terça-feira, 27 de julho de 2010

PRAZO PRESCRICIONAL. AÇÃO REGRESSIVA DO RESPONSÁVEL TRIBUTÁRIO CONTRA O CONTRIBUINTE.

Por Francisco Alves dos Santos Jr


Segue uma sentença onde interessantíssimos assuntos de direito tributário são debatidos, envolvendo o direito de regresso do Responsável Tributário contra o Contribuinte, quando paga tributo no lugar deste. Qual o prazo prescricional? O Responsável sub-roga-se nos direitos de sujeito ativo da Fazenda Pública? É caso de parafiscalidade?

Boa leitura.




PODER JUDICIÁRIO
JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA
Seção Judiciária de Pernambuco
2ª VARA

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior
Processo nº 2009.83.00.006415-7 – Classe 029 – Ação Ordinária
Autor: CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CAIXA (OAB-PE .........................).
Réu: PERNAMBUCO PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS S/A – PERPARTE – PE (OAB-PE................).

Registro nº ...........................................
Certifico que eu registrei esta Sentença às fls..........
Recife, ...../...../2009.

Sentença tipo A



EMENTA:- TRIBUTÁRIO. RESPONSABILIDADE TRIBUTÁRIA.
RESPONSÁVEL X CONTRIBUINTE. SUBROGAÇÃO. AÇÃO REGRESSIVA.

O Responsável tributário que paga o tributo sub-roga-se nos direitos da Fazenda Pública e com todos os direitos desta pode cobrar o respectivo valor do Contribuinte, exceto o valor das multas por infrações que tenha praticado.

Prescrição para a cobrança é a mesma do crédito tributário.

Procedência parcial.


Vistos etc.

A CAIXA ECONÔMICA FEDERAL – CAIXA, devidamente qualificada na Inicial, ajuizou, em 24.04.2009, esta ação ordinária, contra a PERPART – PERNAMBUCO PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS S/A, aduzindo, em síntese, que em março de 2007 a Secretaria da Receita Federal teria autuado a Caixa Econômica Federal pelo não recolhimento e repasse da CPMF no período de 1999 a 2002 de algumas contas em razão de não haver enquadramento nas situações de não incidência, imunidade ou alíquota zero da mencionada contribuição; que, entre elas, haveriam contas de titularidade da CPRH – COMPANHIA PERNAMBUCANA DE MEIO AMBIENTE, quais sejam, 0047.006.10-3, 0651.006.3-4, 0651.006.4-2, 0651.006.5-0, 0651.006.6-9, 0651.006.7-7, 0651.006.8-5, 0651.006.9-3, 0651.006.20-4 e 0651.006.21-2; que, em 17.04.2007, a Autora teria efetuado às suas expensas e em decorrência da autuação, o recolhimento referente à CPMF de 2.513 contas, incluindo as acima referidas, no valor de R$ 55.318.282,02 (cinquenta e cinco milhões, trezentos e dezoito mil, duzentos e oitenta e dois reais e dois centavos), correspondentes ao valor nominal de CPMF não retido nas contas apontadas, as quais seriam de titularidade da extinta CPRH, cujos ativos e passivos estariam aos cuidados da parte ré; que desde novembro de 2007 a Caixa pedira esclarecimentos sobre o gozo de condição que legalmente afastasse do contribuinte o dever de pagar a CPMF, bem como alertado sobre a necessidade de ressarcimento da CPMF e encargos pagos em virtude da autuação da Receita Federal. Sustentou, ainda, que o direito de regresso pleiteado encontraria amparo legal e jurídico no art. 934 do Código Civil; que a legislação de regência da CPMF (Lei nº 9.311/96), principalmente no seu art. 5º, esclarecia que o contribuinte (correntista) também teria a responsabilidade pelo recolhimento do tributo; que na mecânica da CPMF a responsabilidade pela retenção e repasse do tributo seria da Caixa, mas que o contribuinte seria a empresa incorporada pela Ré; que a CPRH – PERNAMBUCANA DE MEIO AMBIENTE estaria gozando indevidamente da não incidência da contribuição, eis que seria pessoa jurídica de direito privado, sujeita ao tributo, não se enquadrando nas situações previstas no art. 3º, inciso I, da Lei nº 9.311/96. Teceu outros comentários e requereu a citação da Ré e a sua condenação ao pagamento do valor de R$ 49.626,36 (quarenta e nove mil, seiscentos e vinte e seis reais e trinta e seis centavos), a serem atualizados pela taxa SELIC, pro-rata die, desde a data em que a Caixa fizera o recolhimento à Receita Federal (17.04.2007) até a efetiva restituição; a condenação da parte ré ao ressarcimento das custas e verba honorária arbitrada em 20% sobre o total devido. Protestou o de estilo e atribuiu valor à causa. Inicial instruída com cópia de instrumento de procuração e de documentos, às fls. 08-79.

Citada, a PERNAMBUCO PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS S/A – PERPART apresentou Contestação, às fls. 89-97, arguindo a prejudicial de prescrição quinquenal. Fez uma pequena consideração sobre o arcabouço normativo da CPMF e sustentou que o caso vertente seria relativo à responsabilidade tributária originária, na qual o encargo de reter e satisfazer o crédito tributário no prazo legal seria de responsabilidade tributária da Caixa Econômica Federal, por força do art. 5º da Lei nº 9.311/96; que não obstante ser uma determinação decorrente de lei, seria de costume observar nos contratos bancários a existência de cláusula específica autorizando a instituição bancária a proceder com a retenção e recolhimento dos valores devidos, sendo esta, mais uma característica determinante para a apuração de responsabilidades; que no caso da CPMF também concorreriam fatores agravantes que imporia a responsabilidade da instituição financeira pelo adequado adimplemento da contribuição, tais como a inexistência de meios para o contribuinte efetuar o recolhimento no prazo da norma, bem como a expectativa legal e contratual de que a instituição contratada procedesse com as retenções e recolhimentos cabíveis; que, por força de lei e do contrato, seria inequívoca a conclusão de que a responsabilidade de reter e recolher o tributo CPMF seria da parte autora; que a responsabilidade supletiva estampada no § 3º do art. 5º da Lei nº 9.311/96 em nada macularia a responsabilidade da Caixa, eis que tal dispositivo retrataria uma posição subsidiária do contribuinte; que o caráter supletivo da responsabilidade do contribuinte apenas poderia ser avocado pela Secretaria da Receita Federal. Teceu outros comentários e afirmou, ainda, que a PERPART, no momento da incorporação da CPRH, não teria adquirido a titularidade das contas informadas na notificação ora impugnada, razão por que deveria ser rejeitada a cobrança perseguida. Requereu o acolhimento da prejudicial de prescrição quinquenal e, se não fosse o entendimento, a improcedência da demanda, condenando-se a parte autora nos consectários legais. Protestou o de estilo e pediu deferimento. Contestação instruída com instrumento de procuração e cópia de documentos, às fls. 98-105.

Réplica à Contestação apresentada pela Caixa Econômica Federal, às fls. 112-115.

Vieram os autos conclusos para sentença.

É o Relatório.
Passo a decidir.

Exceção de Prescrição

A Ré sustenta que o crédito em questão encontra-se fulminado pela prescrição qüinqüenal, prevista no inciso I do § 5º do art. 206 do Código Civil, que tem a seguinte redação:
Art. 206. Prescreve.
(...).
§ 5º - Em cinco anos:
I – a pretensão de cobrança de dívidas líquidas constantes de instrumento público ou particular.
A Autora, na réplica, sustenta que o prazo seria de três anos, como previsto nos incisos IV e IV do § 3º do art. 206 ou então o prazo de cinco anos previsto no inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional.
Tenho que o prazo para a Instituição Financeira, que paga tributo como Responsável tributária, pleitear ressarcimento perante o Contribuinte do tributo , deve ser buscado no Código Tributário Nacional e na Lei relativa ao tributo e não no Código Civil, porque a relação em questão decorreu de uma obrigação tributária, ex lege, e a Responsável tributária sub-roga-se como credora da dívida tributária, ficando no pólo ativo da relação obrigacional tributária.(Na obrigação tributária, o polo passivo é, quase sempre, duplo: Contribuinte, o que pratica o fato gerador, e Responsável, aquele que tem alguma relação com o fato gerador e é eleito pela Lei do tributo como tal - art. 121 c/c o art. 128, todos do Código Tributário Nacional. E são solidários, sem benefício de ordem - art. 124 e respectivo Parágrafo Único do Código Tributário Nacional).
Desde já, data venia, afasto a aplicação do inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional, porque o prazo fixado nesse dispositivo é para repetição de indébito tributário, ou seja, quando Contribuinte paga indevidamente um tributo e requer restituição à Fazenda Pública, tendo, pois, o prazo de cinco anos, fixado nesse dispositivo, para protocolar o respectivo requerimento administrativo ou propor a respectiva ação de repetição de indébito.
O prazo para o Responsável tributário exigir do Contribuinte solidário o valor do tributo que por este recolheu para a Fazenda Pública é o mesmo que a Fazenda Pública tem para cobrar o tributo de qualquer deles.
No caso, a Fazenda Pública já cobrou o crédito tributário da Instituição Financeira tida, legalmente, por Responsável tributária(a ora Autora), e, como o prazo para a Responsável exigir do Contribuinte, devedor solidário, o respectivo ressarcimento, é o mesmo da Fazenda Pública para exigir o tributo, temos a seguinte situação: a CPMF era um tributo submetido ao lançamento por homologação, de forma que o prazo decadencial para lançar era de cinco anos, contado da data do fato gerador(§ 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional) e, depois do lançamento, o prazo prescricional para exigir era de cinco anos(art. 174 do Código Tributário Nacional).
No presente caso, o lançamento foi feito dentro do prazo de cinco anos e deu-se pela modalidade auto-de-infração, em 17.04.2007, fato esse incontroverso, porque alegado na petição inicial e não impugnado na defesa.
O prazo de prescrição dos tributos federais se inicia a partir do primeiro dia após o término do prazo de 30(trinta)dias para impugnação do lançamento(Inciso V do art. 10 do Decreto nº 70.235, de 06.03.1972, Decreto esse que, em face do direito então vigente, tem força de Lei), e assim é porque não pode fluir prescrição contra qualquer tipo de credor, quando o credor não pode exigir o seu crédito.
Tem-se, então, que o prazo de prescrição do crédito tributário em questão se iniciou em 18.05.2007, já que a Responsável pelo tributo foi notificada da autuação fiscal em 17.04.2007, de forma que prescreveria em 18.05.2012.
Como esta ação foi proposta em 27.04.2009, conforme Termo de Autuação de fl. 02, conclui-se que não houve a alegada prescrição.
Portanto, a exceção de prescrição, levantada pela Ré, não merece acolhida.

O Mérito da Questão em Debate

Tenho que estamos diante de uma situação de substituição tributária simultânea(como se sabe, existe em direito tributário a responsabilidade por transferência e as responsabilidades por substituição tributária e estas são antecedentes(ou p’ra trás),simultâneas ou concomitantes e subseqüentes(ou p’ra frente), autorizada no art. 128 do Código Tributário Nacional e concretizada, para o caso presente, no art. 5º, inciso I da Lei nº 9.311, de 1996, pela qual era regida a extinta Contribuição Provisória sobre Movimentação Financeira-CPMF.
Nesse tipo de responsabilidade, conforme se extrai da íntegra do invocado art. 128 do Código Tributário Nacional, o Contribuinte do tributo poderá ou não ficar supletivamente responsável. Dependerá apenas do que for estabelecido na Lei do Ente Tributante. No caso ora debatido, Lei Ordinária do Ente Tributante, que é a acima indicada, ressalvou expressamente a responsabilidade supletiva do Contribuinte.
Então, segundo referida Lei, a Instituição Financeira é Responsável por substituição tributária, de forma que deveria deduzir do ativo financeiro do Contribuinte o valor da CPMF e recolher esse valor para os cofres do Sujeito Ativo da relação obrigacional tributária.
Se a Instituição Financeira não fizesse a retenção, tampouco o recolhimento, a União poderia exigir o tributo de qualquer dos sujeitos passivos, ou seja, da Responsável(no caso, a Instituição Financeira ora Autora)ou do Contribuinte(a então CPRH ou da sua Sucessora), porque a substituição tributária fixada na Lei não afastou a solidariedade entre esses dois Sujeitos Passivos.
No caso, a Fazenda Pública(União)optou por exigir o tributo da Responsável, a ora Autora.
Como a Lei ressalvou a responsabilidade supletiva do Contribuinte, no caso a CPRH que foi sucedida legalmente pela PERPART – PERNAMBUCO PARTICIPAÇÕES E INVESTIMENTOS S/A, ora Ré, não há dúvida que esta se encontra obrigada a ressarcir a Autora do valor que esta desembolsou, como responsável tributária, da CPMF então devido pela CPRH.
A autora sub-rogou-se nos direitos da Fazenda Pública e passou a ser o sujeito ativo da relação obrigacional tributária. Exsurge situação semelhante à parafiscalidade, autorizada na segunda parte do art. 7º do Código Tributário Nacional, sendo, por isso, aplicável, analogicamente, as regras do § 1º desse dispositivo do Código Tributário Nacional, que estende àquele que fica no pólo ativo da obrigação tributária, no lugar da Fazenda Pública própria, todos os privilégios e preferências desta.
No entanto, data venia dos que pensam em sentido contrário, quanto ao valor da sub-rogação abrange apenas o valor do tributo e dos juros, não o valor das multas(seja multa de mora, seja multa fiscal ou ambas, porque todas, inclusive a moratória, segundo o C. Supremo Tribunal Federal – v. julgados que deram origem à sua Súmula 565 – têm caráter punitivo), porque estas decorrem de infração da ora Autora, para a qual a ora Ré não contribuiu com nenhuma parcela de culpa e nesse sentido é expresso o Código Tributário Nacional no seu art. 137 e também se aplica, mutatis mutandis, o inciso XLV do art. 5º da Constituição da República, segundo o qual “nenhuma pena passará da pessoa do condenado”.


Conclusão

Posto isso:
a) rejeito a exceção de prescrição
b) julgo parcialmente procedentes os pedidos desta ação e condeno a Requerida a ressarcir a Autora do valor do tributo em questão, principal + juros de mora(tabela selic), que esta pagou como Responsável tributária em substituição da ora Requerida, atualizados pelos juros da tabela SELIC, e, como foi mínima a sucumbência da Autora, à luz do Parágrafo Único do art. 21 do Código de Processo Civil, condeno a Requerida em verba honorária, que arbitro em 10%(dez por cento) do valor total da condenação.

A apuração do valor líquido será feita à luz das regras do art. 475-B do Código de Processo Civil.

P.R.I.

Recife, 27 de julho de 2010.


Francisco Alves dos Santos Júnior
Juiz Federal, 2ª Vara-PE