terça-feira, 15 de setembro de 2020

AUXÍLIO RECLUSÃO: REQUISITOS.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Na sentença que segue, um detalhamento sobre os requisitos para a obtenção do auxílio-reclusão. 
Boa leitura. 



Minuta de decisão elaborada pela Assessora Rossana Maria Cavalcanti Reis da Rocha Marques


PROCESSO Nº: 0817980-47.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: I. I. S. S.
REPRESENTANTE(PAIS): N M DOS S 
ADVOGADO: F C M
RÉU: INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL - INSS
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

DECISÃO

1-Relatório

Y I S S, menor impúbere, representado por sua genitora N M DOS S, ajuizou em 13/12/2018 esta ação em face do INSTITUTO NACIONAL DO SEGURO SOCIAL, pretendendo, a título de tutela provisória de urgência, o benefício previdenciário de auxílio-reclusão, cujo instituidor, o Sr. ANTONIO JOÃO DA SILVA, seria seu genitor e estaria recluso desde o dia 08/05/2013. Requereu o benefício da assistência judiciária gratuita e juntou instrumento de procuração e documentos.

Alegou, em síntese, que: teria requerido ao INSS o benefício previdenciário de Auxílio-Reclusão em 27/09/2018, sob o número de protocolo 86.98.87.279, em razão do aprisionamento de seu genitor ANTONIO JOÃO DA SILVA que estaria recluso desde 08/05/2013, atualmente na penitenciária Tacaimbó/Tacaimbó; estaria presente a qualidade de segurado; teria legitimidade para pleitear a concessão do benefício; o INSS não teria respondido "ao direito do segurado"; estaria desprovido de qualquer renda; o INSS teria o prazo de trinta dias para responder, de acordo com a Lei nº 9.784/99, o que não teria sido observado; o INSS deveria analisar o caso em apreço com a máxima urgência, e implantar o benefício de Auxílio-Reclusão em favor da parte autora, pois estaria presente a qualidade de segurado, e a dependência econômica da parte autora; seria uma afronta do INSS à Constituição/88, a demora na análise do seu requerimento; o C. STF já teria decidido que as decisões administrativas deveriam ser proferidas no prazo legal; deveria ser deferida a tutela provisória de urgência para que o INSS defira o benefício de auxílio-reclusão, pois o Autor seria menor e necessitaria de provisão alimentar de maneira urgente; justificou o valor da causa, e requereu: "1- Requer que se digne Vossa Excelência de deferir-lhe os benefícios da Justiça Gratuita, nos termos do artigo 98 do CPC; 2 - O deferimento do Pedido Liminar para a concessão imediata do benefício do auxílio reclusão à autora; 3 - Que seja intimado o INSS para o PAGAMENTO do valor citado. e que seja pago o retroativo até a presente data. 4- Que Vossa Excelência se digne de julgar TOTALMENTE PROCEDENTE a presente ação, de maneira que condene o Réu à concessão do benefício do Auxílio Reclusão, a partir da data da reclusão do Reeducando, uma vez que a Parte Autora tem legitimidade e dependência em relação ao benefício pleiteado; 5 - Informa a Requerente que, a teor do § 4º, do art. 17, da Lei 10.259/2001, renuncia ao valor excedente à 60 salários mínimos; 6- Que seja o Órgão Requerido condenado ao pagamento de honorários advocatícios na base de 30% sobre o valor da condenação;" Protestou o de estilo. Atribuiu valor à causa e juntou instrumento de procuração e documentos.

Decisão que determinou a intimação da parte autora para regularizar a representação processual, a fim de que passasse a constar, no instrumento de procuração, a criança YGOR IZAIAS SANTOS SILVA representada por sua Genitora; a parte autora cumpriu a determinação.

Decisão na qual foi deferido, provisoriamente, o benefício da assistência judiciária gratuita; determinada a intimação do INSS para se manifestar sobre o pedido de tutela de urgência; e, no momento oportuno, que os autos seguissem para o MPF, ante a existência de interesse de menor impúbere.

O INSS apresentou Contestação, na qual afirmou que a Parte Autora não faria jus ao benefício pleiteado porque não teria juntado aos autos documentação suficiente que comprovasse o período em que alega ter o seu genitor laborado como trabalhador rural; os documentos coligidos não possuiriam valor probatório, eis que as informações neles contidas decorreriam de simples declaração da própria interessada, sem garantia de veracidade; não haveria probabilidade do direito; também não haveria receio de dano irreparável ou de difícil reparação, porque o recolhimento do genitor do Autor teria ocorrido em 2013 e apenas em 13/12/2018 é que teria resolvido procurar o Judiciário; também estaria presente o risco da irreversibilidade da medida. Transcreveu ementas de decisões judiciais e requereu: "a) sejam acolhidas as preliminares/prejudiciais articuladas; b) seja indeferido o pedido de tutela de urgência; c) sejam os pedidos julgados, por não possuir a parte autora o direito IMPROCEDENTES perseguido; d) a condenação da Autora ao pagamento das custas processuais e honorários advocatícios (art. 12, Lei n° 1.060/50); e) a admissão da prescrição quinquenal antecedente à propositura da demanda a) a fixação dos juros de mora e da correção monetária, nos termos do art. 1º-F da Lei nº 9.494/97; b) sejam os honorários advocatícios fixados nos termos do § 4º, art. 20 do CPC. f) Requer, por fim, que a seja fixada a partir da citação da autarquia data de início do benefício nestes autos."

O Autor apresentou Réplica.

O Ministério Público Federal - MPF ofertou r. Parecer manifestando-se "pela concessão da segurança a fim de ser determinado ao INSS que aprecie o requerimento administrativo do Autor"(sic)..

2-Fundamentação

2.1- Da tutela de urgência

2.1.1 - Temo que o d. Representante do MPF não tenha lido o  processo,  pois não estamos diante de um mandado de segurança.

2.1.2 - O Autor, menor impúbere, representado por sua genitora, requer, a título de tutela de urgência, a concessão do benefício de Auxílio-Reclusão.

Os requisitos para o deferimento da tutela de urgência estão elencados no art. 300 do CPC, que assim dispõe:

"Art. 300.  A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão."

Portanto, dois requisitos devem estar sempre presentes para a concessão da tutela de urgência: a probabilidade do direito alegado, que surge do confronto entre as alegações da parte autora e as provas constantes dos autos, baseada em uma cognição sumária; e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, quando houver uma situação de urgência que não possa aguardar o desenvolvimento natural do processo, sob pena de ineficácia ou inutilidade do provimento final.

Quanto ao benefício pretendido, estabelece o art. 80 da Lei nº 8.213/91 que os requisitos para a sua concessão são semelhantes aos estabelecidos para a concessão da Pensão por morte, regendo-se pela lei vigente à época do recolhimento do segurado à prisão, a saber:

"Art. 80. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão, que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou de abono de permanência em serviço.

Parágrafo único. O requerimento do auxílio-reclusão deverá ser instruído com certidão do efetivo recolhimento à prisão, sendo obrigatória, para a manutenção do benefício, a apresentação de declaração de permanência na condição de presidiário.".

No caso concreto, tendo que quanto ao recolhimento à prisão de ANTONIO JOÃO DA SILVA, ocorrido em 08/05/2013, são aplicáveis as disposições da Lei nº 8.213/91, na redação dada pela Lei nº 9.032/95, pela Lei nº 9.528/97 (precedida da Medida Provisória n. 1.596-14, de 10-11-1997) e pela Lei nº 9.876/99, que estatui:

"Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:

I - do óbito, quando requerida até 30 dias depois deste;

II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso anterior;

III - da decisão judicial, no caso de morte presumida.

Art. 26. Independe de carência a concessão das seguintes prestações:

I - pensão por morte, auxílio-reclusão, salário-família e auxílio-acidente;".

Além disso, de acordo com o art. 201, inciso IV, da CR/88, e no art. 13 da Emenda Constitucional nº 20/98, o auxílio-reclusão será devido aos dependentes dos segurados de baixa renda da seguinte forma:

"Art. 13. Até que a lei discipline o acesso ao salário-família e auxílio-reclusão para os servidores, segurados e seus dependentes, esses benefícios serão concedidos apenas àqueles que tenham renda bruta mensal igual ou inferior a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais), que, até a publicação da lei, serão corrigidos pelos mesmos índices aplicados aos benefícios do regime geral de previdência social.".

O Decreto nº 3048/99, ao regulamentar o artigo 13, da EC nº 20/98, vinculou o deferimento do benefício de auxílio-reclusão aos proventos percebidos, ou não, pelo segurado-apenado:

"Art. 116. O auxílio-reclusão será devido, nas mesmas condições da pensão por morte, aos dependentes do segurado recolhido à prisão que não receber remuneração da empresa nem estiver em gozo de auxílio-doença, aposentadoria ou abono de permanência em serviço, desde que o seu último salário-de-contribuição seja inferior ou igual a R$ 360,00 (trezentos e sessenta reais).".

Tal limitação vem sendo reajustada periodicamente a partir de fevereiro de 2009 mediante portarias ministeriais.

Acrescente-se que o C. STF, em sede de repercussão geral, firmou o entendimento no sentido de que, nos termos do art. 201, IV da CR/88, a renda do segurado preso é a que deve ser utilizada como parâmetro para a concessão do benefício e não a de seus dependentes[1]).

Assim, para a concessão do auxílio-reclusão devem ser preenchidos os  seguintes requisitos: a) efetivo recolhimento à prisão; b) demonstração da qualidade de segurado do recluso à prisão; c) condição de dependente de quem objetiva o benefício; d) prova de que o segurado não está recebendo remuneração de empresa ou de que está em gozo de auxílio-doença, de aposentadoria ou abono de permanência em serviço; e) comprovação de baixa renda, para benefícios concedidos a partir da Emenda Constitucional nº 20/98.

Ocorre que, neste momento processual, reputo ausente o requisito da probabilidade do direito alegado, pois, com os documentos juntados aos autos não se pode decidir, com segurança, acerca do preenchimento do requisito "qualidade de segurado" do genitor do Autor, na categoria de segurado especial.

As provas até esse momento juntadas são insuficientes para comprovar que o genitor do Autor trabalhava "individualmente ou em regime de economia familiar" (Lei nº 8.213/91, art. 11, VII, §1º), a exemplo da declaração de exercício de atividade rural que apenas foi emitida pelo Sindicato dos Trabalhadores Rurais de Tacaimbó/PE mais de cinco anos depois do recolhimento do Sr. Antônio João da Silva ao cárcere (id. 4058300.9564756).

Portanto, ausente a probabilidade do direito alegado, não pode ser deferida a tutela provisória de urgência antecipada neste momento processual.

Ausente o pressuposto supracitado, desnecessária a análise da presença do perigo de dano, tendo em vista que a concessão do provimento demandaria a concomitância dos dois pressupostos.

3- Conclusão

Posto isso,

3.1 - indefiro o pedido de tutela de urgência;

3.2- digam as Partes se há provas a produzir, especificando-as e justificando o seu requerimento.

Prazo de quinze dias contado em dobro em favor do Réu/INSS/Advocacia Pública (CPC, art. 186).

Caso seja requerida a produção de prova testemunhal, apresentem de logo as Partes o respectivo rol de testemunhas, com seus endereços e demais informações previstas no art. 450 do CPC.

Após a manifestação das Partes, ao MPF, tendo em vista a existência de interesse de menor impúbere.

Int.

Recife, 15.09.2020.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara Federal/PE

(rmc)

 

 

[1]BRASIL. SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Disponível em:  http://www.stf.jus.br/portal/jurisprudencia/visualizarEmenta.asp?s1=000087485&base=baseAcordaos. Acesso em: 05/11/2018