terça-feira, 25 de maio de 2021

DIREITO CONSTITUCIONAL-TRIBUTÁRIO. NATUREZA JURÍDICA DOS JUROS DE MORA. NÃO INCIDÊNCIA DO IRPJ, NEM DA CSLL. STJ. STF.

 

Por Francisco Alves dos Santos Júnior


Na sentença segue, discute-se com detalhes a natureza dos valores decorrentes da aplicação dos índices da tabela SELIC, um rígido histórico legal da aplicação desses índices no campo do direito tributário, bem como a natureza jurídica dos juros de mora e o motivo pelo qual estes não podem sofrer incidência do IR, pessoa física ou jurídica, tampouco da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, cuja estrutura de incidência é em tudo, por tudo igual ao do IRPJ.

Boa leitura. 



PROCESSO Nº: - MANDADO DE SEGURANÇA CÍVEL
IMPETRANTE: 
ADVOGADO: 
IMPETRADO: FAZENDA NACIONAL
AUTORIDADE COATORA: DELEGADO DA RECEITA FEDERAL DO BRASIL EM RECIFE/PE,
2ª VARA FEDERAL - PE (JUIZ FEDERAL TITULAR)

SENTENÇA TIPO A



EMENTA: -  TRIBUTÁRIO. MANDADO DE SEGURANÇA. JUROS  DE MORA. TABELA SELIC.

-As Leis que introduziram os índices da tabela SELIC na atualização dos tributos denominaram essa atualização de juros de mora, tanto quando o Contribuinte papa com atraso, como quando a Fazenda Pública ressarce, restitui ou admite a compensação de parcelas que, respectivamente, ressarciu com atraso ou cobrou indevidamente.. 

-Juros de mora têm natureza indenizatória e, por isso, como não comportam aumento patrimonial, não podem, em qualquer situação,  ser submetidos à incidência do Imposto de Renda, tampouco, quando o Contribuinte é Pessoa Jurídica, à incidência da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL.

-Precedentes de efeito repetitivo do STJ, relativo à natureza jurídica dos juros de mora,  superado por julgado posterior do STF.

-O pedido de restituição ou compensação das parcelas indevidamente pagas será parcialmente acolhido, à luz de Súmulas do STF e do STJ, porque formulado em Mandado de Segurança, sem prejuízo do pleito do restante das verbas, ainda não decaídas ou prescritas, pela via administrativa ou judicial própria.

-Parcial concessão da segurança.



Vistos, etc. 

1. Breve ReVatório

............................, qualificada na Inicial, impetrou este Mandado de Segurança com pedido de liminar em face do Ilmo. Sr. Dr. Delegado da Receita Federal do Brasil em Recife/PE, representada, no presente caso, por força de lei, pela Procuradoria Geral da Fazenda Nacional da 5ª Região. Aduziu, em síntese, que: seria sociedade empresária que teria atuado duramente muitos anos no ramo de comércio atacadista em geral, com predominância em alimentos; no exercício de suas atividades empresariais, a Impetrante estaria submetida ao IRPJ e à CSLL, além dos demais tributos incidentes sobre à sua atividade empresarial; a Impetrante, através de ações individuais ou coletivas, estaria buscando o reconhecimento da ilegalidade e/ou da inconstitucionalidade de diversas exigências tributárias postas no ordenamento pátrio; seria associada à Aspa - Associação Pernambucana de Atacadistas e Distribuidores; a Aspa, na qualidade de substituta processual de seus associados, teria impetrado Mandado de Segurança Coletivo buscando o reconhecimento da inconstitucionalidade da inclusão do ICMS na base de cálculo do PIS e da Cofins;  tal Mandado de Segurança Coletivo, tombado sob o nº 0001443-13.2012.4.05.8301, teria transitado em julgado em 29/10/2018, reconhecendo a inconstitucionalidade de tal incidência, assim também o direito dos associados Aspa de restituírem, via compensação, o indébito relativo ao quinquênio anterior ao ajuizamento da ação, devidamente acrescidos da taxa SELIC; dada as características da ação mandamental, a decisão concessiva da segurança seria sempre ilíquida; após o trânsito em julgado de uma ação mandamental de natureza tributária, que tivesse por objeto a restituição do indébito via compensação, para a Impetrante efetivar a compensação, seria sempre necessário um procedimento prévio, previsto na legislação atualmente vigente (Instrução Normativa RFB nº 1.717/2017, art. 100 e seguintes) intitulado "Habilitação de Crédito", adiante detalhado; após a habilitação do crédito, através de despacho decisório da Receita Federal do Brasil, seria possível à Impetrante a compensação do indébito com tributos administrados pela Receita Federal do Brasil, através da entrega da Declaração de Compensação, na forma prevista na Lei nº 9.430/96 (art. 74 e seguintes), sob condição resolutória de posterior homologação expressa ou tácita, no prazo de 5 (cinco) anos a contar da entrega da Declaração de Compensação (art. 74, § 2º, da Lei nº 9.430/96); só com a homologação, expressa ou tácita, da compensação é que o indébito efetivamente se tornaria líquido e certo, capaz de extinguir em definitivo o débito tributário objeto da compensação, nos termos do art. 156, inc. II, do CTN; apesar do indébito tributário decorrente da decisão transitada em julgado em ações mandamentais de natureza tributária, apenas se tornaria efetivamente líquido, certo e apto à extinção dos débitos compensados com a efetiva homologação (tácita ou expressa); o entendimento da Autoridade Coatora seria de que com "o trânsito em julgado da sentença declaratória do direito à compensação, os créditos compensáveis passam a ser receitas tributáveis do IRPJ e da CSLL", sob o argumento de que nesse momento já estariam juridicamente disponíveis para o contribuinte (Solução de Divergência Cosit nº 19/2003); a Impetrante entenderia que a tributação pelo IRPJ e pela CSLL só poderia ocorrer no momento em que viesse a ser implementada a condição resolutória posta na legislação pátria para efetiva liquidez e certeza do indébito, ou seja, no momento em que houvesse a homologação, expressa ou tácita, da compensação realizada, decorrente de decisão judicial transitada em julgado; além da celeuma acerca do momento em que tais receitas devem ser oferecidas à tributação do IRPJ e da CSLL, outra questão que se imporia seria a (não) tributação da parcela atinente aos juros de mora (SELIC) por tais tributos, por não se tratar de receita nova e sim de parcela de caráter indenizatória; ainda que o Superior Tribunal de Justiça tenha julgado a questão pela sistemática de recurso repetitivo no REsp nº 1.138.695/SC, posicionando-se pela legalidade da incidência, a matéria teria evidente natureza constitucional, pois diz respeito ao conceito constitucional de renda/lucro; no Recurso Extraordinário nº 1.063.087, o Supremo Tribunal Federal reconheceu a natureza constitucional e a repercussão geral da matéria relativa à tributação, pelo IRPJ e a CSLL, da parcela atinente aos juros de mora devidos nas situações de repetição de indébito, estando a questão ainda pendente de julgamento. Teceu outros comentários. Transcreveu precedentes. 

Pugnou, ao final, pela:

"Concessão da Segurança para reconhecer o direito da Impetrante de somente recolher o IRPJ e a CSLL incidente sobre os valores restituídos via compensação de indébito quando da efetiva homologação (expressa ou tácita) do crédito objeto da compensação, assim também o reconhecimento da inconstitucionalidade da incidência do IRPJ e da CSLL sobre o valor atinente aos juros de mora/atualização monetária (taxa SELIC), relativo à restituição/compensação de tributo pago indevidamente. Declarada a ilegalidade e a inconstitucionalidade da incidência do IRPJ e da CSLL sobre a parcela atinente ao juros de mora (SELIC), requer seja reconhecido o direito à restituição ou à compensação dos valores recolhidos indevidamente nos últimos 5 (cinco) anos, devidamente acrescido de juros e correção monetária, na forma prevista no art. 74 da Lei nº 9.430/96."

Decisão sob Id. 4058300.15917864 em que foi suspensa  a exigibilidade dos IRPJ e CSLL sobre o valor dos juros de mora(SELIC) da noticiada repetição de indébito tributário, até que o Plenário da Suprema Corte julgue, sob repercussão geral, o nº RE 1.063.187/SC, gerou o Tema 962 e reconhecendo o direito de a Impetrante recolher o IRPJ e a CSLL,  incidentes sobre os valores restituídos via compensação de indébito,  quando da efetiva homologação (expressa ou tácita) do crédito objeto da compensação.

A União (Fazenda Nacional) manifestou interesse no feito (Id. 4058300.16002665).

A autoridade apontada como coatora apresentou Informações sob Id. 4058300.16115544. Defendeu, em síntese, que: conforme se depreende de sua leitura, proventos de qualquer natureza seriam definidos como acréscimos patrimoniais não compreendidos no conceito de renda, deixando claro que a própria renda também seria um acréscimo patrimonial; o CTN definiria o fato gerador do imposto de renda como sendo o acréscimo patrimonial, seja este proveniente da renda (quando decorrente do trabalho, do capital ou da combinação destes), ou dos proventos de qualquer natureza (nos demais casos); neste sentido, deve-se frisar que nem o CTN e nem a Constituição de 1988 teriam definido o conceito de acréscimo patrimonial, cabendo ao legislador ordinário a liberdade para definir-lhe os contornos; assim, a partir dos conceitos de renda e proventos de qualquer natureza instituídos pelo art. 43 do CTN, seria possível inferir que nenhum acréscimo patrimonial fora excluído da incidência do imposto sobre a renda e proventos de qualquer natureza, de modo que, ao legislador ordinário, teria cabido a liberdade para descrever a hipótese de incidência do fato gerador desse imposto, relativamente a qualquer fenômeno que manifestasse um acréscimo patrimonial; seria também da essência da definição do fato gerador do imposto de renda a simples aquisição da disponibilidade econômica ou jurídica de renda ou proventos de qualquer natureza, sendo que a disponibilidade econômica seria a obtenção da posse da renda, de direito e de fato, configurada pelo efetivo recebimento desta, ao passo que a disponibilidade jurídica é a obtenção da posse da renda apenas de direito, configurada pela existência de um crédito com características de liquidez e certeza; os artigos 402 e 403 do CC/2002 teriam deixado patente que a terminologia "perdas e danos" englobaria não apenas os prejuízos efetivos, mas também os lucros cessantes. Teceu outros comentários. Pugnou, ao final, pela denegação da segurança.

O Ministério Público Federal não se manifestou sobre o mérito da questão (Id. 4058300.16177735).

É o relatório, no essencial.

Passo a decidir.

2. Fundamentação

2.2.1 - Como se sabe, a substituição dos índices de correção monetária e de índices juros de mora na atualização dos tributos federais pagos com atraso pelos índices da tabela SELIC ocorreu por meio da Lei nº 8.981, de 1995, no seu art. 84,
verbis:

"Art. 84 - Os tributos e contribuições sociais arrecadados pela Secretaria da Receita Federal, cujos fatos geradores vierem a ocorrer a partir de 1º de Janeiro de 1995, não pagos nos prazos previstos na legislação tributária, serão acrescidos de:

I - Juros de mora, equivalentes à taxa média mensal de captação do Tesouro Nacional relativa à Dívida Mobiliária Federal Interna.

(...)

§4º Os juros de mora de que trata o inciso I, deste artigo, serão aplicados também às contribuições sociais arrecadadas pelo FISCO e aos débitos para com o patrimônio imobiliário, quando não recolhido nos prazos previstos na legislação específica".

Por sua vez o art. 13 da Lei nº 9.065/95 determinou:

"Art. 13 - A partir de abril de 1995, os juros de que tratam a alínea c do parágrafo único do art. 14 da Lei nº 8.847, de 28 de janeiro de 1994, com redação dada pelo art. 6º da Lei 8.850 de 28 de janeiro de 1994, e pelo art. 90 da Lei 9.981, de 1995, o art. 84, inciso I, e o art. 91, parágrafo único, alínea a, da Lei 9.891 de 1995, serão equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para os títulos federais acumulada mensalmente".

E para que os Contribuintes tivessem igual tratamento, quando recebessem, em restituição ou em compensação, parcelas de tributos que tivessem pagado indevidamente, por erro de fato ou de direito, a Lei nº 9.250, de 1995, fixou o mesmo índice para atualização:

"Art. 39 - (....)

§ 4º A partir de 1º de janeiro de 1996, a compensação ou restituição será acrescida de juros equivalentes à taxa referencial do Sistema Especial de Liquidação e de Custódia - SELIC para títulos federais, acumulada mensalmente, calculados a partir da data do pagamento indevido ou a maior até o mês anterior ao da compensação ou restituição e de 1% relativamente ao mês em que estiver sendo efetuada.".  

A Lei nº 9.532, de 1997, estabeleceu,  no seu art. 74, que a incidência do índice da tabela SELIC, na atualização dos valores nos casos de repetição de indébito ou compensação tributárias, ocorreria a partir do primeiro dia do mês seguinte ao do pagamento indevido, verbis: 

"Art. 73. O termo inicial para cálculo dos juros de que trata o § 4º do art. 39 da Lei nº 9.250, de 1995, é o mês subseqüente ao do pagamento indevido ou a maior que o devido.".

E de 1%(um por cento) sobre o valor do mês da efetiva restituição ou compensação(v. final do § 4º do art. 39 da Lei nº 9.250, de 1995, acima  transcrito).

Então, pela linguagem da Lei, na atualização dos créditos tributários,  deixou de existir correção monetária e passou a existir apenas juros de mora, extraídos da Tabela SELIC.

É verdade que há julgados do Superior Tribunal de Justiça, nos quais se sustentou que dentro do índice da Tabela SELIC há parcela de correção monetária e parcela de juros de mora.

Mas a legislação bancária que deu origem aos índices dessa Tabela SELIC outorga-lhe apenas a natureza de juros bancários, no Sistema Integrado de Liquidação e Custódia (SELIC) para títulos federais.

A respeito desse assunto, ensina  Édison Freitas de Siqueira no artigo acima invocado e indicado na nota de rodapé [1] infra:

"A Resolução nº 1.124/96 do Conselho Monetário Nacional instituiu a Taxa SELIC, definida pelas Circulares BACEN 2.868/99 e 2.900/99, assim dispondo: "define-se Taxa SELIC como a taxa média ajustada dos financiamentos apurados no Sistema Integrado de Liquidação e Custódia (SELIC) para títulos federais".

Essa taxa, além de refletir a liquidez dos recursos financeiros no mercado monetário, tem a característica de juros remuneratórios ao investidor. Assim, desconsiderando a natureza deste índice, a SELIC foi utilizada para driblar a limitação legal dos juros moratórios dos débitos tributários, de 1% ao mês, de acordo com o art. 161, § 1º do Código Tributário Nacional (Lei nº 5.172, de 25/10/1966).

Essa burla à mencionada regra da Lei nº 5.172, de 1966, que instituiu o Código Tributário Nacional e que hoje tem status de Lei Complementar(v. art. 146 da vigente Constituição da República), findou por ser aceita pelo Superior Tribunal de Justiça.

2.2.2 - Agora, adentrando na questão do mandado de segurança ora sob análise, se os juros decorrentes da aplicação da Tabela SELIC, na repetição de indébito tributário, sofre ou não incidência do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza de Pessoa Jurídica, bem como da Contribuição Social Sobre o Lucro Líquido, penso que não.

Explico.

Do acima exposto, temos que, legalmente, repito, os valores decorrentes da aplicação dos índices da Tabela SELIC têm natureza de juros e, na repetição de indébito, tributário ou não, tem natureza de juros de mora, pois representa a paga pelo uso indevido do dinheiro daquele que faz jus à repetição do indébito, além do prazo legal ou do prazo contratual. 

Uma leitura atenta da íntegra do art. 43 do Código Tributário Nacional leva, facilmente, à conclusão que só ocorre o fato gerador do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza quando o Administrado adquire a disponibilidade de renda que implique em acréscimo do seu patrimônio.

Como os juros de mora, seja na área privada, seja na área pública, tem sempre natureza indenizatória, tem-se, então, que nada acresce ao patrimônio Daquele que os recebe, apenas repõe alguma verba ou alguma coisa que deixou de obter em determinado momento, por culpa de Alguém que reteve indevidamente  o seu dinheiro e foi obrigado a lhe indenizar,  com o pagamento desses juros, de forma que a aquisição da disponibilidade jurídica ou econômica dos valores relativos a esses juros de mora fica à margem do fato gerador do Imposto de Renda, seja com relação à Pessoa Jurídica(Coletiva, como se diz, com maior propriedade, em Portugal) ou à Pessoa Física que os recebe.

E por consequência, também fica à margem do fato gerador da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido, cujo fato gerador é em tudo por tudo igual ao fato gerador do Imposto sobre Renda e Proventos da Pessoa Jurídica(Coletiva).

2.2.2-1 - No entanto, a 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, no julgamento do REsp 1.138.695/SC, em julgamento submetido ao regime dos recursos repetitivos,  decidiu:

"PROCESSUAL CIVIL. TRIBUTÁRIO. RECURSO REPRESENTATIVO DA CONTROVÉRSIA. ART. 543-C, DO CPC. CONTRIBUIÇÃO SOCIAL SOBRE O LUCRO LÍQUIDO - CSLL. DISCUSSÃO SOBRE A BASE DE CÁLCULO DO IMPOSTO DE RENDA DA PESSOA JURÍDICA - IRPJ E DA EXCLUSÃO DOS JUROS SELIC INCIDENTES QUANDO DA DEVOLUÇÃO DE VALORES EM DEPÓSITO JUDICIAL FEITO NA FORMA DA LEI N. 9.703/98 E QUANDO DA REPETIÇÃO DE INDÉBITO TRIBUTÁRIO NA FORMA DO ART. 167, PARÁGRAFO ÚNICO DO CTN.

1. Não viola o art. 535, do CPC, o acórdão que decide de forma suficientemente fundamentada, não estando obrigada a Corte de Origem a emitir juízo de valor expresso a respeito de todas as teses e dispositivos legais invocados pelas partes.

2. Os juros incidentes na devolução dos depósitos judiciais possuem natureza remuneratória e não escapam à tributação pelo IRPJ e pela CSLL, na forma prevista no art. 17 do Decreto-lei n. 1.598/77, em cuja redação se espelhou o art. 373, do Decreto n. 3.000/99 - RIR/99, e na forma do art. 8º da Lei n. 8.541/92, como receitas financeiras por excelência. Precedentes da Primeira Turma: AgRg no Ag 1359761/SP, Primeira Turma, Rel. Min. Benedito Gonçalves, DJe 6/9/2011; AgRg no REsp 346.703/RJ, Primeira Turma, Rel. Min.Francisco Falcão, DJ de 02.12.02; REsp 194.989/PR, Primeira Turma, Rel. Min. Humberto Gomes de Barros, DJ de 29.11.99. Precedentes da Segunda Turma: REsp. n. 1.086.875 - PR, Segunda Turma, Rel. Min. Eliana Calmon, Rel. p/acórdão Min. Castro Meira, julgado em 18.05.2012; REsp 464.570/SP, Segunda Turma, Rel. Min. Castro Meira, DJ de 29.06.2006; AgRg no REsp 769.483/RJ, Segunda Turma, Rel. Min.Humberto Martins, DJe de 02.06.2008; REsp 514.341/RJ, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 31.05.2007; REsp 142.031/RS, Segunda Turma, Rel. Min. Franciulli Netto, DJ de 12.11.01; REsp. n.395.569/RS, Segunda Turma, Rel. Min. João Otávio de Noronha, DJ de 29.03.06.

3. Quanto aos juros incidentes na repetição do indébito tributário, inobstante a constatação de se tratarem de juros moratórios, se encontram dentro da base de cálculo do IRPJ e da CSLL, dada a sua natureza de lucros cessantes, compondo o lucro operacional da empresa a teor art. 17, do Decreto-lei n. 1.598/77, em cuja redação se espelhou o art. 373, do Decreto n. 3.000/99 - RIR/99, assim como o art. 9º, §2º, do Decreto-Lei nº 1.381/74 e art. 161, IV do RIR/99, estes últimos explícitos quanto à tributação dos juros de mora em relação às empresas individuais.

4. Por ocasião do julgamento do REsp. n. 1.089.720 - RS (Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 10.10.2012) este Superior Tribunal de Justiça definiu, especificamente quanto aos juros de mora pagos em decorrência de sentenças judiciais, que, muito embora se tratem de verbas indenizatórias, possuem a natureza jurídica de lucros cessantes, consubstanciando-se em evidente acréscimo patrimonial previsto no art. 43, II, do CTN (acréscimo patrimonial a título de proventos de qualquer natureza), razão pela qual é legítima sua tributação pelo Imposto de Renda, salvo a existência de norma isentiva específica ou a constatação de que a verba principal a que se referem os juros é verba isenta ou fora do campo de incidência do IR (tese em que o acessório segue o principal). Precedente: EDcl no REsp. nº 1.089.720 - RS, Primeira Seção, Rel. Min. Mauro Campbell Marques, julgado em 27.02.2013.

5. Conhecida a lição doutrinária de que juros de mora são lucros cessantes: "Quando o pagamento consiste em dinheiro, a estimação do dano emergente da inexecução já se acha previamente estabelecida. Não há que fazer a substituição em dinheiro da prestação devida. Falta avaliar os lucros cessantes. O código os determina pelos juros de mora e pelas custas" (BEVILÁQUA, Clóvis. Código Civil dos Estados Unidos do Brasil Comentado, V. 4, Rio de Janeiro: Livraria Francisco Alves, 1917, p. 221).

6. Recurso especial parcialmente provido. Acórdão submetido ao regime do art. 543-C, do CPC, e da Resolução STJ n. 8/2008".[2] - Negritei alguns trechos.

Ou seja, à luz desse julgado, de efeito repetitivo, os juros de mora só não serão ofertados à tributação do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza, se o valor do qual se originaram não sejam tributados ou gozem de isenção desses Tributos.

Vale dizer, deu oas juros de mora a mesma natureza dos valores dos quais se originaram, logo, podem não ter natureza indenizatória.

Data maxima venia, esse entendimento não se amolda à tradição dos velhos comercialistas portugues e brasileiros.

Na verdade, os juros de mora sempre têm natureza indenizatória, pois representam a recomposição da perda do uso de direito alheio(Credor)  por outrem(Devedor). 

Como se viu acima(2.2.1), data maxima venia, guardo profundas reservas sobre o consignado nesse julgado da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça, mas o assunto ainda passará pelo crivo do Supremo Tribunal Federal e nele está sob repercussão geral em dois casos, para pessoa jurídica, em debate neste feito,  RE 1.063.187/SC, tendo gerado  o Tema "962 - Incidência do Imposto de renda - Pessoa Jurídica (IRPJ) e da Contribuição Social sobre o Lucro Líquido (CSLL) sobre a taxa Selic (juros de mora e correção monetária) recebida pelo contribuinte na repetição do indébito.".

Data maxima venia, esse julgado da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça finda por admitir que Leis Ordinárias e Diplomas Legais, como Decretos-Leis, que têm natureza de Lei Ordinária, modifiquem o art. 43 da Lei nº 5.172, de 1966(CTN, que tem status de Lei Complementar), arrolando como fato gerador fato não abrangido nesse artigo dess Código.

As definições do direito privado(civil e comercia) não podem ser alteradas pela legislação do Direito Tributário(art. 110 do Código Tributário  Nacional), de forma que os  juros de mora, decorrente de qualquer verba(submetida  ou não ao IRPJ e à CSLL), em face da sua natureza indenizatória, não podem sofrer a incidência desse imposto, pois não causa nenhum acréscimo patrimonial, uma vez que apenas repõe aquele valor que não se obteve ou que deixou de ser obtido pelo uso indevido(no caso, cobrança indevida ou não ressarcimento no prazo legal) do dinheiro daquele que recebe tais juros(o Contribuinte) pelo Terceiro(no caso,  a Fazenda Nacional). E consequentemente, também não pode incidir sobre o valor dos juros de mora a Contribuição Social sobre o Lucro Líquido - CSLL, que tem, quanto ao fato gerador, a mesma estrutura do Imposto sobre Renda e Proventos de Qualquer Natureza da Pessoa Jurídica - IRPJ.  

E causa-me tristeza, porque o Superior Tribunal de Justiça adjetiva-se de o "Tribunal da Cidadania", e, data maxima venia, findou por modificar uma Lei Complementar, criando, de forma inconstitucional(porque fere o art. 146 da vigente Constituição da República), uma hipótese de incidência do IR, qual seja, sobre uma verba de natureza indenizatória.

2.2.2-2 - Mas, felizmente, surgiu uma luz no final do túnel: com relação à Pessoa Física, pois o Pleno do Supremo Tribunal Federal findou por julgar Recurso Extraordinário - RE nº 855.091 e o respectivo acórdão ficou com a seguinte ementa:

"EMENTA Recurso extraordinário. Repercussão Geral. Direito Tributário. Imposto de renda. Juros moratórios devidos em razão do atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função. Caráter indenizatório. Danos emergentes. Não incidência.

1. A materialidade do imposto de renda está relacionada com a existência de acréscimo patrimonial. Precedentes.

2. A palavra indenização abrange os valores relativos a danos emergentes e os concernentes a lucros cessantes. Os primeiros, correspondendo ao que efetivamente se perdeu, não incrementam o patrimônio de quem os recebe e, assim, não se amoldam ao conteúdo mínimo da materialidade do imposto de renda prevista no art. 153, III, da Constituição Federal. Os segundos, desde que caracterizado o acréscimo patrimonial, podem, em tese, ser tributados pelo imposto de renda.

3. Os juros de mora devidos em razão do atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função visam, precipuamente, a recompor efetivas perdas (danos emergentes). Esse atraso faz com que o credor busque meios alternativos ou mesmo heterodoxos, que atraem juros, multas e outros passivos ou outras despesas ou mesmo preços mais elevados, para atender as suas necessidades básicas e às de sua família.

4. Fixa-se a seguinte tese para o Tema nº 808 da Repercussão Geral: "Não incide imposto de renda sobre os juros de mora devidos pelo atraso no pagamento de remuneração por exercício de emprego, cargo ou função".

5. Recurso extraordinário não provido."[3].

Ou seja, a Suprema Corte fez prevalecer a estrutura jurídico-tributária acima delineada(v. subitem 2.2.1), a qual defendemos nas nossas sentenças há anos.

2.2.2-3 -  A rigor, por força do inciso III do art. 927 do vigente CPC, este Magistrado, como qualquer outro, era obrigado a aplicar mencionado julgado da 1ª Seção do Superior Tribunal de Justiça(v. subiem 2.2.2-1 supra),   porque de efeito repetitivo.

Mas agora como o Pleno da Suprema Corte concluiu, corretamente, pela  natureza jurídica indenizatória dos juros de mora, no d. julgado cuja ementa transcrevi no subitem anterior, e considerando, conforme penso ter demonstrado, que a atualização da tabela SELIC contem apenas percentual de juros de mora, conforme expressamente estabelecido nas Leis que dela tratam no campo bancário e tributário(nesse sentido, vide subitem 2.2.1 supra), creio que será essa a resolução que tomará o Plenário do Supremo Tribunal Federal no julgamento do  RE nº 1.063.187/SC, no qual se gerou o Tema 962, sob repercussão geral,  e onde está a espera de julgamento definitivo, tenho que cabe a medida liminar para autorizar, desde já, a Impetrante a não recolher o IRPJ e a CSLL sobre os valores decorrentes de juros da Tabela SELIC e, no mérito, a concessão da segurança quanto ao direito de não mais ofertar à tributação do IRPJ e da CSLL as parcelas de juros de mora decorrentes de tais juros.

No entanto, diante do uso do mandado de segurança, a restituição ou compensação das parcelas já pagas desses tributos sobre os juros da tabela SELIC, será autorizada nos termos das Súmulas Súmulas 267 e 269 do STF, com as quais não se chocam as seguintes Súmulas do STJ: Súmula nº 271 do STJ: "A concessão de mandado de segurança não produz efeitos patrimoniais em relação a período pretérito, os quais devem ser reclamados administrativamente ou pela via judicial própria"; "Súmula 213 - O mandado de segurança constitui ação adequada para a declaração do direito à compensação tributária."; "Súmula 212 - A compensação de créditos tributários não pode ser deferida em ação cautelar ou por medida liminar cautelar ou antecipatória.".

Claro, após o trânsito em julgado(art. 170-A, CTN), com atualização dos juros da Tabela Selic, conforme fundamentado no subitem 2.2.1 supra.

3. Dispositivo

Posto isso:

3.1 - concedo a medida liminar e autorizo a ora Impetrante a não submeter à tributação do IRPJ e da CSLL os valores que receber a título de juros de mora da Tabela SELIC, na repetição de indébito tributário e determino que a DD Autoridade apontada como coatora abstenha-se de autuá-la por essa prática, sob as penas do art. 26 da Lei nº 12.016, de 2009;

3.2 - no mérito, julgo parcialmente procedentes os pedidos desta ação mandamental e concedo a segurança, tornando definitiva a medida liminar supra, para todos os fins de direito, e condeno a UNIÃO - FAZENDA NACIONAL a restituir ou permitir a compensação das parcelas de IRPJ e CSLL pagas pela ora Impetrante a partir da data em que impetrou este mandado de segurança, ressalvandov à Impetrante o direito de pleitear as parcelas anteriores, não fulminadas pela decadência ou prescrição, na via administrativa própria e, se indeferido o pleito, na via judicial própria, após o trânsito em julgado(art. 170-A, CTN).

3.3 - como foi mínima a sucumbência da Parte Impetrante, condeno a UNIÃO - FAZENDA NACIONAL a restituir as custas pagas pela Impetrante, devidamente atualizadas pelos índices da Tabela SELIC, a partir do mês seguinte àquele em que foram desembolsadas;

3.4 - sem verba honorária(art. 25 da Lei nº 12.016, de 2009, e Súmulça 512 do STF);

3.5 - submeto esta sentença ao duplo grau de jurisdição, sem refeito suspensivo.

Registrada, intimem-se.

Recife, 24.05.2021

Francisco Alves dos Santos Júnior

Juiz Federal, 2ª Vara/PE

(lsc)

___________________________________________ 

[1] Nesse sentido, Édison Freitas de Siqueira, in "Taxa SELIC - Origem, Conceito, Fórmula e Legalidade" no site Thomsom Reuters FISCO on Line.

[2] Brasil. Superior Tribunal de Justiça. Primeira Seção. Recurso Especial - REsp 1.138,695+SC, Recurso Especial – Resp nº 2009/0086194-3, Relator Ministro Mauro Campbell Marques, julgamento em 22.05.2013, in Diário da Juustiça Eletrônico - DJe de 31/05/2013 e
RDTAPET vol. 38 p. 223.

Disponível em

https://scon.stj.jus.br/SCON/jurisprudencia/toc.jsp?i=1&b=ACOR&livre=((%27RESP%27.clas.+e+@num=%271138695%27)+ou+(%27REsp%27+adj+%271138695%27.suce.))&thesaurus=JURIDICO&fr=veja

Acesso em 24.05.2021

[3] Brasil. Supremo Tribunal Federal. Pleno. Recurso Extraordinário - RE nº 855.091\RS, Relator Ministro Dias Toffoli. Julgamento em 15.03.2021, Publicação em 08.04.2021.[Sob

Repercussão Geral].

Disponível em

https://jurisprudencia.stf.jus.br/pages/search?base=acordaos&sinonimo=true&plural=true&page=1&pageSize=10&queryString=RE%20855091&sort=_score&sortBy=desc

Acesso em 24.05.2021.

Nenhum comentário:

Postar um comentário