domingo, 11 de junho de 2023

CONTRIBUIÇÃO DO SALÁRIO EDUCAÇÃO. PRODUTOR RURAL, PESSOA FÍSICA. CASO DE PLANEJAMENTO TRIBUTÁRIO NÃO PERMITIDO?

 

Por Francisco Alves dos Santos Júnior

Segue uma decisão com abordagem geral da atual jurisprudência da Primeira Seção e da Segunda Seção do Superior Tribunal de Justiça, bem como do Supremo Tribunal Federal sobre a matéria em debate.

Boa leitura.

 

 

PROCESSO Nº: 0810033-34.2021.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM CÍVEL
AUTOR: J. I.
ADVOGADO: M. M. B. F.
ADVOGADO: R V C M
ADVOGADO: M F C J
RÉ: UNIÃO - FAZENDA NACIONAL
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL SUBSTITUTO)



 

DECISÃO

1. Relatório 

J. I., qualificado na Inicial, ajuizou esta "AÇÃO DECLARATÓRIA C/C AÇÃO ORDINÁRIA DE REPETIÇÃO DO INDÉBITO E COM PEDIDO DE TUTELA ANTECIPADA DA LIDE INAUDITA ALTERA PARTE" em face da UNIÃO FEDERAL (FAZENDA NACIONAL). Alegou, em síntese, que: estaria enquadrado na condição de produtor rural pessoa física e que exerceria a atividade de produção de aves e ovos, conforme extrato fornecido pelo SINTEGRA; na qualidade de empregador, seria obrigado a se enquadrar no FPAS 604, o que faria com que venha sendo obrigado a proceder com o recolhimento da Contribuição para o Salário-Educação, calculado mediante a aplicação da alíquota de 2,5% (dois inteiros e cinco décimos por cento) incidente sobre a folha de salários, nos termos do art. 212, §5º da Constituição Federal de 1988, atualmente, regulamentada pelo art. 15 da Lei n.º 9.424, de 24.12.1996 e o art. 1º, §3º da Lei n.º 9.766, de 18.12.1998, conforme demonstrativos das GFIPS e das GPS's; ao analisar os citados dispositivos normativos, teria constatado que o Réu viria exigindo a Contribuição para o Salário-Educação de forma ilegítima; a Contribuição para o Salário-Educação só poderia ser exigida das empresas, condição esta que não enquadrariam os produtores rurais pessoas físicas; os produtores rurais pessoas físicas que não tenham registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ não seriam equiparados, para fins tributários, a empresas; no art. 12, inciso V, alínea "a" da Lei n.º 8.212/91, o legislador definiria que o produtor rural pessoa física seria enquadrado como contribuinte individual e não como empresa; a lei tributária determinaria os pré-requisitos a serem observados para que uma pessoa seja enquadrada como contribuinte da Contribuição para o Salário-Educação; além de não recolher a Contribuição para o Salário-Educação, entenderia o Autor que tem o direito de obter a restituição dos valores pagos indevidamente a partir do 5º (quinto) ano anterior ao ajuizamento desta ação, atualizados pela Taxa SELIC, valores estes que deveriam ser apurados quando da liquidação de sentença. Teceu outros comentários. Transcreveu ementas de decisões judiciais. Pugnou, ao final, pela concessão de tutela provisória de urgência antecipada, inaudita altera parte: "...para que seja determinada a imediata suspensão da exigibilidade da Contribuição para o Salário-Educação, nos termos do art. 151, inciso V do Código Tributário Nacional - CTN, abstendo o(s) Réu(s) de adotar(em) quaisquer atos coativos contra o seu patrimônio até o julgamento de mérito da presente ação". Inicial instruída com procuração e documentos.

Despacho exarado em 20/05/2021 (id. 4058300.18839341), no qual se deixou para apreciar o pedido de tutela provisória de urgência após ouvida da Parte Ré; bem como foi determinada sua citação.

Citada, a UNIÃO - FAZENDA NACIONAL apresentou contestação (id. 4058300.19102209). Preliminarmente, suscitou sua ilegitimidade passiva ad causam. Como questão prejudicial, levantou a ocorrência da exceção de prescrição quinquenal. No mérito, alegou, em síntese, que: o STF teria assentado o entendimento de que a contribuição do salário-educação fora recepcionada pela Constituição Federal de 1988, nos termos do Decreto-lei nº 1.422/75 e do Decreto nº 87.043/82, com a alíquota de 2,5%; a norma constitucional seria complementada pela Lei nº 9.424, de 24/12/1996, que dispõe sobre o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento do Ensino Fundamental e de Valorização do Magistério; tal entendimento estaria sedimentado na Súmula nº 732 do STF; o exercício da atividade rural na condição de empregador rural vinculado a pessoa jurídica com inscrição no CNPJ teria o condão de equipará-lo à empresa sujeita ao financiamento do ensino básico público; o STJ viria reiteradamente decidindo que o produtor rural pessoa física com registro no CNPJ se enquadra no conceito de empresa (firma individual ou sociedade), para fins de incidência da contribuição para o salário educação (vide: REsp 1.242.636-SC, REsp 711.166/PR, REsp 842.781/RS); atenta aos precedentes dos Tribunais Superiores, a Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional - PGFN teria editado orientação interna que dispensa os seus membros de contestar e recorrer em demandas que tenham por objeto a declaração de inexigibilidade do salário-educação, quando o contribuinte for produtor rural pessoa física sem inscrição no CNPJ; a dispensa de contestar e recorrer não se aplicaria aos casos em que existam indícios de fraude, tampouco quando o produtor rural pessoa física estiver, a qualquer título, inscrito no CNPJ (ressalvadas eventuais inscrições relativas a outras atividades, desprovidas de qualquer relação com a atividade de produtor rural); o Autor seria produtor rural pessoa física vinculada a três inscrições no CNPJ, situação que impediria a declaração de inexigibilidade tributária pleiteada; o Autor exerceria suas atividades com o auxílio de empregados, sendo certamente equiparado à empresa para fins de aplicação das contribuições destinadas à seguridade social, inclusive o salário-educação, ainda mais diante da existência de vínculos com sociedade empresária dedicada ao mesmo ramo de atividade; teriam sido localizados três vínculos do Autor com a atividade empresarial de produção gênero alimentício (sociedade empresária inscritas no CNPJ). O primeiro deles é INDUSTRIA PROCESSADORA DE OVOS DE PERNAMBUCO - INPROVOS LTDA (22.463.416/0001-89), aparecendo o autor como sócio administrador; de acordo com o autor, na inicial, sua atividade seria essencialmente a produção de ovos; tal atividade se enquadraria exatamente naquela descrita da pessoa jurídica antes mencionada, que é "fabricação de produtos agrícolas"; existiriam outros dois vínculos, com o mesmo ramo de atividade, e em que o autor participaria não apenas como sócio, mas como administrador, a saber DACODORNA INDUSTRIA DE CONSERVA LTDA (27.357.670/0001-16) e DACODORNA PRODUCAO DE OVOS E CONSERVAS LTDA (09.313.399/0001-35), mas que estariam na situação baixada e inapta, respectivamente, perante os cadastros da Receita Federal; na situação dos autos, o Autor tem exercido sua atividade rural por meio da participação em pessoa jurídica e não como mero empregador pessoa física; comprovado documentalmente que a parte oponente possuiria registro no CNPJ, a incidência do salário-educação seria inquestionável; o contexto acima narrado denunciaria uma provável prática abusiva, consubstanciada no cadastro dos empregados em nome da pessoa física, de modo a reduzir a folha de salários da pessoa jurídica, com a consequente evasão do pagamento de tributos, dentre eles a própria contribuição do salário-educação; as próprias Guias da Previdência Social - GPS's juntadas aos autos pelo Autor (e por ele mesmo preenchidas para fins de recolhimento, id. 4058300.18834411), apresentariam como código de pagamento o de nº "2208", referente a "empresas em geral com CEI"; os elementos acima destacados sugeririam a prática de planejamento tributário abusivo pela parte adversa, hipótese em que deveria ser reconhecida a existência de relação jurídico-tributária apta a legitimar a cobrança do salário-educação. Pugnou, ao final: "1) a extinção do feito sem resolução de mérito, a teor do artigo 485, inciso VI, do Código de Processo Civil, haja vista sua ilegitimidade passiva ad causam; 2) a improcedência do pedido deduzido na petição inicial (e, por evidente ausência de probabilidade do direito, reconhecendo-se o Autor como sujeito passivo do salário-educação, na condição de produtor rural pessoa física vinculado a cadastro(s) no CNPJ; 3) a condenação autoral a arcar com os ônus da sucumbência; 4) acaso provido o pedido da parte adversa, o que não se espera, a observância do prazo prescricional quinquenal para os valores a serem restituídos". Protestou o de estilo.

A Parte Autora apresentou réplica (id. 4058300.19257871).

Vieram os autos conclusos. Decido.

2. Fundamentação

2.1 - Da prevenção indicada pelo sistema PJe

Não existe a prevenção acusada pelo sistema PJe com os processos ali indicados, tampouco litispendência.

Nessa situação, a Secretaria deste Juízo deve retirar a anotação de prevenção.

2.2 - Da ilegitimidade passiva ad causam da UNIÃO

A UNIÃO-FAZENDA NACIONAL suscitou, em preliminar de contestação, sua ilegitimidade ad causam para figurar no polo passivo da presente ação, sob o argumento de que a parte legítima a ser demandada seria o Fundo Nacional de Desenvolvimento da Educação - FNDE.

O Egrégio Superior Tribunal de Justiça firmou entendimento de que, com o advento da Lei 11.457/2007, as atividades referentes à tributação, à fiscalização, à arrecadação, à cobrança e ao recolhimento das contribuições sociais destinadas a terceiros, tais como SESI, SENAI, SESC, SENAC, SEBRAE, INCRA, FNDE, a teor de expressa previsão contida no art. 3º da citada lei, foram transferidas à Secretaria da Receita Federal do Brasil, órgão da União, cuja representação, após os prazos estipulados no seu art. 16, ficou a cargo exclusivo da Procuradoria-Geral da Fazenda Nacional para eventual questionamento quanto à exigibilidade da contribuição em questão.

Nesse sentido, colaciono o seguinte precedente da Primeira Seção do Egrégio Superior Tribunal de Justiça - STJ:

"PROCESSUAL CIVIL, FINANCEIRO E TRIBUTÁRIO. EMBARGOS DE DIVERGÊNCIA. CONTRIBUIÇÕES DESTINADAS A TERCEIROS. SERVIÇOS SOCIAIS AUTÔNOMOS. DESTINAÇÃO DO PRODUTO. SUBVENÇÃO ECONÔMICA. LEGITIMIDADE PASSIVA AD CAUSAM. LITISCONSÓRCIO. INEXISTÊNCIA.

1. O ente federado detentor da competência tributária e aquele a quem é atribuído o produto da arrecadação de tributo, bem como as autarquias e entidades às quais foram delegadas a capacidade tributária ativa, têm, em princípio, legitimidade passiva ad causam para as ações declaratórias e/ou condenatórias referentes à relação jurídico-tributária.

2. Na capacidade tributária ativa, há arrecadação do próprio tributo, o qual ingressa, nessa qualidade, no caixa da pessoa jurídica.

3. Arrecadado o tributo e, posteriormente, destinado seu produto a um terceiro, há espécie de subvenção.

4. A constatação efetiva da legitimidade passiva deve ser aferida caso a caso, conforme a causa de pedir e o contexto normativo em que se apoia a relação de direito material invocada na ação pela parte autora.

5. Hipótese em que não se verifica a legitimidade dos serviços sociais autônomos para constarem no polo passivo de ações judiciais em que são partes o contribuinte e o/a INSS/União Federal e nas quais se discutem a relação jurídico-tributária e a repetição de indébito, porquanto aqueles (os serviços sociais) são meros destinatários de subvenção econômica.

6. Embargos de divergência providos para declarar a ilegitimidade passiva ad causam do SEBRAE e da APEX e, por decorrência do efeito expansivo, da ABDI."[1]

Portanto, não merece acolhida a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam suscitada pela UNIÃO - FAZENDA NACIONAL.

2.3 - Da exceção de prescrição 

A UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, em sua peça de defesa, defendeu a ocorrência de prescrição das retenções/recolhimentos há mais de 05 (cinco) anos do ajuizamento da presente ação. 

No campo da restituição/compensação de tributos lançados por homologação, como o é a contribuição em debate, o prazo prescricional para o Contribuinte pedir restituição ou compensação tem sede no inciso I do art. 168 do Código Tributário Nacional, 05 (cinco) anos contados da data de extinção do crédito tributário, com a interpretação determinada pelos arts. 3º e 4º da Lei Complementar nº 118, de 2005[2], e a interpretação que o Plenário do Supremo Tribunal Federal deu a essa Lei, no julgamento do RE 566.621/RS[3]: segundo o qual, o prazo prescricional será de cinco anos para as ações propostas depois da sua entrada em vigor, que é o caso destes autos.

Todavia, noto que a própria Parte Autora limitou o seu pedido, relativamente à compensação, aos últimos 5(cinco) anos.

Então, como esta ação foi proposta em 20/05/2021, as parcelas anteriores a 20/05/2016 não serão objeto de repetição de indébito, via restituição ou compensação, porque assim foi o pleito da própria Autora.

Então, esta exceção de prescrição, levantada pela UNIÃO - FAZENDA NACIONAL, se encontra prejudicada.

2.4 - Do pedido de tutela provisória de urgência

Nos termos do art. 300 do novo Código de Processo Civil, a concessão da tutela provisória de urgência antecipada demanda elementos que evidenciem a probabilidade do direito alegado e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, in verbis:

"Art. 300.  A tutela de urgência será concedida quando houver elementos que evidenciem a probabilidade do direito e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo.

§ 1o Para a concessão da tutela de urgência, o juiz pode, conforme o caso, exigir caução real ou fidejussória idônea para ressarcir os danos que a outra parte possa vir a sofrer, podendo a caução ser dispensada se a parte economicamente hipossuficiente não puder oferecê-la.

§ 2o A tutela de urgência pode ser concedida liminarmente ou após justificação prévia.

§ 3o A tutela de urgência de natureza antecipada não será concedida quando houver perigo de irreversibilidade dos efeitos da decisão."

Portanto, devem estar sempre presentes para a concessão da tutela de urgência antecipada: a probabilidade do direito alegado, que surge do confronto entre as alegações da Parte Autora e as provas constantes dos autos, baseada em uma cognição sumária; e o perigo de dano ou o risco ao resultado útil do processo, quando houver uma situação de urgência que não possa aguardar o desenvolvimento natural do processo, sob pena de ineficácia ou inutilidade do provimento final.

No caso sob análise, pretende a Parte Autora, em sede de tutela provisória de urgência, obter provimento jurisdicional a fim de que seja determinada a imediata suspensão da exigibilidade da Contribuição do Salário-Educação, nos termos do art. 151, inciso V, do Código Tributário Nacional - CTN, por desenvolver atividade de produtor rural pessoa física.

Eis o pedido de tutela de urgência, formulado na petição inicial:

"Diante do exposto, o Autor requer que V. Exa se digne de conceder-lhe a TUTELA ANTECIPADA DA, para que seja determinada a imediata suspensão LIDE INAUDITA ALTERA PARTE da exigibilidade da Contribuição para o Salário-Educação, nos termos do art. 151, inciso V do Código Tributário Nacional - CTN, abstendo o(s) Réu(s) de adotar(em) quaisquer atos coativos contra o seu patrimônio até o julgamento de mérito da presente ação."

Narra a Parte Autora, em síntese, que exerce a atividade de "produção de aves e ovos", estando enquadrado na condição de produtor rural pessoa física. E, como empregador, encontra-se obrigado ao recolhimento da Contribuição do Salário-Educação, calculado mediante a aplicação da alíquota de 2,5% incidente sobre a folha de salários. 

Aduz que tal exigência tributária é indevida, uma vez que essa contribuição somente poderi\ ser exigida de Empresas, Pessoas Jurídicas ou Coletivas, o que não seria o seu caso.

Pois bem.

Sobre a matéria, a jurisprudência do STJ consolidou-se no sentido da inexigibilidade da contribuição do Salário-Educação do produtor rural pessoa física, desprovido de CNPJ, haja vista que não se subsome ao conceito de empresa, constante da hipótese de incidência do referido tributo.

Nesse sentido, a título ilustrativo, eis um precedente da 2ª Turma do Egrégio Superior Tribunal de Justiça - STJ: 

"TRIBUTÁRIO. RECURSO ESPECIAL DA FAZENDA. ENUNCIADO ADMINISTRATIVO Nº 3 DO STJ. EMPREGADOR RURAL PESSOA FÍSICA INSCRITO NO CNPJ. SUJEIÇÃO PASSIVA À INCIDÊNCIA DO SALÁRIO-EDUCAÇÃO. PRECEDENTES.CONCEITO AMPLO DE EMPRESA.

1. Discute-se nos autos a sujeição do produtor rural pessoa física à incidência da contribuição ao Salário-Educação sobre a remuneração paga aos seus empregados.

2. O conceito amplo de empresa para fins de incidência do Salário-Educação é adotado por esta Corte desde o julgamento do REsp 711.166/PR, Rel. Min. Eliana Calmon, Segunda Turma, DJ 16/5/2006 e do REsp 842.781/RS, Primeira Turma, Rel. Min. Denise Arruda, DJ de 10.12.2007, de modo que os produtores rurais pessoas físicas constituídos sob a forma de pessoa jurídica mediante registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica - CNPJ se enquadram na sujeição passiva da exação, tendo esta Corte excepcionado apenas os produtos rurais pessoas físicas sem CNPJ.

Nesse sentido também: AgInt no REsp 1.786.468/SP, Rel. Ministra Regina Helena Costa, Primeira Turma, DJe de 26/06/2019; AgInt no AREsp 883.529/SP, Rel. Ministro Napoleão Nunes Maia Filho, Primeira Turma, DJe de 30/05/2019; REsp 1.743.901/SP, Rel. Ministro Francisco Falcão, Segunda Turma, DJe de 03/06/2019; EDcl no AgInt no REsp 1.719.395/SP, Rel. Ministro Herman Benjamin, Segunda Turma, DJe de 22/04/2019; gInt nos EDcl no AREsp 824665/SP , Rel Min. Assusete Magalhães, Segunda Turma, DJe 17/3/2020.

3. O acórdão recorrido aplicou na hipótese o conceito estritamente empresarial de empresa, contrariando a jurisprudência consolidada desta Corte a teor do REsp 1.162.307/RJ, Rel. Min. Luiz Fux, Primeira Seção, DJe 2/10/2010, julgado na sistemática dos recursos especiais repetitivos, segundo a qual a legislação relativa ao Salário-Educação, respaldada pelo § 5º do art. 212 da Constituição Federal, adota um conceito amplo de empresa para fins de incidência da referida contribuição no qual estão compreendidas as firmas individuais ou sociedades que assumam o risco de atividade econômica, urbana ou rural, com fins lucrativos ou não, em consonância com o art. 15 da Lei 9.424/96, regulamentado pelo Decreto 3.142/99, sucedido pelo Decreto 6.003/2006. Portanto, deve ser reformado o acórdão de segundo grau para reconhecer a sujeição passiva do empregador produtor rural pessoa física inscrito no CNPJ à incidência do Salário-Educação sobre a folha de salários de seus empregados.

4. Recurso especial da FAZENDA NACIONAL provido.”.[4].

A própria UNIÃO - FAZENDA NACIONAL reconhece expressamente, em sua contestação, que há na PGFN "orientação interna que dispensa os seus membros de contestar e recorrer em demandas que tenham por objeto a declaração de inexigibilidade do salário-educação, quando o contribuinte for produtor rural pessoa física sem inscrição no CNPJ".

Todavia, no caso concreto, a UNIÃO - FAZENDA NACIONAL denuncia existir possível prática de planejamento tributário abusivo pelo ora Autor, sob o argumento de que, ainda que possua inscrição como empregador rural pessoa física, o Autor exerceria também sua atividade econômica por meio do CNPJ nº 22.463.416/0001-89, em que aparece como sócio administrador da mencionada pessoa jurídica (id. 4058300.19102209):

"Com efeito, conforme se extrai das informações constantes das consultas ora anexadas, foram localizados três vínculos do Autor com a atividade empresarial de produção gênero alimentício (sociedade empresária inscritas no CNPJ). O primeiro deles é INDUSTRIA PROCESSADORA DE OVOS DE PERNAMBUCO - INPROVOS LTDA (22.463.416/0001-89), aparecendo o autor como sócio administrador.

De acordo com o autor, na inicial, sua atividade é essencialmente a produção de ovos. Ora, tal atividade se enquadra exatamente naquela descrita da pessoa jurídica antes mencionada, que é ¨fabricação de produtos agrícolas¨, consoante se denota da consulta em anexo.

(...)

Logo, é fácil constatar que na situação dos autos, o Autor tem exercido sua atividade rural por meio da participação em pessoa jurídica e não como mero empregador pessoa física.

Ora, comprovado documentalmente que a parte oponente possui registro no Cadastro Nacional de Pessoa Jurídica (CNPJ), a incidência do salário-educação é inquestionável.

O contexto acima narrado denuncia uma provável prática abusiva, consubstanciada no cadastro dos empregados em nome da pessoa física, de modo a reduzir a folha de salários da pessoa jurídica, com a consequente evasão do pagamento de tributos, dentre eles a própria contribuição do salário-educação.

(...)

A robustecer a argumentação acima expendida, é mister destacar, ainda, que as próprias Guias da Previdência Social - GPS's juntadas aos autos pelo Autor (e por ele mesmo preenchidas para fins de recolhimento, id. 4058300.18834411), apresentam como código de pagamento o de nº "2208", referente a "empresas em geral com CEI" ".

Logo, no caso sob exame, ante a alegada prática abusiva, denunciada pela Parte Ré, reputo ausente, neste momento, o requisito da probabilidade do direito alegado pelo Autor, devendo-se dar oportunidade às Partes, por cautela, o contraditório e a ampla dilação probatória.

Com essas considerações, prima facie, tenho por não preenchido o requisito do fumus boni juris.

Ausente o pressuposto supracitado, entendo desnecessária a análise da presença do periculum in mora, tendo em vista que a concessão do provimento demanda a concomitância dos pressupostos.

Dessa forma, por ora, não vislumbro o preenchimento dos requisitos autorizadores da concessão da tutela provisória de urgência vindicada, razão pela qual há de ser indeferido tal pleito.

3. Dispositivo

Posto isso:

3.1 - Determino que a Secretaria cumpra o consignado no subitem 2.1 supra.

3.2 - Rejeito a preliminar de ilegitimidade passiva ad causam suscitada pela UNIÃO - FAZENDA NACIONAL.

3.3 - Dou por prejudicada a exceção de prescrição quinquenal, levantada pela UNIÃO - FAZENDA  NACIONAL, porque a própria Autora limitou o seu pedido de restituição aos últimos  5(cinco) anos.

3.4 - Indefiro o pedido de tutela provisória de urgência.

3.5 - Outrossim, determino a intimação das partes para, no prazo de 15 (quinze) dias, dizer se ainda pretendem produzir provas, esclarecendo de que forma essas provas poderão comprovar a matéria tratada nos autos.

Intimem-se.

Recife, 18.06.2022

Francisco Alves dos Santos Júnior

 Juiz Federal  da 2a Vara da JFPE

_________________________________________________

[1] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Seção. EREsp 1619954/SC, Rel. Ministro Gurgel de Faria, julgado em 10/04/2019, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 16/04/2019.

Disponível em 

https://ww2.stj.jus.br/processo/revista/documento/mediado/?componente=ATC&sequencial=88112847&num_registro=201602135966&data=20190416&tipo=51&formato=PDF

Acesso em 18.06.2022.

[2] Lei Complementar nº 118, de 09.02.2005:

"Art. 3o Para efeito de interpretação do inciso I do art. 168 da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional, a extinção do crédito tributário ocorre, no caso de tributo sujeito a lançamento por homologação, no momento do pagamento antecipado de que trata o § 1o do art. 150 da referida Lei.

Art. 4o Esta Lei entra em vigor 120 (cento e vinte) dias após sua publicação, observado, quanto ao art. 3oo disposto no art. 106, inciso I, da Lei no 5.172, de 25 de outubro de 1966 - Código Tributário Nacional."

[3] Brasil. Supremo Tribunal Federal. Plenário. Recurso Extraordinário - RE nº 566;621/RS. Relatora Ministra Ellen Gracie. Julgamento em 04.08.211,  in Diário Judicial Eletrônico - DJ de 11.10.2011.

Disponível em

https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search?base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&page=1&pageSize=10&queryString=566621&sort=_score&sortBy=desc

Acesso em  18.06.2022

[4] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Segunda Turma, Recurso Especial - REsp nº  1.867.438/SP, Relator Ministro Mauro Campbell Marques,  julgado em 24/11/2020, in Diário Judicial Eletrônico - DJe de 04/12/2020.

Disponível em 

https://scon.stj.jus.br/SCON/GetInteiroTeorDoAcordao?num_registro=202000662573&dt_publicacao=04/12/2020

Acesso em 18.06.2022

 

 

 


Nenhum comentário:

Postar um comentário