domingo, 25 de dezembro de 2011

Ministro da Educação. Delegação de Poderes aos Reitores. Possibilidade.


Por Francisco Alves dos Santos Júnior.



Pode o Ministro da Educação delegar poderes aos Reitores de Estabelecimentos de Ensino Superior na instauração e julgamento de processos administrativos disciplinares, inclusive contra Professores? Na sentença infra isso é debatido, indicando-se inclusive o posicionamento do STF a respeito do assunto. 
Boa leitura.



PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 0010086-34.2010.4.05.8300  Classe: 29 - AÇÃO ORDINÁRIA
AUTOR: J P S E OUTROS
Advogado: H F R, OAB/PE nº ......
RÉU: IFPE - INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE PE
       

Registro nº ...........................................
Certifico que eu, ..................,  registrei esta Sentença às fls...........................
Recife, ...../...../2011.

Sentença tipo A

EMENTA:- ADMINISTRATIVO. NULIDADE DE PROCEDIMENTO ADMINISTRATIVO DISCIPLINAR.

Os atos e procedimentos administrativos em debate não sofreram dos vícios apontados.

Improcedência.


1-Relatório

Trata-se de ação ordinária de nulidade de processo administrativo ajuizada por J P DE S e OUTROS contra o INSTITUTO FEDERAL DE EDUCAÇÃO, CIÊNCIA E TECNOLOGIA DE PERNAMBUCO-IFPE. Aduziram os Autores, em síntese, que: estariam respondendo a Processo Administrativo Disciplinar, sob nº 23054.002658/2009-41, instaurado pelo Réu para apurar supostas falhas funcionais; dito feito, atualmente, encontrar-se-ia no Gabinete da Reitoria, para julgamento pelo Reitor do Réu, entendendo dita autoridade de realizar diligências, consoante se depreenderia do contido no despacho de fls. 244/245; a Portaria que inaugurara referido Processo Administrativo não atenderia aos requisitos mínimos exigi dos; a peça inicial do processo ofereceria um terreno movediço aos acusados, uma vez que não definiria as condutas irregulares que por eles teriam sido praticadas, situação essa que impossibilitaria o amplo direito de defesa dos Autores; a leitura da Portaria em questão evidenciaria que o ato inaugural do procedimento disciplinar não descrevera qual a conduta praticada pelos Autores, de modo a ensejar a aplicação de sanção disciplinar, na medida em que teria sido lavrada de forma lacônica; a Portaria deveria delimitar a atuação da respectiva comissão; não bastaria a descrição genérica dos atos ou fatos a apurar; que nem isso teria sido atendido; a alegada omissão da Portaria, sem dúvida alguma, comprometeria o direito constitucional da ampla defesa; tratar-se-ia de vício que não poderia ser contornado no desenrolar do procedimento; a comissão disciplinar para apurar e julgar fatos já ocorridos, criada, especificadamente, para processar e julgar os Au tores; tal providência feriria o princípio do Juiz Natural, descambando, dessa forma, para o Tribunal de Exceção, cuja existência não teria cabimento no ordenamento jurídico; a designação de comissão temporária para promover o processo administrativo disciplinar contra servidor violaria os princípios do Juiz Natural. Teceram outros comentários. Pugnaram, ao final, pela antecipação de tutela e ao final, fossem declarada nula a Portaria Instauradora do Processo Administrativo Disciplinar ali listado e, consequentemente, também fosse declarado nulo todo o procedimento administrativo disciplinar, em face dos vícios insanáveis apontados.  Protestaram o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos (fls. 13-27).
Decisão fundamentada, calcada em precedente do C. Supremo Tribunal Federal, às fls. 28-28-vº, indeferindo o pedido de antecipação de tutela.
Os Autores requereram, às fls. 33-33,  o aditamento à Inicial, tecendo os seguintes comentários: o relatório da Comissão do Processo Administrativo Disciplinar teria imputado aos Autores a prática de diversas infrações administrativas, apontando para a aplicação da pena capital de demissão; os Autores JOSÉ PEREIRA DE SOUZA E EMÍLIO MOACIR DO AMARAL GONÇALVES seriam ex-diretores da então Escola Agrotécnica Federal de Barreiros (PE), consoante se depreenderia de seus assentamentos funcionais colacionados às fls. 20 e 23; em função da organização interna do órgão a que estão vinculados os Autores, apenas o Ministério da educação, através de sua Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica, é quem poderia processar administrativamente ditos servidores, existindo, como já foi dito, recomendação expressa neste sentido; não obstante isso, os Requerentes estão sendo processados administrativamente por prepostos do Instituto-Réu, pessoas que não deteriam qualquer competência para fazê-lo, consoante se infere do teor do ofício anexo, eivando-se, destarte, de nulidade insanável, todo o procedimento administrativo; a Portaria inaugural do PAD em questão, teria sido subscrita pelo Reitor Réu, quando deveria, por competência, ter sido assinada pelo Ministério da Educação, Secretaria de Educação Profissional e Tecnologia.  Reiteraram, ao final, o pedido de decretação de nulidade do PAD em questão. Juntou documento fl. 34.
Reiteração do pedido anterior às fls. 35-38.
A parte autora noticiou a interposição de Agravo de Instrumento às fls. 40-41. Juntou cópia do referido recurso às fls. 42-54.
Mantida a decisão agravada à fl. 55.
Decisão, à fl. 56, determinando que a parte autora apresentasse cópia da contrafé para instruir a Inicial. No que tange ao novo pedido de antecipação de tutela, não restaria comprovado se os Autores, mesmo depois de deixaram de ser diretores, continuaram com foro administrativo privilegiado.
Os Autores reiteraram o pedido às fls. 58-59.
Às fls. 63-65, cópia de decisão exarada nos autos do AGTR nº 109690/PE, na qual se atribuiu efeito suspensivo ao Recurso, determinando a suspensão do Processo Administrativo Disciplinar nº 23054.002658/2009-41, até o julgamento da ação ordinária nº 0010086-34.2010.4.8300.
O IFPE apresentou Contestação às fls. 72-78. Aduziu, em síntese, que a Portaria nº 650/2009, de instauração do processo administrativo disciplinar, teria observado todos os requisitos legais exigidos; não haveria qualquer lei que garantisse aos Autores foro privilegiado; a alegação dos Autores se basearia em um erro do ofício do Ministério da Educação, expedida pela então chefe de gabinete da Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica e tal ofício não teria força normativa, porque se trataria de mera comunicação interna entre o IFPE e o MEC; os Autores não gozariam de foro privilegiado, para o que teria que haver expressa previsão legal; o processo administrativo não pod eria ser suspenso em relação aos dois Autores, que nunca foram diretores da então Escola Agrotécnica Federal de Barreiros/PE. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela improcedência dos pedidos.
Juntada de documentos às fls. 79-81.
À fl. 83, decisão determinando o cumprimento ao determinado nos autos do noticiado Agravo de Instrumento.
Petição do IFPE à fl. 85, noticiando o cumprimento da determinação contida no Agravo de Instrumento noticiado nos autos.
À fl. 104, petição do IFPE, noticiando o cumprimento da decisão.  Juntou cópia de documentos às fls. 106-131.
À fl. 133-133-vº, o IFET pugnou pela juntada de cópia de julgamento nos autos do AGTR nº 109690, no qual foi indeferido o pleito de suspensão do processo. Documento às fls. 134-145.
Petição dos autores às fls. 146-151, pugnando pela reintegração dos Autores ao cargo em questão.
Cota do MPF à fl. 155.
Determinada a remessa dos autos ao Parquet, este manifestou-se pela improcedência dos pedidos.
É o relatório, no essencial.
Passo a decidir.

1.      Considerações Preambulares

Na petição inicial, pugnaram os Autores pela nulidade do processo administrativo disciplinar indicado nos Autos.
Os Autores atravessaram petição(fls. 146-151), reiterando, praticamente, todos os termos da Inicial, pugnando, nas entrelinhas, fosse determinada a reintegração nos cargos relativamente a alguns a alguns deles, em sede de antecipação de tutela, uma vez que estariam privados de seus vencimentos.
Pois bem.
Formalmente falando, está-se diante de uma alteração do pedido, situação esta que, consoante previsão contida no art. 260[1] do CPC, demandaria anuência da parte contrária.
Entretanto, em termos práticos, penso que o pleito ora formulado seria um consequência lógica do eventual procedência do pleito originariamente formulado, notadamente ante o delineado no art. 28[2]< /span> da Lei nº 8.112/90.
Sendo assim, dou seguimento à prolação da sentença, adentrando ao mérito da questão posta a desate.

2.      Do Mérito

2.1) Os Demandantes pugnaram pela nulidade do procedimento administrativo disciplinar descrito nos autos embasando-se nas seguintes alegações:
2.1.1) A Portaria que inaugurou o referido PAD não teria tendido aos requisitos exigidos, porquanto não teria especificado as irregularidades funcionais atribuídas aos servidores e nem estabelecido as penalidades a que estariam sujeitos;
2.1.2) Teria havido violação ao princípio do Juiz Natural, pois os a comissão disciplinar responsável pelo julgamento fora designada para apurar fatos pretéritos, tendo sido criada especificadamente para julgar os autores, como verdadeiro tribunal de exceção;
2.1.3) Os membros da comissão seriam incompetentes, alegando que, como ex-diretores da Escola Agrotécnica Federal em Barreiros, deveriam ser julgados pelo Ministério da Educação, através de sua Secretaria de Educação Profissional e Tecnológica.

2.2) Relativamente aos dois primeiros pontos acima elencados, a decisão que indeferiu o pleito antecipatório às fls. 28-28-vº rechaçou aqueles argumentos, nos seguintes termos:
Quanto à decisão do E. Superior Tribunal de Justiça, transcrita pelos Autores à fl. 09 da Petição Inicial, observo que foi proferida em Mandado de Segurança impetrado por agente da Polícia Federal, e foi calcada em Lei específica para essa carreira, que é a Lei nº 4.878, de 03 de dezembro de 1965, a qual dispõe sobre o regime jurídico dos funcionários policiais civis da União e do DF, previsão expressa neste sentido:
 “Art. 53. Ressalvada a iniciativa das autoridades que lhe são hieràrquicamente superiores, compete ao Diretor-Geral do Departamento Federal de Segurança Pública, ao Secretário de Segurança Pública do Distrito Federal e aos Delegados Regionais nos Estados, a instauração do processo disciplinar.
(...)
§ 3º Caberá ao Diretor-Geral do Departamento Federal de Segurança Pública a designação dos membros das Comissões Permanentes de Disciplina na sede da repartição e nas Delegacias Regionais mediante indicação dos respectivos Delegados Regionais.”.
Não se aplica,  pois, aos Autores, servidores civis de uma Autarquia da União, que se submetem às regras da Lei nº 8.112, de 1990, instituidora do Regime Jurídico Único dos Servidores Civis da União
2- Os arts. 143 e seguintes da Lei nº 8.112, de 1990, regem o processo disciplinar em questão.
E para casos submetidos a essa Lei, o C. Supremo Tribunal Federal já decidiu que na Portaria de instauração de processo disciplinar não há necessidade de descrição detalhada dos fatos investigados, verbis:
EMENTA: RECURSO ORDINÁRIO EM MANDADO DE SEGURANÇA. INCRA. PROCESSO ADMINISTRATIVO. PORTARIA DE INSTAURAÇÃO. REQUISITOS. COMISSÃO DISCIPLINAR. INTEGRANTE DE OUTRA ENTIDADE DA ADMINISTRAÇÃO. Não se exige, na portaria de instauração de processo disciplinar, descrição detalhada dos fatos investigados, sendo considerada suficiente a delimitação do objeto do processo pela referência a categorias de atos possivelmente relacionados a irregularidades. Entende-se que, para os efeitos do art. 143 da Lei 8.112/1990, insere-se na competência da autoridade responsável pela instauração do processo a indicação de integrantes da comissão disciplinar, ainda que um deles integre o quadro de um outro órgão da administração federal, desde que essa indicação tenha tido a anuênci a do órgão de origem do servidor. Recurso conhecido, mas a que se nega provimento. (RMS 25105, Relator(a):  Min. JOAQUIM BARBOSA, Segunda Turma, julgado em 23/05/2006, DJ 20-10-2006 PP-00088 EMENT VOL-02252-01 PP-00196 RTJ VOL-00200-01 PP-00102 LEXSTF v. 28, n. 336, 2006, p. 144-151)
Ademais, a Portaria que instaurou o processo disciplinar para apurar eventuais ilícitos administrativos que teriam sido praticados pelos Autores, que se encontra à fl. 19, remete aos processos nos quais os fatos encontram-se detalhados e debatidos, gerando assim ampla possibilidade de defesa para os ora Autores naquela fase administrativa, sem qualquer prejuízo ao contraditório.
Impende sublinhar que, consoante informado às fls. 133-145, o E. TRF da 5ª Região findou por negar provimento ao Agravo de Instrumento interposto pelos Autores, confirmando, por conseguinte, a tese consignada na decisão inicial deste juízo, acima transcrita.

2.3) No que se refere ao terceiro e último ponto indicado pelos Autores, como bem ressaltado pelo Parquet no parecer de fls. 158-161- vº, houve enfrentamento do tema nos autos do noticiado Agravo de Instrumento noticiado nestes autos, entendimento este ao qual me filio e passo a transcrever:
Não é o caso em apreciação. Não existe vedação legal a se delegar competência para instauração e julgamento de processo administrativo disciplinar no caso em análise.
Por isso é que, através da Portaria n. 21, de 30 de abril de 2007, o Ministro da Educação subdelegou aos Reitores e Diretores de estabelecimentos de ensino superior, a competência para “julgar processos administrativos disciplinares e aplicar penalidades, nas hipótese de suspensão superior a 30 (trinta) dias, de demissão e cassação de aposentadoria ou disponibilidade de servidores pertencentes a seus quadros de pessoal”, conforme se infere de seu art. 1º, inciso  I.
A delegação de competência é instituto previsto na própria Constituição Federal, conforme se pode extrair do parágrafo único do art. 84, em casos exatamente concernentes ao aqui analisado.
Em matéria de competência, a autoridade incumbida da nomeação é a Autoridade competente para julgar o agente público em processo administrativo disciplinar, quer pela competência originária, quer por delegação de competência.
No caso, quem procede a nomeação dos Agravantes? O Ministro de Estado da Educação. Então, esta Autoridade tanto pode julgar o processo administrativo disciplinar, como pode delegar esse encargo ao Diretor, Reitor ou outra Autoridade dirigente, o que se deu na hipótese.
Procuram os Agravantes justificar a preservação da Autoridade Administrativa em aplicar as sanções, com base no argumento de que são exdirigentes de entidade de ensino.
Parece-nos, que a condição de ex-dirigente de entidade de ensino, não encontra respaldo em caso específico de preservação da Autoridade
Competente sem o poder de delegar ou subdelegar competência em casos que tais, quer porque estamos diante de uma situação de quem
já exerceu o cargo, quer pela circunstância de não existir qualquer norma expressa que pudesse prever essa possível exceção.
Assim, não se tem como acolher a justificativa de Autoridade incompetente para instaurar e julgar o processo administrativo a que os Agravantes foram submetidos, motivo pelo qual não vislumbro, aqui também, qualquer plausibilidade no direito invocado.
Diante de todo o exposto, sob todos os ângulos analisados, não merece guarida o pleito autoral.

Conclusão

Posto isso, julgo improcedentes os pedidos desta ação e condeno os Autores nas custas processuais e em verba honorária, que, com base no § 4º do art. 20 do Código de Processo Civil, arbitro em R$ 4.800,00(quatro mil e oitocentos mil reais), pro rata, que serão monetariamente atualizados,  a partir do mês seguinte ao da publicação desta sentença, pelos índices de correção monetária do Manual de Cálculos do Conselho da Justiça Federal e acrescidos de juros de mora legais, à razão de 0,5%(meio por cento) ao mês, contados estes da data da intimação da execução desta Sentença, mas incidentes sobre o valor j á monetariamente corrigido.

P.R.I.

Recife, 13 de dezembro de 2011.


Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal