sexta-feira, 5 de outubro de 2018

MEDICAMENTO QUE NÃO CONSTA DA LISTA DO SUS. NOVA PRÁTICA JUDICIAL.

Por Francisco Alves dos Santos Jr

Não poucas vezes, quer pelo alto custo, quer pelas dúvidas quanto ao respectivo efeito, medicamentos não são colocados, pelo Órgão de Saúde próprio, no rol daqueles que são obrigatoriamente  fornecidos pelo Serviço Único de Saúde - SUS. A repetição do fato no dia a dia da Justiça gerou novas práticas de apoio técnico aos Magistrados, os quais, apenas excepcionalmente, podem determinar o fornecimento desse tipo de medicamento, porque finda  por adentrar no mérito administrativo do ato de escolha de medicamento. 

Na decisão que segue, essa nova prática foi aplicada. 



Obs. Decisão pesquisada e minuta pela  Assessora Luciana Simoes Correa de Albuquerque, tendo sofrido retoques do Magistrado.



PROCESSO Nº: 0814331-74.2018.4.05.8300 - PROCEDIMENTO COMUM
AUTOR: F J DA S
REPRESENTANTE: DEFENSORIA PÚBLICA DA UNIÃO
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO. e outros
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)
D E C I S Ã O
  1. Breve Relatório


F J DA S, qualificado na Inicial e assistido pela Defensoria Pública da União, ajuizou esta Ação sob Rito Comum com pedido de Tutela de Urgência em face da UNIÃO FEDERAL, do ESTADO DE PERNAMBUCO e do MUNICÍPIO DO RECIFE. Requereu, preliminarmente, os benefícios da Justiça Gratuita. Aduziu, em síntese, que: o Autor seria portador de ADENOCARCINOMA DE PRÓSTATA COM METASTASES ÓSSEAS RESISTENTES À CASTRAÇÃO HORMONAL (CID C 61.9), com diagnóstico em 2018; teria história de tratamento de câncer de próstata refratário há 15 (quinze) anos e teria realizado orquiectomia há 12 (doze) anos, época em que realizado hormonioterapia, quimioterapia e radioterapia; no final de 2017, teria apresentado recidiva tumoral, com a taxa do PSA aumentada; teria sido indicado procedimento cirúrgico de ressecção transuretral de próstata no início de 2018; diante de tal piora no quadro da doença, teria sido indicado o tratamento com a medicação ABIRATERONA (ZYTIGA®), a fim de se evitar a progressão da enfermidade e um ganho de sobrevida global, assim como consta do Laudo da médica assistente Drª. Candice Lima (CRM: 10769), vinculado ao IMIP, vez que o demandante já teria feito uso de outros medicamentos, sem que estes alcançassem os efeitos necessários; as opções disponíveis pela APAC e SUS não lhe seriam mais adequadas; não obstante a indicação de tratamento com o fármaco indicado, seu fornecimento teria sido negado pela Secretaria de Saúde do Estado de Pernambuco, já que a medicação, autorizada pela ANVISA, não seria fornecida pelo SUS por ainda não constar na lista de medicamentos do Ministério da Saúde; restaria configurada a hipossuficiência do demandante para adquirir tal fármaco, tendo em vista que o valor unitário de uma caixa com 120 comprimidos de 250mg custaria cerca de R$ 8.684,00 (oito mil seiscentos e oitenta e quatro reais), segundo orçamento disponibilizado pelo site da ANVISA. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela concessão da antecipação dos efeitos da tutela, inaudita altera parte, de forma que se determine à União, ao Estado de Pernambuco e ao Município do Recife que disponibilizem ao autor a quantidade prescrita do medicamento Abiraterona (Zytiga) na dose de quatro comprimidos de 250 mg por dia em uso contínuo, por prazo indeterminado (até deliberação médica em sentido contrário) ou depositem em juízo o valor necessário para a compra do mesmo por três meses, ou seja, a quantia de R$ 26.052,00 (vinte e seis mil e cinquenta e dois reais). Protestou o de estilo. Inicial instruída com procuração e documentos.


É o relatório, no essencial.


Passo a decidir.


Fundamentação


2. Fundamentação


2.1. Do pedido de justiça gratuita


O pedido de concessão do benefício da Justiça Gratuita será concedido provisoriamente, até a contestação, porque deve a Parte Requerida também ser dele intimado para, querendo, a seu respeito manifestar-se na contestação.


2. Do encaminhamento de ofício ao NAT´S


Considerando que o  medicamento indicado  não consta da lista do SUS e que o Judiciário, só excepcionalmente, poderá interferir nessa seara típica de mérito administrativo, e ainda tendo em  vista a fixação de alguns parâmetros acerca da matéria nos autos do REsp 1.657.156/RJ, reputo necessário suporte técnico, razão pela qual  me valho do  Núcleo de Assessoria Técnica em Saúde (NATS) do TJPE antes mesmo de deliberar sobre o pleito antecipatório.


Com efeito, nos termos do acordo de cooperação institucional celebrado, em 18/12/2017, pelo Tribunal Regional Federal  da 5ª Região e pelo Tribunal de Justiça do Estado de Pernambuco, para a prestação de informações técnicas relevantes em demandas judiciais de saúde pelo Núcleo de Assessoria Técnica em Saúde (NATS) do TJPE, e diante da indispensável necessidade de esclarecimentos técnicos para a adequada apreciação do pedido deduzido nos presentes autos, que envolve matéria fática de elevada complexidade, solicite-se ao NATS/TJPE, que, no prazo máximo de 10 (dez) dias úteis, encaminhe parecer técnico com as informações que repute relevantes acerca do medicamento postulado e do problema de saúde alegado pela parte autora, em que necessariamente esclareça:


a) se a documentação apresentada é evidência médica do problema de saúde alegado pela parte autora;


b) se o fármaco possui indicação em bula para o específico problema de saúde alegado pela parte demandante;


c) se o medicamento postulado possui eficácia cientificamente comprovada para o específico problema de saúde alegado pela parte autora, à luz da medicina baseada em evidências, ou se pode ser considerado experimental, demonstrando-se a fonte em que se baseia a respectiva conclusão;


d) se o fármaco possui registro na ANVISA, correlato à enfermidade alegada, e, caso não possua, se o medicamento possui registro em órgãos estrangeiros análogos e em quais;


e) se o medicamento é fornecido pelo SUS e, caso não o seja, se já houve pronunciamento da CONITEC a respeito e em que sentido;


f) se há alternativas terapêuticas para a enfermidade do autor no âmbito do SUS, quais são elas e se estas, tendo em vista a documentação médica apresentada, possuem prognóstico promissor, no que tange à sua efetividade, para o específico problema de saúde do autor;


g) se a documentação médica apresentada evidencia suficientemente que as alternativas terapêuticas eventualmente existentes no âmbito do SUS já foram tentadas pela parte autora e se mostraram inefetivas ou se já se sabe que não se mostram suficientemente efetivas para o específico problema de saúde alegado; 


h) se o fármaco pretendido, tendo em vista a medicina baseada em evidência, possui efetividade significativamente superior às alternativas terapêuticas abrangidas pelo SUS e quais seriam as eventuais vantagens e ou desvantagens comparativas, sob o prisma médico e o da economicidade.


3. Dispositivo


Diante de todo o exposto:


a) Concedo, provisoriamente, o benefício da Justiça Gratuita, concessão essa que será reapreciada, no momento oportuno (depois da contestação); 


b) Envie a Secretaria os questionamentos listados acima, por mensagem eletrônica, com aviso de recebimento, ao NATS/TJPE, para onde deverá ser encaminhado, a título de subsídio, arquivo na extensão ".pdf" contendo a cópia integral dos autos até o presente momento.


c)  Observe a Secretaria as prerrogativas inerentes à Defensoria Pública da União, que está assistindo a parte autora;


d) Paralelamente, citem-se os Requeridos, na  forma e para os fins legais;
e) Decorrido o prazo assinalado para emissão do Parecer (vide item 2 supra) certifique a Secretaria a respectiva juntada.
Caso não tenha sido apresentado, fica autorizado, desde já, o contato telefônico da Secretaria deste Juízo com o referido Núcleo para agilização respectiva, devendo tal diligência ser certificada nos autos;


d) Sucessivamente e cumprido o acima determinado, voltem-me os autos conclusos para deliberar sobre o pleito antecipatório.


e) Cumpra-se, com urgência.

Recife, 05.10.2018
Francisco Alves dos Santos Jr
 Juiz Federal




(lsc)

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