quarta-feira, 11 de fevereiro de 2015

REMOÇÃO DE SERVIDORA MÃE DE FILHA RECÉM-NASCIDA COM SÉRIOS PROBLEMAS DE SAÚDE. DIREITO CONSTITUCIONAL E LEGAL À REMOÇÃO. CONVENÇÃO DE NOVA IORQUE RELATIVA A DEFICIENTES. MEDIDA CAUTELAR CONCEDIDA LIMINARMENTE.

Por Francisco Alves dos Santos Jr.


   Segue decisão que envolve o delicado problema de uma Mãe, Servidora Pública Federal,  que dá à luz uma criança com sérios problemas cardíacos e com síndrome de Down, lotada em cidade que fica a mais de quinhentos quilômetros de distância onde reside a sua família, Recife-PE, pediu remoção e não recebeu resposta do Ente Público empregador. Então, veio ao Poder Judiciário, que lhe concedeu, liminarmente, medida cautelar, determinando sua imediata remoção, em decisão calcada em regras da Constituição da República, de Leis e da Convenção de Nova Iorque sobre direitos dos deficientes, da qual o Brasil é signatário.
   Boa leitura.



Obs.: decisão pesquisada e rascunhada pela Assessora Fabíola Cavalcanti Santana Siqueira


PROCESSO Nº: 0800429-59.2015.4.05.8300 - PROCEDIMENTO ORDINÁRIO
AUTOR: A M S DE A
ADVOGADO: C DOS S A (e outros)
RÉU: UNIÃO FEDERAL - UNIÃO.
2ª VARA FEDERAL - JUIZ FEDERAL TITULAR


 

D E C I S Ã O

 

A M S DE A, servidora pública federal ocupante de cargo efetivo de agente penitenciária federal, qualificada na inicial, propôs Ação Ordinária com Pedido de Tutela Antecipada em face da UNIÃO objetivando, em caráter liminar, sua remoção para Recife com base nos fatos alegados: a) Ser agente penitenciaria federal tendo tomado posse e se encontrando em exercício desde 16.03.2006, inicialmente designada para exercício do cargo em Penitenciária Federal em Brasília, removida em seguida para a Penitenciária Federal de Catanduvas no Paraná, e posteriormente, em novembro de 2007, para Penitenciária Federal de Mossoró no Rio Grande do Norte - local a qual a Autora se encontra vinculada até presente data; b) Manteve, a prejuízo de sua entidade familiar (esposo), idas e vindas a Mossoró durante todo este tempo, sem nunca ter pleiteado remoção para Recife; c) Ocorreu, no entanto, que no início de 2014, a Autora se descobre grávida, porém com o infortúnio do risco gravídico, do início até a data do parto, motivo que ensejou sucessivas licenças durante todo o período gestacional; d) Ainda durante a gestação, a autora descobriu, mediante exames da praxe pré-natal, que sua bebê era portadora da Trissonomia do Cromossomo 21 que determina a Síndrome de Down (SD); d) Realizou vários exames complementares para afastar a suspeita da alteração do cromossomo 21, houve a confirmação diagnóstica de que a Recém Nascida é portadora da conhecida Síndrome de Down em grau elevado; e) Associada a Síndrome de Down, a criança (com cinco meses de idade), apresenta cardiopatia congênita que repercutiu em cirurgia cardíaca como medida corretiva, fato que reforçou o contínuo cuidado e necessidade de acompanhamento médico próprio com várias visitas aos consultório sem razão do seu quadro clínico fragilizado (Síndrome de Down, cardiopatia congênita, doença do refluxo gastroesofágico, deficiência nutricional secundário à cardiopatia); f) neste novo cenário de sua vida, a Autora aprestou pedido administrativo de remoção da Penitenciária Federal de Mossoró/RN para outro estabelecimento de carceragem federal na Cidade do Recife, não tendo, contudo, obtido resposta do órgão responsável - DEPEN; g) a Autora postula remoção para a cidade do Recife, em razão da debilitada saúde de sua filha, mesmo sabendo que com a remoção poderá ocorrer decréscimo de remuneração com perdas das rubricas de adicional de insalubridade, adicional noturno e "decisão judicial transitada em julgado", que refere-se ao pagamento de 25ª horas de trabalho sob regime de plantão. 

Fundamenta seu pedido com base no art. 2º da Lei nº 10.693/03; no art. 123, da Lei nº 11.907/2009; bem como no art. 36, parágrafo único, inciso III, alínea "B" da Lei nº 8.112/90 e em especial com fulcro nos preceitos constitucionais do art. 1º, 3º, 5º e 226 e 227 da Carta Magna de 1988.

Ao final pugnou pela procedência integral do pedido para que seja reconhecido o direito invocado e determinada sua remoção definitiva de seu atual local de lotação na Penitenciária Federal de Mossoró - Rio grande do Norte para a sede do Departamento da Polícia Federal no Recife/PE, ou outro órgão federal com sede nesta cidade, em que possa exercer suas funções e continuar a prestar suas atribuições funcionais, seja o órgão vinculado ou não ao Ministério da justiça. Juntou documentos, laudos e exames médicos. Custas e procuração nos rigores processuais.

Vieram os autos conclusos.

É o relatório, no essencial.

Decido.

2 -  Fundamentação

Do Pedido de Antecipação da Tutela

Dada a importância de decisão da natureza antecipatória do provimento jurisdicional final, o Legislador tratou de fixar requisitos mais sólidos para que tal provimento possa ser concedido, sendo pressupostos da Antecipação de Tutela a Prova Inequívoca, a Verossimilhança das Alegações e a Possibilidade de Reversibilidade da Medida, art. 273 do CPC.

A remoção a pedido para outra localidade, independente do interesse da Administração Pública, será concedida, segundo a alínea "b", do inciso III, parágrafo único do art. 36 da Lei nº 8.112/90, in verbis:
"Por motivo de saúde do servidor, cônjuge, companheiro ou dependente que viva às suas expensas e conste do seu assentamento funcional, condicionada à comprovação por junta médica oficial". (Grifado)


A Autora preenche os requisitos legais, para sua remoção por motivo de saúde de sua filha, portadora da Síndrome de Down e de problemas cardíacos, patologias bem conhecidas da sociedade e que exigem cuidados, dedicação intensiva e constante dos pais, terapêutica especializada com equipe multidisciplinar em saúde, estimulação precoce das suas potencialidades, bem como educação adequada ao perfil de aprendizagem visando o melhor desenvolvimento da criança nos níveis físico, emocional e mental. No entanto, reza a Lei em comento que se faz necessária perícia médica oficial.
 
Mas, como essa perícia pode demorar, principalmente pelo fato de que o Judiciário Federal não tem corpo de Peritos e depende de favores de médicos particulares, e o problema da Mãe, ora Requerente, é presente, imediato, tenho que se deva aplicar ao caso o § 7º do art. 273 do Código de Processo Civil, para lhe conceder medida cautelar, liminarmente, para lhe assegurar a remoção precária, não definitiva, para o Departamento de Polícia Federal local, com os possíveis prejuízos remuneratórios indicados na peça vestibular, onde deverá ficar lotada, no exercício das funções do seu cargo, até posterior decisão judicial.
 
Acresça-se que essa remoção da Autora não é capaz de causar prejuízos irreparáveis ao Poder Público, até mesmo pelo fato de que a Autora estará trabalhando, no Departamento de Polícia Federal local, para fazer jus a sua remuneração.

Não é razoável, num contexto humano existencial como o em tela, que se mantenha uma Mãe a quilômetros de distância da sua família, que foi acrescida com a bebê que nasceu com tantos problemas de saúde, quando pode essa Mãe exercer suas atividades no serviço público federal e policial local, sem qualquer prejuízo para os interesses da Administração Pública Federal.
Ademais, é compatível e juridicamente possível o exercício das atribuições do cargo de Agente Penitenciário Federal nas dependências de outro órgão carcerário, a exemplo das dependências do Departamento da Polícia Federal. Vejamos, in verbis, as premissas do art. 123 da Lei Federal nº 11.907/2009:
"Art. 123.  Compete aos ocupantes do cargo de Agente Penitenciário Federal o exercício das atividades de atendimento, vigilância, custódia, guarda, escolta, assistência e orientação de pessoas recolhidas aos estabelecimentos penais e de internamento federais, integrantes da estrutura do Departamento Penitenciário Nacional do Ministério da Justiça, e às dependências do Departamento de Polícia Federal". (Redação dada pela Lei nº 12.269 de 2010). (Grifado)
Os bens jurídicos que se procura garantir com a remoção da Autora são, primordialmente, a saúde da infante, sua filha, e a estabilidade da família, bens esses expressamente protegidos pela norma constitucional nos seus artigos 1º, 3º, 5º, 226 e 227. Isto incorre em dizer que a República Federativa do Brasil possui profundo compromisso com os supramencionados bens, tanto que os materializou no instrumento jurídico da mais alta  relevância e hierarquia no País.

Acresça-se, ainda, que, em julho de 2008, foi aprovada, pelo Decreto Legislativo 186, a "Convenção sobre os direitos das pessoas com deficiência", assinada em Nova Iorque, em 30 de março de 2007, que em seguida foi ratificada pelo Brasil em agosto de 2008. O documento, entre outros pontos, destaca a preocupação com o respeito pelo lar e pela família e, sobretudo, da criança com deficiência, exigindo um padrão de vida e proteção social adequados. Os direitos assegurados pela Convenção passaram a gozar do status de direitos fundamentais, pois o documento equivale, segundo o Parágrafo 2º do art. 5º da Constituição em vigor, a uma emenda constitucional

Finalmente, verifico ser idônea a documentação médica, a atestar a situação médica da bebê da ora Autora, tal qual descrita na petição inicial.
 
 3 - Conclusão

Posto isso, com base no § 7º do art.273 do Código de Processo civil, converto o pedido de antecipação de tutela em pedido de medida cautelar e concedo, liminarmente, essa medida,  determinando que a UNIÃO, por seu Órgão próprio, providencie, em caráter provisório, a remoção imediata da Autora para o Departamento de Polícia Federal da cidade do Recife, capital de Pernambuco, onde passará a exercer as atividades funcionais compatíveis com o seu cargo de agente penintênciário,  até ulterior decisão judicial, sob as penas da Lei.
Cite-se a União, na forma e para os fins legais, e também a intime para o imediato e efetivo cumprimento da decisão supra.
Intimem-se, com urgência. Cite-se.

Recife, 11 de fevereiro de 2015.

Francisco Alves dos Santos Júnior
   Juiz Federal, 2ª Vara-PE

terça-feira, 10 de fevereiro de 2015

CORREÇÃO MONETÁRIA. DÍVIDA DA UNIÃO. ÍNDICE APLICÁVEL PROVISORIAMENTE. STF.

Por Francisco Alves dos Santos Jr


Qual índice de correção monetária se aplica nas dívidas judiciais da União, após o julgamento das Ações Diretas de Inconstitucionalidade nºs 4357/DF e 4425/DF? O Ministro Luiz Fux do Supremo Tribunal Federal decidiu a respeito da matéria em Reclamações que lhe foram dirigidas contra um julgado do Superior Tribunal de Justiça. Esse assunto é debatido na sentença que segue. Boa leitura.


 

PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA

 

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 7138-17.2013.4.05.8300 - Classe 209 – Embargos à Execução

Embargante: UNIÃO

Embargado: SEVERINO FERREIRA DE MELO E OUTROS

 

Registro nº ..............................................

Certifico que registrei esta Sentença no Livro às fls..............

Recife, ........./........../2014.

 

Sentença tipo A

 

EMENTA:- EMBARGOS À EXECUÇÃO. EXCESSO DE EXECUÇÃO.

 

- Homologação dos cálculos apresentados pela UNIÃO, à fl. 79, porque em consonância com a decisão do Min. Luiz Fux na Reclamação 16.980, de 18.12.2013.
i
-Condenação da Parte Embargada em verba honorária.

- Procedência.

 

Vistos etc.  

1 - Relatório. 

A UNIÃO ajuizou esta Ação de Embargos à Execução em razão da execução de título judicial movida por SEVERINO FERREIRA DE MELO E OUTROS, no processo tombado sob o nº 0011337-58.2008.4.05.8300, cujo objeto é o acertamento da indenização por desapropriação indireta promovida pela União em imóvel dos Autores. A UNIÃO alegou, nesta ação de embargos, que o seu Núcleo Executivo de Cálculos e Perícias – NECAP da AGU/PRU-5ª Região teria procedido à análise dos valores apresentados e concluído que haveria excesso de execução; que, de acordo com o Parecer NECAP que estaria sendo acostado aos autos, teria sido apurada a importância de R$ 3.761.310,40 devida aos Exequentes, quando estes estariam pleiteando a quantia de R$ 8.786.648,24; que o equívoco teria decorrido do cômputo dos juros compensatórios, os quais, a despeito do índice correto para cada período, teriam sido capitalizados, ou seja,  os Exequentes fizeram incidir juros sobre juros, configurando o excesso; que, portanto, haveria um excesso de R$ 5.025.337,84, atualizado para março de 2013. Requereu, ao final: que fosse reconhecido o excesso de execução, o qual deveria ser extirpado; o recebimento dos embargos à execução com efeito suspensivo; a juntada de peças processuais; fossem acolhidos os cálculos elaborados pelo NECAP, com a condenação dos Embargados nas verbas de sucumbência. Protestou o de estilo. Juntou documentos (fls. 07-60-vº).

Decisão recebendo os Embargos à Execução; determinando a suspensão do andamento dos autos principais relativamente à parte controversa; homologando o valor de R$3.761.310,14; determinando o prosseguimento da execução nos autos principais, quanto à parte incontroversa, com a expedição do requisitório favoravelmente aos Exequentes/Embargados e a intimação da parte embargada para apresentar impugnação (fls. 62-63).

A parte Embargada apresentou manifestação às fls. 66-67 requerendo a remessa dos autos à Contadoria Judicial para fins de apuração da correta evolução dos valores apresentados, de acordo com os comandos judiciais constantes do processo; e requereu a expedição do precatório da parte incontroversa, com a retenção dos honorários contratuais.

Certidão cartorária atestando que a decisão de fls. 62-63 transitou em julgado no dia 08/10/2013 (fl. 68).

Despacho determinando a remessa dos autos à Contadoria para esclarecer qual dos cálculos estaria correto, se o dos Embargados ou se o da Embargante; ou então, caso nenhum dos dois estivesse correto, que a Contadoria apresentasse sua própria conta (fl. 70).

A Contadoria apresentou Parecer Técnico à fl. 72 informando que elaborou os cálculos de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, e adotou o IPCA-E, como índice de correção monetária; que não incluiu nos cálculos o valor das custas processuais porque não localizou a respectiva guia de pagamento e que observou que os Autores são beneficiários da justiça gratuita. Indicou como valor total a quantia de R$ 4.464.880,88 para março de 2013, conforme demonstrativo de cálculo de fl. 73.

Ato ordinatório intimando as Partes sobre os cálculos elaborados pela Contadoria, fl. 75.

A Parte Embargada concordou tacitamente com a conta da Contadoria Judicial, conforme certidão de fl. 77.

A União/Embargante discordou dos cálculos da Contadoria (fl. 78), nos termos do Parecer que acostou à fl. 79, de acordo com o qual, no cálculo da correção monetária não deveria ter sido utilizada o IPCA-E,  mas sim a TR; que discorda da conta apresentada pela Contadoria, porque estaria excessiva em R$ 697.091,17; que o montante reconhecido importaria em R$ 3.767.789,71, em março de 2013, conforme planilha que estaria anexando (fl. 80).

Os autos vieram conclusos para julgamento.  

É o relatório. Passo a decidir. 

2-Fundamentação 

2.1) A parte Embargada deu início à execução do seu crédito, às fls. 581-586 dos autos principais, indicando R$ 8.786.684,24 como quantia que seria devida pela Parte Embargante, atualizada até 29.03.2013.

A UNIÃO, ora Embargante, alegou,  na petição inicial, que haveria excesso de execução, na ordem de R$ 5.025.337,84 e sustentou que o crédito da Parte Embargada, em março de 2013, seria de apenas R$3.761.310,14,  e que o motivo do excesso, segundo Parecer Técnico que estava instruindo sua peça inicial, acostado à fl. 07, decorreria do equívoco da capitalização dos juros(aplicação de juros sobre juros), não obstante a utilização do índice correto para cada período; e, ainda, que o valor apurado e reconhecido aos Autores seria no montante de R$3.761.310,40, atualizado para a mesma data.

Os autos foram remetidos à Contadoria Judicial e o referido órgão auxiliar do Juízo informou, em síntese, ter elaborado os cálculos de acordo com o Manual de Cálculos da Justiça Federal, e adotado o IPCA-E, como índice de correção monetária. Indicou a quantia de R$4.464.880,88 atualizada para 29 de março de 2013 (fl. 73).

Instadas a se manifestar, a parte Embargada não se pronunciou, o que faz presumir sua anuência tácita; e a parte Embargante discordou dos cálculos, nos termos do Parecer Técnico de fl. 79, porque, segundo afirma, a Contadoria Judicial utilizou o IPCA-E, como fator de correção monetária, quando o correto, de acordo com a União/Embargante, seria a TR, em conformidade com a Lei nº 9.494/97, com a redação da Lei nº 11.960/8009 e argumentou que haveria, na conta da Contadoria Judicial excesso de R$ 697.091,17 e alegou que reconheceria uma dívida de R$ 3.767.789,71, em março de 2013.

Note-se: a UNIÃO sustentou, na petição inicial, que seria devedora de apenas R$ 3.761.310,40, mas quando se manifestou sobre a conta da Contadoria Judicial já admitiu dívida ligeiramente maior, qual seja, 3.767.789,71.

Verifica-se no parecer técnico que a UNIÃO juntou com sua impugnação aos cálculos da Contadoria Judicial, acostado à fl. 79, que a divergência estaria no índice de correção monetária utilizado: o Setor de Cálculos da UNIÃO utilizou o índice TR e a Contadoria Judicial o índice IPCA-E. 
 

2.2) Pois bem, quanto à correção monetária, o Superior Tribunal de Justiça-STJ, no acórdão relativo ao RESp 1.248.545-AgR, mandou aplicar o IPCA-E,  enquanto o Supremo Tribunal Federal – STF não modular os efeitos, relativamente ao índice de correção monetária que deve ser utilizado após o julgamento das ADIs 4357/DF e 4425/DF.

Como se sabe, no julgamento dessas ADIs o Plenário do Supremo Tribunal Federal – STF declarou a parcial  inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009, relativamente à correção monetária, mas não estabeleceu qual é o índice que deve ser aplicado em substituição ao fixado na Lei por último referida.

É verdade que o Conselho da Justiça Federal – CJF, certamente à luz do acima referido julgado do Superior Tribunal de Justiça-STJ, cuidou de modificar o seu manual de cálculos e mandou aplicar o IPCA-E, conforme consta do site desse Conselho, verbis:

“Mudanças na correção monetária

Uma das principais modificações no Manual refere-se ao indexador de correção monetária incidente sobre os débitos judiciais da Fazenda Pública. O Manual passa a prever que voltam a incidir como indexadores de correção monetária o Índice de Preços ao Consumidor Amplo - Série Especial (IPCA-E), para as sentenças condenatórias em geral, o Índice Nacional de Preços ao Consumidor (INPC), para sentenças proferidas em ações previdenciárias, e a taxa SELIC, para os créditos em favor dos contribuintes e para os casos de devedores não enquadrados como Fazenda Pública, cuja incidência engloba compensação da mora e correção monetária.

Essa modificação decorre de declaração parcial de inconstitucionalidade do art. 1º-F da Lei n. 9.494/97, com redação dada pela Lei n. 11.960/2009, pelo Supremo Tribunal Federal (STF), na ADI 4.357/DF. A decisão do STF afastou a aplicação da Taxa Referencial (TR) como indexador de correção monetária das condenações impostas à Fazenda Pública. O juiz Marcos Souza novamente acentua que essa alteração não se aplica ao pagamento de precatórios, que não é regido pelo Manual de Cálculos.”

O subitem 4.2.1.1.1 do referido Manual especifica os indexadores de correção monetária para a condenação em geral, e o subitem 4.6.1.1, os indexadores da correção monetária das desapropriações indiretas (caso dos autos),  nos seguintes termos:

 

De 1964 a fev/86
ORTN
 
De mar/86 a jan/89
OTN
Os débitos anteriores a jan/89 deverão ser multiplicados, neste mês, por 6,17
Jan/89
IPC/IBGE de 42,72%
Expurgo, em substituição ao BTN.
Fev/89
IPC/IBGE de 10,14%
Expurgo, em substituição ao BTN.
De mar/89 a mar/90
BTN
 
De mar/90 a fev/91
IPC/IBGE
Expurgo, em substituição ao BTN e ao INPC de fev/91.
De mar/91 a dez/91
IPC/FGV
 
De jan/92 a dez/2000
Ufir
Lei n. 8.383/91
A partir de jan/2001
IPCA-E / IBGE (em razão da extinção da UFIR como indexador, pela MP n. 1.973-67/2000, art. 29, §3º).
 
O percentual a ser utilizado em janeiro de 2001 deverá ser o IPCA-E acumulado no período de janeiro a dezembro de 2000. A partir de janeiro de 2001 deverá ser utilizado o IPCA-E mensal (IPCA-15 / IBGE).

 

Mas, o Supremo Tribunal Federal – STF, pelo Relator das noticiadas ADIs, Ministro Luiz Fux, no julgamento da Reclamação nº 16.980, em decisão de 18.12.2013, assim se expressou:

“(...). Ex positis, tendo em vista que ainda pende de decisão a questão alusiva à modulação dos efeitos da decisão, o que influenciará diretamente o desfecho da presente reclamação, defiro a liminar para suspender efeitos da decisão do Superior Tribunal de Justiça-STJ nos autos do RESp 1.248.545-AgR, determinando que os pagamentos devidos pela Fazenda Pública sejam efetuados observada a sistemática anterior à declaração de inconstitucionalidade parcial da EC nº 62/2009, até julgamento final desta Corte relativamente aos efeitos das decisões nas mencionadas ações diretas de inconstitucionalidade. Comunique-se. Publique-se[1]”.

 Assim, à luz dessa r. decisão, deve-se continuar aplicando o índice de variação da TR, como estabelecido na Lei 11.960, de 2009, até que o Supremo Tribunal Federal – STF, na modulação dos efeitos dos julgados das mencionadas ADIs(e que o fará à luz do art. 27 da Lei nº 9.868, de 1999), venha a dizer qual índice deve ser aplicado.

Então, há de se ter por correta a conta apresentada pela União, acostada à fl. 79, na qual utilizou, para correção monetária, o índice TR, conta essa apresentada quando da manifestação sobre os cálculos da Contadoria Judicial, que afastou, corretamente,  a capitalização de juros, denunciada na petição inicial, por não ter essa capitalização respaldo na legislação que trata da dívida da UNIÃO.
 

2.3 – Diante da vitória da UNIÃO, a Parte Embargada há de lhe pagar, à luz do § 4º do art. 20 do CPC, a título de honorários advocatícios, a quantia de R$ 6.470,31(seis mil, quatrocentos e setenta reais e trinta e um centavos), que é exatamente a diferença entre o valor que a Parte Embargada já requisitou, em decorrência da decisão de fls. 62-63 e o valor que a UNIÃO reconhece, na conta de fl. 79, como devido.
Logo, a UNIÃO não tem nada mais a pagar à Parte Embargada, porque receberá como verba honorária advocatícia a diferença que ainda teria que pagar à tal Parte.
 

3. Conclusão. 

POSTO ISSO, julgo procedentes os pedidos desta ação de embargos à execução do julgado, infirmo a memória de cálculos apresentada pela  Parte Embargada nos autos principais e homologo a conta da UNIÃO, acostada à fl. 79 destes autos, para todos os fins de direito, e condeno a Parte Embargada a pagar a verba honorária indicada no subitem 2.3 supra, que será deduzida da parcela que a UNIÃO ainda teria que lhe pagar, conforme explicado no mencionado subitem.

Traslade-se cópia desta sentença,  bem como dos cálculos ora homologados para os autos principais.

Sem custas, nos termos do art. 7º da Lei 9.289/96.

Após o trânsito em julgado, dê-se baixa e arquive-se.

 

Recife, 10 de fevereiro de 2015.

 

Francisco Alves dos Santos Júnior

     Juiz Federal, 2ª Vara-PE

 

 

 

 

 



[1] Tal entendimento foi ratificado nos autos da RCL n. 17503/DF, julgada procedente pelo E.STF, em 28/11/2014.

sexta-feira, 12 de dezembro de 2014

INCADUCIDADE TRIBUTÁRIA. NOVA TESE. NÃO ACOLHIMENTO PELO TRF DA 5ª REGIÃO.

          Por Francisco Alves dos Santos Jr.


         Segue sentença na qual o juiz adotou uma nova tese sobre incaducidade tributária, mas que não foi mantida pelo Tribunal Regional Federal da 5ª Região, no acórdão cujos dados encontram-se logo após o final da sentença.

          Boa leitura.




PODER JUDICIÁRIO

JUSTIÇA FEDERAL DE PRIMEIRA INSTÂNCIA

Seção Judiciária de Pernambuco

2ª VARA

 

Juiz Federal: Francisco Alves dos Santos Júnior

Processo nº 0009243-69.2010.4.05.8300 - Classe 29 – Ação Ordinária

Autor: C  A  DO A
Adv.: M F G - OAB/PE

Réu: COMISSÃO DE VALORES IMOBILIÁRIOS - CVM

Procurador(a) Federal 

 

Registro nº ...........................................

Certifico que registrei esta Sentença às fls..........

Recife, ...../...../2011 

 

Sentença tipo A
 

EMENTA : - DIREITO TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. INEXISTÊNCIA.  

Não flui o prazo de decadência do § 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional, quando o Contribuinte não paga o tributo, utilizando-se de prática dolosa.  

Rejeição da exceção de decadência. Improcedência.
 

Vistos etc. 

COMPANHIA AGROPECUÁRIA DO ARAME, qualificada nos autos, ajuizou, em 06.07.2010, a presente “Ação Anulatória de Lançamento Fiscal com Pedido de Tutela Antecipada para Suspensão da Exigibilidade do Crédito Tributário” contra a COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS, aduzindo, em síntese, que teria incorporado a sociedade CISA – Companhia de serviços Agrícolas; que a Ré teria lavrado contra referida empresa notificação de lançamento nº 173/32, em 06.11.2001, formalizando o processo administrativo nº CVM nº RJ 2002/146, relativamente a crédito tributário decorrente do não recolhimento da Taxa de Fiscalização de Valores Mobiliários dos quatro trimestres do ano de 1991; que teria se insurgido administrativamente contra mencionado lançamento, sem, contudo, haver obtido êxito; que não teria havido lançamento por homologação, eis que a Ré teria procedido de ofício; que, não havendo a Autora efetuado o pagamento da taxa em questão, o prazo decadencial passara a contar do primeiro dia do exercício seguinte àquele em que o lançamento poderia ter sido efetivado (01.01.1992), conforme disposto no inciso I, do art. 173 do CTN; que a notificação de lançamento teria sido datada de 06.11.2001, quando já ultrapassado o prazo decadencial para constituição do crédito tributário; que o lançamento questionado deveria ser anulado; que, em se tratando de tributo sujeito a lançamento por homologação e inexistindo antecipação de pagamento, não seria possível a soma dos prazos do § 4º, do art. 150 e do inciso I, do art. 173 do CTN; que, remontando o início do prazo decadencial a 01.01.1992, e, havendo sido a Autora notificada do lançamento apenas em 06.11.2001, teria tal prazo sido ultrapassado a partir de 01.01.1997. Teceu outros comentários. Transcreveu algumas decisões judiciais. Invocou entendimentos doutrinários. Requereu a antecipação dos efeitos da tutela, inaudita altera pars, para que fosse ordenada a suspensão da exigibilidade do crédito tributário lançado no processo administrativo CVM nº RJ 2002/146, bem como a abstenção da inscrição do nome da Autora no CADIN; a citação da COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS; a procedência dos pedidos, para anular o lançamento de ofício perpretado pela Ré através do referido processo administrativo; a condenação da Ré ao pagamento de honorários advocatícios e custas. Fez protestos de estilo. Deu valor à causa. Pediu deferimento. Instruiu a Inicial com cópia de documentos e instrumento de procuração (fls. 20/95).

Comprovante de recolhimento de custas (fl. 96).

O pedido de antecipação da tutela foi indeferido em decisão de fls. 100/101.

À fl. 104, a Autora noticiou a interposição de Agravo de Instrumento, juntando cópia do referido recurso (fls. 105/127).

Mantida a decisão agravada (fl. 128).

À fl. 129, ofício encaminhando cópia de decisão proferida nos autos do noticiado Agravo de Instrumento (fls. 130/133).

Citada, a COMISSÃO DE VALORES MOBILIÁRIOS apresentou Contestação, às fls. 138/145, sustentou que a Autora não teria comprovado que a sua omissão, quanto ao recolhimento da Taxa de Fiscalização do Mercado de Títulos e Valores Mobiliários, teria sido apenas culposa; que, configurada a omissão dolosa, a contagem do prazo decadencial se daria nos termos do disposto no final do § 4º, do art. 150 e do parágrafo único, do art. 173 do CTN; que, ainda que se admitisse a tesa da omissão dolosa e, se partisse da premissa de existir omissão culposa, não mereceria prosperar a tesa da Autora; que mencionada taxa seria um tributo sujeito a lançamento por homologação, de modo que o nascimento do crédito tributário coincidiria com o instante de ocorrência do fato gerador; que o lançamento, condição de exigibilidade do referido crédito, poderia ser realizado até o prazo decadencial; que, considerando que o prazo do lançamento por homologação seria de cinco anos, a CVM possuiria mais cinco anos para constituir definitivamente o seu crédito; que o crédito em comento referir-se-ia ao exercício de 1991; que o prazo para constituição do crédito, relativamente ao fato gerador mais remoto, ocorrido em 16.02.1991, teria iniciado em 01.01.1992; que de 01.01.1992 até a data em que o lançamento fora aperfeiçoado não teriam decorrido dez anos; que o lançamento poria termo à decadência, enquanto a prescrição somente se iniciaria com a constituição definitiva do crédito, que se daria após o encerramento do contencioso administrativo; que, realizado o lançamento tributário dentro do prazo legal, a Fazenda teria ainda o prazo de cinco anos, contados da constituição definitiva do crédito, para ajuizar a ação de execução fiscal, ex vi o art. 174 do CTN; que, no presente acaso, também não teria ocorrido a prescrição. Fez outros comentários. Ao final, requereu: a improcedência dos pedidos formulados na Inicial, condenando a Autora nos ônus da sucumbência. Protestou o de costume. Pediu deferimento. Juntou cópia de documentos (fls. 146/224).

A Autora apresentou Réplica, às fls. 231/252, rebatendo os argumentos da Defesa e reiterando os termos da Inicial.

Vieram os autos conclusos para julgamento.  

É o Relatório.

Passo a decidir. 

Fundamentação.

1. A Autora alega que o direito de a Comissão de Valores Mobiliários-CVM, Autarquia Federal, lançar a taxa de fiscalização em debate teria sido fulminado pela decadência, para cujo exercício o prazo seria de 5(cinc)anos, contados da data do fato gerador.  E assim seria, porque o crédito tributário era do quarto trimestre de 1991, de forma que, embora se trate de tributo submetido ao lançamento por homologação, ante a não realização dos procedimentos para o lançamento e a falta de pagamento, o início do prazo de decadência transmudara-se para o primeiro dia do exercício subsquente àquele em que o lançamento poderia ter sido efetuado, qual seja, para 01.01.1992, e findado cinco anos depois, em 01.01.1997, tudo conforme inciso I do art. 173 do Código Tributário Nacional e sedimentado entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça e da doutrina.  

Realmente, há esse entendimento no E. Superior Tribunal de Justiça e dele transcrevo uma de suas inúmeras r. decisões a respeito desse assunto, verbis:

TRIBUTÁRIO. DECADÊNCIA. TRIBUTOS SUJEITOS AO REGIME DO LANÇAMENTO POR HOMOLOGAÇÃO. Nos tributos sujeitos ao regime do lançamento por homologação, a decadência do direito de constituir o crédito tributário se rege pelo artigo 150, § 4º, do Código Tributário Nacional, isto é, o prazo para esse efeito será de cinco anos a contar da ocorrência do fato gerador; a incidência da regra supõe, evidentemente, hipótese típica de lançamento por homologação, aquela em que ocorre o pagamento antecipado do tributo. Se o pagamento do tributo não for antecipado, já não será o caso de lançamento por homologação, hipótese em que a constituição do crédito tributário deverá observar o disposto no artigo 173, I, do Código Tributário Nacional. Embargos de divergência acolhidos.

(EREsp 101407/SP, Rel. Ministro ARI PARGENDLER, PRIMEIRA SEÇÃO, julgado em 07/04/2000, DJ 08/05/2000, p. 53) 

                Esse E. Tribunal também já adotou a tese de cinco anos + cinco anos para que a Fazenda Pública ultimasse o lançamento, tese essa afastada por sua 1ª Seção, no julgamento do ERESP 101407, in DJU de 08.05.2000, conforme tratou de demonstrar a Autora na sua petição inicial.  

                O acima transcrito entendimento do E. Superior Tribunal de Justiça pode ser aceito, tranquilamente, nas hipóteses em que o Contribuinte age culposamente.  

                2. Mas quando ele age ou omite-se dolosamente, não recolhendo nenhuma parcela do tributo, não pode receber o mesmo tratamento, porque há regra expressa no final do § 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional, regra essa que, data maxima vênia, nunca foi abordada pelo mencionado E. tribunal.   

                Resta claro nessa parte desse dispositivo legal que, se o Contribuinte praticar qualquer ato doloso, ou omitir-se dolosamente, quanto as atividades que deveria realizar, tendentes à concretização do lançamento, que findaria com a homologação da Fazenda Pública, e assim agindo ou omitindo-se não recolhe nenhuma parcela do tributo, não fluirá o prazo decadencial de 5(cinco)anos para que a Fazenda Pública realize a homologação ou, por óbvio, faça o lançamento de ofício(de caráter revisional, quando o Contribuinte, por exemplo, tiver recolhido valor menor que o devido; ou realize o lançamento integral, quando o Contribuinte tiver se omitido totalmente).  

                Então, nessa situação, quando a Fazenda Pública tomar conhecimento do ato ou da omissão, se qualquer deles for doloso, poderá, quando descobrir o ato ou a omissão dolosos,  efetuar o lançamento por notificação de lançamento, por notificação de auto de infração ou por notificação de início de procedimento fiscal, tendente à realização do lançamento. E, se for esta última hipótese(notificação de início de procedimento tendente ao lançamento), o prazo de cinco anos será para que finde o procedimento, ou seja, para que concretize o lançamento(Parágrafo Único do art. 173 do Código Tributário Nacional).    

                Constata-se, no documento de fl. 76, acostado pela Autora com sua petição inicial, que a Comissão de Valores Mobiliários-CVM optou pela notificação de lançamento, com data de 06.11.2001.  
 
                Conforme procurei demonstrar na decisão inicial, que se encontra às fls. 100-101, isso não é nenhuma inovação do Direito Brasileiro, pois encontra igual tratamento no Código Tributário da Alemanha de 1977, ainda em vigor, bem como em Lei da Espanha, que trata do Imposto sobre Transmissões Patrimoniais – ITP. 

                Extrai-se do referido dispositivo legal do nosso Código Tributário Nacional que cabe apenas examinar se o Contribuinte agiu ou não dolosamente.  

                O Contribuinte não age dolosamente, nos tributos submetidos a lançamento por homologação, quando comprova que não poderia, em hipótese alguma, recolher o tributo que apurou, por completa impossibilidade econômico-financeira, ou quando comprova sua total ignorância no que diz respeito a essa responsabilidade, a de apurar e recolher o tributo, sob condição resolutória.  

                Não é o que aconteceu no presente caso, pois a própria ora Autora tratou de demonstrar sua higidez econômico-financeira, e o seu completo conhecimento da legislação tributária brasileira.  

Não pode vingar o seu argumento de que absorvera a Empresa, que seria a Devedora originária(CISA COMPANHIA DE SERVIÇOS AGRÍCOLAS), por incorporação, de forma que não poderia ter agido dolosamente. 

                Ocorre que, ao incorporar a Devedora originária, a ora Autora assumiu a responsabilidade pelas dívidas tributárias desta(art. 132 do Código Tributário Nacional).  

                E se continuou silente a respeito da referida dívida tributária, agiu dolosamente, a espera da decadência.  

                Assim, quando a Comissão de Valores Mobiliários-CVM notificou a ora Autora do lançamento, em 06.11.2001, ainda não tinha ocorrido a alegada decadência.  

                Como a Autora não impugna o mérito da taxa em cobrança, alegando apenas a existência de decadência, a qual, data maxima venia, não ocorreu, tenho que referida exceção merece ser rejeitada, com a consequente improcedência do pleito e respectiva resolução do mérito.  

                3. O entendimento acima constou do anteprojeto do Código Tributário Nacional, feito pelo saudoso RUBENS GOMES DE SOUZA, cujo artigo 213 tinha a seguinte redação:

Art. 213. A prescrição não começa a correr enquanto a ocorrência do fato gerador do tributo, ou a prática da infração, não cheguem ao conhecimento da autoridade administrativa competente, por qualquer das seguintes razões: I. Dolo, fraude, simulação ou ocultação por parte do contribuinte ou de terceiro em benefício daquele; II. Omissão de cumprimento de obrigação tributária acessória, ainda que sem dolo ou fraude, por parte do contribuinte ou de terceiro em benefício daquele”.[1] 

Nota 1 – Apud SANTOS JR, Francisco Alves dos. Decadência e Prescrição no Direito Tributário do Brasil: análise das principais teorias existentes e proposta para alteração da respectiva legislação. Rio de Janeiro – São Paulo: Renovar, 2001, p. 152.

Obs.: Esse livro foi uma adaptação da Dissertação de Mestrado do Autor, defendida na Faculdade de Direito da Universidade Federal de Pernambuco, no ano 2000.  

Note-se que no anteprojeto falava-se apenas em prescrição, porque o direito positivo brasileiro de então não tinha a figura da decadência, tendo passado a existir expressamente a partir exatamente do Código Tributário Nacional e no Código Civil de 2002, atualmente em vigor.               

4. O referido dispositivo legal(o § 4º do art. 150 do Código Tributário Nacional)e o entendimento supra, data maxima venia, não ferem o princípio da segurança jurídica, que é um dos fundamentos da origem da decadência e da prescrição, pois se trata de um caso excepcional, pelo qual, elastecendo-se a possibilidade de a Fazenda Pública efetuar o ato de lançamento dos seus tributos, busca-se punir o contribuinte que age com dolo.  

                Haveria ferimento a esse princípio, sim, se acontecesse o contrário, ou seja, se o contribuinte que agisse dolosamente recebesse, como pretende a Autora, o mesmo tratamento tributário dado ao contribuinte que agisse apenas culposamente, no descumprimento das obrigações tributárias.

Se assim fosse, aí sim haveria um incentivo a práticas dolosas, um incentivo à insegurança jurídica, à insegurança na realização das receitas tributárias por parte da Fazenda Pública. 

                Conclusão

                Posto isso, rejeito a exceção de decadência e, com resolução do mérito, julgo improcedentes os pedidos desta ação(art. 269-I do Código de Processo Civil), condenando a ora Autora nas custas processuais e em verba honorária, que arbitro em 10%(dez por cento)do valor total do tributo em debate, atualizado na forma da respectiva legislação tributária, valor esse a ser apurado na forma preconizada no art. 475-B do Código de Processo Civil e executado conforme art. 475-J do mesmo diploma processual.

Com urgência, remeta-se cópia desta sentença para os autos  do noticiado agravo de instrumento, aos cuidados do respectivo Relator.
                                                                                                                                                                                                 

P.R.I.

Recife, 08 de agosto de 2011.

 
Francisco Alves dos Santos Júnior

  Juiz Federal, 2ª Vara-PE

 
NOTAS SOBRE O ACÓRDÃO DO TRIBUNAL REGIONAL FEDERAL DA 5ª REGIÃO, QUE REFORMOU A SENTENÇA.

Apelação Cível nº 533.288/PE(0009243-69.2010.4.05.8300). Relator Juiz Francisco Cavalcanti. Primeira Turma. Julgado em 10.05.2012. Disponibilização no Diário da Justiça Eletrônico do TRF5 nº 096/2012, de 18.05.2012 e publicação no mesmo DJe de 21.05.2012.

O recurso especial, interposto pela Comissão de Valores Mobiliários - CVM não foi admitido, por decisão do Vice-Presidente do referido Tribunal, datada de 09.09.2014, contra a qual a Parte Recorrente não interpôs recurso, pelo que foi certificado que o acórdão acima mencionado transitou em julgado, tudo conforme certidão de 28.10.2014, constante de fl. 356 dos autos do processo nº 0009243-49.2010.4.05.8300, 2ª Vara Federal de Pernambuco.