sábado, 18 de agosto de 2018

COMPETÊNCIA TRIBUTÁRIA X CAPACIDADE ATIVA TRIBUTÁRIA. IRRF PELOS ESTADOS E MUNICÍPIOS. INCAPACIDADE ATIVA TRIBUTÁRIA DA UNIÃO.


Por Francisco Alves dos Santos Jr. 

O Legislador Constituinte outorgou aos Estados e Municípios a capacidade ativa tributária com relação ao IR que retêm na  fonte, então quando um deles não faz essa retenção, embora haja o fato gerador do tributo, o respectivo Servidor comete improbidade administrativa e crime contra os seus interesses. Mas, nessa situação, a UNIÃO, embora tenha competência  para instituir, por Lei, esse Imposto,  não tem capacidade ativa tributária para lançar, inscrever em dívida e cobrar essa parcela desse Imposto, que cabe aos Estados e Municípios.  
Na sentença que segue, um caso concreto a respeito dessa matéria foi debatido. 
Boa  leitura. 

PROCESSO Nº: 0816262-49.2017.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: G A U C P DE M
ADVOGADO: R H L T Dos S e outros
RÉU: FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

Sentença tipo A
 EMENTA: - CONSTITUCIONAL-TRIBUTÁRIO. AJUDA DE CUSTO PAGA POR ESTADO DA FEDERAÇÃO. IR. COMPETÊNCIA. CAPACIDADE ATIVA.
- A UNIÃO não tem capacidade ativa tributária com relação às parcelas de IR retidas na fonte pelos Estados e Municípios, porque essas parcelas pertencem a estas Unidades da Federação.
- A "ajuda de custo" para participação em assembleia ordinária, paga a Deputado Estadual, não goza da isenção do IR.
-A não retenção na fonte do IR sobre determinada verba, que não goza de isenção legal, por Servidor de Estado da Federação, cuja respectiva parcela seria incorporada às receitas tributárias desse Estado, pode caracterizar improbidade administrativa e crime contra os interesses desse Estado.
-Nulidade do(s) auto(s) de infração emitido(s) por Órgão da UNIÃO, bem como o(s) ato(s) dele(s) decorrente(s).
-Procedência.




Vistos, etc.

1. Relatório


G A U C P DE M, qualificado na petição inicial, propôs esta ação anulatória de lançamento fiscal contra a UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, alegando em síntese que faltaria legitimidade à Requerida para lançar e cobrar IR sobre verbas que recebera da Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco, a título de "ajuda de custo", na qualidade de Deputado Estadual, porque respectiva receita, se referido imposto fosse devido sobre referida verba, pertenceria ao Estado de Pernambuco e não à UNIÃO; que, ademais, mencionada verba gozaria de isenção do referido imposto, porque teria natureza indenizatória; se mencionada pretensão não fosse acolhida, que a multa e os juros demora deveriam ser excluídos, pelas razões descritas na petição inicial; e finalmente pediu a decretação da nulidade do lançamento tributário feito pela UNIÃO e,  "31 Sucessivamente, em última hipótese, requer-se a procedência parcial da demanda para reconhecer a inexigência dos acréscimos de multa de ofício e de juros de mora"
A UNIÃO - FAZENDA NACIONAL contestou, alegando, em síntese que, como teria competência para instituir o IR, também teria "competência" para lançar e cobrar, na situação em debate neste processo; que só não poderia figurar no polo passivo de pedido de restituição, quando o Estado ou o Município fizesse retenção indevida do IR. No que diz respeito à multa, sustentou que o STF já teria adotado a tese no sentido de que a multa de ofício, caso dos autos, poderia chegar a até 100% do valor do tributo devido e que apenas a multa de mora é que não poderia ser superior a 20% de tal valor, pelo que não poderia vingar a tese da petição inicial em sentido contrário. Fez inúmeras outras considerações e pugnou pela improcedência dos pedidos.

2. Fundamentação


2.1 - Se Órgão da órbita do Poder Legislativo(Assembleia Legislativa) de determinado Estado não retém imposto de renda na fonte de verba paga a Parlamentar Estadual, a título de ajuda de custo relativa a assembleia ordinária, para a qual não há isenção desse Imposto,  fixada em Lei Federal [1], considerando que a respectiva receita da mencionada tributação pertenceria ao Estado[2],  tem-se que pode ter havido ilicitude, causadora de improbidade administrativa e crime por parte da pessoa física responsável pela realização da mencionada retenção na fonte.
Mas essa omissão de Órgão da órbita do Poder Legislativo Estadual, responsável pela retenção do IR na fonte pagadora,  data venia, não autoriza a UNIÃO a lançar e cobrar o IR que não foi retido no ato do pagamento ao Beneficiário(no caso, o Parlamentar Estadual ora Autor) da mencionada "ajuda de custo", pois, embora se trate de um Imposto da competência da UNIÃO,  a respectiva receita, com relação ao referido fato gerador, não pertenceria à UNIÃO, mas sim ao Estado de Pernambuco, em face do inciso I do art. 157 da vigente Constituição da República, parcela essa que não entraria no cômputo dos demais repasses de parte das receitas desse Imposto pela UNIÃO para o referido Estado, conforme regra do § 1º do art. 159 da mesma Carta Magna.
Temos, então, caso de outorga, concedida diretamente pelo Legislador Constituinte, de capacidade ativa tributária aos Estados e Municípios da Federação com relação à parte da receita desse Imposto Federal, no caso, o Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza.
E essa situação constitucional afastou a legitimidade da UNIÃO para lançar, inscreve em dívida, extrair Certidão de Dívida Ativa e de executar mencionada parcela do referido Imposto, porque lhe falta, para tanto, a capacidade ativa tributária.
Não é caso de aplicação do Parágrafo Único do Art. 45 do Código Tributário Nacional, o qual tem a seguinte redação: "Parágrafo único. A lei pode atribuir à fonte pagadora da renda ou dos proventos tributáveis a condição de responsável pelo imposto cuja retenção e recolhimento lhe caibam.", porque essa hipótese seria para Terceiro que não fosse titular da receita desse Imposto(as Empresas Privadas, por exemplo). O Retentor desse dispositivo legal funcionaria como mero repassador da receita desse Imposto para a UNIÃO.  Diverso do presente caso, no qual aquele que deveria fazer a retenção do IR na fonte(o Estado de Pernambuco) era o titular da respectiva receita e omitiu-se quanto à retenção.
Então o(s) lançamento(s) tributário(s) realizado(s) pela UNIÃO, via auto de infração, para a cobrança da parcela do IR sobre os valores da mencionada "ajuda de custo", que foram pagos ao ora Autor, são nulos de pleno direito, nulidade essa que também torna nulos todos os demais atos deles decorrentes, tais como inscrição(ões) em dívida ativa da UNIÃO, e respectiva Certidão(ões) de Dívida Ativa.
2.2 - A noticiada "ajuda de custo" era paga ao Autor para participar de assembleias ordinárias, logo a respectiva verba não gozava, como não goza, da isenção do IR.
Segundo a Lei nº 7.713, de 1988, que trata do assunto, só goza de isenção desse imposto o valor da "ajuda de custo" delineada no inciso XX do seu art. 6º, verbis
"Art. 6º Ficam isentos do imposto de renda os seguinte rendimentos percebidos por pessoas físicas:
XX - ajuda de custo destinada a atender às despesas com transporte, frete e locomoção do beneficiado e seus familiares, em caso de remoção de um município para outro, sujeita à comprovação posterior pelo contribuinte.".
É verdade que há julgado do Superior Tribunal de Justiça, invocado na petição inicial, o REsp 1.269.269-PE, segundo o qual a "ajuda de custo" paga a Parlamentares para participação em "assembleias extraordinárias" também goza dessa isenção, porque tem caráter indenizatório.
Todavia, a "ajuda de custo" paga ao ora Autor, como já dito,  foi para participação em "assembleias ordinárias" e isso resta inconteste nos autos, logo os valores que o Autor recebeu a tal título não gozavam, como não gozam, da isenção desse imposto.
Então, o Órgão próprio do Estado de Pernambuco, como já dito acima, deveria ter efetuado a retenção do IR e repassado o respectivo valor para os cofres desse Estado, por força do inciso I do art. 157 da vigente Constituição da República.
Diante desse quadro, o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco - TCPE e o Ministério Público do Estado de Pernambuco - MPPE devem receber cópia desta sentença, para os fins legais próprios, nas áreas de suas respectivas atividades.

3. Dispositivo


Posto isso, julgo procedente o primeiro pedido desta ação e, embora reconhecendo que a mencionada "ajuda de custa" não gozava, como não goza da isenção do IR, que deveria ter sido retido na fonte pelo Órgão próprio da Assembleia Legislativa do Estado de Pernambuco e repassado o respectivo valor para os cofres desse Estado, tenho que falta capacidade ativa tributária à UNIÃO com relação a essa parcela do IR incidente sobre valores pagos pelo Estado de Pernambuco, a qualquer título, pelo que decreto a nulidade do(s) lançamento(s) tributário(s) feito(s) por Órgão da UNIÃO, relativo(s) ao IR debatido neste feito, bem como de todos os atos dele(s) decorrentes, ficando o Autor liberado do pagamento à UNIÃO das mencionadas parcelas tributárias, ressalvando-se ao Órgão próprio do Estado de Pernambuco realizar mencionada lançamento e esse Estado a respectiva cobrança, administrativa ou judicial, caso ainda não tenha ocorrido decadência ou prescrição dessa pretensão tributária.
Outrossim, condeno a UNIÃO a pagar ao(s) Patrono(s) do Autor verba honorária, que, considerando o esforço e dedicação de tal(s) Patrono(s), e à luz do § 2º do art. 85 do vigente Código de Processo Civil, arbitro no percentual médio legal de 15%(quinze por cento) sobre o valor atualizado da causa(inferior a 200(duzentos) salários mínimos), portanto dentro do patamar do inciso I do § 3º do art. 85 do mencionado diploma processual, então, tendo em vista que o valor da causa foi arbitrado na petição inicial em R$ 94.304,17, tenho que o valor da verba honorária será de R$ 14.245,66(quatorze mil, duzentos e quarenta e cinco reais e sessenta e seis centavos), que serão atualizados(correção monetária e juros de mora) a partir de outubro(mês seguinte ao da data da petição inicial), pelos índices do manual de cálculos do Conselho da Justiça Federal[3], até a data da expedição do respectivo requisitório[4].
Remeta-se cópia desta sentença para o Tribunal de Contas do Estado de Pernambuco - TCPE, para os fins fiscalizatórios próprios, bem como para o Ministério Público do Estado de Pernambuco - MPPE, para os fins administrativos e criminais pertinentes, se for o caso.
Deixo de submeter esta sentença ao duplo grau de jurisdição, porque o valor em debate é inferior a 1.000(mil) salários mínimos(inciso I do § 3º do art. 496 do vigente Código de Processo Civil).
Registre-se. Intimem-se.

Recife, 14.08.2018
Francisco Alves dos Santos Jr
  Juiz Federal, 2a Vara-PE.

Notas de Rodapé
[1] Como o IR é da competência da UNIÃO[art. 153, I, da vigente Constituição da República], isenção relativa a esse imposto só pode ser veiculada em Lei Federal Específica (§ 6º do art. 153).
[2] O art. 157-I c/c o § 1º do art. 159, todos da vigente Constituição da República.
[3] Brasil Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário -  RE nº  870.947/SE, Repercussão Geral. Tema 810. Relator Ministro Luiz Fux. Julgado em 20.09.2017.
Disponível em:http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?numero=870947&classe=RE-RG&codigoClasse=0&origem=JUR&recurso=0&tipoJulgamento=M
Acesso em 26.09.2017.
[4] Brasil Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário-RE 579.431/RS. Relator Ministro Marco Aurélio, Publicado no Diário Judicial Eletrônico - Dje de 19.04.2017[Repercussão Geral, Tema 96, Mérito].
Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/processo/verProcessoAndamento.asp?incidente=2598262
Acesso em 10.10.2017.


quarta-feira, 15 de agosto de 2018

AMICUS CURIAE: QUANDO CABE E QUANDO NÃO CABE, SEGUNDO O ENTENDIMENTO REINANTE NA SUPREMA CORTE DO BRASIL.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.


Segue importante decisão monocrática do Ministro ALEXANDRE MORAIS do Supremo Tribunal Federal, a respeito de quando cabe e quando não cabe a adesão de Amicus Curiae. 
Esse é o atual entendimento da Suprema Corte. 
Boa leitura. 


RE 852475 / SP - SÃO PAULO
RECURSO EXTRAORDINÁRIO
Relator(a):  Min. ALEXANDRE DE MORAES
Julgamento: 19/06/2018

Publicação
PROCESSO ELETRÔNICO
DJe-126 DIVULG 25/06/2018 PUBLIC 26/06/2018
Partes
RECTE.(S)           : MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DE SÃO PAULO
PROC.(A/S)(ES)      : PROCURADOR-GERAL DE JUSTIÇA DO ESTADO DE SÃO PAULO
RECDO.(A/S)         : A C C E OUTRO(A/S)
ADV.(A/S)           : R M
AM. CURIAE.         :  UNIÃO
PROC.(A/S)(ES)      : ADVOGADO-GERAL DA UNIÃO
RECDO.(A/S)         : G P P
RECDO.(A/S)         : M A R DOS S P
RECDO.(A/S)         : M A R DOS S P
RECDO.(A/S)         : G P P
RECDO.(A/S)         : M A R DOS S P
RECDO.(A/S)         : G P P
RECDO.(A/S)         : M A R DOS S P
RECDO.(A/S)         : G P P


Decisão

    Por intermédio da Petição 40.318/2018, W V da S postula seu
ingresso nos autos na qualidade de amicus curiae.
    O pedido apresentado afigura-se manifestamente extemporâneo.
    É firme a jurisprudência desta CORTE no sentido de que o 
amicus curiae somente pode demandar a sua intervenção até a data
em que o Relator liberar o processo para
 pauta (ADI 4.071-AgR, Rel. Min. MENEZES DIREITO, Tribunal Pleno,
 DJe de 16/10/2009).
    Ainda: ADI 4.067-AgR, Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA, Tribunal 
Pleno, DJe de 23/4/2010; ADI 5.104-MC, Rel. Min. ROBERTO BARROSO,
 Tribunal Pleno, DJe de 30/10/2014.
    E, no caso presente, o processo foi liberado para pauta em 
27/6/2017, ao passo que o pedido de admissão como “amigo da CORTE”
foi apresentado pela postulante em 15/6/2018.
    De todo modo, o requerente, pessoa natural, não exibe a 
representatividade necessária para a admissão como amicus curiae.
    Ademais, suas razões, notadamente direcionadas a seus interesses
pessoais, não se coadunam com a figura processual eleita.
    Diante do exposto, indefiro o pedido.
    Publique-se.
    Brasília, 19 de junho de 2018.
    Ministro Alexandre de Moraes
    Relator
    Documento assinado digitalmente[1]








Nota de Rodapé
[1] Disponível em http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/listarJurisprudencia.
asp?s1=%28%28852475%29%29+NAO+S.PRES.&base=baseMonocraticas&url=http://tinyurl.com/
h39t4uv
Acesso em 15.08.2018.