quarta-feira, 31 de julho de 2013

IMPORTAÇÃO. IPI. INCIDÊNCIA NO DESEMBARAÇO ADUANEIRO E NA SAÍDA DO ESTABELECIMENTO IMPORTADOR OU DAS SUAS FILIAIS PARA O MERCADO INTERNO. EQUALIZAÇÃO DE PREÇO COM O PRODUTO NACIONAL. VEDAÇÃO DA CONCORRÊNCIA DESLEAL.

    Por Francisco Alves dos Santos Júnior


    Segue sentença, na qual se adota o entendimento de que a saída do produto importado do Estabelecimento Importador e/ou das suas Filiais para o mercado brasileiro sofre incidência do IPI, porque assim está previsto no direito positivo e, se assim não fosse, haveria concorrência desleal com o produto nacional similar, que sofre incidência desse imposto na saída do Fabricante brasileiro.

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA


Juiz Federal: Dr. Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 0004968-72.2013.4.05.8300  Classe: 126 - MANDADO DE SEGURANÇA

IMPETRANTE: R C DE P PARA C V LTDA.

Advogado: R M M X, OAB/PE

IMPETRADO : DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE



Registro nº ...............................

Certifico que eu, ........,  registrei esta sentença às fls. ....................

Recife, ......../......../2013


Sentença Tipo “A”



EMENTA: MANDADO DE SEGURANÇA. TRIBUTÁRIO. IPI. INCIDÊNCIA. SAÍDA DE MERCADORIA IMPORTADA. TRIBUTAÇÃO.

-Não há a alegada bitributação, porque há fatos geradores diversos do IPI: na importação, o desembaraço aduaneiro(art. 46-I do Código Tributário Nacional); na venda dos produtos importados, no mercado interno, a saída do estabelecimento Importador ou de  Filial deste(art. 46-II c/c o Parágrafo Único do art. 51, todos do referido Código).

- O Importador não tem nenhum prejuízo com essas tributações, graças à técnica de crédito/débito da tributação do IPI.

-Equalização do preço: se o produto importado não sofrer incidência do IPI poderá ser vendido por preço menor que o produto semelhante, fabricado no Brasil, que sofre tributação desse imposto.

- Denegação da Segurança.


Vistos, etc...

1.Relatório

R C DE P PARA C V LTDA., qualificada na inicial, ajuizou o presente mandado de segurança com pedido de liminar em face de suposto ato do DELEGADO DA RECEITA FEDERAL EM RECIFE, cujo objetivo é assegurar a suspensão da incidência do IPI – Imposto sobre Produtos Industrializados nas transações comerciais realizadas no mercado interno brasileiro.

Alega, em síntese, que: a) é uma empresa que se dedica à atividade de comércio atacadista e varejista de produtos serigráficos, artigos para serigrafia, artefatos para tecidos, lonas, vinil autoadesivo, artigos para sinalização e comunicação visual, malhas e camisetas, tintas para silk-screen, máquinas e equipamentos mecânicos e elétricos para serigrafia e impressão digital, importação e exportação de máquinas e mercadorias, para serem comercializados no mercado interno brasileiro consoante informações de seu contrato social e cartão de CNPJ; b) é contribuinte regular do IPI (Imposto sobre Produtos Industrializados); c) o tributo do IPI incide no ato do desembaraço aduaneiro das mercadorias; d) além da incidência do IPI, será submetida ao lançamento de novo tributo quando da saída da mercadoria do estabelecimento comercial, qual seja, IPI (transformação, beneficiamento, montagem ou recondicionamento), sem que a Impetrante exerça qualquer atividade prevista para incidência deste novo fato gerador; e) considera o caso de bitributação; f) sua atividade se resume a aquisição dos produtos no mercado externo, sua internalização no mercado brasileiro e posterior venda dentro do território nacional; g) entende indevida a cobrança do imposto (IPI), sobre as mercadorias quando da saída do estabelecimento comercial, posto que ausente qualquer ato de indústria ou equiparado, mas apenas mero ato comercial de revenda. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pelo deferimento da liminar, para que seja determinada a suspensão da incidência do IPI nas transações comerciais realizadas no mercado interno brasileiro das mercadorias provenientes do exterior, alternativamente, que seja autorizado o depósito em juízo do valor referente ao IPI cobrado da saída (revenda) das mercadorias no mercado interno.

Acompanham a petição inicial, procuração e documentos de fls. 18-36.

Custas recolhidas (fl. 37).

Negada a concessão de medida liminar às fls. 39-40.

A União (AGU/PGFN), requereu seu ingresso no feito à fl. 50.

Informações prestadas às fls. 52-57, nas quais foi defendida a legalidade do ato impugnado e requerida a denegação da segurança.

Parecer do Ministério Público Federal manifestando seu desinteresse em intervir no feito (fl. 59-59vº).

É o relatório, no essencial.

2. Fundamentação

2.1)  Preliminarmente, noto que o pedido que a UNIÃO(Fazenda Nacional)formulou, à fl. 50,  para ser integrada no feito, ainda não foi apreciado, pelo que o faço agora. Mencionado pleito merece acolhida, até mesmo porque hoje encontra fundamento no próprio texto legal(inciso II do art. 7º da Lei nº 12.016, de 2009) e, embora a  UNIÃO não tenha indicado em que polo do feito, há de ser no passivo, porque e nesse polo que se encontra a Autoridade apontada como coatora, que faz parte dos quadros funcionais da  UNIÃO.

2.2) Não há qualquer modificação no quadro fático ou jurídico desde o instante da decisão de fl. 39-40, na qual foi indeferido o pedido de medida liminar, pelo que deve ser mantida, por seus próprios fundamentos jurídico-legais, decisão aquela da qual transcrevo mencionada fundamentação como parte da fundamentação desta sentença:

“(...).

Não desconheço uma r. decisão da 1ª turma do E. Superior Tribunal de Justiça e uma r. decisão da 2ª Turma do E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região a respeito da matéria ora em debate, que, respectivamente, têm as seguintes ementas:

EMPRESA IMPORTADORA. FATO GERADOR DO IPI. DESEMBARAÇO ADUANEIRO. I - O fato gerador do IPI, nos termos do artigo 46 do CTN, ocorre alternativamente na saída do produto do estabelecimento; no desembaraço aduaneiro ou na arrematação em leilão. II - Tratando-se de empresa importadora o fato gerador ocorre no desembaraço aduaneiro, não sendo viável nova cobrança do IPI na saída do produto quando de sua comercialização, ante a vedação ao fenômeno da bitributação. III - Recurso especial provido. (STJ. 1ª Turma. Rel. Min. Francisco Falcão. REsp 841269/BA. DJ, 14/12/06).” (G.N.)

PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA PREVENTIVO. VIA ELEITA ADEQUADA. IPI. FATO GERADOR NO DESEMBARAÇO ADUANEIRO. ART. 46, I, CTN. 1 - Não está caracterizada a inadequação da via eleita, eis que se trata de mandado de segurança impetrado sob contornos de preventividade, diante da presença de risco do contribuinte ver-se obrigado a tributar o que não é devido. 2 - O IPI tem como fato gerador uma operação que envolva produtos industrializados, de acordo com o art. 46, do CTN, que determina sua incidência nos casos de desembaraço aduaneiro, saída de produto de estabelecimento industrial ou equiparado, ou arrematação, alternativamente, ou seja, na ocorrência de um dos três citados fatos geradores. 3 - No caso dos autos, o impetrante recolherá o IPI devido à importação de mercadorias industrializadas, quando de seu desembaraço aduaneiro, não sendo cabível nova incidência do imposto pela revenda destas, ante a vedação da bitributação. A incidência de citado imposto seria possível se ocorresse novo fato gerador, a exemplo da mercadoria ser submetida a novo processo de industrialização dentro do território nacional ou de ser levada a leilão. 4 - Precedentes do STJ e deste Tribunal (STJ. 1ª Turma. Rel. Min. Francisco Falcão. REsp 841269/BA. DJ, 14/12/06; TRF 5ª Região. 3ª Turma. Rel. Des. Marcelo Navarro. AC526306/PE. DJ, 28/03/12; 4ª Turma. Rel. Des. Margarida Cantarelli. AG120078/PE. DJ, 16/12/11; TRF 5ª Região. 2ª Turma; Rel. Des. Rubens Canuto (convocado); AGTR 128004/PE; julgado em 30/10/2012). 5 - A invocada ofensa ao princípio da isonomia não ostenta suficiente verossimilhança, conforme foi bem observado pelo MM. Magistrado a quo: Quanto ao argumento de que a não cobrança do IPI fere a isonomia, entendemos não proceder. Com efeito, se a cobrança for realizada é que, haverá, efetivamente, agressão ao princípio. Ocorre o importador que revende produtos estrangeiros no Brasil estaria pagando o IPI em duas ocasiões: quando do desembaraço aduaneiro e quando da saída do produto de seu estabelecimento. O revendedor de produtos nacionais, por sua vez, só arcaria com os custos do imposto uma vez, quando comprasse o produto do estabelecimento industrial. Desse modo, a cobrança do IPI do importador em duas ocasiões, quando o revendedor de produtos nacionais só paga a exação em uma, é que constitui afronta à isonomia. 6 - Quanto à compensação, a sentença decidiu pela denegação da segurança, ficando prejudicada a discussão a respeito do tema, inclusive quanto à prescrição. 7 - Apelação e remessa oficial improvidas (AC 200982000004912, Desembargador Federal Sérgio Murilo Wanderley Queiroga, TRF5 - Segunda Turma, DJE - Data::13/12/2012 - Página::440.)” (G.N.)

No entanto, data maxima venia, com elas não comungo, pelas razões que seguem.

Primeiro, data maxima venia, não há a alegada bitributação, porque há fatos geradores diversos do IPI: na importação, o desembaraço aduaneiro(art. 46-I do Código Tributário Nacional); na venda dos produtos importados, no mercado interno, a saída do estabelecimento Importador ou de  Filial deste(art. 46-II c/c o Parágrafo Único do art. 51, todos do referido Código). [1]

Os dispositivos do Código Tributário Nacional, invocados pela ora Impetrante, são claros no sentido de que o Importador é contribuinte do IPI(art. 51-I do Código Tributário Nacional), bem como cada dos seus Estabelecimento(Parágrafo Único do art. 51 desse Código).

E o Importador não tem nenhum prejuízo com essas tributações, graças à técnica do crédito/débito da tributação do IPI.

Com efeito, o Importador credita-se, no livro Registro de Entradas de Produtos, do valor do IPI recolhido no desembaraço aduaneiro e debita-se, no livro Registro de Saídas de Produtos, do valor do IPI destacado na nota fiscal de venda, que acoberta a saída dos produtos do seu estabelecimento, quando das vendas para o mercado interno. No final de determinado período, fixado na Lei, faz o respectivo encontro de contas entre os valores da coluna “créditos” e da coluna “débitos” do livro denominado Registro de Apuração do IPI, e só recolherá algum valor de IPI para os cofres públicos se tiver vendido os produtos por preço maior que o valor pago na importação, ou seja, sobre o valor acrescido.

E, note-se, apenas recolherá (não pagará), porque trata-se de um tributo indireto,  cujo respectivo ônus financeiro é transferido para o preço final do produto, cabendo à ora Impetrante apenas recolher para a Fazenda Nacional o respectivo valor, funcionando, pois, como um mero intermediário(um Contribuinte de direito)entre o Contribuinte de fato(o consumidor dos produtos da ora Impetrante, que efetivamente paga, no preço do produto, o valor do IPI) e a Fazenda Nacional.

Nessa situação, data maxima venia dos d. Julgadores dos acórdãos acima referidos, não diviso a existência do requisito do fumus boni iuris.”

Finalmente, merece ser destacado detalhe importantíssimo trazido aos autos pela DD. Autoridade Impetrada nas suas informações de fls. 52-57, a equalização do preço dos produtos importados pela Impetrante com produtos similares fabricados no Brasil: estes pagam o IPI na saída e caso os importados pela Impetrante não sofram incidência desse imposto poderão ser vendidos mais baratos, gerando uma concorrência desleal com os produtos nacionais.

Sendo assim, não merece acolhida o pleito da Impetrante.

3. Conclusão

POSTO ISSO:

a)                               preliminarmente, defiro a integração da  UNIÃO no polo ativo e determino que a Secretaria providencie a respectiva autuação, antes da publicação desta sentença;

b)                              julgo improcedentes os pedidos desta ação mandamental e denego  a segurança pleiteada.

Sem custas e sem verba honorária, ex lege.


P.R.I.


Recife, 30 de julho de 2013.


Francisco Alves dos Santos Júnior

  Juiz Federal, 2ª Vara-PE


Nota:   A 1ª Seção do STJ, que já tinha um precedente dando ganho de causa para os Contribuintes, concluindo que a saída do Estabelecimento Importador ou de suas Filiais não concretizaria fato gerador do IPI, findou por mudar o seu entendimento e a adotar a tese defendida na fundamentação da sentença supra.
Eis o novo precedente da 1ª Seção do STJ, Embargos de Divergência no REsp nº 1.403.532/SC(2014/0034846-0. julgado em 14.10.2015 e publicado no Diário Judicial Eletrônico - DJe de 18.12.2015, concluindo que são constitucionais os dispositivos do CTN e das respectivas Leis Ordinárias que transformam as filiais dos Importadores em estabelecimentos equiparados a industriais, pelo que praticam o fato gerador do IPI quando dão saída a mercadorias importadas pela Matriz e que esta também pratica o fato gerador desse imposto quando revende tais mercadorias.
Modéstia à parte, leiam o voto vencedor do Ministro Relator para o Acórdão Mauro Campbell Marques, com passagens idênticas às consignadas na sentença supra, que foi elaborada em 29.12.2012, ou seja, quase três anos antes do mencionado d. voto vencedor na 1ª Seção do Superrior Tribunal de Justiça. 

"EMENTA EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA EM RECURSO ESPECIAL. DIREITO TRIBUTÁRIO. IMPOSTO SOBRE PRODUTOS INDUSTRIALIZADOS - IPI. FATO GERADOR. INCIDÊNCIA SOBRE OS IMPORTADORES NA REVENDA DE PRODUTOS DE PROCEDÊNCIA ESTRANGEIRA. FATO GERADOR AUTORIZADO PELO ART. 46, II, C/C 51, PARÁGRAFO ÚNICO DO CTN. SUJEIÇÃO PASSIVA AUTORIZADA PELO ART. 51, II, DO CTN, C/C ART. 4º, I, DA LEI N. 4.502/64. PREVISÃO NOS ARTS. 9, I E 35, II, DO RIPI/2010 (DECRETO N. 7.212/2010). 
1. Seja pela combinação dos artigos 46, II e 51, parágrafo único do CTN - que compõem o fato gerador, seja pela combinação do art. 51, II, do CTN, art. 4º, I, da Lei n. 4.502/64, art. 79, da Medida Provisória n. 2.158-35/2001 e art. 13, da Lei n. 11.281/2006 - que definem a sujeição passiva, nenhum deles até então afastados por inconstitucionalidade, os produtos importados estão sujeitos a uma nova incidência do IPI quando de sua saída do estabelecimento importador na operação de revenda. 
2. Não há qualquer ilegalidade na incidência do IPI na saída dos produtos de procedência estrangeira do estabelecimento do importador, já que equiparado a industrial pelo art. 4º, I, da Lei n. 4.502/64, com a permissão dada pelo art. 51, II, do CTN. 
3. Interpretação que não ocasiona a ocorrência de bis in idem, dupla tributação ou bitributação, porque a lei elenca dois fatos geradores distintos, o desembaraço aduaneiro proveniente da operação de compra de produto industrializado do exterior e a saída do produto industrializado do estabelecimento importador equiparado a estabelecimento produtor, isto é, a primeira tributação recai sobre o preço de compra onde embutida a margem de lucro da empresa estrangeira e a segunda tributação recai sobre o preço da venda, onde já embutida a margem de lucro da empresa brasileira importadora. Além disso, não onera a cadeia além do razoável, pois o importador na primeira operação apenas acumula a condição de contribuinte de fato e de direito em razão da territorialidade, já que o estabelecimento industrial produtor estrangeiro não pode ser eleito pela lei nacional brasileira como contribuinte de direito do IPI (os limites da soberania tributária o impedem), sendo que a empresa importadora nacional brasileira acumula o crédito do imposto pago no desembaraço aduaneiro para ser utilizado como abatimento do imposto a ser pago na saída do produto como contribuinte de direito (não-cumulatividade), mantendo-se a tributação apenas sobre o valor agregado. 
4. Precedentes: REsp. n. 1.386.686 - SC, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 17.09.2013; e REsp. n. 1.385.952 - SC, Segunda Turma, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 03.09.2013. Superado o entendimento contrário veiculado no REsp. n. 841.269 - BA, Primeira Turma, Rel. Min. Francisco Falcão, julgado em 28.11.2006. 5. Embargos de divergência em Recurso especial não providos.".

Brasil. Superior Tribunal de Justiça. 1ª Seção. Embargos de Divergência em REsp nº 1.403.532/SC(2014/0034746-0). Relator Ministro Napoleão Nunes Maia Filho(vencido). Relator para o Acórdão Ministro Mauro Campbell Marques(vencedor). Julgado em 14.10.2015. Publicado no Diário Judicial Eletrônico - DJe de 18.12.2015. 


[1] E a legislação ordinária, plasmada na Lei nº 4.502, de 30.11.1964, já com centenas de alterações, é rica no detalhamento da equiparação dos estabelecimentos do Importador a estabelecimento industrial, para fins de pagamento do IPI.