estatuto dos Militares); f) em 04.07.1998 completou nas Fileiras do Exército Brasileiro 15 (quinze) anos de efetivo serviço prestado a Força, e se nessa data a administração tivesse cumprido o que preconiza o Decreto nº 86.289/81, em seu art. 2º, inciso I, o tempo de 15 (quinze) anos, ou mais, de efetivo serviço dentre os requisitos da graduação de Cabo para de Terceiro-Sargento do Quadro Especial, seria promovido, uma vez que preenchia todos os requisitos e em 04.07.1998, portanto, deveria ter sido promovido à graduação de Terceiro-Sargento, g) a devida promoção não ocorreu no momento próprio, mas apenas 01.06.1999, 11 (onze) meses depois, contrariando, assim, a eficácia da legislação da época, trazendo perdas e danos a sua remuneração; h) pleiteia a retificação do publicado no Boletim Interno nº 100, de 31.05.1999 do Comando Militar do Nordeste, do período de 01.06.1999, para que seja retroagido para 04.07.1998 e do pagamento das diferenças do soldo de Cabo para 3º Sargento do Quadro Especial, de 31.05.1999 que retroaja para 04.06.1998. Teceu outros comentários. Colacionou precedentes. Ao final, requereu "a procedência da presente Ação Declaratória de retificação (do boletim interno do comando militar do nordeste) acumulado com pedidos de ressarcimento (Condenação) do pagamento da diferença do soldo de cabo e terceiro-sargento da época, cumulada de ação declaratória em conexão com ação, constitutiva ou condenatória (STJ-BolAASP 1739/119).". Deu valor à causa. Instruiu a inicial com Instrumento de procuração e documentos.


Despacho (ID. 4058300.1596485) no qual foi deferido os benefícios da justiça gratuita e determinada a citação da UNIÃO.


A UNIÃO apresentou contestação (ID. 4058300.1754784). Em preliminar do mérito, arguiu a prescrição do fundo do direito e requereu a extinção do processo com resolução do mérito. No mérito, alegou que, dos dispositivos vigentes à época - ano 2000 - o tempo de serviço - 15 (quinze) anos - era apenas um dos vários requisitos necessários à efetivação da promoção; que a administração castrense - pública também - tem sua atuação adstrita ao princípio da legalidade, só podendo fazer aquilo que a lei ampara ou determina que se faça; se à época outros militares foram promovidos e não o Autor decorreu de uma ação discricionária de competência do Administrador do Exército Brasileiro. Ao final, pugnou pela improcedência dos pedidos.


A parte Autora apresentou réplica à contestação (ID. 4058300.1803578).


Vieram os autos conclusos.


É o relatório.
Passo a fundamentar e a decidir.



2. Fundamentação



2.1 - Prescrição do Fundo do Direito

O Autor é, atualmente, Segundo-Sargento da Reserva Remunerada do Exército Brasileiro, e pretende, em suma, que se retifique a data da sua promoção de Cabo para Terceiro Sargento de 01.06.1999 para 04.07.1998, bem como que se lhe paguem as diferenças desse período do posto de Cabo para Terceiro Sargento, com a devida atualização monetária.
A União, invocando o artigo 1° do Decreto nº 20.910/32, pugna pelo acolhimento da prescrição quinquenal do fundo do direito.


Quer se considere a data em que a noticiada promoção se deu, 01.06.1999, quer se considere a data em que, segundo a petição inicial, deveria ter ocorrido, 04.07.1998, tendo em vista que esta ação só foi proposta em 17.12.2015, tenho que ocorreu, à luz do art. 1º do Decreto nº 20.910, de 1932,  a invocada prescrição quinquenal do fundo do direito. 
Registro que não se aplica ao caso a Súmula 163 do extinto Tribunal Federal de Recursos, tampouco a Súmula 85 do Superior Tribunal de Justiça, porque o pleito não envolve prestações de trato sucessivo que se estendem para o futuro, mas sim parcelas enquadradas dentro do período de 04.07.1998 a 01.06.1999.


Aliás, quando essa matéria era da competência do C. Supremo Tribunal Federal, as duas Turmas dessa Colenda Corte tinham firme entendimento em tal sentido, cujas respectivas r. Decisões, mutatis mutandis, aplicam-se a este caso.


Eis a v. Decisão, unânime, da 1ª Turma dessa C. Corte, lançada em 06.05.1988:


"E M E N T A - Funcionário Público. Reenquadramento. Prescrição.
-Em se tratando de saber se o recorrido tem, ou não, direito a reenquadramento determinado pela lei estadual 3.640, de 05.01.1978, não há dúvida alguma de que a prescrição diz respeito à pretensão a essa situação funcional nova(e, portanto, ao denominado fundo de direito), e não apenas às prestações mensais que decorrem de situação funcional inquestionável e que não são pagas, ou o são, mas em quantum inferior ao devedor."


A 2ª Turma da mesma Colenda Corte, em v. Decisão de 02.09.1988, decidiu no mesmo sentido, verbis:


"EMENTA - Funcionalismo. Prescrição qüinqüenal. Requerida, em juízo, a vantagem funcional apenas após decorridos mais de cinco anos da data da legislação na qual se funda o pedido, sem que o funcionário tenha, anteriormente, exercitado sua pretensão, cabe reconhecer a prescrição do próprio fundo do direito e não das prestações. Art. 1º, Decreto-lei nº 20.910/32. RE conhecido e provido.".


Como as parcelas remuneratórias seriam meros acessórios daquele possível direito e se a pretensão ao gozo daquele direito se encontra fulminada pela prescrição, não há que se falar em aplicação das Súmulas 163 do extinto E. Tribunal Federal de Recursos e 85 do E. Superior Tribunal de Justiça, pois o que prescreveu foi a pretensão de pleitear o gozo da pretendida promoção a partir de 04.07.1998, data em que se iniciou a fluência do prazo prescricional, porque foi a partir dessa data que teria havido a alegada violação do direito (art. 189 do Código Civil).



2.2. Verba Sucumbencial



A parte Autora está em gozo do benefício conhecido por 'Justiça Gratuita'.


O Supremo Tribunal Federal - STF, no julgamento de três embargos de declaração, transformados em agravos regimentais, nos recursos extraordinários nºs 249.003, 249.277 e 284.729, firmou o entendimento de que, não obstante a imunidade veiculada no inciso LXXIV do art. 5º da Constituição da República, a condição suspensiva do art. 12 da Lei nº 1.060, de 1950, fora recepcionado por mencionada Carta, que obriga o Jurisdicionado em gozo de tal benefício a, no prazo de 5(cinco)anos, recolher as custas e pagar verba honorária, caso saia da situação de miserabilidade jurídica.


Eis o texto da decisão do Pleno da Suprema Corte, no RE 249.277/RS, tendo por Relator o Ministro Edson Fachin:


"Decisão: O Tribunal, por maioria, vencido o Ministro Marco Aurélio, recebeu os embargos de declaração como agravo regimental e a este, por unanimidade, deu provimento a fim de assentar a recepção do art. 12 da Lei nº 1.060/50, bem como determinar aos juízos de liquidação e de execução que observem o benefício da assistência judiciária gratuita deferido no curso da fase cognitiva, ficando as partes ora agravantes exoneradas de ônus sucumbenciais, nos termos do artigo recepcionado. Presidiu o julgamento o Ministro Ricardo Lewandowski. Plenário, 09.12.2015."[1]


Embora o art. 12 da Lei nº 1.060, de 1950, faça referência apenas às custas processuais, mencionado entendimento também se aplica aos honorários advocatícios, por força do texto do seu art. 7º ("Art. 7º. A parte contrária poderá, em qualquer fase da lide, requerer a revogação dos benefícios de assistência, desde que prove a inexistência ou o desaparecimento dos requisitos essenciais à sua concessão.").


Assim, sob a condição suspensiva e temporal do art. 12 da Lei nº 1.060, de 1950, o Autor deve ser condenado nas custas e em verba honorária, caso se implemente o evento dessa condição legal, no prazo de cinco anos, contados do trânsito em julgado desta sentença.


3. Dispositivo




Posto isso, acolho a exceção de prescrição do fundo do direito do pedido de Promoção de Cabo à Graduação de Terceiro Sargento, a partir de 04.07.1998, bem como a pretensão de percepção das diferenças de remuneração até 01.06.1999, e dou este processo por extinto, com resolução do mérito (art. 487, II do Código de Processo Civil), para todos os fins de direito



Como a parte Autora está em gozo do benefício da denominada Justiça Gratuita, a condeno nas custas e em verba honorária, que, tendo em vista o esforço e dedicação do(a) Advogado(a) da União, arbitro em 10% (dez por cento) do valor da causa, indicado na petição inicial, atualizado a partir do mês seguinte ao da propositura desta ação, pelos índices e forma fixados no manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal - CJF, ficando, todavia, a cobrança dessas verbas sucumbenciais, submetida às condições suspensiva e temporária do § 3º do art. 98 do CPC, aplicável ao presente caso, pelas razões indicadas no último subtópico da fundamentação supra.



Intimem-se.



No momento oportuno, dê-se baixa e arquive-se.




Recife, 30 de março de 2017.







Francisco Alves dos Santos Junior



Juiz Federal, 2ª Vara/PE

mef




[1] ATA Nº 37, de 09/12/2015. DJE nº 251, divulgado em 14/12/2015


No mesmo sentido, mesmo relator, no julgamento de idênticos embargos de declaração, relativamente ao RE 249.003/RS(disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1760105) e no RE 284.729(disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=1865697).


AUXÍLIO ALIMENTAÇÃO DO SERVIDOR PÚBLICO FEDERAL. NÃO ACUMULAÇÃO.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


O Servidor que acumula mais de um cargo, como não se alimenta tantas vezes quantos são os cargos acumulados, faz jus à percepção de um único auxílio alimentação, conforme a Legislação que trata do assunto. 

A sentença infra analisa essa matéria. 

Boa leitura. 

Obs.: pesquisa da legislação e da jurisprudência feita pela Assessora Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques.





PROCESSO Nº: 0806821-78.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: SINDICATO.../PE
ADVOGADO: R M F
RÉU: EMPRESA BRASILEIRA DE SERVICOS HOSPITALARES - EBSERH
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR
)

Sentença tipo A, registrada eletronicamente.

EMENTA. ADMINISTRATIVO. SERVIDOR PÚBLICO. ACUMULAÇÃO DE AUXÍLIO-ALIMENTAÇÃO. VEDAÇÃO LEGAL.  

-Há vedação legal à percepção de mais de um auxílio-alimentação(que tem natureza indenizatória)por servidor público da Administração Pública Federal, que ocupe, licitamente, mais de um cargo público.
-O Servidor não se alimenta tantas vezes quantos sejam os cargos acumulados, por isso tem que optar por qual dos Empregadores quer receber o auxílio alimentação.

-Improcedência.



Vistos, etc. 


1 - Relatório


O SINDICATO.../PE, qualificado na petição inicial, ajuizou esta "AÇÃO DE OBRIGAÇÃO DE NÃO FAZER COM PEDIDO DE TUTELA DE URGÊNCIA" em face da EMPRESA BRASILEIRA DE SERVICOS HOSPITALARES - EBSERH, objetivando a emissão de provimento jurisdicional para declarar a possibilidade de os substituídos processuais, servidores da Requerida,  permanecerem usufruindo de todos os direitos, sobretudo do auxílio alimentação, quando estiverem acumulando  cargos, nos ditames previstos na Constituição Federal e da legislação, nos termos da fundamentação; bem como para "determinar que, em qualquer hipótese de análise de acumulação de cargos, seja respeitado o devido processo legal, no sentido de possibilitar que os substituídos demonstrem a compatibilidade de horários e os demais requisitos legais para manutenção dos vínculos". Aduziu a entidade sindical autora, em síntese: a) teria a EBSERH, pelo Memorando Circular nº 0275/2016/DIVGPQHC-PE, determinado a opção pelo recebimento do auxílio-alimentação a ser pago pela empresa pública ou por outro órgão público aos empregados públicos que acumulam, licitamente, cargos na forma da Constituição, nos termos da Orientação Normativa nº 5, de 09 de agosto de 2005, do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, para evitar a duplicidade na percepção do benefício; b) deveriam os substituídos que acumulam cargos, independente da vinculação do empregado, sendo este empregado só da EBSERH ou de outro Órgão, optar pela percepção de um dos auxílios-alimentação; c) todavia, existindo compatibilidade de horário, situação que se enquadraria nas hipóteses do art.37, XVI, da Constituição Federal, e havendo o exercício de dois cargos ou empregos privativos de profissionais de saúde, com profissões regulamentadas, deveria ser mantida a acumulação e permitida a contratação com todos os benefícios inerentes aos cargos, incluindo-se o auxílio-alimentação; d) não poderia a Administração criar restrições ao permissivo constitucional; e) por ser a acumulação de cargos públicos, na área de saúde, admitida pela Constituição e pela legislação infraconstitucional, não poderia a Ré impor a restrição de direitos aos empregados ao determinar que fizessem a opção pela percepção do auxílio-alimentação de um dos 2(dois) vínculos com a Administração Pública, seja ele remunerado pelo Erário Federal, Estadual ou Municipal. Teceu outros comentários. Protestou, ao final, pela concessão da tutela de urgência. Juntou documentos.

Exarado r. despacho determinando a distribuição por dependência ao processo nº 0803359-16.2016.4.05.8300, em face da pretensa conexão entre os feitos.

Diante do previsto no art. 2º da Lei nº 8.437/92  foi determinada a oitiva da Requerida acerca da tutela provisória de urgência.

A EBSERH manifestou-se acerca do pedido de tutela provisória de urgência (Id. 4058300.2420148). Aduziu, em síntese, que: o Sindicato autor não teria demonstrado os elementos necessários à concessão da tutela provisória de urgência, porque se trataria de pretensão juridicamente impossível, nos termos do §5º do art. 22 da Lei nº 8.460/1992; a EBSERH, por se tratar de uma empresa pública federal, estaria sujeita às determinações do Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão, dentre os quais a Orientação Normativa n. 05/2005/SRH/MPOG da Secretaria de Recursos Humanos do Ministério do Planejamento; a vedação à percepção de dois auxílios-alimentação também seria uma determinação do Tribunal de Contas da União; na hipótese de acúmulo lícito de cargos ou funções públicos, o servidor faria jus à percepção de auxílio-alimentação em relação apenas a um vínculo em decorrência do caráter indenizatório do benefício. Teceu outros comentários. Transcreveu jurisprudência. Pugnou, ao final, pelo indeferimento do pedido de tutela provisória de urgência. Juntou documentos.

Decisão interlocutória, sob identificador 4058300.2445646,  arbitrando para a causa o valor de R$ 1.000,00, nos termos do art. 292, §3º, do CPC;  indeferindo a tutela de urgência quanto ao pedido de percepção acumulada do auxílio-alimentação;  e, no que se refere ao pleito para manutenção dos vínculos ante a demonstração de compatibilidade de horários, por se tratar de pedido litispendente com relação ao processo n. 0803359-16.2016.4.05.8300, extinguindo o processo sem resolução do mérito.

Certidão cartorária retificando o valor da causa para R$ 1.000,00 conforme decisão acima mencionada.

A EMPRESA BRASILEIRA DE SERVIÇOS HOSPITALARES - EBSERH apresentou Contestação, aduzindo, inicialmente, que a possibilidade de acumulação de cargos pelos servidores que possuem mais de um vínculo com a Administração, mas em jornada excessiva, enquadrados nas hipóteses do parecer nº GQ-145, da Advocacia Geral da União, cumpre ressaltar que a matéria será tratada nos autos do processo nº 0800290-49.2016.4.05.8308, que tramita nesta vara federal, do qual este processo é dependente. No mérito, alegou, em síntese, que o auxílio-alimentação constituiria verba de caráter indenizatório que objetivaria compensar o gasto do trabalhador (empregado, servidor ou funcionário) com suas refeições, e não guardaria relação com a quantidade de cargos ou funções desempenhadas, mas somente com a pessoa do servidor; o montante recebido a esse título seria suficiente para compensar o gasto do servidor com suas refeições, pelo que a manutenção de dois vínculos com a Administração não faria com que fosse devido aos servidores o pagamento em dobro do auxílio-alimentação, e quanto a isso seria expresso o art. 22, §§2º e 5º da Lei nº 8.460/92; na hipótese de acúmulo lícito de cargos ou funções públicas, o servidor faria jus à percepção de auxílio-alimentação em relação apenas a um vínculo, em decorrência do caráter indenizatório do benefício. Teceu outros comentários, e requereu a improcedência dos pedidos e a condenação da parte autora nas verbas de sucumbência.

O SINDICATO DOS SERVIDORES PÚBLICOS FEDERAIS PERNAMBUCO informou a interposição do recurso de agravo de instrumento em face da r. decisão que indeferiu o pedido de tutela de urgência, e requereu a reconsideração da mencionada decisão.

Proferi despacho mantendo a r. decisão agravada por seus próprios e jurídicos fundamentos.

A parte autora apresentou Réplica à Contestação.

É o relatório.
Passo a fundamentar e a decidir.





2 - Fundamentação


2.1. No que se refere ao pedido para manutenção dos vínculos ante a demonstração de compatibilidade de horários, foi proferida r. decisão pelo MM Juiz Federal, Dr. Isaac Batista de Carvalho Neto, quanto atuava nesta 2ª Vara Federal/PE na condição de Juiz Auxiliar, sob identificador nº 4058300.2445646, reconhecendo a litispendência entre esta ação e a ação,  PJE nº 0803359-16.2016.4.05.8300, que se processa nesta 2ª Vara Federal/PE, indeferiu esse pleito de plano e, quanto a ele, deu este processo por extinto, sem resolução do mérito.  

Portanto, com relação a mencionado pleito, nada mais há a decidir.


2.2. O Sindicato-Autor requer seja declarada a possibilidade de os substituídos processuais, que fazem parte da categoria profissional que representa,  permanecerem usufruindo todos os direitos, sobretudo tantos auxílios alimentação quantos sejam os cargos acumulados.
Normalmente, um Servidor, pelo problema do horário máximo de trabalho, consegue acumular dois cargos.
A adotar-se a tese do Sindicato autor, nessa situação, o Servidor também teria direito de comer em dobro.
Essa pretensão, além de ser contrária à natureza das coisas, é expressamente vedada na Legislação que trata do assunto.

Com efeito, o auxílio-alimentação foi criado pela Lei nº 8.460/92, com redação superveniente dada pela Lei nº 9.527/97, que assim dispõe:

"Art. 22. O Poder Executivo disporá sobre a concessão mensal do auxílio-alimentação por dia trabalhado, aos servidores públicos federais civis ativos da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional. 

 § 1º A concessão do auxílio-alimentação será feita em pecúnia e terá caráter indenizatório. 

 § 2º O servidor que acumule cargo ou emprego na forma da Constituição fará jus a percepção de um único auxílio-alimentação, mediante opção. 

 § 3º O auxílio-alimentação não será: 

 a) incorporado ao vencimento, remuneração, provento ou pensão;  

 b) configurado como rendimento tributável e nem sofrerá incidência de contribuição para o Plano de Seguridade Social do servidor público; 

 c) caracterizado como salário-utilidade ou prestação salarial in natura

 § 4º O auxílio-alimentação será custeado com recursos do órgão ou entidade em que o servidor estiver em exercício, ressalvado o direito de opção pelo órgão ou entidade de origem. 

 § 5º O auxílio-alimentação é inacumulável com outros de espécie semelhante, tais como auxílio para a cesta básica ou vantagem pessoal originária de qualquer forma de auxílio ou benefício alimentação.

§ 6º Considerar-se-á para o desconto do auxílio-alimentação, por dia não trabalhado, a proporcionalidade de 22 dias. 

 § 7º Para os efeitos deste artigo, considera-se como dia trabalhado a participação do servidor em programa de treinamento regularmente instituído, conferências, congressos, treinamentos, ou outros eventos similares, sem deslocamento da sede. 

 § 8º As diárias sofrerão desconto correspondente ao auxílio-alimentação a que fizer jus o servidor, exceto aquelas eventualmente pagas em finais de semana e feriados, observada a proporcionalidade prevista no § 6º." 

O Decreto nº 3.887/2001 regulamentou o pagamento do auxílio-alimentação, nos seguintes termos:
"Art. 1º  O auxílio-alimentação será concedido a todos os servidores civis ativos da Administração Pública Federal direta, autárquica e fundacional, independentemente da jornada de trabalho, desde que efetivamente em exercício nas atividades do cargo.


§ 1º  O auxílio-alimentação destina-se a subsidiar as despesas com a refeição do servidor, sendo-lhe pago diretamente.

§ 2º  O servidor fará jus ao auxílio-alimentação na proporção dos dias trabalhados, salvo na hipótese de afastamento a serviço com percepção de diárias.

Art. 2º  O auxílio-alimentação será concedido em pecúnia e terá caráter indenizatório.

Art. 3º  Ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão caberá fixar o valor mensal do auxílio-alimentação, observadas as diferenças de custo por unidade da federação.

Parágrafo único.  O servidor que acumule cargos na forma da Constituição fará jus à percepção de um único auxílio-alimentação, mediante opção.

(...)."

Do exposto, tem-se que o auxílio-alimentação constitui verba de caráter indenizatório, devida aos servidores públicos federais ativos, e destinada a subsidiar as suas despesas com refeições.

Extrai-se facilmente das regras dos § § 4º e 5º do art. 22 da Lei nº 8.460/92, com redação superveniente dada pela Lei nº 9.527/97, c/c o Parágrafo Único do art. 3º do Decreto nº 3.887/2001, que o Servidor, em acúmulo de cargo, deve optar por qual dos Empregadores pretende continuar recebendo o valor do auxílio alimentação, sendo, pois, a acumulação vedada.
E assim é, porque o Servidor não come tantas vezes quantas sejam as suas relações de trabalho.

2.3 - No que diz respeito à verba honorária, em face do minúsculo valor da causa e da necessidade de não dar ao Advogado vencedor tratamento constrangedor, deve ser fixada em valor razoável, observando-se as diretrizes dos §§ 2º e 8º do art. 85 do NCPC. Noto que os Procuradores da Parte Requerida desenvolveram trabalho de boa qualidade, do qual se extrai que dedicaram à tarefa muito esforço, dedicação e um bom tempo de pesquisa, pelo que a verba honorária deve ser em valor fixo, em montante que prestigie essa prática.




3 - Conclusão


Posto ISSO: julgo improcedentes os pedidos formulados na petição inicial (CPC, art. 487, I) e condeno o Sindicator autor nas custas judiciais e em verba honorária, que, à luz dos §§ 2º e 8º do art. 85 do NCPC,  arbitro em R$ 5.000,00 (cinco mil reais), corrigidos monetariamente a partir do mês seguinte ao da publicação desta sentença, pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal - CJF, observada as regras da Lei nº 11.960, de 2009, mais juros de mora, à razão de 0,5% (meio por cento) ao mês, incidentes a partir da data do trânsito em julgado desta sentença ou de acórdão que a mantenha(§16 do art. 85 do CPC), sobre o valor já monetariamente corrigido.
Remeta-se cópia desta sentença para os autos do noticiado agravo de instrumento aos cuidados do respectivo d. Relator, para os fins de direito.


R. I.


Recife, 30 de março de 2017.


Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara Federal/PE

(r.m.c)


quarta-feira, 29 de março de 2017

NÃO INCIDEM JUROS COMPENSATÓRIOS, NEM DE MORA, NOS REPASSES TRIBUTÁRIOS CONSTITUCIONAIS DA UNIÃO PARA OS MUNICÍPIOS.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior.

Na sentença que segue são discutidos interessantes assuntos de direito constitucional e financeiro, no que diz respeito aos repasses tributários da UNIÃO para os Municípios. 

Sentença pesquisada e minutada pela Assessora Luciana Simoes Correa de Albuquerque

Boa leitura. 


PROCESSO Nº: 0801081-42.2016.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: MUNICIPIO DE INAJA
ADVOGADO: B R P M
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)


Sentença tipo A, registrada eletronicamente.

EMENTA: - DIREITO CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO


Não incide juros de mora, que tem natureza indenizatória, quando a União repassa para o mencionado Fundo as parcelas previstas nas alíneas 'd' e 'e' do inciso I do art. 159 da vigente Constituição da República dentro dos prazos fixados nesses dispositivos constitucionais.
Outrossim, não há que se falar em juros compensatórios, por falta de expressa previsão legal.

Improcedência.


Vistos, etc.

1. Breve Relatório

O MUNICÍPIO DE INAJÁ/PE, devidamente qualificado na inicial, propôs esta ação ordinária, com pedido de liminar inaudita altera parte, em face da UNIÃO (FAZENDA NACIONAL). Alegou, em síntese, que: a) o Fundo de Participação dos Municípios, como uma das modalidades de transferências de recursos financeiros da União para os Municípios, está previsto no art. 159, inciso I, alíneas "b", "d" e "e" da Constituição Federal; b) a partir da entrada em vigor das Emendas Constitucionais nº 55/2007 e 84/2014, o repasse ao Fundo de Participação dos Municípios deveria ser de 24,5% do produto da arrecadação dos impostos federais sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados; c) deste percentual, ser 1% entregue no primeiro decênio do mês de dezembro de cada ano e 1% no primeiro decênio do mês de julho de cada ano, sendo os demais 22,5% entregues mês a mês; d) o valor correspondente aos 22,5% da arrecadação líquida do IR e do IPI é repassado pelo Banco do Brasil nas contas correntes dos Municípios, de acordo com os valores que lhes cabem; e) com relação ao percentual de 2% da mesma arrecadação, a Secretaria do Tesouro Nacional credita numa conta específica do SIAFI, quantias que vão sendo acumuladas pelo período de um ano, quando então, são distribuídos no primeiro decêndio do mês de julho e depois no primeiro decêndio de dezembro; f) os mencionados 2% seriam depositados e acumulados e renderiam juros na Conta Única da União e só seriam entregues no ano seguinte até o repasse ao FPM; g) quando o repasse dos 2% é feito, a União teria apenas repassado o valor do principal sem o acréscimo dos juros ocorridos no período; h) os juros que seriam gerados sobre os valores dos 2% e depositados na conta da União, deveriam ser repassados aos Municípios e não terem sido apropriados pela União. Fundamentou sua pretensão com base na legislação pátria, juntou documentos e ao final requereu:
    "a) LIMINARMENTE, a concessão da medida antecipatória INAUDITA ALTERA PARTE, diante da presença dos requisitos autorizadores da medida, a saber, a prova inequívoca, a verossimilhança da alegação e o fundado receio de dano irreparável ou de difícil reparação, todos comprovados no bojo desta petição, para determinar que a Ré repasse as próximas cotas-extras do FPM relativas aos 2% (dois por cento) da arrecadação de IR e IPI acumulados durante todo o ano e a serem entregues apenas em 10 de julho (art. 159, I, 'e', CF/88 - 1%) e 10 de dezembro (art. 159, I, 'd', CF/88 - 1%) conjuntamente com os juros e que incidiram sobre os respectivos valores no período entre a efetiva arrecadação e seu repasse, vedando que a mesma se aproprie dos mesmos, notificando-se o SECRETÁRIO DO TESOURO NACIONAL e o SECRETÁRIO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL para cumprimento da decisão, determinando-se ainda que seja comprovado contabilmente o cumprimento da tutela antecipada, sob pena de multa diária não inferior a R$ 5.000,00 (cinco mil reais) e as demais cominações legais cabíveis;
     b) que seja citada a União, na pessoa de seu representante legal na Fazenda Nacional, no prazo da Lei, para responder aos termos da presente ação;
    c) que a Fazenda Nacional seja notificada para que  proceda  com  o  registro  contábil,  financeiro e orçamentário dos juros pagos pelo Banco Central junto com o valor do principal (2% do valor de IR e IPI arrecadado no período), a fim de evitar que a União disponha dos referidos valores;
     d) no mérito seja julgado procedente o pedido formulado nesta ação, confirmando-se a tutela antecipada, para determinar que a União repasse as cotas-extras do FPM relativas aos 2% (dois por cento) da arrecadação de IR e IPI acumulados durante todo o ano e a serem entregues apenas em 10 de julho (art. 159, I, 'e', CF/88 - 1%) e 10 de dezembro (art. 159, I, 'd', CF/88 - 1%) conjuntamente com os juros pagos pelo Banco Central do Brasil e que incidiram sobre os respectivos valores no período entre a efetiva arrecadação e seu repasse, vedando que a mesma se aproprie dos mesmos;
    e) por se tratar de desconstituição de ato administrativo-financeiro realizado unilateralmente pela União, dispensa-se a expedição de precatório, do que se requer seja autorizada a devolução da quantia não repassada à conta do Município Autor, a ser depositada neste juízo em favor da Municipalidade.
    f) o pagamento, pela União, da correção monetária e juros, pela TAXA SELIC, das verbas não repassadas nos últimos 5 (cinco) anos;
    g) que seja condenada a União nas custas e honorários advocatícios no percentual de 20% (vinte por cento) sobre o valor da condenação."
Decisão exarada em 24/02/2016, indeferindo o pleito antecipatório (Id. 4058300.1724227).
A União apresentou Contestação (Id. 4058300.1847893). Defendeu a ausência de interesse processual do pedido no que tange ao 2% do produto de arrecadação do produto da arrecadação do IR e do IPI creditado ao FPM no mês de dezembro de cada ano retroativo a 05 anos anteriores ao ajuizamento da ação, uma vez que tal obrigação de receita só teria passado a existir a partir da Emenda Constitucional n. 84. Defendeu, ainda, que o prazo prescricional previsto para o caso em análise seria de três anos. No mérito, alegou, em apertada síntese, inexistência de previsões constitucional, legal e infralegal no que se refere ao repasse com tais acréscimos de juros, como pretendido. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela decretação de improcedência dos pedidos.
Réplica apresentada em 19/05/2016 ( Id. 4058300.1985837), reiterando os termos da Inicial e rebatendo os argumentos da defesa.
 É o relatório, no essencial.

2. Fundamentação

2.1. Da ausência de interesse processual em relação à parte do pedido.

Suscitou a União a preliminar de ausência de interesse processual no que tange ao 1% do produto da arrecadação do IR e do IPI creditado ao FPM no primeiro decênio de julho de cada ano retroativo a 5 anos anteriores ao ajuizamento da ação.
Isso porque, tal obrigação de transferência de receita só teria passado a existir a partir da Emenda Constitucional nº 84, de 02 de dezembro de 2014, ou seja, eventual condenação não poderia retroagir a 5 anos do ajuizamento da ação no que tange a essa parcela.
Com parcial razão a UNIÃO, pois, se procedente o pleito, as parcelas previstas na aínea 'e' do inciso I do art. 159 da vigente Constituição da República só poderá retroagir a partir da entrada em vigor da Emenda Constitucional nº 84, que é de 2014, Emenda essa que introduziu mencionada alínea no referido inciso I do indicado artigo constitucional.

2.2. Da prescrição

Alegou, ainda, a União não se aplicar, ao presente caso, a prescrição qüinqüenal prevista no Decreto nº 20.910/1932, aduzindo ser aplicável a prescrição trienal, normatizada no art. 206, § 3º do Código Civil, sob o argumento de não estar o demandante buscando o cumprimento de uma obrigação principal da União, mas sim a pretensa imposição acessória referente a eventuais juros incidentes entre a arrecadação e o repasse.
Contudo, é de ver-se que o Decreto nº 20.910/1932 não faz distinção sobre a sua aplicação se dar apenas em relação às obrigações principais atinentes à União. Ao contrário, a referida norma estabelece que a prescrição qüinqüenal deve ser aplicada a quaisquer dívidas da União, seja qual for a sua natureza.Confira-se:
"Art. 1º As dívidas passivas da União, dos Estados e dos Municípios, bem assim todo e qualquer direito ou ação contra a Fazenda federal, estadual ou municipal, seja qual for a sua natureza, prescrevem em cinco anos contados da data do ato ou fato do qual se originarem".
Ante tais considerações, aplicável, ao caso concreto, a norma do art. 1º do Decreto nº 20.910/1932.

2.3. Do julgamento antecipado

Julgo este feito antecipadamente, por não divisar necessidade de dilação probatória(art. 355, I, do novo Código de Processo Civil). 
Pretende o Município-autor que a União seja obrigada a incluir juros de mora, contados da data da arrecadação até a data do repasse, relativamente às verbas indicadas nas alíneas 'd' e 'e' do inciso I do art. 159 da vigente Constituição da República.
Sustenta o autor correrem juros entre a arrecadação e o repasse de tais percentuais, isto é, durante o tempo que o numerário permanece na conta única do Tesouro Nacional, na forma da MP 2179-36/2001, não sendo, contudo, repassados pela União ao FPM, mas tão somente o valor do principal, apropriando-se a União indevidamente dos valores correspondentes.
Dispõe a Constituição Federal, em seu artigo 159:
"Art. 159. A União entregará:
I - do produto da arrecadação dos impostos sobre renda e proventos de qualquer natureza e sobre produtos industrializados, 49% (quarenta e nove por cento), na seguinte forma: (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 84, de 2014)
a) [...];
b) vinte e dois inteiros e cinco décimos por cento ao Fundo de Participação dos Municípios;
c) [...];
d) um por cento ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decêndio do mês de dezembro de cada ano; (Incluído pela Emenda Constitucional n.º 55, de 2007)
e) 1% (um por cento) ao Fundo de Participação dos Municípios, que será entregue no primeiro decêndio do mês de julho de cada ano;" (Incluída pela Emenda Constitucional n.º 84, de 2014)".
No que tange à periodicidade dos referidos repasses, na regulamentação dos dispositivos constitucionais, estabeleceu-se que a cada decêndio seriam repassados os valores referentes aos 22,5% devidos ao FPM, conforme sistemática instituída pela Lei Complementar n.º 62/1989, cujo art. 4.º prescreve:
"Art. 4°. A União observará, a partir de março de 1990, os seguintes prazos máximos na entrega, através de créditos em contas individuais dos Estados e Municípios, dos recursos do Fundo de Participação:
I - recursos arrecadados do primeiro ao décimo dia de cada mês: até o vigésimo dia;
II - recursos arrecadados do décimo primeiro ao vigésimo dia de cada mês: até o trigésimo dia;
III - recursos arrecadados do vigésimo primeiro dia ao final de cada mês: até o décimo dia do mês subseqüente."
Já no tocante aos valores adicionais estabelecidos nas alíneas "d)" e "e)" do inciso I do art. 159 da CF/88, o próprio dispositivo constitucional estabelece as datas em que devem ser feitos os repasses, quais sejam, o primeiro decêndio de dezembro e de julho de cada ano, respectivamente.
Questiona-se, no caso, se são devidos juros pela União no repasse dos valores devidos ao FPM, bem como se os juros são devidos mesmo que os repasses sejam realizados dentro dos prazos estabelecidos na Constituição Federal e nas leis de regência.
É sabido que a doutrina jurídica classifica os juros, quanto ao seu fundamento, em juros moratórios e juros remuneratórios. Os primeiros têm natureza indenizatória, pois decorrem de crédito em face do não pagamento efetuado no tempo oportuno. O segundos, também chamados de compensatórios, são aqueles devidos ao credor com objetivo de remunerar o empréstimo do capital. Têm natureza distinta dos juros moratórios (devidos pela inadimplência) e podem ser classificados em convencionais (taxas pactuadas) e legais (taxas previstas em lei).
O Município autor fundamenta seu pedido no argumento de que os valores que lhe são repassados permanecem, durante certo período, depositados em conta da União e que, por isso, rendem juros pagos pelo Banco Central, nos termos da Medida Provisória n.º 2.179-36/2001.
Tal MP, que rege as relações financeiras entre a UNIÃO e o Banco Central do Brasil, estabelece o seguinte:
"Art. 1º.  As disponibilidades de caixa da União depositadas no Banco Central do Brasil serão remuneradas, a partir de 18 de janeiro de 1999, pela taxa média aritmética ponderada da rentabilidade intrínseca dos títulos da Dívida Pública Mobiliária Federal interna de emissão do Tesouro Nacional em poder do Banco Central do Brasil".
Observa-se, da norma transcrita, que se trata de relação obrigacional estabelecida entre o Tesouro Nacional (UNIÃO) e o Banco Central do Brasil, em que se estabelece a remuneração do capital da União que esteja depositado na referida autarquia.
Note-se, contudo, que tal previsão normativa não abrange terceiros com quem referidas pessoas jurídicas tenham obrigações de qualquer natureza. Não existe, de fato, fundamento normativo para, com base em tal regra jurídica - que estabelece obrigações financeiras entre o BACEN e a UNIÃO - o município em tela pleitear que lhe sejam pagos juros no repasse de sua cota do FPM.
Assim, não há como se obrigar a União a pagar juros, muito menos de mora, pois a União, na medida em que realiza o repasse de valores ao FPM dentro dos prazos constitucionais e legais, não está sendo impontual com sua obrigação.
Conforme estabelece a Lei Complementar n.º 62/1989:
"Art. 4° A União observará, a partir de março de 1990, os seguintes prazos máximos na entrega, através de créditos em contas individuais dos Estados e Municípios, dos recursos do Fundo de Participação:
I - recursos arrecadados do primeiro ao décimo dia de cada mês: até o vigésimo dia;
II - recursos arrecadados do décimo primeiro ao vigésimo dia de cada mês: até o trigésimo dia;
III - recursos arrecadados do vigésimo primeiro dia ao final de cada mês: até o décimo dia do mês subseqüente.
§ 1º [...]
§ 2° Ficam sujeitos à correção monetária, com base na variação do Bônus do Tesouro Nacional Fiscal, os recursos não liberados nos prazos previstos neste artigo."
O dispositivo em destaque é claro no sentido de que apenas é devida a correção monetária quando os recursos do FPM e do FPE não são liberados nos prazos previstos na lei. Ora, se no pagamento pontual não há sequer a obrigação de pagar a correção monetária, menos razões existem para o pagamento de juros.
De outro vértice, tampouco são devidos juros remuneratórios, pois a União não está empregando capital do município que lhe esteja emprestado ou esteja em seu poder. Não se configura hipótese de compensação pelo emprego de capital alheio.
Como acertadamente aduziu a União, na sua defesa, o Legislador da Constituição Federal, por imposição do pacto federativo e aberta à necessidade de fortalecimento político e financeiro dos entes federados menores, consciente da ainda existente centralização econômica no ente federado maior, previu um sistema de repartição de receitas na Seção VI do Capítulo I do seu Título VI, nominado "DA REPARTIÇÃO DAS RECEITAS TRIBUTÁRIAS". Previu, pois, hipóteses em que parte da arrecadação de tributos das competências tributárias dos entes maiores seriam repartidas com os entes menores, criando, notadamente, duas espécies de repartição.
Na primeira espécie, a Constituição estabeleceu hipóteses em que as receitas, embora decorram de tributos da competência do ente maior, "pertencem" ao ente menor, desde a arrecadação. São as hipóteses dos art. 157 e 158 da CF, este último relativo aos municípios. Confiram-se:
"Art. 157. Pertencem aos Estados e ao Distrito Federal:
I - o produto da arrecadação do imposto da União sobre renda e proventos de qualquer natureza, incidente na fonte, sobre rendimentos pagos, a qualquer título, por eles, suas autarquias e pelas fundações que instituírem e mantiverem;
II - vinte por cento do produto da arrecadação do imposto que a União instituir no exercício da competência que lhe é atribuída pelo art. 154, I.
Art. 158. Pertencem aos Municípios:
I - o produto da arrecadação do imposto da União sobre renda e proventos de qualquer natureza, incidente na fonte, sobre rendimentos pagos, a qualquer título, por eles, suas autarquias e pelas fundações que instituírem e mantiverem;
II - cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto da União sobre a propriedade territorial rural, relativamente aos imóveis neles situados, cabendo a totalidade na hipótese da opção a que se refere o art. 153, § 4º, III; (Redação dada pela Emenda Constitucional n.º 42, de 19.12.2003)
III - cinqüenta por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre a propriedade de veículos automotores licenciados em seus territórios;
IV - vinte e cinco por cento do produto da arrecadação do imposto do Estado sobre operações relativas à circulação de mercadorias e sobre prestações de serviços de transporte interestadual e intermunicipal e de comunicação.
Parágrafo único. As parcelas de receita pertencentes aos Municípios, mencionadas no inciso IV, serão creditadas conforme os seguintes critérios:
I - três quartos, no mínimo, na proporção do valor adicionado nas operações relativas à circulação de mercadorias e nas prestações de serviços, realizadas em seus territórios;
II - até um quarto, de acordo com o que dispuser lei estadual ou, no caso dos Territórios, lei federal."
Em tais situações, o produto da arrecadação já pertence ao ente menor desde a sua origem. Tal, evidentemente, não é o caso dos autos.
A segunda hipótese de repartição de receitas se dá na forma de "transferências tributárias", caso vertente. Nessas, o produto da arrecadação pertence ao ente maior, detentor da competência tributária (para instituir o tributo) e da sujeição tributária ativa (competência para exigir e arrecadar o tributo). Porém, a Constituição estabeleceu uma obrigação de transferir parcela do produto da arrecadação ao ente menor; criou, assim, uma obrigação pública de dar quantia certa do ente maior para o ente menor, correspondente a um percentual daquela arrecadação.
Logo, ao invés de o constituinte usar a expressão "pertencem", como nos arts. 157 e 158, usou a expressão "A União entregará" (art. 159, caput, da CF/1988). Nesse último caso, as importâncias só passam ao domínio do ente menor quando são transferidas pelo ente maior.
Desse modo, o município só vem a ser o titular do dinheiro com o repasse nas datas estabelecidas na Constituição. As verbas passam a lhe pertencer apenas, no que concerne ao que é discutido nos autos, passado o primeiro decênio de julho quanto ao primeiro 1% e passado o primeiro decênio de dezembro quanto ao outro 1%.
Não há dúvida, por outro lado, de que o dinheiro é bem móvel fungível, que, como tal, somente tem sua propriedade transferida com a tradição (art. 1.267 do Código Civil).
No caso das receitas de IR e IPI, tem-se que se tratam de tributos de titularidade da União, nos termos do art. 153, III e IV, da Lei Maior. Assim, a competência tributária e a capacidade tributária ativa são atribuídas à União.
O fato de a Constituição Federal prever com rigor a obrigação de repasse de parte da arrecadação de tais impostos aos demais entes políticos internos não significa que a propriedade do produto da arrecadação seja já dos municípios ou dos Estados no momento em que ocorre. O rigor da norma constitucional apenas indica que a União está adstrita à determinação de realizar inexoravelmente a transferência.
Portanto, a titularidade dos valores em apreço é da União, até que sejam entregues aos Estados e municípios. Tanto é assim, que cabe a ela cobrar judicialmente tais valores de IR e IPI. Não é o município ou o Estado, mas sim a UNIÃO, quem, em nome próprio, executa as dívidas de referidos tributos contra os contribuintes inadimplentes.
Desse modo, por não estar se valendo de capital alheio, também não cabe falar em juros remuneratórios. Não se trata de capital que a União tenha obtido por meio de mútuo, tampouco de dinheiro de outrem que esteja em seu poder.
Para ilustrar o entendimento ora adotado, confira-se o precedente que se segue:
CONSTITUCIONAL. TRIBUTÁRIO. FUNDO DE PARTICIPAÇÃO DOS MUNICÍPIOS. REPASSE. JUROS INCIDENTES SOBRE OS VALORES ACUMULADOS NA CONTA ÚNICA DA UNIÃO (CTU). ACESSÓRIO QUE SEGUE O PRINCIPAL DE TITULARIDADE DA UNIÃO. INCABIMENTO DE REPASSE DO ACRÉSCIMO PARA O ENTE MUNICIPAL.
1. Apelação de sentença que julgou improcedente o pedido formulado na inicial, não reconhecendo o Município autor como titular dos juros incidentes sobre os valores acumulados na Conta Única da União (CTU), que serão repassados, posteriormente, ao Fundo de Participação dos Municípios, nos termos do art. 159, I, "d" e "e", da Constituição Federal de 1988.
2. Em suas razões, o Município repisa sua tese de que faz jus ao repasse das cotas-extras do Fundo de Participação dos Municípios, relativas aos 2% (dois por cento) da arrecadação de IR e IPI acumulados durante todo o ano e a lhes serem entregues apenas em 10 de julho (art. 159, I, "e", CF/88 - 1%) e 10 de dezembro (art. 159, I, "d", CF/88 - 1%), acrescidas dos juros pagos pelo Banco Central do Brasil. Destaca que a principal fonte de receitas destinada aos Municípios advém do Fundo de Participação dos Municípios - FPM e aponta violação ao princípio federativo. Destaca a existência de vinculação entre União e a Secretaria do Tesouro Nacional, defendendo a tese de que não existe uma permissibilidade para que a União se aproprie desses valores principais, muito menos dos acessórios, ou seja, os juros.
3. O Fundo de Participação dos Municípios configura uma das sistemáticas constitucionais de repartição de receitas tributárias entre os entes federados. Referido Fundo, segundo preceitua o art. 159, inciso I, da CF/88, é constituído do percentual de 22,5% do produto da arrecadação dos impostos sobre a renda e proventos de qualquer natureza (IR) e sobre produtos industrializados (IPI), acrescido de 1% incluído pela Emenda Constitucional nº 55/2007, que será entregue no primeiro decênio do mês de dezembro de cada ano, totalizando o percentual de 23,5%. Trata-se, portanto, de um mecanismo de repartição, cuja finalidade é transferir parte do produto da arrecadação de impostos que, originariamente, segundo a competência tributária, pertenceriam à União.
4. Nesse diapasão, em que pese a União estar adstrita ao referido repasse do FPM, dentro dos prazos constitucionais e legais estabelecidos, prevalece o entendimento de que a quantia a ser repassada não pertence, desde sempre, ao Município, mas, ao revés, apenas pertencerá quando ocorrer o efetivo repasse. Assim, apenas o fato de incidirem juros compensatórios (pagos pelo Banco Central) sobre os valores depositados em conta da União (aí incluída a parcela que será repassada para o Município), não justifica o pretendido incremento do valor repassado, em que pese a grande importância do FPM como fonte de receitas do Município. 
5. Não há que entender os referidos juros como acessório dos valores repassados, posto que o principal ao qual os mesmos se atrelam, como visto, pertencem a União, na medida em que a relação obrigacional de remuneração do capital foi estabelecida entre o Tesouro Nacional e o Banco Central do Brasil, por força da MP n.º 2.179-36/2001, de maneira que tal comando não abrange terceiros com quem referidas pessoas jurídicas tenham obrigações de qualquer natureza. Daí a permissibilidade para que a União se aproprie dos acessórios (juros) que seguem os valores principais que integram originariamente (produto da arrecadação de impostos) a receita da União.
6.  No caso, não há lastro legal para o pleito do Município apelante, dado que o referido acessório (juros), ao ser implementado/acrescido, pertencerá à União, proprietária da quantia depositada (principal) à época da constituição dos mesmos. Ademais, não há que se falar em juros moratórios, posto que não se trata de hipótese de impontualidade de pagamento de obrigação. Nem se cogita de violação ao princípio federativo. No mesmo sentido, julgados deste Regional: AC/PE, Processo: 08080804520154058300, Data do Julgamento: 10/07/2016, Primeira Turma, Relator: Desembargador Federal Manoel Erhardt; AG/SE, Processo: 08008118620164050000, Data do Julgamento: 25/07/2016, Segunda Turma, Relator: Desembargador Federal Ivan Lira de Carvalho (Convocado); (AC/PE, Processo: 08080630920154058300, Data do Julgamento: 04/08/2016, Terceira  Turma, Relator: Desembargador Federal Alcides Saldanha (Convocado).
7. Apelação desprovida.
(PROCESSO: 08011082520164058300, AC/PE, DESEMBARGADOR FEDERAL PAULO MACHADO CORDEIRO, 3ª Turma, JULGAMENTO: 28/10/2016, PUBLICAÇÃO:  )
Nesse cenário, a improcedência do pedido é medida que se impõe.

3. Dispositivo

Posto isso:

3.1 - acolho em parte a preliminar de falta de interesse de agir do Município-autor, levantada na defesa da UNIÃO, relativamente ao pleito de retroação da condenação ao período de cinco anos, contados da data da propositura da ação, uma vez que tal retroação só poderá, com relação à verba repassada à luz da alínea 'e' do inciso I do art. 159 da vigente Constituição, dar-se até a data em que a Emenda Constitucional nº 84, que é de 2014, que introduziu mencionada alínea no texto do referido dispositivo constitucional, pelo que, com relação a este pleito dou indefiro a petição inicial e dou o processo por extinto, sem resolução do mérito(art. 485, I e VI, do NCPC)..
3.2 - no mérito,  julgo IMPROCEDENTES os pedidos, dando o processo por extinto, cmo resolução do mérito, nos termos do art. 487, I, CPC. 
Isento o Município autor do pagamento de custas, nos termos do art. 4º, inciso I, da Lei nº 9.289/1996, mas o condeno condeno ao pagamento de honorários advocatícios, fixados em 10% (dez por cento) sobre o valor atualizado da causa, tendo em conta os critérios fixados nos § 2º do art. 85 do NCPC (lugar de prestação do serviço, baixa complexidade da causa - mormente por se tratar de demanda repetitiva - e o trabalho realizado pelo advogado, bem como o tempo exigido para o seu serviço), observando-se os limites dos §§ 3º ao 5º do art. 85 do mesmo diploma processual.
Sentença sujeita ao duplo grau de jurisdição obrigatório (art. 496, I, CPC).
Registre-se. Intimem-se.

Recife, 29 de março de 2017.

Francisco Alves dos Santos Jr.
  Juiz Federal, 2a Vara-PE