domingo, 11 de junho de 2023

AÇÃO DE EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. INOCORRÊNCIA.

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Segue interessante acórdão relativo à alegada e inexistente prescrição intercorrente da pretensão executiva de Autarquia Corporativa, com cuidadoso estudo do caso, da legislação aplicável e da jurisprudência dominante do Supremo Tribunal Federal e do Superior Tribunal de Justiça. 

Boa leitura. 


Observação: acórdão pesquisado e minutado pela Assessora Ana Carolina de Freitas Souza.

 

 

PROCESSO Nº: 0000656-55.2008.8.17.0380 - APELAÇÃO CÍVEL

APELANTE: CONSELHO REGIONAL DE FARMACIA DE PERNAMBUCO

ADVOGADO: Bergson Jose Nogueira Do Nascimento

APELADO: A C C B

ADVOGADO: J L G De A

RELATOR(A): Desembargador(a) Federal Francisco Alves dos Santos Júnior - 5ª Turma

JUIZ PROLATOR DA SENTENÇA (1° GRAU): Juiz(a) Federal

 

RELATÓRIO

1- Trata-se de recurso de apelação interposto pelo CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DE PERNAMBUCO contra a r. sentença proferida pelo MM. Juízo da 2ª Vara da Comarca de Cabrobó/PE, no exercício de competência federal, pela qual se julgou extinta a execução fiscal nº 0000656-55.2008.8.17-0380 e, consequentemente, o crédito tributário, ante o reconhecimento da prescrição intercorrente (id. 8170380.35931431).

2 - Em suas razões recursais (id. 8170380.35931430), o Apelante sustentou que, considerando sua natureza jurídica de autarquia, seus representantes possuem a prerrogativa da intimação pessoal em execução fiscal, conforme entendimento fixado pelo STJ quando do julgamento do REsp repetitivo nº 1.330.473/SP, a qual não foi observada, razão pela qual estaria afastada a inércia necessária à decretação da prescrição intercorrente. O Apelante ressaltou que a demora na intimação da Fazenda Pública não poderia gerar responsabilização, conforme entendimento externado no REsp repetitivo nº 1.340.553-RS.

3 - Em vista disso, o Apelante requereu "o conhecimento e o provimento do presente recurso de apelação, a fim de reformar a sentença, haja vista o error in judicando, haja vista o cerceamento do contraditório e devido processo legal, pois a mora do Poder Judiciário para intimar a Fazenda Pública e em atender os requerimentos tempestivos há de ser submetida à mesma lógica que ensejou a publicação da Súmula nº 106/STJ, conforme os Repetitivos do REsp. nº 1.340.553-RS".

4 - Não foram apresentadas contrarrazões (id. 8170380.35931426).

5 - Certidão de regularidade do preparo em id. 4050000.35983804.

6 - Em seguida, os autos vieram-me conclusos.

É o relatório.

VOTO

O Desembargador Federal Francisco Alves dos Santos Junior (relator):

Trata-se de recurso de apelação interposto, a tempo e modo, pelo CONSELHO REGIONAL DE FARMÁCIA DE PERNAMBUCO, devidamente preparado.

O mérito recursal cinge-se à ocorrência ou não da prescrição intercorrente em execução fiscal movida pelo Conselho Regional de Farmácia do Estado de Pernambuco - CRF/PE contra Firma A C C B - Filial para cobrança de crédito não tributário consubstanciado na CDA nº 0547/08, referente à multa administrativa por infração ao art. 24 da Lei nº 3.820/1960, no valor originário de R$1.944,26 (um mil e novecentos e quarenta e quatro reais e vinte e seis centavos.

A prescrição intercorrente nas execuções fiscais regula-se pelo art. 40 da Lei de Execuções Fiscais (LEF - Lei nº 6.830/1980), segundo o qual o juiz deve suspender o curso da execução quando o devedor não é localizado ou não são encontrados bens para penhora, sendo que, durante esse interregno, não correrá o prazo prescricional (art. 40, caput, da LEF).

Decorrido o prazo máximo de um ano sem alteração da situação fática, os autos devem ser arquivados.

A partir de então volta, automaticamente, a fluir o prazo prescricional quinquenal[1], cuja fluência até então estava suspensa e, uma vez transcorrido, o magistrado deve, depois de ouvida a Fazenda Pública, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato (art. 40, §4º, da LEF).                   

Anote-se que o Supremo Tribunal Federal (STF) declarou a constitucionalidade das regras que disciplinam a prescrição intercorrente ocorrida no curso de processos de execução fiscal por meio de decisão unânime do Plenário no julgamento do RE 633.562, com repercussão geral (Tema 390 - "É constitucional o art. 40 da Lei nº 6.830/1980 (Lei de Execuções Fiscais - LEF), tendo natureza processual o prazo de 1 (um) ano de suspensão da execução fiscal. Após o decurso desse prazo, inicia-se automaticamente a contagem do prazo prescricional tributário de 5 (cinco) anos.").

Com o fito de perquirir sobre os marcos da fluência e de eventual interrupção do prazo da prescrição intercorrente é imprescindível recapitular as movimentações processuais desde a distribuição da execução fiscal.

  • Em 21/05/2008, a ação foi distribuída e foi proferido o "cite-se".
  • Em 07/07/2008, o executado apresentou exceção de pré-executividade.
  •  Em 28/07/2019, os autos foram conclusos para despacho.
  • Em 04/10/2016, o Juízo da Vara Única da Comarca de Cabrobó proferiu despacho, determinando a remessa dos autos à Central de Agilização Processual.
  • Em 13/12/2016, os autos foram recebidos na Central de Agilização Processual e na mesma data foi proferido o seguinte despacho: "Intime-se a parte exequente remetendo-se os presentes autos para, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, sob pena de extinção: 1. Informar se ainda possui interesse no feito. 2. Caso ainda tenha interesse no feito a. Se manifestar sobre a exceção de pré-executividade; b. Requerer as demais diligências que entender de direito. Após o prazo assinalado, com ou sem manifestação do exequente, retornem os autos conclusos".
  • Em 26/01/2017, os autos foram devolvidos à Vara Única da Comarca de Cabrobó.
  • Em 08/09/2017, os autos foram redistribuídos à Segunda Vara da Comarca de Cabrobó.
  • Em 12/09/2017, os autos foram recebidos na Segunda Vara da Comarca de Cabrobó.
  • Em 06/12/2018, os autos foram remetidos Pa Procuradoria do Conselho Regional de Farmácia do Estado de Pernambuco - CRF/PE.
  • Em 23/01/2018, foi protocolizada petição do exequente, requerendo a penhora de bens via antigo BACENJUD e RENAJUD.
  • Em 25/01/2018, a petição supra referida foi juntada.
  • Em 30/01/2019, os autos foram conclusos.
  • Em 17/03/2020, foi registrada e publicada a sentença extintiva.

 Contata-se do histórico de tramitação processual que, desde o protocolo da exceção de pré-executividade (07/07/2008) até a data em que determinada providências a cargo do exequente pelo magistrado a quo (12/12/2016), a demora na marcha do processo se deu por trâmites burocráticos e cartorários internos da máquina judiciária.

Desde a distribuição, o Exequente (ora Apelante) somente teve acesso aos autos em 06/12/2018, quando os autos foram remetidos à Procuradoria, de modo que só a partir dessa data poderia se manifestar sobre a exceção de pré-executividade e requerer providências, tendo em vista que, em execução fiscal ajuizada por conselho de fiscalização profissional, seu representante judicial possui a prerrogativa de ser pessoalmente intimado, conforme tese fixada no Tema 580 do STJ.

A manifestação do exequente sobreveio logo após sua intimação pessoal, porém seus requerimentos não foram, sequer, analisados pelo juiz sentenciante, que já reconheceu, de plano,  a prescrição, fulminando, portanto, a pretensão executória.

Ou seja, aproximadamente, dez anos se passaram sem que a demora na satisfação do crédito pudesse ser atribuída à inércia do interessado.

Com efeito, a demora na tramitação do processo por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, é inteiramente imputável ao Poder Judiciário e atrai a incidência da Súmula 106 do STJ[2].

Nesse sentido, colaciono precedente deste E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região elucidativo da matéria:

"EMENTA: PROCESSO CIVIL. EXECUÇÃO FISCAL. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE NÃO CONFIGURADA. NULIDADE DA CDA NÃO RECONHECIDA. AUSÊNCIA DE PROVA INEQUÍVOCA. IMPROVIMENTO.

1. Agravo de instrumento interposto por CERÂMICA TIBIRI LTDA ME contra decisão proferida pelo magistrado estadual, investido de jurisdição federal, da Vara única da Comarca de Parelhas - RN que, no Processo nº 0000065-41.2007.8.20.0123 (Ação de Execução Fiscal), indeferiu pedido de reconhecimento de prescrição intercorrente.

2. Primeiramente, quanto à alegação de prescrição da pretensão executória, esta não merece acolhimento. Consoante documento anexado à petição inicial da execução fiscal, trata-se de dívida constituída mediante auto de infração pelo IBAMA, com data de vencimento em 06/09/2004. Tratando-se de multa administrativa, aplica-se ao caso o disposto no art. 1º-A da Lei nº 9.873/1999, de modo que a Fazenda Pública dispõe do prazo de cinco anos para promover a execução fiscal. O feito executório foi ajuizado pelo IBAMA em 2006, razão pela qual se afasta a tese de prescrição da execução.

3. A prescrição intercorrente corresponde à hipótese de extinção da pretensão executiva que se configura em decorrência da inércia endoprocessual. Ou seja, ajuizada a execução fiscal, o advento da prescrição intercorrente pressupõe a ausência de citação do devedor por qualquer meio válido e/ou a não localização de bens sobre os quais possa recair a penhora, seguida da desídia do autor em promover medidas executivas potencialmente capazes de realizar o propósito de satisfação do crédito inadimplido no quinquênio legal.

4. No que concerne ao início da contagem do prazo extintivo, o STJ, em sede de julgamento de Recurso Especial Repetitivo - Resp nº 1.340.553/RS - afirmou que ela se dá de forma automática, após o fim do prazo de suspensão do processo, fixando a seguinte tese: "O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, parágrafos 1º e 2º da Lei n. 6.830/80 - LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução (...)".

5. Conforme se observa, o início do prazo da prescrição intercorrente (cinco anos) se dá após o transcurso do lapso temporal de 01 (um) ano de suspensão do processo. Dessa forma, para se afirmar a ocorrência da prescrição intercorrente é necessário o cômputo final de 06 (seis) anos, sendo 01 (um) ano de suspensão e 05 (cinco) anos desde o arquivamento dos autos sem baixa.

6. Compulsando os autos, observa-se que: a) trata-se de execução fiscal movida pelo IBAMA em face de Cerâmica Tibiri Ltda., ajuizada em 14/12/2006, objetivando a cobrança de crédito concernente à multa administrativa; b) o representante legal da executada foi citado em 24/01/2007; c) em 31/01/2007, foi certificado pelo Oficial de Justiça que deixou de proceder à penhora de bens por desconhecer a existência de bens da executada que ainda não tivessem sido penhorados; d) o IBAMA foi intimado da certidão acima em 15/06/2007 e, em 27/07/2007, requereu a penhora de tijolos da executada; e) em 18/06/2008, foi certificado por Oficial de Justiça a frustração da medida judicial (penhora dos tijolos), considerando que a empresa estaria inativa há mais de quatro anos; f) o IBAMA, em 08/08/2008, pleiteou a penhora via Bacenjud, bem como o redirecionamento em face do corresponsável; g) em 26/05/2009, foi proferido despacho, deferindo a penhora; h) o IBAMA, tendo sido intimado em 14/11/2012, acostou nova petição, requerendo o redirecionamento do feito; i) o pedido foi indeferido, conforme decisão proferida em 21/02/2013; j) o IBAMA foi intimado em 11/10/2013, tendo requerido nova busca de bens via Renajud; k) a busca via Renajud ocorreu em dezembro de 2014, após tentativa frustrada de conciliação entre as partes, realizada em audiência ocorrida no dia 06/12/2013; l) em 08 de março de 2016, foi determinada a intimação da Fazenda Pública, para indicar bens à penhora, sendo os autos remetidos ao IBAMA em 17/05/2017; m) o IBAMA acostou novo pedido de redirecionamento, em 12/06/2017; n) em 07/07/2017, o IBAMA pleiteou a avaliação e penhora de imóvel em nome do particular corresponsável; o) em 20/11/2019, foi lavrado termo de penhora de imóvel de propriedade do sócio da sociedade executada.

5. Observando-se os marcos processuais acima, há que se afastar a prescrição intercorrente, uma vez que a hipótese dos autos atrai a aplicação da Súmula 106 do STJ ("Proposta a ação no prazo fixado para o seu exercício, a demora na citação, por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, não justifica o acolhimento da arguição de prescrição ou decadência").

6. In casu, só se pode afirmar que o IBAMA teve ciência da não localização de bens do devedor quando intimado da frustração do pedido de penhora de tijolos, o que ocorreu em junho de 2008, conforme certidão de vistas ao representante do IBAMA. Neste momento, restou certificado pelo Oficial de Justiça, inclusive, a inatividade da pessoa jurídica executada.

7. Ocorre que, entre o pedido de redirecionamento do feito ao corresponsável (realizado em 08/08/2008) e a nova intimação do exequente (14/11/2012), passaram-se mais de 03 anos sem que sequer o pedido tenha sido efetivamente apreciado, uma vez que o magistrado deferiu tão somente a penhora via Bacenjud. Novamente, o IBAMA formulou pleito de redirecionamento da execução fiscal (formulado em 26/11/2012), cuja análise apenas ocorreu 21/02/2013, tendo o IBAMA sido intimado cerca de 08 meses depois da decisão. Ainda, entre o pedido de busca de bens via Renajud e a realização da medida transcorreu lapso temporal superior a 01 ano. Desta medida judicial, por sua vez, a Fazenda Pública apenas foi intimada em 17/05/2017, ou seja, cerca de 02 anos e 05 meses após sua realização.

8. Tais intervalos de tempo não podem ser imputados ao IBAMA, afastando-se a sua desídia na hipótese. Na realidade, o transcurso do tempo sem realização de medidas efetivas é atribuído aos mecanismos inerentes ao Poder Judiciário, não havendo que se falar em inércia da Fazenda Pública.

9. Registra-se que, embora a efetivação da penhora do imóvel tenha ocorrido em 20/11/2019, a interrupção da prescrição retroage à data em que formulado o pedido pelo IBAMA, o que ocorreu em 07/07/2017. Nesses termos, tem-se por afastada a tese de prescrição intercorrente.

10. Quanto à nulidade da CDA, cabe consignar que não se tratou de matéria ventilada nos autos originários, uma vez que o pedido da parte ora agravante se limitou ao reconhecimento de prescrição intercorrente. Não obstante, tratando-se de matéria de ordem pública, passível de alegação e conhecimento em qualquer grau de jurisdição, é possível sua análise no presente recurso. Todavia, deve ser rechaçada a tese de nulidade. Isto porque as alegações suscitadas pela agravante são demasiado genéricas e não tem o condão de elidir a presunção de certeza e liquidez de que goza a CDA (art. 204 do CTN), o que exige prova inequívoca. Assim, a mera alegação de dúvida quanto à data de ocorrência do fato gerador não é prova robusta para afastar os atributos inerentes ao título exequendo.

11. Agravo de instrumento improvido."

(Brasil. Tribunal Regional Federal da 5ª Região. Terceira Turma. PROCESSO: 08058274520214050000, AGRAVO DE INSTRUMENTO, Relator DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA DAMASCENO, JULGAMENTO: 01/12/2022, grifos nossos).

Logo, não foram implementados quaisquer dos requisitos de que dependem o reconhecimento da prescrição intercorrente, a saber: não localização do executado ou de bens penhoráveis, suspensão automática do processo pelo prazo de um ano, desídia do exequente em promover medidas executivas tendentes à satisfação do crédito e transcurso do prazo de cinco anos após o término do prazo de um ano.

 Ademais, o magistrado sentenciante furtou-se ao dever de, ao reconhecer a prescrição intercorrente, fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo.

A respeito, eis a orientação da jurisprudência do STJ, firmada por ocasião do julgamento do RESp 1.340.553 - RS pela sistemática dos recursos repetitivos, in verbis:

"RECURSO ESPECIAL REPETITIVO. ARTS. 1.036 E SEGUINTES DO CPC/2015 (ART. 543-C, DO CPC/1973). PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. SISTEMÁTICA PARA A CONTAGEM DA PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE (PRESCRIÇÃO APÓS A PROPOSITURA DA AÇÃO) PREVISTA NO ART. 40 E PARÁGRAFOS DA LEI DE EXECUÇÃO FISCAL (LEI N. 6.830/80).
1. O espírito do art. 40, da Lei n. 6.830/80 é o de que nenhuma execução fiscal já ajuizada poderá permanecer eternamente nos escaninhos do Poder Judiciário ou da Procuradoria Fazendária encarregada da execução das respectivas dívidas fiscais.
2. Não havendo a citação de qualquer devedor por qualquer meio válido e/ou não sendo encontrados bens sobre os quais possa recair a penhora (o que permitiria o fim da inércia processual), inicia-se automaticamente o procedimento previsto no art. 40 da Lei n. 6.830/80, e respectivo prazo, ao fim do qual restará prescrito o crédito fiscal. Esse o teor da Súmula n. 314/STJ: "Em execução fiscal, não localizados bens penhoráveis, suspende-se o processo por um ano, findo o qual se inicia o prazo da prescrição qüinqüenal intercorrente".
3. Nem o Juiz e nem a Procuradoria da Fazenda Pública são os senhores do termo inicial do prazo de 1 (um) ano de suspensão previsto no caput, do art. 40, da LEF, somente a lei o é (ordena o art. 40: "[...] o juiz suspenderá [...]"). Não cabe ao Juiz ou à Procuradoria a escolha do melhor momento para o seu início. No primeiro momento em que constatada a não localização do devedor e/ou ausência de bens pelo oficial de justiça e intimada a Fazenda Pública, inicia-se automaticamente o prazo de suspensão, na forma do art. 40, caput, da LEF. Indiferente aqui, portanto, o fato de existir petição da Fazenda Pública requerendo a suspensão do feito por 30, 60, 90 ou 120 dias a fim de realizar diligências, sem pedir a suspensão do feito pelo art. 40, da LEF. Esses pedidos não encontram amparo fora do art. 40 da LEF que limita a suspensão a 1 (um) ano. Também indiferente o fato de que o Juiz, ao intimar a Fazenda Pública, não tenha expressamente feito menção à suspensão do art. 40, da LEF. O que importa para a aplicação da lei é que a Fazenda Pública tenha tomado ciência da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido e/ou da não localização do devedor. Isso é o suficiente para inaugurar o prazo, ex lege.
4. Teses julgadas para efeito dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 543-C, do CPC/1973): 4.1.) O prazo de 1 (um) ano de suspensão do processo e do respectivo prazo prescricional previsto no art. 40, §§ 1º e 2º da Lei n. 6.830/80 - LEF tem início automaticamente na data da ciência da Fazenda Pública a respeito da não localização do devedor ou da inexistência de bens penhoráveis no endereço fornecido, havendo, sem prejuízo dessa contagem automática, o dever de o magistrado declarar ter ocorrido a suspensão da execução; 4.1.1.) Sem prejuízo do disposto no item 4.1., nos casos de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido antes da vigência da Lei Complementar n. 118/2005), depois da citação válida, ainda que editalícia, logo após a primeira tentativa infrutífera de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução.
4.1.2.) Sem prejuízo do disposto no item 4.1., em se tratando de execução fiscal para cobrança de dívida ativa de natureza tributária (cujo despacho ordenador da citação tenha sido proferido na vigência da Lei Complementar n. 118/2005) e de qualquer dívida ativa de natureza não tributária, logo após a primeira tentativa frustrada de citação do devedor ou de localização de bens penhoráveis, o Juiz declarará suspensa a execução.
4.2.) Havendo ou não petição da Fazenda Pública e havendo ou não pronunciamento judicial nesse sentido, findo o prazo de 1 (um) ano de suspensão inicia-se automaticamente o prazo prescricional aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) durante o qual o processo deveria estar arquivado sem baixa na distribuição, na forma do art. 40, §§ 2º, 3º e 4º da Lei n. 6.830/80 - LEF, findo o  qual o Juiz, depois de ouvida a Fazenda Pública, poderá, de ofício, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato; 4.3.) A efetiva constrição patrimonial e a efetiva citação (ainda que por edital) são aptas a interromper o curso da prescrição intercorrente, não bastando para tal o mero peticionamento em juízo, requerendo, v.g., a feitura da penhora sobre ativos financeiros ou sobre outros bens. Os requerimentos feitos pelo exequente, dentro da soma do prazo máximo de 1 (um) ano de suspensão mais o prazo de prescrição aplicável (de acordo com a natureza do crédito exequendo) deverão ser processados, ainda que para além da soma desses dois prazos, pois, citados (ainda que por edital) os devedores e penhorados os bens, a qualquer tempo - mesmo depois de escoados os referidos prazos -, considera-se interrompida a prescrição intercorrente, retroativamente, na data do protocolo da petição que requereu a providência frutífera.
4.4.) A Fazenda Pública, em sua primeira oportunidade de falar nos autos (art. 245 do CPC/73, correspondente ao art. 278 do CPC/2015), ao alegar nulidade pela falta de qualquer intimação dentro do procedimento do art. 40 da LEF, deverá demonstrar o prejuízo que sofreu (exceto a falta da intimação que constitui o termo inicial - 4.1., onde o prejuízo é presumido), por exemplo, deverá demonstrar a ocorrência de qualquer causa interruptiva ou suspensiva da prescrição.
4.5.) O magistrado, ao reconhecer a prescrição intercorrente, deverá fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, inclusive quanto ao período em que a execução ficou suspensa.
5. Recurso especial não provido. Acórdão submetido ao regime dos arts. 1.036 e seguintes do CPC/2015 (art. 543-C, do CPC/1973)".

(Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Seção. REsp n. 1.340.553/RS, relator Ministro Mauro Campbell Marques, julgado em 12/9/2018, DJe de 16/10/2018, grifos nossos).

Pelo exposto, voto no sentido de DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação para anular a sentença recorrida e, em consequência, afastar a prescrição intercorrente, determinando-se o prosseguimento da execução fiscal.

Sem honorários advocatícios, ante a ausência de condenação em primeiro grau de jurisdição.

É como voto.


[1] Art. 1-A da Lei nº 9.873/1999: Constituído definitivamente o crédito não tributário, após o término regular do processo administrativo, prescreve em 5 (cinco) anos a ação de execução da administração pública federal relativa a crédito decorrente da aplicação de multa por infração à legislação em vigor.

[2] Súmula 106 do STJ: Intentada a ação no prazo de lei, a demora na citação, quando por motivo atribuível ao funcionamento da Justiça, não justifica o acolhimento da argüição de decadência. Em casos dessa ordem, a demora não pode ser imputada ao autor.

 

EMENTA

ADMINISTRATIVO. TRIBUTÁRIO. EXECUÇÃO FISCAL. MULTA ADMINISTRATIVA. PRESCRIÇÃO INTERCORRENTE. ART. 40, §4º, DA LEF. INOCORRÊNCIA. DEMORA PROCESSUAL INERENTE AO PODER JUDICIÁRIO. SÚMULA 106 DO STJ. CONSELHO DE FISCALIZAÇÃO PROFISSIONAL QUE GOZA DA PRERROGATIVA DE INTIMAÇÃO PESSOAL. TEMA 580 DO STJ.

1 - O mérito recursal cinge-se à ocorrência ou não da prescrição intercorrente em execução fiscal movida pelo Conselho Regional de Farmácia do Estado de Pernambuco - CRF/PE contra Firma A C Crateu Brandão - Filial para cobrança de crédito não tributário consubstanciado na CDA nº 0547/08, referente à multa administrativa por infração ao art. 24 da Lei nº 3.820/1960, no valor originário de R$1.944,26 (um mil e novecentos e quarenta e quatro reais e vinte e seis centavos.

2 - A prescrição intercorrente nas execuções fiscais regula-se pelo art. 40 da Lei de Execuções Fiscais (LEF - Lei nº 6.830/1980), segundo o qual o juiz deve suspender o curso da execução quando o devedor não é localizado ou não são encontrados bens para penhora, sendo que, durante esse interregno, não correrá o prazo prescricional (art. 40, caput, da LEF). Decorrido o prazo máximo de um ano sem alteração da situação fática, os autos devem ser arquivados. A partir de então começa automaticamente a fluir o prazo prescricional quinquenal[1] e, uma vez transcorrido, o magistrado deve, depois de ouvida a Fazenda Pública, reconhecer a prescrição intercorrente e decretá-la de imediato (art. 40, §4º, da LEF). 

3 - O Supremo Tribunal Federal (STF) já declarou a constitucionalidade das regras que disciplinam a prescrição intercorrente ocorrida no curso de processos de execução fiscal por meio de decisão unânime do Plenário no julgamento do RE 633.562, com repercussão geral (Tema 390).

4 - Com o fito de perquirir sobre os marcos da fluência e de eventual interrupção do prazo da prescrição intercorrente é imprescindível recapitular as movimentações processuais desde a distribuição da execução fiscal. Em 21/05/2008, a ação foi distribuída e foi proferido o "cite-se". Em 07/07/2008, o executado apresentou exceção de pré-executividade. Em 28/07/2019, os autos foram conclusos para despacho. Em 04/10/2016, o Juízo da Vara Única da Comarca de Cabrobó proferiu despacho, determinando a remessa dos autos à Central de Agilização Processual. Em 13/12/2016, os autos foram recebidos na Central de Agilização Processual e na mesma data foi proferido o seguinte despacho: "Intime-se a parte exequente remetendo-se os presentes autos para, no prazo de 15 (quinze) dias úteis, sob pena de extinção: 1. Informar se ainda possui interesse no feito. 2. Caso ainda tenha interesse no feito a. Se manifestar sobre a exceção de pré-executividade; b. Requerer as demais diligências que entender de direito. Após o prazo assinalado, com ou sem manifestação do exequente, retornem os autos conclusos". Em 26/01/2017, os autos foram devolvidos à Vara Única da Comarca de Cabrobó. Em 08/09/2017, os autos foram redistribuídos à Segunda Vara da Comarca de Cabrobó. Em 12/09/2017, os autos foram recebidos na Segunda Vara da Comarca de Cabrobó. Em 06/12/2018, os autos foram remetidos Pa Procuradoria do Conselho Regional de Farmácia do Estado de Pernambuco - CRF/PE. Em 23/01/2018, foi protocolizada petição do exequente, requerendo a penhora de bens via antigo BACENJUD e RENAJUD. Em 25/01/2018, a petição supra referida foi juntada. Em 30/01/2019, os autos foram conclusos. Em 17/03/2020, foi registrada e publicada a sentença extintiva.

5 - Contata-se do histórico de tramitação processual que, desde o protocolo da exceção de pré-executividade (07/07/2008) até a data em que determinada providências a cargo do exequente pelo magistrado a quo (12/12/2016), a demora na marcha do processo se deu por trâmites burocráticos e cartorários internos da máquina judiciária.

6 - Desde a distribuição, o Exequente (ora Apelante) somente teve acesso aos autos em 06/12/2018, quando os autos foram remetidos à Procuradoria, de modo que só a partir dessa data poderia se manifestar sobre a exceção de pré-executividade e requerer providências, tendo em vista que, em execução fiscal ajuizada por conselho de fiscalização profissional, seu representante judicial possui a prerrogativa de ser pessoalmente intimado, conforme tese fixada no Tema 580 do STJ.

7 - A manifestação do exequente sobreveio logo após sua intimação pessoal, porém seus requerimentos sequer foram analisados pelo juiz sentenciante, que já decretou de plano a prescrição, fulminando, portanto, a pretensão executória.

8 - A demora na tramitação do processo por motivos inerentes ao mecanismo da Justiça, é inteiramente imputável ao Poder Judiciário e atrai a incidência da Súmula 106 do STJ. Precedente deste E. Tribunal Regional Federal da 5ª Região: PROCESSO: 08058274520214050000, AGRAVO DE INSTRUMENTO, DESEMBARGADOR FEDERAL FERNANDO BRAGA DAMASCENO, 3ª TURMA, JULGAMENTO: 01/12/2022.

9 - Não foram implementados quaisquer dos requisitos de que dependem o reconhecimento da prescrição intercorrente, a saber: não localização do executado ou de bens penhoráveis, suspensão automática do processo pelo prazo de um ano, desídia do exequente em promover medidas executivas tendentes à satisfação do crédito e transcurso do prazo de cinco anos após o término do prazo de um ano.

10 - O magistrado sentenciante furtou-se ao dever de, ao reconhecer a prescrição intercorrente, fundamentar o ato judicial por meio da delimitação dos marcos legais que foram aplicados na contagem do respectivo prazo, consoante orienta a jurisprudência do STJ, firmada por ocasião do julgamento do RESp 1.340.553 - RS pela sistemática dos recursos repetitivos.

11 - Recurso conhecido e provido para anular a sentença recorrida, afastar a prescrição intercorrente e determinar o prosseguimento da execução fiscal.

12 - Sem honorários advocatícios, ante a ausência de condenação em primeiro grau de jurisdição.

ACÓRDÃO

Vistos, relatado e discutido o que constou destes autos, em que são partes as acima mencionadas, acordam os Desembargadores Federais da Quinta Turma do TRF da 5ª Região, em sessão realizada nesta data, por unanimidade, em CONHECER E DAR PROVIMENTO ao recurso de apelação, nos termos do voto do Relator e notas taquigráficas constantes dos autos, que ficam fazendo parte do presente julgado.

 Recife, 05.06.2023.

Francisco Alves dos Santos Júnior

Desembargador Federal Relator

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